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Armas de fogo e violência

 

*Rômulo Resende Reis

Diversos setores da "grande" mídia sempre insistem em correlacionar os altos índices de violência e criminalidade ao uso de armas de fogo pela população honesta, aqui compreendidos os cidadãos de bens, sem antecedentes criminais e cumpridores de seus deveres. Desinformados jornalistas, bem como, mais desinformados ainda, políticos, afirmam em altos brados que os altos índices de criminalidade se devem ao fato de cidadãos honestos possuírem armas de fogo.

Com base nestas equivocadas e estapafúrdias premissas e conclusões, destituídas de qualquer fundamento científico, o Governo Federal, imbuído de um inaceitável espírito autoritário, chegou ao ponto de propor ao Congresso Nacional, através do Projeto de Lei n. 1.073 de 1999, a completa proibição de venda de armas de fogo aos cidadãos honestos do País.

Felizmente o malsinado projeto de lei ainda não foi aprovado no Congresso Nacional, e queira Deus que nunca o seja, embora os esforços autoritários do Poder Executivo no sentido de vê-lo aprovado a "toque de caixa". Tomara que pelo menos desta vez nosso congressistas saiam em defesa dos cidadãos honestos do País e rejeitem, de uma vez por todas, este projeto absurdo, autoritário e demagógico.

Entretanto, o que mais assusta, é que mesmo depois de ampla discussão, alguns setores políticos e da mídia continuam a insistir no falso argumento de que o uso de armas de fogo por cidadãos honestos necessariamente implica no aumento da criminalidade.

Analisaremos neste breve estudo os argumentos mais utilizados pelos ditos "anti-armas" e demostraremos o quão equivocados são os mesmos.

O primeiro argumento dos "anti-armas" é o de que a Lei 9.437/97 (que regulamentou o uso de armas de fogo por civis no Brasil), muito severa por sinal, não conseguiu resolver os problemas do controle de armas de fogo e da criminalidade no País. Argumento este, inclusive utilizado pelo então Ministro da Justiça, Sr. Renan Calheiros, em sua mensagem ao Presidente da República, para justificar o projeto de proibição de uso de armas de fogo, de sua autoria.

Tal argumento não resiste a mais sutil avaliação. Ora, se a Lei 9.437/97, embora extremamente severa e restritiva ao uso de armas pela população, não resolveu os problemas do efetivo controle de armas de fogo em poder da população, foi por completa inércia e incompetência do Poder Público, que até o momento não se dispôs a colocar efetivamente em prática os dispositivos da citada Lei. Pergunto: Criar outra lei, sendo que a anterior ainda nem foi colocada efetivamente em prática, vai resolver o problema? Será que com a simples criação de uma lei, como num passe de mágica, o problema da violência estaria solucionado?

Outro argumento, largamente utilizado pelos "anti-armas",é o de que em países como Inglaterra e Japão, de alto padrão de desenvolvimento, o uso de armas de fogo é proibido. Mais uma vez aquela velha e estúpida mania do brasileiro em achar que a legislação estrangeira é melhor que a nossa. Argumento este também usado pelo então Ministro da Justiça, em suas justificativas para o estapafúrdio projeto.

Este argumento também não resiste a mais singela análise. Realmente, tanto no Japão quanto na Inglaterra o uso de armas de fogo por cidadãos é extremamente restrito. Só que, em hipótese alguma isto significou a diminuição da criminalidade. A reportagem de 28 de março de 1997, á pag. C-7, do Jornal "O Estado de São Paulo", sob o título "Inglaterra tem os maiores índices de crimes", elucida bem a questão. Tal reportagem, analisando a "Pesquisa Internacional de Vítimas de Crimes – 1996", é taxativa ao afirmar que entre os 11 países mais industrializados, a Inglaterra é o que tem o maior índice de criminalidade. Quanto ao Japão, basta ver os noticiários internacionais sobre a dita "máfia japonesa" e seus crimes para tirarmos conclusões. È de se ressaltar que recentemente, tanto a polícia do Japão como a da Inglaterra implantaram programas para rearmamento de seus políciais. Pergunto: De que adiantou Japão ou Inglaterra restringirem o uso de armas de fogo pela população no combate a criminalidade? Os índices de violência diminuíram?

