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Algumas considerações sobre as espécies de prisões provisórias no ordenamento jurídico-penal brasileiro

 

Paulo Roberto Dantas de Souza Leão


 

SUMÁRIO

I - INTRODUÇÃO
        1. Justificativa
        2. Abordagem geral do tema
               2.1 - Célere escorço histórico da prisão
        3. Conceito de prisão
II - A TUTELA CAUTELAR PENAL
        1. A tutela cautelar geral, sua natureza jurídica, requisitos e condições;
        2. A tutela cautelar penal;
        3. Liberdade da pessoa física. Provisoriedade da prisão e sua base constitucional. Princípio da legalidade. Presunção de inocência.
III - DA PRISÃO EM FLAGRANTE
        1. Generalidades
        2. Natureza jurídica
        3. Cabimento: pressupostos e requisitos
IV - DA PRISÃO PREVENTIVA
        1. Generalidades;
        2. Natureza jurídica;
        3. Cabimento: pressupostos e requisitos.
V - DA PRISÃO TEMPORÁRIA
        1. Generalidades;
        2. Natureza jurídica.
VI - DA PRISÃO DECORRENTE DE DECISÃO DE PRONÚNCIA
        1. Generalidades
        2. Natureza jurídica
        3. Cabimento: pressupostos e requisitos
VII - DA PRISÃO DECORRENTE DE SENTENÇA RECORRÍVEL
        1. Generalidades;
        2. Natureza jurídica;
        3. Cabimento: pressupostos e requisitos.
VIII - CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSIVAS.
IX - BIBLIOGRAFIA.
 
 

I - INTRODUÇÃO

1. JUSTIFICATIVA.

       A prisão é uma exigência amarga, porém imprescindível. Concebida como uma das formas de apenamento, a prisão é relativamente recente. Sua origem é apontada na penitência do direito eclesiástico, no final do século XVI. Entretanto, a moderna sistematização dessa espécie de sanção, enquanto punição judiciária, data de fins do século XVIII e início do século passado, com o Código Criminal de 1808 em França. A partir de então passou a ser considerada a pena das sociedades civilizadas.

       Na verdade, a prisão era utilizada tão-somente como forma instrumentária de manutenção do acusado no distrito da culpa, a fim de assegurar a tramitação do processo e posterior aplicação das sanções definitivas, que quase sempre eram muito desumanas, como o açoite, o arrastamento, a morte, a empalação e outras. De modo que, na sua origem mais remota a prisão tinha apenas um caráter provisório e instrumental.

       Até agora, infelizmente, o Estado não conseguiu alcançar os seus fins sem a aplicação de medidas restritivas da liberdade humana. Pouco mais de dois séculos foram suficientes para se constatar sua mais absoluta falência em termos de medidas retributivas e preventivas. Assim, a história da prisão não é a de sua progressiva abolição, mas a de sua reforma.

       Além das prisões decorrentes das condenações irrecorríveis, as prisões antecipadas, provisórias, cautelares ou prévias, como são chamadas , predominantemente, a prisão em flagrante, a prisão preventiva, a prisão temporária, a prisão decorrente de decisão de pronúncia e a prisão de sentença penal condenatória passível de recurso, continuam se justificando como imperativo social. Um mal necessário.

       Essas restrições antecipadas, provisórias, cautelares (carcer ad custodiam) ou prévias da liberdade individual devem circunscrever-se, rigidamente, ao modelo jurídico-constitucional e atender a seus fins, sob pena dessa opressão contingente e temporária não se justificar.

       A Constituição Federal garante em seu artigo 5º, inciso LXI que o cidadão somente será tolhido de seu direito de ir e vir em virtude de prisão em flagrante ou por ordem escrita de autoridade judicial. Além desses casos, somente se justifica a prisão administrativa que pode vir a ser apreciada judicialmente em caso de manifesta ilegalidade, ainda que pese a impossibilidade de exame de sua conveniência ou motivação, pois foge à esfera judicial a apreciação do mérito do ato administrativo. Assim, a prisão continua sendo uma necessidade social que encontra amparo no direito constitucional. Porém, quando tenha caráter antecipado, provisório, cautelar ou prévio, deve estar rigidamente enquadrado dentro da previsão legal e obediente aos princípios constitucionais e jurídicos que norteiam nosso sistema.

       Sabemos que todos gozamos do direito de não ser presos, salvo depois de uma sentença penal condenatória, proferida dentro de um processo legal (CF, art. 5º, LIV) . Mas ocorre que todas essas normas constitucionais (ressalvada a última) não são absolutas. O direito que temos de não ser preso antes de uma condenação definitiva pode, em casos excepcionais, conflitar com o interesse da sociedade em ver decretado o recolhimento à prisão, mesmo antes da sentença irrecorrível. Fala-se, nesse caso, em cinco hipóteses em nosso ordenamento jurídico de prisão: flagrante, preventiva, temporária, derivada de pronúncia e decorrente de sentença recorrível. Em casos excepcionais, em suma, mesmo antes da sentença irrecorrível, pode o juiz, fundamentadamente, decretar ou manter a prisão cautelar do autor do delito. Essa posição encontra agasalho de modo iniludível na Corte Superior de interpretação de lei federal, o Superior Tribunal de Justiça , ao assentar na Súmula nº 09 que a exigência da prisão provisória não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência, inclusive para apelar. Mas essa prisão provisória é exceção: somente quando existe absoluta necessidade é que o juiz pode decretá-la.

       Destarte, o tema escolhido - Espécies de Prisões Provisórias no Ordenamento Jurídico-Penal Brasileiro - para dissertação final do Curso de Mestrado em Direito Público com área de concentração em Teoria da Constituição, oferecido pela Universidade Federal do Ceará-UFC, e em convênio com a Universidade Regional do Rio Grande do Norte-URRN e a Universidade Potiguar-UNP, tem grande pertinência com o atual momento pelo qual atravessa o novo Estado Brasileiro, instaurado em outubro de 1988 e em vias de ser novamente modificado. Naquela época, repudiou-se as reminiscências do autoritarismo, garantindo-se a liberdade de ir e vir, salvo no caso de flagrante delito ou por intermédio de ordem escrita advinda de prisão decretada por Juiz.

       Deste modo, faz-se necessário o estudo dessas espécies de prisão provisórias. A dissertação tem um capítulo inicial abordando o tema de maneira generalizada com um breve histórico. A seguir, serão vistos aspectos constitucionais gerais sobre o assunto, passando, a cada capítulo, para o desenvolvimento propriamente dito de cada instituto prisional prévio, onde serão vistos aspectos processuais como as condições e requisitos para a sua decretação, natureza jurídica, competência, prevenção, prazos, recursos e procedimentos.

2. ABORDAGEM GERAL DO TEMA.

       O Estado é, na justa definição de Balladore Pallieri , uma ordenação que tem por fim específico e essencial a regulamentação global das relações sociais entre os membros de uma dada população sobre um dado território, na qual a palavra ordenação expressa a idéia de poder soberano, institucionalizado. Assim, como fruto de criação humana para servi-lo e objetivando o bem comum e tornando melhor e organizada a vida em sociedade, é de sua essência poderes para manter em harmonia a paz social. Em nosso país, temos um ordenamento jurídico insculpido em base positivista, daí termos como nascedouro primeiro do direito a norma legal escrita, donde vem o poder de restrição à liberdade dos cidadãos em casos bem limitados.

       A Constituição Federal garante no artigo 5º, inciso LXI, que ´ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei´. Deste modo, a prisão continua sendo uma necessidade social que encontra estribo no direito constitucional e quando tem caráter provisório, cautelar, deve estar estritamente subsumida na previsão legal e em rígida observância aos princípios constitucionais, sob pena de ilegalidade e abuso.

2.1 - Célere escorço histórico da prisão.

       Já foi visto que a prisão como forma de apenamento é relativamente recente. Originada na penitência do direito eclesiástico, ao final do século XVI, passou a ser sistematizado como espécie de pena, enquanto punição judiciária, em fins do século XVIII. A bem da verdade, a prisão era utilizada como forma instrumentária de manutenção do acusado no distrito da culpa, a fim de assegurar a tramitação do processo e posterior aplicação das sanções definitivas, que quase sempre eram muito desumanas. Conclui-se, destarte, que, na sua origem mais remota, a prisão tinha apenas um caráter provisório e instrumental.

       À guisa de ilustração, o direito romano, por exemplo, conheceu o arresto pessoal para garantir a presença do réu no processo após a in jus vocátio (citação). Na idade média, com o processo inquisitório, a custódia do acusado era absolutamente necessária para viabilizar a tortura como meio de prova. Na Grécia antiga, já havia referência à prisão preventiva, que tinha caráter provisório e facultativo, destinada sempre a atender os fins do processo. As Ordenações do Reino admitiam a prisão preventiva de forma excepcional e somente para autores de homicídio, feridas ou chagas graves, incidiários, furto manifesto, britadores de igreja e outros. Ao tempo das Ordenações, aparentemente restritivas em relação à prisão preventiva, a custódia do acusado ficava ao arbítrio do juiz e era sempre facultativa.

       No Brasil, com a proclamação da independência em 1822, a Constituição Imperial de 1824 admitiu a prisão provisória mediante ordem escrita do juiz. O Código de Processo Criminal do Império, de 1832, previu também a prisão sem culpa formada para os crimes inafiançáveis, por ordem escrita da autoridade legítima, até que o Código de Processo Penal de 1941, respaldado no Código italiano de 1930, veio sistematizar com rigor dogmático, a prisão provisória no processo penal brasileiro.

3. Conceito de prisão

       A prisão, em sentido jurídico, é a privação da liberdade de locomoção, ou seja, do direito de ir e vir, por motivo ilícito ou por ordem legal. Indistintamente essa expressão é utilizada para denominar o local em que alguém fica segregado, o recolhimento do preso à prisão, a captura, a custódia e a detenção. São antigos e conhecidos os protestos dos nossos juristas contra essa desordem de nomenclatura.

