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Antoniel Souza Ribeiro da Silva Júnior*
*Acadêmico de Direito da Universidade Católica do Salvador (BA)
Sumário: 1. Introdução. 2. Dogmática processual penal. 3. Direito
comparado. 4.Conclusões. 5. Bibliografia.
1.
INTRODUÇÃO.
A
reconstituição do crime ou reprodução simulada dos fatos vem prevista no art.
7º do Código de Processo Penal pátrio, ipsis verbis: "Para verificar a
possibilidade de haver a infração sido praticada de determinado modo, a autoridade
policial poderá proceder à reprodução simulada dos fatos, desde que esta não
contrarie a moralidade ou a ordem pública". Trata-se de instituto do qual
poderá lançar mão a autoridade investigadora para esclarecer determinados
aspectos do fato supostamente delituoso, mormente nos de difícil elucidação
quanto ao modus operandi do agente.
No
presente ensaio pretendemos tecer algumas considerações sobre o instituto da
reconstituição do crime, colacionando considerações doutrinárias e pesquisando
da existência do instituto em outros ordenamentos jurídicos. Discute-se da
importância ou não de se proceder à reprodução simulada, e qual procedimento a
adotar-se quando tal diligência for efetuada no curso do processo penal, uma
vez que o diploma processual criminal é silente neste particular.
2.
DOGMÁTICA PROCESSUAL PENAL.
Consoante
dissemos acima, a reprodução simulada dos fatos está prevista no art. 7º do
CPP, inscrita entre os dispositivos do Título II - Do inquérito policial. Está
compreendida no elenco das providências instrutórias a cargo da autoridade
policial. Esta autoridade poderá proceder à reconstituição nos casos de
complexa elucidação, principalmente quando houver dúvidas sobre posicionamento,
distância, existência de obstáculos, etc(1) . Naturalmente é a complexidade do
caso que ditará da necessidade ou não da reconstituição. Trata-se de faculdade
discricionária da autoridade já que a norma processual não lhe impõe este
dever. Além do mais, quando houver concurso de autores ou de crimes, o procedimento
pode mostrar-se bastante útil, aclarando aspectos relativos à participação de
cada um dos indivíduos no fato delituoso.
Para que
tal expediente alcance sua precípua finalidade, qual seja a de lançar um facho
de luz sob determinados aspectos do fato supostamente delituoso, mister se faz
a presença do indigitado autor ou autores deste fato sob investigação. Sem este
ator protagonista, a encenação poderá perder muito de sua utilidade. Além do
que, a encenação deverá ser realizada no mesmo ambiente, se possível reunindo
testemunhas do fato original (o que nem sempre é fácil, pelo medo que estas
podem ter de represálias dos agentes do crime), e do ato geralmente são feitas
fotografias, croquis ou filmagens. Tudo documentado num laudo pericial que será
juntado aos autos do procedimento policial ou da ação penal se for o caso.
LUIZ
CARLOS ROCHA registra que a reconstituição tem as seguintes características:
"(a) quanto à natureza, é uma prova mista, baseada nas informações e
nas fotografias, filmagens ou vídeos feitos na ocasião da diligência; b)
quanto ao objetivo, verificar como o crime foi praticado; c) quanto ao modo de
fixação, é documentada pelo relatório pericial, ilustrado com fotografias
seriadas com legendas e croquis; d) quanto à oportunidade, é procedida
geralmente na apuração de crimes de homicídio, acidentes de trânsito e contra o
patrimônio"(2) (grifo nosso).
Trata-se, como se vê, de meio de prova
caracterizado pela "teatralización de las seqüências del hecho
investigado, según distintas versiones de sus protagonistas (incluidos
imputados, víctimas, testigos) proporcionan, con el objeto de determinar la
posibilidad (física) que se hubiere desarollado del modo relatado"(3) . Como elemento de prova obtido no inquérito
policial está sujeita as mesmas limitações dos demais meios de prova levados a
efeito nesta fase da persecução penal.