Mas como os "anti-armas" adoram citar exemplos de outros países, também o faremos, citando o exemplo da Suíça. Na Suíça, país de elevadíssimo padrão econômico e social, praticamente em toda, repito, toda residência existe uma arma de fogo. E digo mais, não qualquer arma de fogo, não mísero revolverzinho calibre 38, mas sim um fuzil de assalto, de verdade, não aquelas carabinas AR-15 dos traficantes cariocas. Tal situação se deve ao fato de que o exército suíço é composto em sua quase totalidade por reservistas. Ao final do serviço militar os homens voltam para casa com o respectivo equipamento militar, dentre ele seu fuzil, o qual fica sob sua guarda. O próprio Estado estimula o treinamento freqüente com arma, fornecendo inclusive munição. Pergunto: Na Suíça, onde na maioria das casas existem armas de fogo, os índices de violência são tão altos como os do Brasil, onde a legislação é restritiva?

Argumentam também os "anti-armas", notadamente alguns repórteres da TV, que no Brasil é muito fácil adquirir uma arma de fogo. Tão fácil que até crianças têm acesso às mesmas. Com isto tentando justificar uma eventual proibição.

É simplesmente ridículo que estes elementos não tenham conhecimento, mesmo que rudimentares, da nossa legislação. Hoje, após o advento da Lei 9.437/97 e do Dec. 2.222/97, é extremamente complicada e burocrática a compra de uma arma de fogo por parte de um cidadão comum no comércio legal, frise-se. O cidadão tem que mostrar autorização da Polícia, comprovar idoneidade, preencher todos os requisitos elencados nos citados dispositivos legais, para somente, depois de esperar em torno de 15 a 30 dias, Ter acesso a arma comprada.

Mas, quanto aos bandidos e marginais, os mesmos simplesmente adquirem suas armas de fogo no comércio ilegal, no contrabando e através de outros crimes. Nunca se submetem ao rigoroso processo da compra legal. Mais uma vez pergunto: Proibir a venda legalizada vai coibir os marginais, vai impedir que os mesmos tenham acesso a armas de fogo? Será que alguma vez os criminosos se submeteram ao longo, burocrático e caro processo de aquisição legal de uma arma de fogo? Será que suprimindo o comércio legal, não estaremos dando alento ao comércio ilegal e sem controle?

Agora, quanto às crianças e adolescentes, que, ilegalmente, têm acesso a armas de fogo, é de se ressaltar que a legislação brasileira já proíbe a venda, entrega, doação ou qualquer outra forma que disponibilize a arma ao menor. O Art. 18 da Lei 9.437/97 veda expressamente a venda de armas a menores de 21 anos, sendo que o art. 242 da Lei 8.069/90 (E.C.A.) tipifica como crime a conduta de quem vende, fornece ainda que gratuitamente ou simplesmente entrega uma arma ou explosivo a criança ou adolescente. Portanto, mais uma vez fica claro que não necessitamos de mais leis. Necessitamos sim, de que as leis já existentes sejam efetivamente cumpridas, principalmente pelo Poder Público, seu maior infrator. Só assim conseguiremos evitar que crianças e adolescentes sigam o triste caminho da criminalidade.

Resta analisar agora o argumento mais utilizado pelos "anti-armas", qual seja, o de que nos últimos anos, o número de homicídios praticados com armas de fogo aumentou a índices nunca antes vistos. Em princípio tal afirmação é correta. Mas daí a querer correlacionar este aumento a venda legalizada de armas a cidadãos honestos é um grave e estúpido equívoco, tal como provaremos adiante.