       Galdino Siqueira, citado por Eduardo Espínola Filho , na obra de Teles Castelo Branco , escreveu em 1930: "Para denotar os atos restritivos da liberdade pessoal, em matéria de crime, as nossas leis empregam indistintamente o termo prisão, o que não são poucas confusões produzidas. A exemplo da moderna legislação portuguesa poderíamos empregar os termos custódia e captura, no sentido em que os franceses dos termos arrestation e detention. Os franceses chamam arrestation à prisão de alguém, unicamente para obrigar a comparecer perante autoridade a fim de ser interrogado sobre o delito que lhe é imputado, e detention, especialmente detention preventive ou préalable, à conservação de alguém em prisão até o julgamento ou à prisão de indiciado para que fique detido até o julgamento"

       Hélio Tornaghi , com doce ironia, também comenta: "A meu ver, a balbúrdia que reina em matéria terminológica, no que diz respeito à prisão, e os maus entendidos que disso decorrem resultam do fato de se classificarem os vários tipos de prisão, tomando ao mesmo tempo mais de um critério. Acontece, então, como ocorreu com aquele sujeito que classificou as mulheres em louras, morenas, viúvas e manicures".

       Portanto, o melhor entendimento, é de que capturar é o ato de prender ou deter. Efetuar a captura de alguém é prender ou deter alguém. Por sua vez, custodiar é conservar a pessoa em prisão. Destarte, a captura antecede a custódia e essa tem natureza de provisoriedade.

       A atual situação jurídico-penal do ordenamento pátrio, enseja a ampliação do conceito de prisão provisória, locução encontrada em várias passagens do Código de Processo Penal, que, a rigor, é uma expressão genérica, para significar que não se trata de prisão definitiva ou, vista de outro ângulo, executória. Pode-se dizer que a prisão provisória é um genus, de que são species a prisão em flagrante, a prisão preventiva, a prisão temporária, a prisão decorrente de pronúncia e a prisão em virtude de sentença condenatória recorrível.

       Nesse passo, e de acordo com o melhor entendimento doutrinário , há de convir-se que toda prisão, tomada esta palavra em sua acepção processual e específica, é provisória. Depois da condenação por sentença irrecorrível, não haverá mais prisão em seu caráter atípico, porém reclusão, detenção ou prisão simples. E sendo anterior a essa condenação irrecorrível é, genericamente, preventiva e, em essência, provisória.

       Assim, o conceito de prisão pode ser dado como qualquer restrição à liberdade individual, dentro de casa, ou de penitenciária, delegacia de polícia, dependências policiais, ou de quartel, ou de qualquer casa fechada destinada à esse fim, ou, ainda, pela limitação da liberdade mediante algemas, ou ligação a pesos ou qualquer outro meio inibidor da liberdade.

       Segundo Teles Castelo Branco , a palavra prisão vem do latim prensione, que, por sua vez, se origina de prehensione - de prehensio, onis, e quer dizer prender. E prender, nesse diapasão, significa o carcer ad custodiam.

II - A TUTELA CAUTELAR PENAL

1. A tutela cautelar geral, sua natureza jurídica, requisitos e condições da ação cautelar em geral.

       No tocante as medidas cautelares, é fato que há uma intensa discordância na doutrina quanto à natureza, requisitos e finalidade dessas medidas. Por outro lado, há consenso no sentido de que a tutela cautelar, em muitos casos, torna-se imprescindível à prestação jurisdicional do Estado. O uso constante dessas medidas e a atenção dispensada na doutrina e na jurisprudência, afiguram sua importância e sua imprescindibilidade.

       Com efeito, o desenvolvimento processual é feito por meio de atos e procedimentos cuja realização em seqüência estende-se ao longo do tempo. Assim, o lapso temporal necessário para a efetivação desses atos procedimentais, muitas vezes dilatados, quando não demorados, poderá ocasionar prejuízos irreparáveis às partes em litígio. Deste modo, é natural que sejam adotadas medidas provisórias tendentes à preservar o equilíbrio e a situação dos litigantes no processo, até a prestação jurisdicional definitiva.

       No ensinamento de Liebman , a tutela cautelar ocupa posição autônoma ao lado da cognição e da execução. De acordo com o mestre italiano, a atividade cautelar destina-se a garantir a eficácia daquelas duas atividades, garantindo assim os resultados e os objetivos da jurisdição, seja no processo de conhecimento, seja no processo de execução.

       Deste modo, as medidas cautelares que já foram consideradas mero apêndice da ação de conhecimento e da ação de execução, hoje vês recebendo tratamento sistemático-científico por parte da teoria geral do processo, como exercício autônomo do direito de ação (cautelar) e do direito à jurisdição e seu respectivo processo.

       Nesse caminho, chega-se à conclusão de que a pretensão cautelar, como autêntica ação asseguradora , com o fim de evitar o dano jurídico decorrente da demora do processo principal, deve manifestar-se por meio de ação correspondente, com caráter instrumental e tendente à preservação da situação inicial das partes no processo, sempre que houver perigo (periculum in mora) para o direito aparentemente fundado (fumos boni juris), invocado na relação material.

       A instrumentalidade é uma das principais características do processo cautelar, na medida em que este busca, no dizer de Nelson Nery Jr. , "assegurar a plena realização e eficácia mesma dos processos cognitivos e executórios".

       A latere da instrumentalidade estão a provisoriedade a revogabilidade das medidas cautelares. Assim, a decisão exarada no processo cautelar não faz coisa julgada material, pode portanto ser revogada ou modificada quando as circunstâncias assim o exigirem.

       A ação cautelar, por sua vez, está submetida às condições da ação em geral: possibilidade jurídica do pedido, legitimidade de parte e interesse processual. Contudo, ao lado dessas condições aparecem aqueles requisitos específicos identificados como fumus boni juris e periculum in mora.

2. Tutela cautelar penal.

       O direito processual penal, tal como os demais ramos do direito, admite também uma cautelaridade específica com o escopo de obter a efetividade no processo. Essa cautela encontra estribo jurídico tanto na norma processual penal quanto em esfera constitucional.

       Assim, são várias as medidas cautelares em matéria penal e referem-se ora à pessoa do próprio acusado, ora a determinadas coisas relacionadas com o fato delituoso. E, por fim, há também medidas acautelatórias em relação à prova.

       A prisão provisória, também chamada processual, em sentido amplo, é cautelar e inclui a prisão em flagrante (arts. 301 a 310, CPP), a prisão preventiva (arts. 311 a 316, CPP), a prisão temporária (Lei nº 7.960/89), a prisão resultante de pronúncia (arts. 282 e 408, § 1º, CPP) e a prisão resultante de sentença penal condenatória (art. 393, inc. I, CPP). Vale ressaltar, por oportuno, que a prisão civil é a decretada em casos de devedor de alimentos e de depositário infiel, únicas permitidas pela Constituição . A prisão administrativa, que após a Constituição de 1988 só pode ser decretada por autoridade judiciária, é prevista pelo Código de Processo Penal (art. 319, inc.I) e leis especiais. Por fim, existe a prisão disciplinar permitida na própria Constituição para as transgressões militares e crimes propriamente militares (arts. 5º, inc. LXI e 142, § 2º), regulada essa prisão disciplinar pelo art. 18 do Decreto-lei nº 1.002/69.

       Para nosso estudo, entretanto, só nos interessa a prisão cautelar, de natureza processual, ou cárcere ad custodiam, como a chamavam os canonistas. É aquela prisão anterior à condenação e que, na lição de Manzini , "consiste en una limitatión más o menos intensa de la liberdad física de una persona, por una finalida procesal penal"

       Essa prisão sem pena, pois como já foi visto, depois da condenação por sentença irrecorrível, não haverá mais prisão em seu caráter atípico, porém reclusão, detenção ou prisão simples, nada mais é do que uma execução cautelar de natureza pessoal (em oposição à coerção processual de natureza real - como as buscas e apreensões, seqüestro, arresto, etc.) e que se justifica como medida imprescindível para assegurar, em sentido amplo, a efetiva aplicação da lei penal.

       A prisão como medida acautelatória surgiu muito antes da prisão como sanção, tendo sido assinalada por ULPIANO como "carcer ad continendos homines non ad puniendos"

       Assim, a prisão cautelar tem natureza processual e somente poderá ser emanada de ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária, ou na hipótese do flagrante quando mantido no curso da ação penal, e visa à garantia imediata da tutela de um bem jurídico para impedir as conseqüências do periculum in mora, assentando-se num juízo de plausibilidade da condenação, afigurador do fumus boni juris, garantindo a aplicação da pena futura.

       A prisão, dessa forma, se assenta num juízo de probabilidade. Destarte, havendo probabilidade de condenação, decreta-se a providência cautelar para garantir a execução ulterior da pena.

       Alguns doutrinadores, como o ilustre FREDERICO MARQUES argumentam que é equivocado chamar tais prisões de processuais, aduzindo que "prisão processual é toda aquela decretada pelo Juiz no exercício dos poderes contidos na jurisdição que exerce: ela se deriva da coercitio ou potestas coercendi que a jurisdição confere ao magistrado, ou da executio que é imanente ao poder jurisdicional, na atualidade. Prisão processual é a que o Juiz impõe, como providência compulsória, ao síndico, ao inadimplente em obrigação alimentar, ao depositário infiel, à testemunha faltosa, ao falido relapso; e a prisão processual é ainda a prisão que o Juiz impõe, em sentença condenatória, ao criminoso. Por outro lado, a prisão preventiva contra quem vai ser expulso do território nacional, que o Ministro da Justiça pode decretar (Dec.-lei 392, art. 10, de 27.04.38), não é prisão processual, e sim, prisão cautelar de caráter administrativo."

       Contudo, há que se observar que a prisão penal cautelar é chamada processual quando decretada pelo Juiz e é representada pela prisão preventiva, pela prisão temporária, pela prisão resultante de pronúncia e de sentença penal condenatória recorrível. Quando emana de outra autoridade, ou pessoa, é denominada prisão em, flagrante.