O
indiciado não está obrigado a participar dos atos de reconstituição, já que
constituiria constrangimento ilegal o qual na está obrigado a suportar. O
ilustrado BENTO DE FARIA há mais de quarenta anos já lecionava: "A
autoridade não pode obrigar o indiciado a figurar no quadro, pois tal
importaria em violência, e não valem os adminículos de prova obtidos por este
meio"(4) . A doutrina é uníssona neste aspecto. Pode o indiciado ou réu
legitimamente recusar-se a participar, sem que se caracterize nenhuma
desobediência ou desrespeito à autoridade. Mesmo trilho percorre a
Jurisprudência do STF deferindo Habeas corpus para remediar a ilegalidade como
podemos conferir: "O suposto autor do ilícito penal não pode ser
compelido, sob pena de caracterização de injusto constrangimento, a participar
da reprodução simulada do fato delituoso. Do magistério doutrinário, atento ao
princípio que concede a qualquer indiciado ou réu o privilégio contra
auto-incriminação, resulta circunstância de que é essencialmente voluntária a
participação do imputado ao ato - provido de indiscutível eficácia probatória -
caracterizador de reprodução simulada do fato delituoso" (RT
697:385-6).
Silenciar
durante os atos persecutórios é um direito constitucional de qualquer cidadão
conforme o art. 5º, inciso LXIII: "o preso será informado dos seus
direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a
assistência da família e de advogado" (grifo nosso). Constitui-se numa
aberração pretender ou exigir a qualquer custo que o indiciado participe da
reprodução simulada dos fatos. O Estado não pode exigir que o cidadão se
auto-incrimine fornecendo elementos de prova que podem complicar-lhe a situação
numa futura ação penal. Nemo tenetur se detegere é o brocardo que
sinaliza que ninguém é obrigado a acusar a si próprio. Incumbe aos órgãos da
persecução penal reunir as provas da autoria e materialidade da infração. O
suspeito pode restar completamente inerte, sem que nenhuma presunção possa ser
derivada de seu comportamento.
Conforme
disposto no ordenamento processual, a encenação dos fatos de regra ocorre ainda
na fase pré-processual da persecutio criminis. No inquérito policial o
sujeito é objeto de investigação(5) e há toda uma atmosfera de coação que lhe
cerca, mormente se estiver detido. Nestas circunstâncias predomina uma áurea de
confiança acerca da culpabilidade do indivíduo, mormente se foi detido em
flagrante delito. Isto é inevitável, se não o fosse não estaria sendo
investigado. Embora a conduta, os atos supostamente praticados pelo indivíduo
sejam objeto de diligências pelo Estado, aquele não perde suas qualidades de
sujeito de direitos, ainda mais aqueles inscritos na Carta Magna da República.
Resta-lhe incólume a sua dignidade humana, integridade física e moral, bem como
a sua presunção de inocência. Afinal, quando a carta magna prescreve "ninguém
será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei"
(Constituição da República, art. 5º, inciso II), consubstancia uma das
expressões do princípio da legalidade com reflexos importantes na esfera
processual penal. Ou seja, só será legítimo restringir a liberdade de agir da
pessoa mediante preceitos de origem do poder legislativo competente. Não consta
em nenhum texto legal o mandamento de que o sujeito tem que fazer prova contra
si próprio!
Fatos já
históricos na literatura processual penal ilustram bem tal aspecto durante os
interrogatórios policiais, coroando o privilégio da não auto-incriminação como
princípio constitucional limitador das atividades investigativas do Estado.
