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Ricardo Ribeiro Velloso*
*Pós-graduado em Direito Penal Econômico pela Universidade de Coimbra –
Portugal; Orientador do Núcleo de Desenvolvimento Acadêmico - OAB/SP; Pós-graduado
em Direito Penal Empresarial pela FGV/SP; Professor da Universidade Bandeirante
- UNIBAN
Advogado criminalista
Lombroso,
médico psiquiatra italiano, realizou grandes estudos a respeito da antropologia
criminal, que serviram de diretrizes para uma nova consciência sobre o Direito
Penal, iniciando a Escola Positiva Italiana e, posteriormente, culminando na
"Teoria Finalista da Ação", dando origem, assim ao moderno Direito
Penal. Onde a ação do delinqüente passou a ter um caráter secundário, dando-se
maior relevância à pessoa e sua vontade.
Para que
uma pessoa responda a um processo crime e consequentemente seja punida por sua
ação, primeiramente é preciso que esta ação seja considerada crime.
Conforme
a "teoria finalista" de Hans Welzel, os elementos formais do delito
são o fato típico e a antijuridicidade, ficando a culpa excluída, por tratar-se
do pressuposto da pena, diferente da doutrina tradicional, onde esta integra os
elementos formais.
A culpa
finalista está dividida em três elementos: imputabilidade, exigibilidade de
conduta diversa e possibilidade de conhecimento do injusto.
O fato do
agente não compreender plenamente que sua conduta é criminosa, o exclui de
sofrer as punições previstas no Código Penal, isto é, mesmo que o ato
praticado, seja típico e antijurídico, é como tal um delito, conforme a teoria
finalista. Segundo Tourinho Filho , se ao agente "falta discernimento
ético para entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se com esse
entendimento, o juiz proferirá sentença absolutória, com fulcro no art. 26 do
Código Penal e art. 386, V do Código de Processo Penal, impondo-lhe, contudo,
medida de segurança, tal como dispõe os arts. 97 do Código Penal, e art. 386,
parágrafo único, III do Código de Processo Penal".
Verificamos
uma preocupação do legislador em prever situações nas quais, mesmo estando
presentes os elementos formais do delito, o agente não sofreria o peso da
sanção, por sua conduta.
O
legislador trata da imputabilidade subjetivamente, preferindo elencar quem são
os inimputáveis, ao invés de explicar quem seriam os imputáveis.
O Código
Penal traz em seus arts. 26 "caput", 27 e 28, § 1, os inimputáveis,
que são os doentes mentais, menores de 18 anos e em casos onde o agente está
sob estado de embriaguez acidental.
Os casos
em que a inimputabilidade advier de embriaguez acidental serão comprovados
através de exame clínico, já os atos praticados por agente menor de 18 anos,
com a simples apresentação do registro de nascimento, comprova-se.
Mais
delicado, entretanto, é a declaração de inimputabilidade, quando se suspeitar
da integridade mental do agente, pois esta confirmação só se dará, através de
exame psiquiátrico.
O exame
psiquiátrico pode ser solicitado em qualquer fase do procedimento criminal,
quer na sua fase inquisitorial, quer na sua fase processual, bem como na sua
fase executória.
O
magistrado é o único com competência para determinar a feitura do exame de
sanidade mental, esse tipo de perícia é a única que, o delegado não pode
determinar de ofício.
É
imprescindível a realização do exame psiquiátrico, quando surge dúvida dessa
natureza, para que se estabeleça o nível de entendimento do agente, no momento
em que praticou o delito, e também, para que se possa averiguar se a doença,
pré existia ou se veio a ocorrer após o evento delituoso.
Observamos
que em certos casos, o agente não possui uma doença mental propriamente dita,
mas sim, uma perturbação de seu estado mental, criando assim, uma lacuna entre
a higidez mental e a insanidade. Para esses casos chamados fronteiriços, o
Código Penal prevê a redução da pena de um a dois terços (art. 26, parágrafo
único).
A discussão
no âmbito da semi-imputabilidade se dá em torno do verbo "poder"
especificado no parágrafo único do art. 26 do Código Penal, "A pena pode
ser reduzida de um a dois terços, se o agente, em virtude de perturbação de
saúde mental ou por desenvolvimento mental incompleto ou retardado não era
inteiramente capaz de entender o caráter ilícito do fato ou de determinar-se de
acordo comesse entendimento" (grifo nosso). Há os que defendem a faculdade
do magistrado, pela simples interpretação gramatical do verbo, outros, porém,
interpretam utilizando o critério biopsicológico, devendo o magistrado, adequar
a pena à compreensão do agente pelo ato praticado.
Os
semi-imputáveis, atualmente, são regidos pelo sistema vicariante ou monista,
que consiste na possibilidade de se estabelecer pena ou medida de segurança,
diferente do que acontecia no sistema anterior, o duplo binário, no qual se
determinava pena e mais a medida de segurança.
A
adequação da pena ou da medida de segurança, para os semi-imputáveis, acontece
porque, embora o agente tenha alguma capacidade de entender o caráter delituoso
de sua ação, não o compreende por inteiro, não sendo inteiramente responsável
por seus atos, impossibilitando assim, que sua conduta seja punida na
totalidade prevista pelo tipo.
Caso a
questão da insanidade mental seja levantada na fase executória, a perícia deve
ser determinada pelo juiz da execução, e restando reconhecida a
inimputabilidade, deverá o réu ser internado em manicômio judiciário,
seguindo-se o procedimento descrito no Código de Processo Penal em seu art. 682
e parágrafos.
O juiz
pode determinar o exame de ofício, mediante representação do delegado ou a
requerimento do Ministério Público, do defensor, curador, ascendente,
descendente irmão ou cônjuge do acusado.
Após o
juiz determinar o exame, deverá abrir vistas dos autos, primeiramente ao
Ministério Público e em seguida à defesa, para que sejam formulados os
quesitos.
Os
peritos poderão ser oficiais ou não, caso não sejam oficiais, deverão prestar
compromisso, sendo nomeados, não podendo se negar a aceitar, salvo em caso de
justa escusa, sob pena de multa. O prazo para a feitura do exame deve respeitar
os 45 dias, salvo complexidade demonstrada pelo perito, devendo os autos
correrem apartados da ação principal.
O juiz
não fica vinculado ao laudo apresentado, em razão de que a dúvida levantada
acerca da condição mental do agente, deve ser suprida, podendo, inclusive,
determinar que seja feito novo laudo, até que as dúvidas sejam dirimidas, para
que se torne prova útil ao seu livre convencimento.
Da mesma
forma que nas penas, a medida de segurança preenche os critérios da prevenção
geral e especial, a primeira quando dá a sociedade uma resposta, através do
processo penal, acerca da lesão sofrida e na segunda, quando garante ao autor
do ato delitivo, tratamento médico para que não volte a praticar condutas
anti-sociais.
Assim,
pelo comando legal, observamos que o Direito é a mais nobre e versátil das
ciências, porquanto é a liga que une todas as relações sociais, utilizando-se,
assim, de todo conhecimento humano, sempre na busca utópica da verdade real,
chegando, assim, o mais próximo da Justiça, mesmo que o alvo da acusação seja
alguém que jamais entenderá o que fez.
VELLOSO, Ricardo Ribeiro. A inimputabilidade do doente mental.
Disponível em: <http://www.boletimjuridico.com.br/doutrina/texto.asp?id=259>
Acesso em: 15 set. 2006.