       De qualquer maneira, todas elas são prisões penais, pelo motivo muito simples de serem decretadas na esfera penal. A elas, por natureza, se opõem as prisões civis. É válido ressaltar, a bem da verdade, que a prisão em flagrante é, inicialmente, de natureza administrativa, mas, depois, ele se torna de natureza processual, pois vai projetar conseqüências na relação processual que se estabelece no juízo penal. Nessa hipótese, o preso passa da custódia administrativa da autoridade policial que preside o inquérito para a custódia processual imposta pelo Juiz, quando não há irregularidades, ouvido o Ministério Público, ou seja, não quando não são encontradas irregularidades formais ou materiais no auto de prisão em flagrante, nem ocorre a existência de motivos que possam levar à concessão de uma contracautela.

       Portanto, por tudo que foi exposto, há de se concluir que as prisões cautelares tem assento jurídico-constitucional e não prescindem jamais de uma estrita e clara tipicidade. Ademais, a previsão legal dessas medidas é exigência indeclinável, impostergável, afastado que está, em matéria penal, o chamado poder geral de cautela do juiz que o nosso ordenamento jurídico prevê na esfera processual civil. Assim, observa-se que o Juiz não pode criar medidas processuais restritivas da liberdade individual sem que elas estejam expressamente contempladas em lei. Além da previsão legal ordinária, algumas dessas restrições à liberdade individual do indivíduo tem também fundamento jurídico-constitucional. Destarte, a tomada de medida que vise tolher ou restringir a liberdade do indivíduo há de ser tomada em caráter excepcional e em situações de concreto risco para a efetividade da jurisdição e sempre observando os requisitos e pressupostos legalmente tipificados. Em não sendo assim, afigura a constrição da liberdade humana constrangimento intolerável com iniludível abuso de autoridade por parte de quem a ordena ou executa.

       Em suma, visando proteger bens jurídicos envolvidos no processo ou que o processo pode, hipoteticamente, assegurar a prisão processual de natureza cautelar não comporta qualquer critério de oportunidade ou conveniência. O critério é de legalidade e de adequação a uma das hipóteses legais.

3. LIBERDADE DA PESSOA FÍSICA. PROVISORIEDADE DA PRISÃO E SUA BASE CONSTITUCIONAL. PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA.

       A primeira forma de liberdade que o homem teve de conquistar foi a liberdade da pessoa física. Essa liberdade se opõe a situação de prisão de modo geral. Assim, na lição do Professor José Afonso da Silva , liberdade é a possibilidade jurídica que se reconhece a todas as pessoas de serem senhoras de sua própria vontade e de locomoverem-se desembaraçadamente dentro do território nacional. Deste modo, essa expressão de liberdade da pessoa física afigura-se na liberdade de locomoção e na liberdade de circulação.

       Nesse passo, sendo a liberdade um dos direitos fundamentais do homem, procurou a Constituição preservá-la. Ao instaurar-se o Estado formal, por meio da Constituição, procurou-se delimitar o que podem ou não podem fazer os órgãos que exercem o poder público, estabelecendo-se, daí, barreiras para o tutela e garantia dos nominados direitos fundamentais do homem. Nesse sentido, sabemos que a liberdade não é o direito de alguém fazer o que bem quiser e entender, e sim o de fazer o que não é defeso em lei. Sem a normatização do comportamento da vida em sociedade, ou seja, sem os freios da lei, a liberdade sem controle, desenfreada, poderia conduzir à anarquia, ao caos, enfim. Daí permitir-se, na lex mater, a restrição da liberdade em situações excepcionais, feita com prudência e comedimento, estritamente dentro dos limites do indispensável, do necessário e, assim mesmo, cercada de reais garantias para que se evitem extrapolações e abusos por parte do poder público, devendo sempre ser observada os lindes marcados pela lei.

       Assegura a Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, caput, que " Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:"

       Deste modo, procurou o legislador constituinte assegurar a liberdade, como garantia fundamental do homem. Entretanto, para mantê-la é necessário observar os limites da lei. in casu, pode-se fazer o que a lei não proíbe, sob pena de perder a liberdade, temporária ou definitivamente.

       A Carta Magna, expondo os termos já referidos, no inciso II do artigo 5º, proclamou que "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei" . Ora, o princípio da legalidade é básico no Estado Democrático de Direito. É da essência do seu conceito subordinar-se à Constituição e fundar-se na legalidade democrática. A lei é efetivamente o ato oficial de maior realce na vida política. é por meio dela que o poder estatal propicia ao viver social modos predeterminados de conduta, de maneira que os membros da sociedade saibam, de antemão, como guiar-se na realização de seus interesses.

       Portanto, a vontade estatal de impor conduta ou comportamento social encontra limites na lei e o indivíduo, enfim, é livre , tem liberdade, desde que não faça o que a lei não permite.

       Nesse diapasão, todas as modalidades de prisão são presididas pelo princípio da legalidade, também denominado princípio da reserva legal, e do órgão legal, conforme disposição constitucional impositiva de que "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime militar, definidos em lei."

       Cabe, pois, à lei ordinária dizer quais as autoridades judiciárias competentes, as hipóteses em que se permite a prisão, os requisitos e cabimentos da prisão em flagrante, as formalidades da ordem escrita e a necessariedade do fundamento. Veda, por outro lado, portanto, a Lei Maior, terminantemente, qualquer prisão que, excetuando-se o estado de flagrância, que possui contornos bem definidos, qualquer prisão que não provenha de ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária.

       Destarte, a prisão, pois, há de ser conforme a lei.

Em tema de cautelaridade penal restritiva da liberdade, para qualquer uma das modalidades de prisão provisória, é necessário a observância do devido processo legal por exigência indeclinável do art. 5º, inc. LIV, da Constituição da República, segundo o qual "ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal" . Deste modo, a decretação da prisão provisória, seja qual for a espécie e independentemente do momento processual em que é decretada, até mesmo antes do processo, deverá atender não somente aos pressupostos legais, mas também aos requisitos processuais da autoridade competente e ordem escrita e fundamentada.

       Assim, muito emborca seja inafastável a exigência do devido processo legal para a decretação do carcer ad custodiam, nas suas variadas formas, nem sempre o mesmo pode-se dizer com relação ao princípio do contraditório, coralário do due process of low. É sabido que a custódia provisória pode ser decretada de ofício pelo Juiz e não há nenhuma regra processual penal que imponha, no caso da decretação ex officio, a prévia audiência do acusado. Portanto, mormente nos casos em que a prisão provisória é decretada ainda na fase inquisitiva do procedimento, admiti-se a adoção da medida sem a oitiva do pretendido, sob pena de frustar-se a finalidade da providência cautelar.

       Por outro lado, desde que o legislador constituinte de 1988 consagrou a presunção de inocência na vigente ordem constitucional , afirmando que " ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória", instalou-se a discussão acerca da subsistência ou não das prisões provisórias no curso, ou mesmo antes, do processo.

       Pensam alguns doutrinadores, como Afrânio Silva Jardim , que o referido dispositivo constitucional surgiu mesmo como um elemento complicador, sugerindo uma espécie de incompatibilidade entre os institutos da custódia provisória ou prisão antecipada dos acusados, e aquele princípio liberal cuja origem, diga-se de passagem, remonta à declaração de direitos da Constituição de 1791 na França.

       Entretanto, sem embargo da opinião daqueles que entendem que a prisão provisória ofende o princípio constitucional da presunção de inocência, o assunto, na prática não merece mais crédito, pois, como já foi anteriormente citado, o Egrégio Tribunal Superior de Justiça de Justiça-STJ sumulou a questão asseverando que " a exigência da prisão provisória, para apelar, não ofende a garantia constitucional da presunção de inocência". O próprio Supremo Tribunal Federal vem decidindo que o disposto no inciso LVII do artigo 5º da Carta Política de 1988, ao dizer que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado da sentença penal condenatória, não importa revogação dos preceitos do Código de Processo Penal que autorizam a prisão após a sentença condenatória recorrível.

III - DA PRISÃO EM FLAGRANTE

1. Generalidades.

       Originada do latim flagrans, derivada do verbo latino flagro-flagras-flagravi-flagratum-flagrare, a palavra significa arder, induzindo a idéia de fogo, de chama ardendo, queimando. Transmite, pois, o entendimento de alguém surpreendido em plena cripitação. Indica, portanto, a atualidade da perpetração do delito. Para Teles Castelo Branco , citando Nogente-Saint Lourentes, o flagrante delito implica a plena posse da evidência, a evidência absoluta, quanto ao fato que acaba de cometer-se, que acaba de ser provado, que foi visto e ouvido e, em presença do qual, seria absurdo ou impossível negá-lo.

       O termo flagrante tem o sentido literal com que a emprega doutrina francesa, isto é, ´delito em chamas´. Garroud transmitiu essa noção: "Le délit se coment actuellement. Cette situation est celle de la flagrance propement dite. Le coupable est pris sur le fait en flagrant délit, en present méfait, comme on disait autrefois, dans la chaleur de l´action, comme nous disons aujourd´hui. Surpris ainsi au moment oú il accomplit son farfait, soit par le magistrat, soi par des témoins, l´inculpé ne peut nier le fait qui luit est reproché: le flagrant délit equivaut à l´aveu".

       Entretanto, o legislador brasileiro buscou inspiração na doutrina italiana, dando maior amplitude ao instituto e revistando com uma técnica mais apurada, indo um pouco mais do que a simples certeza visual do crime.

       Para Mirabete , em sentido jurídico, flagrante é uma qualidade do delito, é o delito que está sendo cometido, praticado, é o ilícito patente, irrecusável, insofismável, que permite a prisão do seu autor, sem mandado, por ser certo o crime.

       Nesse passo, o flagrante é a situação, prevista em lei, de resposta imediata à prática do delito que enseja a prisão, sem haver necessidade de ordem judicial.