Veja o caso Miranda vs. Arizona julgado em 1966 na Suprema Corte Americana da
lavra de EARL WARREN, então presidente daquela corte:
"Esta corte há notado recientemente
que el privilegio en contra de la autoincriminación (...) se funda num em um
complejo de valores y todos estos valores apuntan a uma reflexión dominante: el
fundamiento constitucional que subyace al privilegio es el respeto que el
gobierno debe observar a la dignidad e integridad de sus cidadanos. Para
mantener um ' justo equilíbrio Estado-individuo', para exigir del gobierno
'suportar toda la carga', para respetar 'la inviolabiladad de la personalidad
humana' nuestro sistema acusatorio de justicia criminal exige que el Gobierno
que pretende penar a um individuo produzca la prueba em sua contra por sus
propios e independientes medios, em lugar de hacerlo a través del cruel y
simple recurso de forzar dicha prueba desde la propia boca del imputado"(6)
.
Intuitivo
que durante tal reconstituição o acusado poderá ser induzido a fazer
declarações ou assumir comportamentos não compreendidos na conduta que ensejou
instauração do inquérito. Por desconhecimento de seus direitos constitucionais
o investigado concorda em participar de tais encenações, sem ao menos se dar
conta das futuras implicações de sua conduta. O que o caso Miranda vs
Arizona veio demonstrar é que a dignidade e integridade dos cidadãos
constituem uma barreira intransponível às atividades investigatórias. O ônus
probatório deve recair sobre as autoridades governamentais utilizando-se de
seus próprios meios, e não através "da própria boca do acusado".
Afiguram-se ilícitos meios probatórios que violentem a personalidade e a
dignidade humana, e outro dispositivo constitucional rechaça a admissibilidade
de tais provas assim coligidas no seio do processo.
Ademais
resta consignado no art. 8, letra "g" do Pacto de San Jose de Costa
Rica, no capítulo destinado às garantias judiciais, que toda pessoa acusada de
um delito tem "direito de não ser obrigada a depor contra si mesma, nem
a declarar-se culpada". Como sabemos este pacto foi positivado e
incorporado no direito brasileiro pelo decreto 678 de 06.11. 1992 que
determinou seu integral cumprimento. Por se tratar de garantia individual
contra ingerências do Estado na esfera de autonomia do cidadão, por força do
parágrafo segundo do art. 5º da Magna Carta, incorporou-se às demais garantias
processuais elencadas naquele artigo. Tem status constitucional inegável. Ainda
assim, para alguns doutrinadores, o indiciado poderá ser forçado a comparecer,
mas não a participar (7) .
O valor
de tal reconstituição é questionado por alguns mestres. Para MEHMERI a
reprodução "é peça de pouca valia, ou quase nenhuma, posto que não gera
fato novo, nem fornece elementos autônomos", destinando-se apenas a
esclarecer algumas dúvidas(8) . O mesmo pensamento é o de DÉLIO MARANHÃO que
fulmina a eficácia de tal método, pois não alcançaria resultados práticos,
"provocando apenas alarde da imprensa com esse método de investigação, e
atraindo aos locais de diligência a curiosidade popular...(9) .
Uma vez
que o indigitado autor da infração concorde livre e espontaneamente em
participar da reconstituição, a autoridade deve se cercar de alguns cuidados a
legitimar o procedimento: afastar curiosos e a impensa do local, não alardear o
ato, manter tratamento urbano com o acusado e deverá oficiar o Procurador Geral
solicitando presença de Membro do Ministério Público para acompanhar as
diligências(10) . Claro que se o indivíduo sob investigação tiver defensor o
mesmo deve se fazer presente. Deverá ainda providenciar condições de redobrada
vigilância para evitar "resgate, por parte de seus companheiros, fuga ou
tentativa de fuga"(11) . As referidas providências impõem legitimidade e
seriedade ao ato investigatório.
