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A Lei Hedionda.

 

Autor: Adeildo Nunes. Juiz de Execução Penal em Pernambuco. Doutorando em Direito e presidente do Instituto Brasileiro de Execução Penal-IBEP.

A Lei 8.072, de 25-07-1990 (Lei dos Crimes Hediondos), ingressou no ordenamento jurídico nacional após o seqüestro do empresário Roberto Medina, que durou longos 40 dias de cativeiro, de enorme repercussão nacional e fora do País. Na época, o tráfico ilícito de entorpecentes no Brasil expandia-se em grande escala, mas a extorsão mediante seqüestro era o crime que mais atormentava a vida brasileira, tornando-se rotina nas grandes e médias cidades. O seqüestro de pessoas com o fim de obter vantagem econômica ilícita, com o uso de violência ou grave ameaça, portanto, foi a causa primeira da aprovação da Lei.

Depois, a intensificação da plantação de maconha no sertão de Pernambuco e o tráfico de drogas nas favelas do Rio de Janeiro e São Paulo, também deram causa à aprovação da Lei. Nesse sentido, nossos legisladores federais aproveitaram o momento de pânico social, devido ao crescimento do seqüestro e do tráfico ilícito de entorpecentes, daí porque resolveram regulamentar o art. 5º, XLIII, da Constituição Federal, aprovando a Lei 8072/90.

A partir de então, alguns crimes praticados com violência ou grave ameaça, com requintes de perversidade em sua execução ou com intensidade de repulsa social - como em geral acontece com o homicídio praticado por grupos de extermínio, latrocínio, extorsão mediante seqüestro, estupro, atentado violento ao pudor, epidemia com resultado morte, genocídio e o tráfico ilícito de drogas - passaram a ser considerados hediondos, tornaram-se inafiançáveis, insuscetíveis de indulto e de liberdade provisória, as penas foram majoradas e proibiu-se a possibilidade do réu progredir de regime prisional. Em 1994, com a morte da atriz global Daniella Perez, o homicídio qualificado passou a integrar o rol dos crimes hediondos (Lei 8.930/94) e pela Lei 9.695/98, a falsificação de medicamentos também a eles incorporou-se.

Na prática, com o surgimento da Lei 8072/90 deu-se um recrudescimento das penas (mais tempo de prisão), e a partir de então os acusados pela prática desses ilícitos penais teriam que aguardar o julgamento detidos, pois a fiança e a liberdade provisória haviam sido abolidas. Por conta disso, uma pessoa que conduzisse um cigarro de maconha, por exemplo, mesmo que para consumo próprio, passou a ser equiparado a um grande traficante de cocaína que transportasse toneladas da droga. Se presos, nesse caso, os dois responderiam aos processos criminais custodiados. Os condenados, por outro lado, deixaram de gozar do benefício da progressão de regime. Somente o livramento condicional passou a ser acessível aos criminosos, mesmo assim somente após o cumprimento de 2/3 da pena aplicada, sendo que o reincidente específico – aquele que tenha cometido dois ou mais crimes da mesma espécie – passou a cumprir a pena integralmente, sem qualquer tipo de benefício. Era o início, no Brasil, da introdução do “Direito Penal do Terror”, que até hoje persiste.

Quatorze anos após a vigência da Lei 8072/90, o Brasil passou dos 79 mil presos existentes, para 310 mil. Cada preso brasileiro custa em média 700 reais ao erário público. Cerca de 85% dos que cumprem pena de prisão voltam a cometer novos delitos. 78% da população carcerária nacional não sabem ler e nem escrever. 32% deles não têm qualquer tipo de qualificação profissional. Será que a Lei 8072/90 diminuiu a criminalidade? Claro que não. O que diminui o crime é a certeza de que todos serão punidos, indistintamente, não a quantidade da pena, nem o castigo físico e moral. A Lei 8072/90 (Lei hedionda) precisa ser revista com urgência, pois quanto mais prisão, mais injustiça social.

 

Retirado: http://www.direitopenal.adv.br/artigos.asp?id=1175