       Justifica-se a prisão pela reação social imediata à prática da infração e a captação, igualmente imediata, da prova. Assim, pois, a possibilidade de se prender o indivíduo em flagrante afigura um sistema de auto defesa da sociedade, advinda da real necessidade social de se fazer cessar a prática criminosa e a perturbação da ordem jurídica, sendo, em segundo plano, salutar providência acautelatória do lastro probante da materialidade do fato e pertinente autoria.

2. Natureza jurídica.

       A prisão em flagrante é uma prisão cautelar e está prevista nos artigos 301 a 310, do Código de Processo Penal. É um ato administrativo, no entendimento do artigo 301, CPP, revestindo-se como uma medida acautelatória de natureza processual que dispensa ordem escrita e tem previsão expressa na Carta Política de 1988 em seu artigo 5º, inciso LXI.

       Assim, dispõe a Constituição Federal : ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar, definidos em lei.

       Ora, constituindo-se forma de prisão cautelar de natureza processual, pois, seu caráter administrativo transfigura-se para processual ao ser confirmada em juízo, com a remessa do auto de prisão em flagrante no prazo legal. Os artigos 301 a 310 do Código de Processo Penal, que regulam o assunto, foram recepcionados pelo suso referido preceito constitucional. Assim, garante o artigo 301 que qualquer do povo poderá prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito, faculdade esta que assume o caráter de obrigatoriedade para as autoridades policiais e seus agentes.

       Destarte, nenhuma dúvida quanto à natureza jurídica da prisão em flagrante. É, pois, medida cautelar. Assim, efetivada a prisão em flagrante, só se justifica a permanência do indiciado preso para assegurar o resultado final do processo, para garantir o desenrolar normal do processo, ou, então, para tutelar a ordem pública, evitando prováveis danos que o indiciado, solto, possa causar à ordem pública.

       Dessa forma, pode ser sujeito ativo em caso de flagrância, efetuando a prisão imediatamente, qualquer pessoa, seja autoridade policial, seus agentes ou qualquer do povo. No polo passivo, podemos encontrar, em regra, qualquer pessoa, execetuando-se os representantes diplomáticos que gozam do privilégio de não ser sujeito passivo de prisão em flagrante, na confo>


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do Código de Processo Penal.

3. Cabimento: Pressupostos e requisitos.

       Permite o artigo 301, do Código de Processo Penal, que, em existindo flagrante, qualquer do povo poderá e as autoridade policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.

       Para afigurar o flagrante e, assim, efetivá-la, é preciso que o agente seja encontrado em uma das quatro situações do artigo 302, CPP, como adiante se vê:


 
 
 

I - está cometendo a infração penal;

II- acaba de cometê-la;

III- é perseguido, logo após, pela autoridade, pelo ofendido
ou por qualquer pessoa, em situação que faça
presumir ser autor da infração;

IV- é encontrado, logo depois, com instrumentos, armas,
objetos ou papéis que façam presumir ser ele
o autor da infração."

       Ao se analisar as situações caraterizadoras do flagrante, denomina-se as dos itens I e II de flagrante próprio, real, efetivo, verdadeiro. Para a hipótese do item III chamamos de flagrante impróprio ou quase flagrante e para a situação do item IV denominamos de flagrante presumido ou ficto.

       Assim, em consonância com o nosso ordenamento processual penal vigente, é possível distinguir três espécies de flagrante: flagrante denominado próprio, flagrante chamado impróprio ou quase flagrante e o flagrante presumido.

       Há flagrante em sentido próprio quando o sujeito passivo é surpreendido praticando a infração penal, isto é, surpreendido em plena cripitação. É o momento exato em que o agente está a praticar o delito ou acabou de cometê-lo. É a certeza visual do delito que se comete naquele momento, noção retirada do art. 41 do Code d´Instruction Criminelle: "un délict que se commet actuellemente, ou qui vient de se commetre". Desse modo, entende-se em flagrante próprio quando o delito é praticado no momento ou foi cometido naquele momento.

       Portanto, na conformidade do artigo 302, incisos I e II, do Código de Processo Penal, há flagrante real, caso que constitui a forma típica do flagrante, quando o agente é surpreendido no momento em que está cometendo a infração penal ou acaba de cometê-la.

       O flagrante impróprio ou quase flagrância ocorre quando o agente é perseguido, logo após o delito, pela autoridade, pelo ofendido, ou por qualquer pessoa, em situação que faça presumir ser o autor da infração, de acordo com o artigo 302, inciso III, CPP. Deste modo, a exigência primordial para a efetiva caracterização desse tipo de flagrância é que o agente seja de fato perseguido após a prática do delito, isto é, que o autor da infração penal seja perseguido sem solução de continuidade, não importando, vale ressaltar, o tempo de perseguição. Exige-se, assim, que a perseguição seja contínua, real e verdadeira, podendo durar o tempo que for necessário. O entendimento contido no dispositivo suso referido é que a lei requer, de um modo geral, uma acusação viva, movida contra o autor do ato criminoso desde a sua prática e em seu seguimento, no percurso da fuga.

       Portanto, não se pode fixar prazo para a caracterização desse tipo de flagrante. A expressão ´logo após´ não fixa prazo, como querem alguns. Não há lapso temporal indicado, ou mesmo estendido até 24 horas, por exemplo, desde a prática da infração penal. Essa marcação de tempo não se coaduna com a vontade da lei que deixa ao seu aplicador a possibilidade de se usar o bom senso e prudente critério ao verificar a existência ou não desse tipo de flagrante. Deve-se, assim, entender esse ´logo após´ como o tempo que ocorre entre a prática do delito e a coleta de informações pertinentes a identificação do autor do ato, que passa, destarte, a ser imediatamente, e de forma efetiva, perseguido. Por isso, entende-se que há flagrante quando a perseguição é iniciada, logo após a prática do delito, por pessoas que se encontravam no local do fato ou pela polícia, avisada esta por comunicação telefônica, radiofônica ou por qualquer outro meio de comunicação. Não se pode confundir, entretanto, com uma demorada investigação a respeito dos fatos, situação esta que não comporta o flagrante.

       Iniciada, por fim, a perseguição, logo após a prática da infração penal, sendo ela contínua e incessante, não quebrando a continuidade a substituição ou alternância de perseguidores, desde que não haja interrupção da perseguição, não importa o tempo de duração dessa perseguição, podendo durar horas, dias ou, em situações bem peculiares, em que a perseguição esteja de fato caracterizada, até mesmo meses. A prisão pode ser feita em qualquer local onde é encontrado o agente, mesmo em outro município ou outra unidade da Federação. Não merece crédito o entendimento de que é de 24 horas o prazo entre a hora do crime e a prisão em flagrante. Em não havendo perseguição, logo após o ilícito penal, não é legal a prisão, mesmo decorrendo apenas poucas horas após o delito.

       Por seu turno, o flagrante é ficto ou presumido quando o agente é encontrado, logo depois do fato, com instrumentos, armas, objetos ou papéis que façam presumir ser ele o autor da infração penal. A expressão ´logo depois´ não tem medida normativa. É o tempo razoável, com uso do bom senso. É, em suma, o lapso psicológico que liga a situação com a prática da infração penal. Neste caso, a pessoa não é perseguida e sim encontrada, pouco importando se por acaso ou se foi procurado após investigações. O que importa para a caracterização da flagrância presumida é o fato de ser encontrado o agente, logo depois do delito, na posse de coisas que imputem ao mesmo a autoria da infração penal.

       De qualquer maneira, essa distinção de espécies, entre nomenclaturas, tem pouca importância prática, pois o que autoriza a prisão, como encarceramento cautelar é a ocorrência, em gênero, do flagrante, a teor do art. 301, CPP.

       Em qualquer das espécies de flagrante, se o indiciado se esconder em alguma casa, ao morador será pedida para entregá-lo e, se não o fizer, tomando o executor a cautela necessária, perante duas testemunhas, entrará a força, arrombando as portas, se for o caso.

       A Carta Política de 1988, em seu artigo 5º, inciso XI , permite ao executor da prisão entrar em casa, mesmo sem consentimento do morador, sem restrição de horário em caso de flagrante delito.

       Afigurado o flagrante em seu aspecto material, é necessário se observar seu aspecto formal, sob pena de nulidade do auto de prisão em flagrante. E, ocorrendo vício que possa macular o auto de prisão em flagrante, torna-se ilegal a prisão, ensejando seu relaxamento, conforme assegura o inciso LXV, do artigo 5º, da Constituição Federal . Assim, devem ser observadas as seguintes providências quando da prisão em flagrante: o preso deve ser imediatamente informado de seus direitos, inclusive o de permanecer em silêncio (CF, art. 5º, LIXAI); é facultado ao preso a assistência da família e de advogada; é comunicada imediatamente a prisão ao Juiz competente e à família ou à pessoa por ele indicada (art. 5º, inc. LXII). Neste caso, vem entendo a jurisprudência, que é bem possível que o preso prefira não seja comunicada à família, indicando terceira pessoa para isso. Deste modo, a situação jurídica fica suprida .

       Para que o aspecto formal do auto de prisão em flagrante seja lavrado sem vício que o torne nulo, ainda é exigido que sejam ouvidos o condutor e testemunhas, se houver, que acompanham e interrogado o preso. Passadas 24 horas da prisão, será dada ao preso nota de culpa com o motivo da prisão, a identificação do condutor e, se houver, das testemunhas, passando o preso recibo dessa nota.

       Portanto, além das situações de flagrância que são o seu requisito substancial, o flagrante tem requisitos formais, sob pena de invalidade.

       Por fim, para que haja flagrante, há necessidade de que o delito seja possível, ou seja, que tenha havido início de execução e ela possa, em tese consumar-se, conforme orientação sumulada do Supremo Tribunal Federal . Não se pode confundir, entretanto, flagrante preparado com flagrante esperado. Aquele refere-se ao crime impossível, ou seja, não há a menor possibilidade de ser consumado. O flagrante é esperado, por seu turno, quando é possibilitada a consumação , não interferindo a autoridade policial, ou qualquer pessoa, nas circunstâncias de sua execução. Aguarda-se, por ser sabido, apenas, a prática do delito. Neste caso, é possível o flagrante.