De regra,
a reprodução simulada pode ser realizada ex officio pela autoridade policial,
caso esta julgue que a mesma possa trazer elementos relevantes para esclarecimento
dos fatos delituosos. Ou alternativamente pode ainda o representante do
Ministério Público requisitar que seja realizada a reconstituição do crime,
caso esta diligência seja imprescindível para oferecimento da denúncia (CPP,
art. 16). Restando vedada a reprodução simulada quando ofensiva à moralidade ou
ordem pública (CPP art. 7º, parte final). Os doutos entendem atentar contra
moralidade hipóteses tais como dos crimes contra os costumes. Atentaria contra
ordem pública, de outra parte, casos em que os atos simulados possam trazer
risco de inundação, desabamento, desmoronamento, etc(12) .
O CPP é
omisso em relação à reprodução simulada do fato uma vez instaurada a instância
penal. Compreende-se que o juiz criminal pode determinar ex officio este tipo
de diligência, figurando entres seus poderes instrutórios para dirimir dúvidas
sobre ponto relevante (CPP, art. 156). Pode atender a requerimento de alguma
das partes. Aliás, como dispõe a exposição de motivos do CPP no. VIII:
"... o juiz deixará de ser um espectador inerte da produção de provas. Sua
intervenção na atividade processual é permitida, não somente para dirigir a
marcha da ação penal e julgar a final, mas também para ordenar, de ofício, as
provas que lhe parecerem úteis ao esclarecimento da verdade". Também aqui
o réu não está obrigado a participar.
Por ser
diligência no curso do processo, as garantia sagradas do contraditório e ampla
defesa aqui sem impõem com toda sua grandeza. É direito do réu estar presente e
fazer-se acompanhar de advogado, bem como fazer observações que repute
favorável a sua defesa, dirigindo-se ao juiz criminal. Trazemos para ilustrar
outro julgado de nossa Suprema corte que corrobora semelhante entendimento:
"A reconstituição do crime, especialmente quando realizada na fase
judicial da persecução penal, deve fidelidade ao princípio constitucional do
contraditório, ensejando ao réu, desse modo, a possibilidade de a ela estar
presente e de, assim impedir eventuais abusos descaracterizadores da verdade
real, praticados por autoridade pública ou por seus agentes" (RT
697:385-6)(13) .
Como se
sabe o Código de Processo Penal não disciplina o procedimento de reprodução
simulada no curso da instrução processual. Aplicam-se subsidiariamente os
dispositivos dos arts. 440 ao 443 do Código de Processo Civil que cuida da
Inspeção Judicial. Assim nos autoriza a Lei de Introdução ao Código Civil, no
seu art 4º:"Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo
com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito".Aplicamos
aqui a analogia, pois subsistem seus critérios de aplicação: o caso não está
previsto em norma processual penal e relação de semelhança entre este
procedimento no cível e no crime é relevante a ponto de autorizar o uso da
analogia(14) . Há a lacuna no diploma processual criminal que deve ser
integrada segundo os ditames da teoria geral do direito. Há semelhanças
importantes entre a inspeção judicial e reconstituição dos fatos, a primeira
como um procedimento estático de observação dos vestígios de uma realidade
sensível, e a última como observação de uma realidade que tenta reproduzir
fatos pretéritos através da "teatralização" destes mesmos fatos. Para
VILLANUEVA HARO doutrinando acerca das relações entre a inspeção judicial e a
reconstituição dos fatos vocifera que "la relación substancial entre estas
diligencias la encontramos em el tiempo, modo y forma de como se efectúa la
observación del escenario del desarollo del delito; mientras que la inspeción
observa, describe y transcribe, la reconstrucción observa, describe,
reconstruye, comprueba, infiere y transcribe los hechos. Aparentemente la
diligencia de reconstruccíon de los hechos contiene a la de inspección, pero
cada uma de estas tiene tareas difenciadas"(15) .
