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A eficácia do novo art. 168-a do Código Penal
Fernando dos Santos Wilges
No dia 17-7-2000, foi publicada
no Diário Oficial da União a Lei Federal n° 9983/00, a qual promoveu algumas
alterações no Código Penal. Entre tais alterações, uma que chama especial
atenção é aquela que estabelece como crime a chamada apropriação indébita
previdenciária.
Reza
o que segue o texto de Lei (Lei n° 9983/00):
"Art° 1° - São acrescidos à Parte
Especial do Decreto-Lei n° 2848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, os seguintes
dispositivos:
‘Apropriação indébita previdenciária’ (AC)
Art° 168-A – Deixar de repassar à previdência
social as contribuições recolhidas dos contribuintes, no prazo e forma legal ou
convencional. (AC)
Pena – reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco)
anos, e multa. (AC)
§ 1° - Nas mesmas penas incorre quem deixar
de: (AC)
I – recolher, no prazo legal, contribuição ou
outra importância destinada à previdência social que tenha sido descontada de
pagamento efetuado a segurados, a terceiros ou arrecadada do público; (AC)
II – recolher contribuições devidas à
previdência social que tenham integrado despesas contábeis ou custos relativos
à venda de produtos ou à prestação de serviços; (AC)
III – pagar benefício devido a segurado,
quando as respectivas cotas ou valores já tiverem sido reembolsados à empresa
pela previdência social. (AC)
§ 2° - É extinta a punibilidade se o agente,
espontaneamente, declara, confessa e efetua o pagamento das contribuições,
importâncias ou valores e presta as informações devidas à previdência social na
forma definida em lei ou regulamento, antes do início da ação fiscal. (AC)
§ 3° - é facultado ao juiz deixar de aplicar
a pena ou aplicar somente a de multa se o agente for primário e de bons
antecedentes, desde que: (AC)
I – tenha promovido, após o início da ação
fiscal e antes de oferecida a denúncia, o pagamento da contribuição social
previdenciária, inclusive acessórios; ou (AC)
II – o valor das contribuições devidas,
inclusive acessórios, seja igual ou inferior àquele estabelecido pela
previdência social, administrativamente, como sendo o mínimo para o ajuizamento
de suas execuções fiscais. (AC)"
Da
redação do texto legal de logo nosso conhecimento empírico revela que
dificilmente estarão atrás das grades os profissionais da sonegação e da
apropriação indébita previdenciária aqui tratada.
São
aqueles que, utilizando sempre de terceiros, os chamados "laranjas",
abstraem-se do campo de alcance da norma. Um de seus principais traços é, de um
lado, a vivência em um verdadeiro paraíso na Terra (com carros magníficos,
mansões e toda sorte de conforto) e, de outro, a "triste"
realidade de não ter propriedade de um único bem.
E
a dificuldade em agarrar tais sonegadores reside no próprio fato de que quem
apropriar-se-á indevidamente das contribuições previdenciárias serão os sócios,
procuradores e prepostos das empresas pertencentes, de fato, aos verdadeiros e
inalcançáveis culpados.
E
quanto a tais prepostos e sócios, configurado o tipo penal, será bastante
difícil (socialmente) simplesmente condená-los à pena de reclusão e lotar ainda
mais os presídios.
Ora,
a lei, publicada da forma que foi, afasta qualquer hipótese de modalidade
culposa do crime, pois o verbo núcleo do tipo é deixar de repassar a verba
devida à previdência social (conduta omissiva), o que mostra o radicalismo do
texto e a voracidade do Poder Público em cobrar o que lhe é devido, a duras
penas. Anote-se que o texto legal ora discutido é sucessor de uma Medida
Provisória.
Cabe
aqui tecer uma consideração no que concerne a dificuldade financeira que não
poucos setores empresariais sabidamente enfrentam. A lei, como visto, ignora
isso, pois constitui crime a simples conduta de deixar de repassar,
independentemente de qualquer condição financeira observada. Assim, muitas
empresas, que religiosamente cumprem as suas obrigações tributárias e sociais,
estarão à mercê de caírem na hipótese legal, até mesmo porque em não raras
vezes a empresa que anda mal é justamente porque honra com as suas obrigações.
A
seu turno, façamos a análise daquela empresa saudável financeiramente. Qual a
razão de tanta saúde? Será que as obrigações, todas, serão devidamente
cumpridas? A do artigo 168-A do Código Penal certamente que sim, pois senão
dará cadeia...
Outra
conseqüência social que certamente ocorrerá, haja vista que a tendência do
sistema é a adequação à lei, será o lançamento de ainda mais trabalhadores à
economia informal.
Ora,
que empregador irá querer se arriscar, diante de uma eventual dificuldade
financeira, ao cometimento de um crime? Devemos nos lembrar que o simples
atraso no recolhimento da verba previdenciária já configura crime com pena de
reclusão de dois a cinco anos, e multa.
Assim,
até mesmo a dona-de-casa poderá estar sujeita às penalidades legais se houver
atraso no recolhimento da verba previdenciária.
Claro
que sabemos que o Poder Judiciário culminará por relativizar a norma, diante
dos casos concretos que surgirão.
No
entanto, merece ficar registrada a presente análise crítica a mais uma faceta
do modelo neoliberal, criador de exércitos cada vez maiores de desempregados e
monstro voraz quando o assunto é arrecadação.
Elogios ao povo brasileiro certamente surgirão de qualquer estrangeiro que, ao pisar no solo verde e amarelo, ler o texto da Lei 9983/00. Ora, se há pena tão grave para o não repasse, em dia, da cota previdenciária, quão saudável financeiramente será o sistema previdenciário dessa nação? Ora, ninguém vai querer ser preso, ou vai?
Retirado de: http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp?id=1498
Palavras chaves: eficácia 168-A código penal