       É cabível, em conclusão, o flagrante delito tanto no crime quanto na contravenção.

IV - DA PRISÃO PREVENTIVA

1. Generalidades.

       A prisão preventiva é uma medida de força que o interesse social reclama da liberdade individual com o objetivo tríplice de se manter o indiciado ou acusado no distrito da culpa, com a garantia da ordem público, mantendo estável e regular a produção das provas, com a conveniência da instrução criminal e, finalmente, para efetivar a aplicação da lei penal.

       A prisão preventiva, com previsão nos artigos 311 a 316 do Código de Processo Penal, é medida cabível, por despacho fundamentado da autoridade judiciária , em qualquer fase do inquérito policial ou da ação penal, antes de transitar em julgado a sentença penal condenatória, podendo ser decretada de ofício pelo Juiz ou a pedido do Ministério Público, do querelante ou por representação da autoridade policial.

       A prisão preventiva é espécie do gênero ´prisão cautelar de natureza processual´. Já vimos que toda prisão que precede a uma condenação é provisória. É uma medida restritiva da liberdade determinada pelo Juiz, e como suso referido, em qualquer etapa do inquérito ou do processo, seja para garantir a ordem pública, seja para assegurar eventual execução da pena, seja por conveniência da instrução criminal, isto é, para impedir que o indiciado ou acusado, por manobras, estorve a produção de provas na instrução ou obste o regular prosseguimento da ação penal.

       Já foi dito que toda e qualquer prisão decretada antes de uma condenação definitiva é uma medida odiosa, porém, em determinadas situações, necessária.

       Já dizia Carrara que a prisão preventiva deprime e abate o sentimento de dignidade pessoal de quem é ferido por uma mancha imerecida, depois de haver levado uma vida honesta e inocente. Iniludível, nesse passo, é o entendimento que o encarceramento de pessoas, não reconhecidamente culpadas, juntas a condenados em definitivo, representa grande perigo. Inobstante saber-se que o artigo 330, CPP, dispõe que, sempre que possível, os presos provisórios ficarão separados dos definitivamente condenados, na prática isso raramente acontece.

       Assim, sem embargo das críticas e lamentações que se fazem à prisão antes da condenação, é um mal necessário, uma dolorosa necessidade social.

       Deste modo, a prisão preventiva pode ser entendida como uma medida acautelatória que assegura a instrução processual e a execução da pena, garantindo, também, a ordem pública.

2. Natureza jurídica da prisão preventiva.

       A prisão preventiva é prisão processual e cautelar, constituindo-se em privação da liberdade do indiciado ou do acusado por decisão fundamentada do juiz em qualquer fase do inquérito ou da instrução processual.

       Justifica-se a prisão preventiva em situações bem específicas e em caso especiais onde o encarceramento em prisão provisória é indispensável.

       Diferentemente de anterior disposição do Código de Processo Penal, a prisão preventiva deixou de ser obrigatória para algumas hipóteses, tornando-se medida facultativa, podendo ser estabelecida quando estritamente necessário e na conformidade de requisitos legalmente estabelecidos.

       É lição comezinha no processo penal que esse tipo de carcer ad custodiam, como providência de segurança, garantia da verdadeira execução da sanção e meio assegurador da instrução possui limites e contornos bem definidos, não sendo possível a sua apreciação pela via da discricionariedade e somente pode ser decretada pelo juiz.

       Desse modo, em essência, a prisão preventiva, a prisão preventiva, espécie de prisão provisória, possui natureza processual e cautelar, com todos as características das medidas acautelatórias. Portanto, esse instituto processual penal tem caracteres da instrumentalidade, da provisoriedade, da revogabilidade e da facultatividade.

       Quanto ao seu aspecto instrumental, este salta aos olhos quando verifica-se a sua decretação por conveniência da instrução criminal, consoante art. 312, do Código de Processo Penal. Há conveniência da instrução criminal quando, vg., se procura impedir que o indiciado ou o acusado, por manobras, estorve a regular produção de provas ou obste o prosseguimento normal da ação penal ou da própria atividade criminosa do indigitado. Assim, evita-se embaraço à atividade probante, impedindo-se o desaparecimento de vestígios que compõem o corpo de delito bem como ameaças a peritos ou testemunhas. Nesses casos, a prisão preventiva vem como medida que objetiva a efetividade do processo principal a que está instrumentalmente conexa, garantindo a satisfatória realização das provas destinas à fundamentação da decisão final.

       Quanto a provisoriedade, indubitavelmente sabe-se que esse tipo de prisão não é definitiva. O encarceramento, pois, deve durar somente durante a tramitação processual e até a decisão final. Havendo condenação, e sendo esta definitiva, não se pode mais falar em prisão, como já foi dito, e sim reclusão ou detenção, como pena privativa de liberdade.

       A revogabilidade, que é facultativa, por sua vez, encontra amparo no art. 316, do Código de Processo Penal:


 
 
 

"O juiz poderá revogar a prisão preventiva se,
no correr do processo, verificar a falta de motivo
para que subsista, bem como de novo decretá-la,
se sobrevierem razões que a justifiquem".

       Essa facultatividade de se revogar a prisão preventiva, entretanto, somente se viabiliza se ausente seus pressupostos, pois, na clara dicção do art. 310, § único, do CPP, esse revogabilidade é impositiva, caracterizando a chamada liberdade provisória vinculada. De mais a mais, o artigo 5-º, inciso LXVI da Constituição Federal dispõe que ninguém será recolhido à prisão ou nela mantido, sempre que a lei admitir a liberação provisória. Deste modo, tendo o agente cometido o fato em clara situação que exclua a ilicitude ser-lhe-á concedida liberdade provisória, depois de ouvido o Ministério Público. Igual procedimento será adotado quando o juiz verificar a inocorrência de qualquer das hipóteses que autorizam a prisão preventiva.

3. Cabimento: pressupostos e requisitos.

       Sabe-se que a prisão acautelatória submete-se às chamadas condições gerais da ação, ou seja, a possibilidade jurídica do pedido, a legitimidade de parte e o interesse processual. Além disso, é necessário também a existência de dois requisitos específicos: a plausibilidade do direito invocado e o perigo de dano - fumus boni juris e o periculum in mora.

       Já foi visto que a cautelaridade no direito penal não observa o denominado poder geral de cautela, faculdade que o juiz possui de determinar as medidas provisórias que julgar adequadas (art. 798, CPC). No campo do direito penal é obrigatória a observância de regras estritas e obediência rigorosa ao princípio da legalidade. Para a decretação da prisão preventiva, pois, é condição indispensável a sua previsão legal, isto é, a possibilidade jurídica do pedido.

       São pessoas legitimadas a requerer a prisão preventiva tanto o Órgão do Parquet, como o querelante, além da representação da autoridade policial, sendo, obrigatório, nesses dois últimos casos, a oitiva do Ministério Público. Vale ressaltar, por oportuno, que a medida pode ser também decretada de ofício pelo juiz. Neste caso, aplica-se a discricionariedade do juiz apenas para apreciar e decidir sobre a conveniência e oportunidade da custódia provisória, pois, como já foi dito, a autoridade judiciária não tem poder geral para criar medidas restritivas da liberdade (inominadas), além daquelas já previamente estabelecidas em lei, in casu, a prisão preventiva.

       Nesse passo, e em conformidade com o artigo 312, CPP, temos como pressupostos básicos para a decretação da prisão preventiva, além de já ter sido observadas as condições gerais da ação (possibilidade jurídica do pedido, legitimidade de parte e interesse ao agir), e nos casos cabíveis (garantia da ordem pública, assegurar a instrução processual e garantir a efetiva aplicação da lei penal), a prova da existência do crime e indícios suficientes da autoria.

       Assim, a prisão preventiva exige, a princípio, prova bastante da existência do delito e apenas indícios suficientes da autoria. Neste caso, não é necessária a mesma certeza que deve ter o juiz para a condenação do réu . Deste modo, exige a lei, como pressupostos básicos, afigurando a possibilidade de decretação do carcer ad custodiam, a prova da existência do crime. Assim, a medida se autoriza quando há prova da existência material da infração penal e quando os indícios apontem o acusado ou indiciado como autor.

       Portanto, a lei exige prova da existência do crime. Não bastam, pois, simples suspeitas ou conjecturas de que houve um crime. É preciso que haja lastro probante suficiente que aponte indubitavelmente na existência da materialidade delitiva.

       Ao lado da prova da existência do crime, a lei exige indícios suficientes da autoria. Como já foi referido, não se trata de certeza da autoria, mas de convicção razoável que possa convencer o magistrado. A prova, neste caso, é menos robusta, não autoriza uma condenação , mas enseja, em conjunto com as condições gerais da ação, nos casos cabíveis e na certeza material do crime, a decretação da prisão preventiva.

       Nesse diapasão, vale ressaltar, que, desde que a prisão preventiva se revele necessária, na conformidade do artigo 312, não elidem a sua decretação o fato de ser o acusado ou indiciado primário ou de bons antecedentes, ou pelo fato de ter residência fixa e profissão definida, bem como de ter instrução superior, de ter família, etc.

       Por seu turno, o artigo 313, do Código de Processo Penal, dispõe a respeito das condições de admissibilidade da prisão preventiva, quando presentes os pressupostos e requisitos suso referidos. Diz o citado artigo que a prisão preventiva somente será admitida quando houver dolo na prática da infração penal, ou seja, quando o delito for doloso, punido com reclusão e no caso de ser punido com detenção é necessário que o autor seja vadio ou haja dúvidas sobre sua identidade ou dificulte o mesmo sua identificação. É possível ainda a decretação da prisão preventiva quando o indiciado ou acusado tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado, ressalvada, obviamente a reabilitação.