Ora,
algumas regras o magistrado deve seguir para guiar uma diligência realizada sob
sua presidência. Se o diploma processual criminal é omisso, nada mais intuitivo
que se valha das regras processuais do cível para orientar-se, naquilo que não
destoar dos princípios que regem o processo penal. Consoante disposto no CPC no
capítulo que trata da inspeção judicial, o juiz poderá ser assistido por perito
(art. 441 do CPC), as partes têm direito a assistir à reconstituição, prestando
esclarecimentos e fazendo observações de interesse para a causa ( tanto o
representante do MP, quanto o acusado, art. 442, parágrafo único), concluída a
diligência o juiz mandará lavrar auto circunstanciado , mencionando nele tudo
quanto for útil ao julgamento da causa, podendo instruir o auto com
fotografias, gráficos ou desenho ( art. 443, parágrafo único)(16) . Alias,
DÉLIO MARANHÃO já pontificava: "só a reprodução judicial inspira
confiança"(17) ( grifo nosso). Não falece razão a este notável
processualista, uma vez que obtido meio de prova sob crivo do contraditório,
inegável que esta se torna mais robusta. Diferente do que ocorre no inquérito
policial, se não são tomadas as providências delineadas anteriormente. Em
alguns ordenamentos alienígenas, conforme veremos avante, a reprodução simulada
dos fatos só ocorre por solicitação do Ministério Público, do acusado ou do
juiz instrutor, atendendo aos reclames do contraditório.
Esta
diligência determinada pelo juiz criminal somente se legitimaria de forma
complementar e supletiva à atuação dos órgãos encarregados da persecução penal.O
perigo maior seria o da quebra da imparcialidade como uma das maiores
qualidades do órgão jurisdicional. Os mestres o dizem. FREDERICO MARQUES com a
genialidade que lhe é peculiar leciona "se ele (juiz) entregar-se à
instrução da causa, com ardor de detetive diligente, estará quebrada a garantia
da defesa plena e comprometida toda a estrutura acusatória do processo penal.
(...). Pensar que o juiz precise descer à arena das investigações, como se
fosse um policial à procura de pistas e vestígios seria tentar a ressurreição
das devassas, do procedimento inquisitivo e criar o risco e perigo de decisões
parciais e apaixonadas, com grande prejuízo, sobretudo para o direito de
defesa"(18) . Comentando o art. 156 do CPP pátrio o mestre TOURINHO FILHO
arremata: "Ademais, o juiz que desce do seu pedestal de terceiro
desinteressado, para proceder à pesquisa e colheita de material probatório,
compromete, em muito, a sua imparcialidade e 'no se comporta funcionalmente
como auténtico órgano jurisdicional'"(19) . Se o mérito da pretensão
punitiva depender de modo relevante deste procedimento, cremos que tal
reprodução simulada estaria legitimamente autorizada, presidindo o próprio
magistrado o ato de reconstituição auxiliado pela Polícia Judiciária.
3. DIREITO
COMPARADO.
Trata-se
de uma inovação do Código de Processo pátrio e mesmo antes de sua vigência,
como noticia DÉLIO MARANHÃO, as Polícias do Estado de São Paulo e do Distrito
Federal já lançavam mão da reprodução simulada do delito, quando a sociedade era
abalada por crimes bárbaros(20) .
Pesquisando
os Códigos de processo de alguns países da América, observamos que fazem
previsão do instituto sob comento: Argentina nos arts. 221 e 222, dispondo que
somente o juiz de instrução poderá ordenar a reconstituição dos fatos,
contemplando expressamente que: "no podrá obligarse al imputado a
intevenir em la reconstrucción; pero tendrá derecho a solicitarla";
Costa Rica no art. 192 prevendo na sua segunda parte que: "Nunca se
obligará al imputado a intervenir em el acto, que deberá practicarse com la
mayor reserva posible"; Peru no art 146, 2ª parte quando a diligência
será determinada pelo juiz instrutor; Equador no art. 112 determinada pelo
Ministério Público; Honduras disciplina o instituto da reconstrução dos fatos
em sete artigos dos arts. 321 ao 327. Neste caso, as partes podem solicitar a
reconstituição dos fatos, que será determinada pelo juiz. Esta diligência de
reprodução do fato delituoso poderá ocorrer quantas vezes o juiz julgue
necessário. Nem este nem as testemunhas poderão externar opinião durante a
reconstituição. No diploma processual Uruguaio a diligência é prevista no art.
