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I -
INTRODUÇÃO
A
questão que aqui se propõe diz respeito à punibilidade da tentativa de crime
contra a ordem tributária. Evidentemente, há de ser respondida uma indagação
preliminar, qual seja a que diz respeito à possibilidade dessa tentativa.
2.
Como se sabe, na antiga lei sobre os então denominados crimes de sonegação
fiscal – Lei nº 4.729/65, o delito em exame era meramente formal e consistia no
emprego de certos meios (falsidade, falsificação, fraude) com o fim de deixar
de recolher, total ou parcialmente o tributo devido. O crime consumava-se,
então, com o emprego dos meios, independentemente da obtenção do resultado
perseguido. A pretensão do agente interferia na estrutura delito apenas para a
fixação do tipo subjetivo, pois o propósito do agente (obtenção da vantagem
tributária) só configurava um elemento subjetivo especial do tipo (antigo dolo
específico). Consumava-se o delito ainda que sem a realização do fim a que o
agente se propôs. A realização, se ocorrida, nada mais era do que o exaurimento
(esgotamento) do crime. Assim, praticadas as ações mediais, com a finalidade
apontada, consumava-se o delito, sem a possibilidade de tentativa.
3.
Hoje, com o advento da L. 8.137/90, a situação mudou radicalmente. O crime, que
era formal, transformou-se em material. Observe-se que estou me referindo ao
crime contra a ordem tributária contido no art. lº da citada lei, consistente
em suprimir ou reduzir tributo ou contribuição social e qualquer acessório,
mediante meios ligados à falsidade, falsificação ou fraude. Aí, o propósito do
agente deixou de ser só elemento subjetivo especial do tipo para estruturar-se
no tipo objetivo do delito, como seu resultado. Sem que esse propósito se
realize, o fato punível não se consuma, podendo dar-se, por outro lado, a
figura da tentativa, desde que iniciada a execução e, para isso, não concorra a
vontade do agente. Assim, salvo nas modalidades omissivas próprias, é
perfeitamente possível a tentativa.
4.
Daí, então, perguntar-se: - essa tentativa é punível?
Possibilidade
e punibilidade da tentativa são questões diversas. Os crimes dolosos,
materiais e comissivos comportam, geralmente, a forma tentada. Até as
contravenções penais admitem a tentativa, desde que também sejam dolosas e
comissivas. Contudo, o art. 4º da LCP a declara impunível. A indagação sobre
possibilidade e punibilidade da tentativa foi resolvida facilmente pelo Código
Penal Alemão, que a isso se refere após cada definição de fato punível. No
direito penal brasileiro, isso não acontece, devendo o aplicador da lei, à luz
das regras da hermenêutica e da dogmática penal, resolver o problema. Por tudo,
e com apoio no elemento sistemático da interpretação jurídica, é que cheguei ao
deslinde da questão.
5.
Sabe-se que o crime em estudo, antes de ser um ilícito penal, é um ilícito
tributário, cuja natureza não prescinde de dano à Fazenda Pública. Sem a
existência de um valor, que havia de ser recolhido aos cofres do erário, não se
pode pensar em ilícito tributário e, por força disso, em ilícito penal. Isso
fica patenteado com o advento da Lei 9.249/95 que, se espelhando na antiga Lei
de Sonegação Fiscal, admitiu a extinção da punibilidade do delito pelo pagamento
do tributo ou da contribuição social, incluindo os acessórios, antes do
recebimento da denúncia. Com o pagamento, exclui-se o ilícito tributário e
extingue-se a punibilidade do crime tributário.
6.
A causa de extinção da punibilidade pelo pagamento do tributo devido é, em
última análise, uma condição objetiva de punibilidade ao inverso, ou seja, uma
condição negativa de punibilidade. E na tentativa como será? Essa causa
extintiva da punibilidade não poderá ocorrer. Mas, não poderá ocorrer porque,
não tendo o crime se consumado, pela falta de supressão ou redução de tributo,
não há o que pagar. Ora, se não há pagamento a ser feito, pela inocorrência de
dano ao erário, já se operou, ex ante, a condição negativa de
punibilidade.
Em
suma, tem-se que, no crime consumado contra a ordem tributária, há extinção da
punibilidade pelo pagamento do tributo devido; na tentativa, há ausência de
punibilidade pela inexistência de tributo a devido a pagar.
http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=6806