       Destarte, em conclusão, podemos afirmar que, para a decretação da prisão preventiva, observa-se, em primeiro plano, as condições gerais da ação. A seguir, vê-se qual a finalidade. As finalidades da prisão preventiva, como já foi referido, são três e expressamente previstas em lei: garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal e certeza da aplicação da lei penal. Esses são os três fins que justificam a imposição da custodiam in carcelum e esse elenco é exaustivo, ou seja, numerus clausus. Deste modo, essas situações devem representar uma probabilidade concreta de dano em função da demora do processo principal. Assim, havendo uma razoável possibilidade de que a demorada solução da lide penal possa ocasionar algum dano à ordem pública, à instrução criminal e à efetiva aplicação da lei penal, justifica-se o prévio encarceramento do acusado ou do indiciado, se for o caso. Ademais, é necessário ainda o preenchimento dos pressupostos específicos, ou seja, a certeza da existência do delito e indícios de sua autoria. Visto tudo isso, passa-se, finalmente, para as chamadas condições de admissibilidade, previstas no artigo 313, CPP, quais sejam: a prisão preventiva somente será admitida quando houver dolo na prática da infração penal, isto é, quando o delito for doloso, punido com reclusão e no caso de ser punido com detenção é necessário que o autor seja vadio ou haja dúvidas sobre sua identidade ou dificulte o mesmo sua identificação; é possível ainda a decretação da prisão preventiva quando o indiciado ou acusado tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado.

       Como tópico final, vale a pena analisar a tríplice finalidade da prisão preventiva. Em primeiro lugar, temos a garantia da ordem pública. Objetiva ela o resguardo do chamado equilíbrio social e da ordem pública, maculado com a prática do delito, suas conseqüências e suas repercussões. A ordem pública apresenta-se por variadas formas. Às vezes afigura-se como a necessidade de encarcerar-se o indivíduo perigoso, periculoso, autor de vários delitos e com amplas possibilidade de, solto, voltar a praticar outros. Às vezes a ordem pública representa aquela situação em que, apesar de não ter passado criminoso, o indivíduo cometeu delito de intensa repercussão na sociedade que exige o seu recolhimento imediato. Neste caso, a permanência do agente solto, numa alegada presunção de inocência, é danosa para o interesse coletivo. Assim, justifica-se a prisão preventiva pelo interesse coletivo sobrepondo-se ao individual. Ademais, dependendo da situação, a possibilidade de represálias e até linchamentos contra o autor do crime, mormente nos caso de grande repercussão social ou clamor público, justifica o encarceramento se conjugados a outros fatores. Se for decretada apenas para justificar a incolumidade do autor do delito, constitui desvio de finalidade, conforme já decidiu o Supremo Tribunal Federal .

       Assim, podemos dizer que a ordem pública, como elemento justificador da custódia preventiva está diretamente ligada com a gravidade do delito ou com a periculosidade do agente, acautelando-se, deste modo, o meio social e a própria credibilidade da justiça, em face da gravidade do crime e sua repercussão. Portanto, a garantia da ordem pública está fortemente ligada à gravidade do delito, suas conseqüências, repercussão no meio social e periculosidade do agente.

       A conveniência da instrução criminal possui intenso caráter instrumental. Chama-se de conveniência a utilização do acusado como prova no processo ou, por outro lado, evitar que o mesmo prejudique a colheita de prova, dificultando a descoberta da verdade. Relaciona-se, assim, essa finalidade da prisão preventiva com a atividade probante no processo. Atividade essa que depende da colaboração do acusado para realizar-se ou cuja realização esteja ameaçada intencionalmente por ele, justificando, deste modo, a custódia preventiva.

       Finalmente, a prisão preventiva visa também assegurar a aplicação da lei penal. A possibilidade de fuga do acusado, frustrando a efetiva aplicação da lei penal, justifica a medida restritiva de liberdade. Deste modo, sempre que houver a fundada possibilidade de que o acusado pretende desonerar-se de sua responsabilidade criminal, evadindo-se, terá lugar a imposição da prisão preventiva, como meio de garantir o efetivo resultado da ação penal condenatória.

       Ressalto, enfim, que a prisão preventiva não será decretada se o juiz verificar pelas provas constantes nos autos que o agente cometeu o fato em legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento de dever legal ou por exercício regular de direito, na conformidade do artigo 314, CPP. A prisão preventiva poderá ser revogada se, no curso do processo, cessarem os motivos para que subsista, e ser novamente decretada, se novas razões a justificarem, de acordo com o artigo 316, do código de Processo Penal.

       O único remédio cabível para impugnar a decisão que decreta a prisão preventiva é o habeas corpus. O recurso em sentido estrito (art. 581, inc. V, CPP) com a nova redação dada pela Lei nº 7.780/89, está reservado apenas para as hipóteses de indeferimento do pedido dessa modalidade de prisão cautelar e para o caso de sua revogação. Assim, somente por intermédio de habeas corpus poderá se impugnar a decretação da prisão preventiva ou, se for o caso, pedir a sua revogação, se não mais subsistir os motivos que a ensejaram.

V - DA PRISÃO TEMPORÁRIA

1. Generalidades.

       A prisão temporária tem origem no direito estrangeiro. Hélio Tornaghi , com a mestria que lhe é peculiar, ensina:


 
 
 

"na Itália, a permissão de reter (fermare) o investigado em
casos excepcionais de necessidade e de urgência"

 

       Diz o ilustrado doutrinador que a prisão provisória, na Itália, é concedida às autoridades de segurança pública pela própria constituição. Após firmar a regra de que a restrição da liberdade só é admitida mercê do ato motivado do Poder judiciário, a Constituição italiana permite às autoridades de segurança tomar providências cautelares, entre as quais a do ´fermo´, isto é, da retenção do investigando. Nas quarenta e oito horas seguintes, a polícia pede ao juiz a convalidação do ato.

       Na França, o Code de Procédure Pénale disciplina a garde à vue nos seguintes termos:
 
 
 

"Se contra uma pessoa existem indícios graves e concordantes,
de modo a fundamentar sua inculpação,o oficial de polícia judiciária
deve conduzi-la à presença do Procurador da República,
não podendo retê-la por mais de 24 horas"

 

       Sabe-se que institutos similares são encontrados no direito alemão, espanhol, português, inglês e americano.

       Em nosso ordenamento jurídico penal, o instituto de prisão temporária ganhou ênfase com a elaboração do Projeto de Código de Processo Penal (ainda nesta data em tramitação no Congresso Nacional), sendo combatida por alguns doutrinadores . Contudo, a morosidade da tramitação do referido projeto ensejou a possibilidade de, mediante medida provisória, ser criado em nosso direito o instituto da prisão provisória . Mais tarde, a medida provisória 111/89 foi transformada em lei .

2. Natureza jurídica

       Como suso referido, a prisão provisória passou a existir no ordenamento jurídico penal brasileiro por força da Medida Provisória 111, de 24.11.89, transformada em na Lei nº 7.960, de 21.12.89. A prisão temporária é mais uma espécie de prisão provisória ou cautelar. É uma medida acautelatória, restringe a liberdade de locomoção por tempo determinado e tem como objetivo facilitar as investigações a respeito de determinados crimes, durante o inquérito policial. Assim, podemos dizer que a prisão provisória decorre de norma processual de caráter instrumental.

       É certo que a prisão temporária somente pode ser decretada pelo juiz, tem lapso temporal limitado, podendo ser estabelecida por 05 dias, prorrogáveis por igual período, com exceção da prática de crimes hediondos e de outros delitos graves cujo período é de prisão é de trinta dias podendo, em caso de extrema necessidade, ser prorrogado por igual lapso de tempo. O tempo de prisão temporária não deve ser contado no prazo máximo fixado na lei para o término do inquérito policial de réu preso, que é de 10 dias, ou do processo criminal que, na hipótese do rito comum, é de 81 dias.

       A Lei nº 7.960/89 dispõe que caberá prisão temporária ´quando imprescindível para as investigações do inquérito policial ´. Objetiva, assim, a prisão provisória, possibilitar a investigação policial facilitando seu curso retirando-se eventuais entraves que impedem se possa esclarecer o fato crimino, suas circunstâncias, bem como sua autoria. Permite, pois, citado dispositivo, não só a prisão do indiciado como de qualquer pessoa (uma testemunha, por exemplo), pois não se refere especificamente ao indiciado. Há vedação, entretanto, a decretação da prisão temporária, quando o inquérito policial não tenha sido instaurado, conforme entendimento do § 1º do artigo 1º da Lei nº 7.960/89.

       Cabe, ainda, a prisão temporária quando o indiciado não tiver residências fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade, de acordo com o inciso II do artigo 1º do mesmo diploma legal.

       É permitida, mais ainda, a prisão temporária na ocorrência dos crimes de homicídio doloso, seqüestro ou cárcere privado, roubo, extorsão, extorsão mediante seqüestro, estupro, atentado violento ao pudor, rapto violento, epidemia com resultado de morte, envenenamento de água potável ou de alimentos, crime de quadrilha, genocídio, tráfico ilícito de entorpecentes e crimes contra o sistema financeiro.

       Vale ressaltar, por oportuno, que, mesmo tendo originado-se de uma medida provisória e representando uma invasão na área de competência reservada ao poder legislativo, bem como de ter forte cheiro de inconstitucionalidade, pois a tanto a Medida Provisória 111/89 como a Lei nº 7.960/89 ultrapassaram os limites fixados pela constituição Federal no balizamento da liberdade, violando os direitos e garantias expressamente previstos na lex mater , o instituto vem se mantendo desde a sua adoção pelo Congresso Nacional, bem como vem recebendo tratamento de adequadamente constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, fincando raízes em nosso sistema jurídico.

3. Cabimento: pressupostos e requisitos.

       Já foi dito que caberá prisão temporária quando imprescindível para as investigações do inquérito policial, bem como cabe, ainda, a prisão temporária quando o indiciado não tiver residências fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade, além de ser permitida a prisão temporária na ocorrência dos crimes de homicídio doloso, seqüestro ou cárcere privado, roubo, extorsão, extorsão mediante seqüestro, estupro, atentado violento ao pudor, rapto violento, epidemia com resultado de morte, envenenamento de água potável ou de alimentos, crime de quadrilha, genocídio, tráfico ilícito de entorpecentes e crimes contra o sistema financeiro.