182, também determinada pelo juiz.
No
direito luso a reconstituição do crime vem prevista no art. 150, dispondo que a
reprodução deve ser "tão fiel quanto possível" (art. 150, n 1) e que
"o despacho que ordenar a reconstituição do facto deve conter uma
indicação sucinta de seu objeto, do dia, hora e local em que ocorrerão as
diligências e da forma de sua efectivação, eventualmente com recurso a meios
audiovisuais. No despacho pode ser designado perito para execução de operações
determinadas" (art. 150, n 2). Por fim rege que a publicidade deve ser
evitada (art. 150, n 3). Em nenhum dos diplomas consultados a reconstituição do
crime é minudentemente disciplinada. Os dispositivos limitam-se a traçar regras
gerais. A diligência é determinada pelo Ministério Público ou pelo juiz
criminal, consoante o modelo de processo penal adotado naqueles países.
O
anteprojeto de lei de reforma do Código de Processo Penal que hiberna no
congresso prevê no art. 6º, entre as providências da autoridade policial no
inciso VII que esta deverá proceder à reprodução simulada dos fatos quando
necessária e não ofensiva a moralidade ou ordem pública, tal como atualmente
disciplina. A inovação salutar, ao meu sentir, é o que reza o & 1º deste
art. 6º quando ordena que esta diligência de reconstituição só se faça com
prévia intimação do Ministério Público, do ofendido e do investigado. Neste
ponto cremos que foi dado um largo passo para legitimar a reprodução simulada
com meio de prova a seguir os ditames do contraditório.
4.
CONCLUSÕES.
A reconstituição do crime , como instituto processual penal, não é
providência recente no direito brasileiro. Como salientou DÉLIO MARANHÃO,
autoridades policiais de alguns estados brasileiros já procediam a esta
diligência antes da vigência do atual CPP. Esta providência tem seu valor
questionado por alguns processualistas. Pensamos que em casos complexos, com
participação de vários agentes ou nos concursos de crimes, a reprodução
simulada poderá ajudar a aclarar alguns aspectos ainda obscuros do fato
delituoso. Não só os interesses da acusação são atendidos neste procedimento de
indiscutível eficácia probatória. A defesa poderá se beneficiar da providência.
Cogitemos da hipótese da impossibilidade material do fato ter ocorrido tal como
relatado na denúncia ou na notícia crime, evidenciar uma participação de menor
importância, uma cooperação dolosamente distinta, etc. Para ser legitimada como
meio de prova, a autoridade deve se acautelar com as procedências elencadas
acima, compatibilizando ambos os interesses: o da sociedade em ver apuradas as
infrações penais e do investigando ou réu em ter resguardado seus direitos
constitucionais.
NOTAS
1.
MEHMERI,
Adilson. Inquérito Policial (dinâmica). São Paulo: Saraiva, 1992. Pág. 259.
2. ROCHA, Luiz Carlos. Investigação Policial. Teoria e prática. 1. ed. São
Paulo: Saraiva, 1998. Pág. 104.
3. CARLOS CREUS Apud HARO, Benito Villanueva in La reconstrucción de los hechos
y su valor probatório em el proceso penal. Disponível em:
htpp//:www.derechopenalonline.com/fevrero.2004/harorecontrucción.htm. Acesso em
15/02/2004.
4. BENTO DE FARIA Apud MEHMERI na ob. Cit, pág. 261, nota de rodapé 215.
5. Não queremos aqui nos referir à pessoa humana como coisa, e sim como objeto
no sentido filosófico do vocábulo. Contraposto ao sujeito cognoscente situa-se
o "objeto" cognoscível deste. Repudiamos o Direito Penal do autor,
porquanto o que é objeto de investigação no inquérito é a conduta do(s)
sujeito(s).