Em estatística oficial do Exército Brasileiro, publicada em matéria intitulada "Venda de armas no País cai, mas violência cresce", publicada no Jornal "O Estado de São Paulo", de 22 de junho de 2000, pág. C-01, foi constada a queda de, pasmem, 59% (cinquenta e nove por cento) na venda legal de armas de fogo no Brasil. Ora, o raciocínio é muito simples, se por um lado a criminalidade cresce, por outro a venda legal de armas de fogo cai. Portanto, em hipótese alguma poderemos relacionar a venda legalizada de armas de fogo ao aumento dos índices de violência. A estatística do Exército Brasileiro é clara, derruba por terra todo e qualquer argumento em sentido contrário. Pergunto: Levando-se em conta as estatísticas oficiais, a proibição da venda de armas de fogo a cidadãos honestos afetará os índices de criminalidade? Resolverá o problema?

Resta esclarecer ainda que a grande maioria das armas usadas no cometimento de crimes são ilegais. Entraram ou foram comercializada no País por meios ilegais. E mais, a grande, a quase absoluta maioria dos crimes de homicídio cometidos, o são por criminosos habituais, os quais pela lei em vigor são proibidos de adquirir armas no comércio legal. Portanto cremos estar definitivamente comprovada a falsidade dos argumentos utilizados pelos "anti-armas".

É de se ressaltar que marginais e criminosos não compram armas de fogo no comércio legalizado, e que medidas como a proposta pelo Governo Federal em nada afetará os mesmos, visto que somente os cidadãos de bem serão privados de suas armas, sendo que os marginais continuarão na posse de seus arsenais.

Tentamos com estas breves considerações lançar um pouco de luz sobre tão controvertido e polêmico tema. Despretensiosamente queremos abrir os olhos da população brasileira para o absurdo da arbitrária medida proposta pelo Governo Federal. Muitas vezes os cidadãos honestos, assustados com a violência são seduzidos pelos falsos argumentos da mídia "anti-armas" e pelas, até bem intencionadas campanhas, mas que em nada resolverão no combate a criminalidade.

Cremos, sinceramente, que todo cidadão tem o direito de possuir uma arma de fogo, tanto para defesa como para a prática esportiva. Direito este que também implica deveres de guarda e uso correto da mesma. Cremos também que o verdadeiro Estado Democrático tem a obrigação de assegurar este direito ao cidadão. Lembro aqui, que os únicos estados que proibiram completamente o uso de armas pela população foram a Alemanha Nazista de Adolf Hitler e a URSS e demais ditaduras comunistas. Será que é isto que queremos para o Brasil?

Por outro lado, somos enfáticos em dizer que o uso de armas de fogo pela população civil deve ser controlado e fiscalizado pelo Estado, como forma de se garantir ao cidadão bem estar e segurança, bem como de se evitar o uso banal da arma de fogo, como visto todos os dias nas TVs. Mas em hipótese alguma admitimos o suprimento deste direito dos cidadãos.

Temos de nos concientizar de que, se hoje abrimos mão de uma parcela de nossa liberdade, amanhã de outra, e nos calarmos diante disto, chegará o dia em que não teremos mais liberdade nenhuma.

A violência só será combatida com trabalho sério e honesto, sem demagogias e medidas hipócritas. Será combatida com educação, emprego, trabalho e lazer aos nossos jovens, bem como com o efetivo combate ao tráfico de drogas e ao crime organizado.

Finalizando, gostaríamos de citar Cesare Bonesana, o grande Marquês de BECCARIA, que já no século XVIII doutrinava:

"Podem considerar-se igualmente como contrárias ao fim de utilidade as leis que proíbem o porte de armas, pois só desarmam o cidadão pacífico, ao passo que deixam as armas nas mãos do criminoso, bastante acostumado a violar as convenções mais sagradas para respeitar as que são apenas arbitrárias."

* O autor é advogado militante no Estado de Minas Gerais e praticante de tiro esportivo.

 

Fonte:http://www.apriori.com.br/artigos/armas_de_fogo_e_violencia.shtml