       Nesse passo, e de acordo com o artigo 2º da Lei nº 7.960/89, a prisão temporária pode ser decretada em face da representação da autoridade policial ou a requerimento do Ministério Público. É certo que havendo a representação da autoridade policial o Ministério Público é obrigatoriamente ouvido, ofertando parecer sobre a possibilidade ou não da medida. Não há previsão legal de ser a prisão temporária decretada de ofício pelo juiz, mesmo porque a medida só se justifica na fase do inquérito policial. Recebendo a representação, e ouvido o Ministério Público, no prazo de 24 horas, bem como no caso do pleito vir do Parquet, o juiz deve decidir em despacho fundamentado sobre a prisão, sob pena de nulidade. Decidindo sobre o prisão, deverá ser expedido mandado em duas vias e efetuada a prisão pela autoridade policial, devendo o preso ser informado dos direitos previstos no artigo 5º da Constituição Federal (o de permanecer calado, querendo, e o de ser assistido por advogado e por sua família).

       Ao término do prazo da prisão temporária, seja o de 05 dias prorrogável por mais 05 dias, seja o de trinta dias prorrogável por igual período, nos casos de crimes hediondos ou delitos graves, já mencionados, o preso deve ser obrigatoriamente posto em liberdade, salvo se já tiver sido decretada a prisão preventiva, nos casos cabíveis e preenchidos os pressupostos e requisitos legais.

       Por fim, a pessoa sujeita à prisão temporária deve obrigatoriamente permanecer separada dos demais presos, conforme clara dicção do artigo 3º da Lei nº 7.960/89, não estando sujeito à incomunicabilidade, vedada pela Constituição Federal, podendo entrevistar-se com advogado, pessoa da família ou qualquer outra, devendo ser observada, entretanto, os regulamentos referentes, quanto as demais pessoas e familiares, a estabelecimentos penais.

VI - DA PRISÃO DECORRENTE DE DECISÃO DE PRONÚNCIA

1. Generalidades.

       A pronúncia é instituto processual admitido hoje apenas para os crimes dolosos, consumados ou tentados, contra a vida e conexos com estes. Assim, é certo que a pronúncia é uma medida processual que se exercita unicamente nos casos a serem julgados pelo tribunal do júri. A pronúncia é uma decisão tomada pelo juiz presidente do tribunal do júri em que pronunciará o réu, ou seja, admitirá a acusação, com a procedência da denúncia ou queixa, se se convencer da existência do crime e de indícios de que o réu seja o seu autor. Nesta caso, o juiz não julga o mérito, mas, por decisão, apenas emite um juízo de admissibilidade remetendo o julgamento para o tribunal do júri. A decisão de pronúncia, como toda decisão judicial, deve ser fundamentada, sob pena de nulidade, devendo-se limitar-se a indicar os elementos probatórios que conformem a existência dos requisitos legais, enquadrando o acusado nos dispositivos da infração penal. O Juiz, assim, deve ater-se apenas a indicar os dispositivos infringidos, a prova encontrada quanto a existência do crime e referir-se aos indícios da existência da autoria.

       Deste modo, conclui-se que a pronúncia é a decisão em que se apuram a existência do crime, a certeza provisória da autoria e indícios da responsabilidade do acusado.

       Assim, terminada a fase de instrução, o juiz presidente do tribunal do júri poderá impronunciar o acusado, se se convencer da não existência material do crime ou de não ter sido o réu o seu autor; poderá ainda desclassificar o crime para outro de competência do juízo singular, remetendo a este o processo; ou poderá absolver liminarmente o réu em casos de excludentes de ilicitude. Por fim, pronunciando o acusado, e admitindo total ou parcialmente a acusação, o processo prosseguirá no tribunal do júri, podendo o juiz determinar a prisão provisória do acusado ou mantê-la, caso já esteja provisoriamente encarcerado.

2. Natureza jurídica.

       A prisão provisória decorrente de decisão de pronúncia mantém a mesma natureza jurídica das outras prisões provisórias. É medida acautelatória de natureza processual. Procura ela resguardar a integridade processual levando a efeito o julgamento pelo tribunal do júri, que só poderá haver estando o réu presente.

       Assim, e de acordo com orientação do Supremo Tribunal Federal, bem como do Superior Tribunal de Justiça , o artigo 408, § 2º, do Código de Processo Penal, contém mera faculdade do juiz decretar a prisão, manter ou revogar o prisão anteriormente decretada, não lhe conferindo obrigação, mas dever jurisdicional se presentes as condições dessa providência.

3. Cabimento: pressupostos e requisitos.

       A pronúncia por crime inafiançável deveria acarretar o ordem de prisão. Entretanto, o artigo 408, § 2º, do Código de Processo Penal, autoriza a não expedição do mandado de prisão se o acusado for primário e de bons antecedentes.

       Já foi dito que o artigo 408, § 2º, do Código de Processo Penal, contém mera faculdade do juiz decretar a prisão, manter ou revogar o prisão anteriormente decretada, não lhe conferindo obrigação, mas dever jurisdicional se presentes as condições dessa providência.

       Isso significa que, se o acusado não for primário e de bons antecedentes, há presunção da necessidade da prisão, entretanto essa presunção não é absoluta, mormente após a consagração da presunção de inocência na Constituição Federal.

       Por outro lado, se o o acusado é primário e de bons antecedentes, tem direito à liberdade, mas presentes os pressupostos não há discricionariedade na decisão do juiz. O que se precisa observar é que a primariedade e os bons antecedentes não são os requisitos únicos para a concessão da liberdade para se aguardar o julgamento pelo júri, no caso da pronúncia.

       É sabido que além da primariedade e dos bons antecedentes, é necessário que não exista motivo para preventiva, porque se a liberdade ofender a ordem pública ou colocar em risco a aplicação da pena não será deferida.

       Portanto, estando o acusado preso, por ocasião da pronúncia poderá ser mantido preso até o julgamento pelo júri ou, sendo primário e de bons antecedentes, e inexistindo motivo possibilidade de ofensa a ordem pública ou risco a efetiva aplicação da pretensa sanção, poderá ser colocado em liberdade. Por sua vez, estando solto, pronunciado poderá ser preso se no momento estiverem presentes os motivos suso referidos.

       Por fim, não há confundir a prisão decorrente de decisão de pronúncia com a prisão preventiva. Ambas são provisórias, acautelatórias e de natureza processual. Entretanto, a primeira em nada se compadece com os requisitos dos artigos 311 e seguintes do Código de Processo Penal, sendo apenas decorrente de uma decisão de admissibilidade da acusação, sui generis, e imprescindível para levar o réu a julgamento pelo tribunal popular.

PRISÃO POR SENTENÇA CONDENATÓRIA RECORRÍVEL

1. Generalidades.

       Ao ser proferida a sentença final, em ação penal, em qualquer juízo, poderá ele, se for condenatória, impor penas privativas de liberdade, restritivas de direito ou multa. Em algumas situações, poderá, antes mesmo de transitar em julgado a sentença penal condenatória, haver o recolhimento do réu à prisão ou a conservação do mesmo lá, se já estiver preso.

       Diz o artigo 393, do Código de Processo Penal:


 
 
 

"São efeitos da sentença condenatória recorrível:

I - ser o réu preso ou conservado na prisão, assim nas infrações
inafiançáveis, como nas afiançáveis enquanto não prestar fiança;

II - ...."

       Por sua vez, o artigo 594, do Código de Processo Penal, dispõe:


 
 
 

"O réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança,
salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido
na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto"

       Assim, antes mesmo do trânsito em julgado da sentença, é possível o recolhimento do réu à prisão, ou a sua conservação ali, se já estiver preso, salvo se for caso de livrar-se solto sem fiança, se for beneficiado com a suspensão da pena ou se a sentença condenatória reconhecer que o acusado é primário e de bons antecedentes, caso em que poderá apelar sem recolher-se à prisão.

2. Natureza jurídica.

       A prisão provisória decorrente de sentença penal condenatória recorrível mantém a mesma natureza jurídica das outras prisões provisórias. É medida acautelatória de natureza processual. Procura ela salvaguardar a integridade processual, garantindo a efetiva aplicação da lei penal e evitando ofensa o ordem pública.

       O recolhimento do réu à prisão em virtude de sentença condenatória recorrível, ou sua manutenção lá, caso já esteja provisoriamente preso, é a regra. São, deste modo, exceções: quando o réu é condenado por crime de que se livre solto, nas hipóteses do artigo 321, CPP; quando for afiançável, presentes os requisitos da fiança, primário e de bons antecedentes, desde que reconhecidas essas circunstâncias na sentença condenatória. De mais a mais, para que ele não apele em liberdade é necessário que tal restrição se contenha expressamente na sentença.

3. Cabimento: pressupostos e requisitos.

       A prisão provisória decorrente de sentença penal condenatória recorrível é efeito da condenação, tem natureza acautelatória e processual e visa garantir a efetiva aplicação da lei penal e evitar ofensa o ordem pública.

Para que o réu seja preso, em virtude de condenação recorrível, devem concorrer os seguintes alguns requisitos. Primeiro, tem que haver a imposição de pena privativa de liberdade. Não cabe, por óbvio, a prisão provisória quando a pena é restritiva de direito ou de multa. Em segundo lugar, é possível esse tipo de encarceramento cautelar quando não se tratar de infração em que o réu se livra solto, ou seja, no caso de infração, a que não for, isolada ou cumulativa ou alternativamente, cominada pena privativa de liberdade ou quando o máximo da pena privativa de liberdade não exceder a três meses. Também é necessário, para que o réu seja preso, não ser admitido a prestar fiança e não ser beneficiado com o sursis (suspensão condicional da pena). Finalmente, não ter a sentença reconhecido a sua primariedade e seus bons antecedentes.