6. In BAYTELMAN A. "Tiene derecho a guardar silencio..." La
Jurisprudência Norteamericana Sobre la declaración policial. Disponível em:
http//:www.justiciacriminal.cl/doctrina. Acesso em 27/11/2003.
7. CAPEZ, Fernando. Curso de Processo Penal. 9. ed. Rev. e atual. São Paulo:
Saraiva, 2003. Pág. 84.
8. MEHMERI, Adilson. Op. Cit.
Pág. 259.
9. DELIO MARANHÃO Apud. MEHMERI, na op. Cit. Pág. 260.
10. MEHEMERI, Adilson. Op. Cit. Pág. 262.
11. ROCHA, Luiz Carlos. Op. Cit. Pág. 104.
12. Os exemplos são de MIRABETE
in Código de Processo Penal interpretado. 9.ed. São Paulo: Atlas, 2002, pág.
110.
13. Os julgados foram retirados de MIRABETE na Op. Cit. págs. 110-1.
14. DINIZ, Maria Helena. Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro
interpretada. 6. ed. Atual. São Paulo: Saraiva, 2000. Págs.
112-113.
15. HARO, Benito Villanueva in Op. Cit.
Ubi eadem legis ratio, ibi eadem dispositio ! A doutrina penalista leciona que
o "pedido de explicações em juízo" nos crimes contra a honra por não
ser disciplinada pelos diplomas criminais, deverá seguir o rito procedimental
das interpelações e notificações judiciais do CPC (arts. 867 a 873). Cf. por
todos BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal. Parte Especial. 2.ed.
São Paulo: Saraiva, 2002, pág. 405. Neste passo leciona Vicente Greco que o CPC
pode servir de importante fonte subsidiária ao processo penal (GRECO FILHO,
Vicente. Manual de Processo Penal. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 1998, pág. 88)
16. DÉLIO MARANHÃO apud MEHEMERI, Adilson . op. Cit. Pág. 263.
17. FREDERICO MARQUES. Elementos de Direito Processual penal. Vol II. 1.
ed. Campinas: Bookseler, 1997.
Pág. 264.
18. TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. 3º volume. 12. ed. São
Paulo: Saraiva, 1990. Pág. 215.
19. DELIO MARANHÃO apud MEHEMERI, Adilson na Op. Cit. Pág. 260.
5.
BIBLIOGRAFIA.
CAPEZ,
Fernando. Curso de Processo Penal. 9. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva,
2003.
FREDERICO
MARQUES. Elementos de Direito Processual Penal. Vol. II. Campinas:
Bookseller, 1997.
GRECO
FILHO, Vicente. Manual de Processo Penal. 5.ed. São Paulo: Saraiva, 1998.
MEHEMERI,
Adilson. Inquérito Policial (dinâmica).São Paulo: Saraiva, 1992.
MIRABETI,
JULIO FABBRINI. Código de Processo Penal Interpretado. 9.ed. São Paulo: Atlas,
2002.
MOSSIN,
Heráclito. Curso de Processo Penal.Vol. 1. São Paulo: Atlas, 1997.
ROCHA,
Luiz Carlos. Investigação Policial. Teoria e Prática. São Paulo: Saraiva, 1998.
SALLES
JÚNIOR, Romeu de Almeida. Inquérito Policial e Ação Penal. 7.ed. São Paulo:
Saraiva, 1998.
TOURINHO
FILHO, Fernando da Costa. Código de Processo Penal comentado. Vol. 1. 4. ed.
São Paulo: Saraiva, 1999.
SILVA JÚNIOR, Antoniel Souza Ribeiro da. A reconstituição do crime no processo penal brasileiro. Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=316> Acesso em: 15 set. 2006.