       É bom se ressaltar que preso o réu em flagrante, preventivamente ou por pronúncia, cessam esses motivos no momento da condenação, que será a partir daí o motivo determinante do encarceramento. Entretanto, permanece a natureza acautelatória e instrumental da prisão, visando sempre garantir a aplicação da lei penal e ofensa a ordem pública, podendo cumular-se ou não. Com o trânsito em julgado, como já referido, não se há de falar em prisão e sim em reclusão, detenção ou prisão simples, em casos de contravenção penal, conforme seja, e aí a execução da pena, computado em qualquer caso o tempo de prisão provisória por força do instituto da detração.

CONSIDERAÇÕES FINAIS E CONCLUSIVAS

       É quase unânime, no mundo da ciência do Direito Penal e do Processo Penal, a afirmação de que a prisão, sem condenação definida, justifica-se por sua necessidade. É certo que sem esse instituto, prisão provísória, não seria possível, em algumas situações, chegar a termo em ações penais, dificultando, assim, a convivência na sociedade de nossos dias.

       A prisão provisória, seja ela em flagrante delito, privativa, temporária, decorrente de decisão de pronúncia ou em consequência de sentença penal condenatória recorrível, constitui um recurso elementar com que conta o Estado e ao qual recorre, quando necessário, para, genericamente, evitar ofensa a ordem pública, garantir a instrução criminal e assegurar a efetiva aplicação da norma penal. Deste modo, de fato, conclui-se que é ´um mal necessário´.

       Nesse passo, também é verdadeiro afirmar que o carcer ad custodiam, no dias atuais, é uma amarga necessidade de seres imperfeitos como são os homens. É, pois, uma grave e imprescindível necessidade social.

       Entretanto, em que pese ser preciso a aplicação desse remédio amargo, é necessário ter em mente que a sua efetivação só poderá ser feita nos estreitos e estritos caminhos traçados pela lei, pois, no Estado Democrático de Direito, a liberdade é a regra e a prisão exceção.

       Assim, podemos concluir que em nosso ordenamento jurídico penal existem apenas cinco tipos de prisão provisória: a prisão em flagrante delito, a prisão preventiva, a prisão temporária, a prisão decorrente de decisão de pronúncia e a prisão como consequência da sentença penal condenatória recorrível.

       A prisão em flagrante, como foi visto, é uma prisão cautelar e está prevista nos artigos 301 a 310, do Código de Processo Penal. É um ato administrativo, no entendimento do artigo 301, CPP, revestindo-se como uma medida acautelatória de natureza processual que dispensa ordem escrita e tem previsão expressa na Carta Política de 1988 em seu artigo 5º, inciso LXI.

       Sobre o assunto, dispõe a Constituição Federal : ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar, definidos em lei.

       Ora, constituindo-se forma de prisão cautelar de natureza processual, pois, seu caráter administrativo transfigura-se para processual ao ser confirmada em juízo, com a remessa do auto de prisão em flagrante no prazo legal. Os artigos 301 a 310 do Código de Processo Penal, que regulam o assunto, foram recepcionados pelo suso referido preceito constitucional. Assim, garante o artigo 301 que qualquer do povo poderá prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito, faculdade esta que assume o caráter de obrigatoriedade para as autoridades policiais e seus agentes.

       Destarte, nenhuma dúvida quanto à natureza jurídica da prisão em flagrante. É, pois, medida cautelar. Assim, efetivada a prisão em flagrante, só se justifica a permanência do indiciado preso para assegurar o resultado final do processo, para garantir o desenrolar normal do processo, ou, então, para tutelar a ordem pública, evitando prováveis danos que o indiciado, solto, possa causar à ordem pública.


 
 

       A prisão preventiva, por sua vez, é prisão processual e cautelar, constituindo-se em privação da liberdade do indiciado ou do acusado por decisão fundamentada do juiz em qualquer fase do inquérito ou da instrução processual.

       Justifica-se a prisão preventiva em situações bem específicas e em caso especiais onde o encarceramento em prisão provisória é indispensável.

       Diferentemente de anterior disposição do Código de Processo Penal, a prisão preventiva deixou de ser obrigatória para algumas hipóteses, tornando-se medida facultativa, podendo ser estabelecida quando estritamente necessário e na conformidade de requisitos legalmente estabelecidos.

       É lição comezinha no processo penal que esse tipo de carcer ad custodiam, como providência de segurança, garantia da verdadeira execução da sanção e meio assegurador da instrução possui limites e contornos bem definidos, não sendo possível a sua apreciação pela via da discricionariedade e somente pode ser decretada pelo juiz.

       Desse modo, em essência, a prisão preventiva, a prisão preventiva, espécie de prisão provisória, possui natureza processual e cautelar, com todos as características das medidas acautelatórias. Portanto, esse instituto processual penal tem caracteres da instrumentalidade, da provisoriedade, da revogabilidade e da facultatividade.

       A prisão temporária passou a existir no ordenamento jurídico penal brasileiro por força da Medida Provisória 111, de 24.11.89, transformada em na Lei nº 7.960, de 21.12.89. A prisão temporária é mais uma espécie de prisão provisória ou cautelar. É uma medida acautelatória, restringe a liberdade de locomoção por tempo determinado e tem como objetivo facilitar as investigações a respeito de determinados crimes, durante o inquérito policial. Assim, podemos dizer que a prisão provisória decorre de norma processual de caráter instrumental.

       Entendemos que a prisão temporária somente pode ser decretada pelo juiz, tem lapso temporal limitado, podendo ser estabelecida por 05 dias, prorrogáveis por igual período, com exceção da prática de crimes hediondos e de outros delitos graves cujo período é de prisão é de trinta dias podendo, em caso de extrema necessidade, ser prorrogado por igual lapso de tempo. O tempo de prisão temporária não deve ser contado no prazo máximo fixado na lei para o término do inquérito policial de réu preso, que é de 10 dias, ou do processo criminal que, na hipótese do rito comum, é de 81 dias.

       A Lei nº 7.960/89 dispõe que caberá prisão temporária ´quando imprescindível para as investigações do inquérito policial ´. Objetiva, assim, a prisão provisória, possibilitar a investigação policial facilitando seu curso retirando-se eventuais entraves que impedem se possa esclarecer o fato crimino, suas circunstâncias, bem como sua autoria. Permite, pois, citado dispositivo, não só a prisão do indiciado como de qualquer pessoa (uma testemunha, por exemplo), pois não se refere especificamente ao indiciado. Há vedação, entretanto, a decretação da prisão temporária, quando o inquérito policial não tenha sido instaurado, conforme entendimento do § 1º do artigo 1º da Lei nº 7.960/89.

       Finalmente, cabe, ainda, a prisão temporária quando o indiciado não tiver residências fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade, de acordo com o inciso II do artigo 1º do mesmo diploma legal.

       É permitida, mais ainda, a prisão temporária na ocorrência dos crimes de homicídio doloso, seqüestro ou cárcere privado, roubo, extorsão, extorsão mediante seqüestro, estupro, atentado violento ao pudor, rapto violento, epidemia com resultado de morte, envenenamento de água potável ou de alimentos, crime de quadrilha, genocídio, tráfico ilícito de entorpecentes e crimes contra o sistema financeiro.

       Vale ressaltar, por oportuno, que, mesmo tendo originado-se de uma medida provisória e representando uma invasão na área de competência reservada ao poder legislativo, bem como de ter forte cheiro de inconstitucionalidade, pois a tanto a Medida Provisória 111/89 como a Lei nº 7.960/89 ultrapassaram os limites fixados pela constituição Federal no balizamento da liberdade, violando os direitos e garantias expressamente previstos na lex mater , o instituto vem se mantendo desde a sua adoção pelo Congresso Nacional, bem como vem recebendo tratamento de adequadamente constitucional pelo Supremo Tribunal Federal, fincando raízes em nosso sistema jurídico.

       A prisão decorrente de decisão de pronúncia é provisória decorrente e mantém a mesma natureza jurídica das outras prisões provisórias. É medida acautelatória de natureza processual. Procura ela resguardar a integridade processual levando a efeito o julgamento pelo tribunal do júri, que só poderá haver estando o réu presente.

       Por último, a prisão decorrente de setença penal condenatória recorrível mantém a mesma natureza jurídica das outras prisões provisórias. É medida acautelatória de natureza processual. Procura ela salvaguardar a integridade processual, garantindo a efetiva aplicação da lei penal e evitando ofensa o ordem pública.

       O recolhimento do réu à prisão em virtude de sentença condenatória recorrível, ou sua manutenção lá, caso já esteja provisoriamente preso, é a regra. São, deste modo, exceções: quando o réu é condenado por crime de que se livre solto, nas hipóteses do artigo 321, CPP; quando for afiançável, presentes os requisitos da fiança, primário e de bons antecedentes, desde que reconhecidas essas circunstâncias na sentença condenatória. De mais a mais, para que ele não apele em liberdade é necessário que tal restrição se contenha expressamente na sentença.

       Portanto, por tudo que foi exposto, dissertado e argumentado, chega-se à conclusão que sabemos que todos gozamos o direito de não ser presos, salvo depois de uma sentença penal condenatória, proferida dentro de um processo legal. Contudo, esse direito que temos de não ser preso antes de uma condenação definitiva pode, em casos excepcionais, conflitar com o interesse da sociedade e, assim, ser decretado o recolhimento à prisão, mesmo antes da sentença irrecorrível por meio das cinco hipóteses objeto deste estudo, cabível, como dito, quando existir absoluta necessidade e nos pressupostos e requisitos por lei elencados.

VII - BIBLIOGRAFIA BÁSICA

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Natal/RN, abril de 1997.


 
 

PAULO ROBERTO DANTAS DE SOUZA LEÃO
Promotor de Justiça e Professor da UFRN, UNP, CEAF e ESMARN
 
 
 

Retirado de: http://www.neofito.com.br/front.htm

Palavras Chaves: tutela cautelar penal prisão flagrante preventiva temporária