19 / 12 / 2002 A Suspensão Condicional da Pena no Direito Penal pátrio: Noções Gerais e a ocorrência de “bis in idem” na revogação do período de prova e não detração
I-) Introdução:
O sursis é uma novidade no direito penal, sendo introduzida no atual sistema
penal por influência do direito francês e belga. Hodiernamente, verificamos nos
direitos penais do mundo a tendência ao desapenamento com aplicação de medidas
substitutivas ao regime fechado, como a multa, as penas alternativas, revelando
ser um meio apto para punição dos réus, a menos no caráter ressocializador da
pena, que não apresenta ser martirizante e violadora dos direitos fundamentais
sacramentais.
A falência do sistema carcerário manifesta-se em todos os objetivos da pena,
não funcionando como meio de ressocialização, finalidade terapêutica da pena.
Com vistas, a aplicar formas que evitem o encarceramento do indivíduo insurgem
tais medidas, como manifestação do liberalismo penal. A tendência liberal influencia
a todo o ordenamento penal, dando azo a criação de métodos de punição que
evitem a reincidência e não abarrote ainda mais o cárcere, são criadas novas
medidas que visam afastar a restrição da liberdade, como é o caso do sursis, a
suspensão condicional da pena, que é a base desse estudo.
A política criminal encontra-se embebida dos ideais ressocializadores da pena,
antes do estritamente punitivo que eivava a sistemática penal de rigidez e
punição exacerbada. O Estado visualizou que estava falhando ao aplicar a todos
as penas privativas de liberdade olvidando, portanto, do fim social que o
apenamento deve ter, reconduzindo o cidadão para a sociedade.
Luís Augusto Freire Teotônio elucida: “O que mais importa ao Estado não é
punir, mas reeducar o delinqüente e conduzi-lo à sociedade como parte
integrante daqueles que respeitam o direito de liberdade alheia em seu mais
amplo entendimento, que é o limite do outro direito. Toda vez que essa
recuperação pode ser obtida, mesmo fora das grades de um cárcere, recomendam a
lógica e a melhor política criminal o sursis” (p. 259)
II-) Conceito:
A idealização desse instituto foi para que os condenados a penas pequenas
ficassem livres da condenação não indo a prisão, evitando a incidência dos
martírios que a condenação aflige aos réus. Ela permite ao condenado o direito
de não cumprir a pena, caso estejam reunidos todos os critérios legais. E.
Magalhães Noronha conceitua o sursis: “É a suspensão condicional da pena medida
jurisdicional que determina o sobrestamento da pena, preenchidos que sejam
certos pressupostos legais mediante determinadas condições impostas pelo juiz”
. Sendo um incidente de execução da pena que privativa de liberdade, que iria
ser executada e é suspensa condicionalmente.
O sursis é a suspensão condicional da pena, onde o juiz verifica existir os
requisitos que configuram o crime, os pressupostos de punibilidade, com o
reconhecimento da pretensão punitiva estatal descrita na denúncia ou queixa,
mas deixa de promover a execução da pena cominada, por reconhecer estar o réu
dentro da alçada de incidência dos elementos autorizadores do sursis,
suspendendo a pena mediante o cumprimento de condições, que ao serem
devidamente cumpridas, conduzem a extinção da punibilidade do réu.
Julio Fabbrini Mirabete leciona: “Permite a lei que não se execute a pena
privativa de liberdade ao condenado que preencha os requisitos exigidos,
ficando o condenado sujeito a algumas condições impostas na lei ou pelo juiz,
durante prazo determinado, e que, se não cumpridas, podem dar causa à revogação
do benefício” .
Damásio Evangelista de Jesus, com clareza expõe: “Sursis quer dizer suspensão,
derivado de surseoir, que significa suspender. Permite que o condenado não se
sujeite à execução da pena privativa de liberdade de pequena duração” .
III-) Natureza Jurídica:
A essência da suspensão condicional da pena é controversa no direito penal.
Alguns doutrinadores a entendem como sendo efetivo cumprimento de pena, tendo
os efeitos da sentença condenatória como real cumprimento da pena cominada no
édito condenatório. René Ariel Dotti et alii comentam: “o sursis encerra uma
autêntica pena restritiva de direitos, não se tratando, assim, de mero
benefício ou mesmo de um direito do réu. A essência, claramente sancionatória,
da suspensão condicional, como manifesta e evidente restrição de direitos, vem
indicada pela Lei de Execução Penal, que a retirou dos incidentes de execução e
a incluiu na parte referente à execução das penas em espécie” Outros entendem
ser um direito público subjetivo do réu, como Celso Delmanto, não podendo o
magistrado denegá-la quando presentes os pressupostos autorizadores da medida .
O sursis é um direito público subjetivo do réu (facultas agendi), dependendo de
motivação por parte do magistrado para negar o mesmo ao réu. Em tese, todo o
sentenciado tem esse direito e o magistrado deverá fundamentar a rejeição do
instituto ao réu. Entendemos ser o sursis um acordo judicial, com escopo de
substituir a pena corporal cominada, por impossibilidade de concessão da
restritiva de direitos ao réu, operando como forma de cumprimento da pena, mas
sem a imposição de regimes, em liberdade, com algumas restrições feitas pelo
juiz.
Onde o juiz aplicará o sursis, suspendendo a pena e concedendo um benefício ao
réu, extinguindo a pena e não o levando para o efetivo cumprimento da pena,
quando cumprido o período de prova fixado na sentença sem qualquer violação as
proibições ali estatuídas. O sursis somente poderá ser concedido quando
tivermos um delito com grave ameaça ou violência.
IV-) Pressupostos de Aplicabilidade da medida:
4.1-) Prazo Máximo de Condenação e Período de Prova:
O requisito legal temporal é de 2 anos de condenação, onde a pena ficará
suspensa e o sentenciado deverá cumprir algumas condições, que serão arbitradas
pelo juiz na sentença em conformidade com o diploma penal. Esse período de
condenação será convertido em período de prova, onde após seu devido
cumprimento, será extinta, com o magistrado liberando o réu da imposição da
pena corporal e da responsabilidade penal, extinguindo a pena. Esse prazo de
condenação de dois anos limita-se a quase todas as contravenções penais e a
maioria dos crimes punidos com detenção, que revelam menor periculosidade,
lesividade e o desvalor da conduta.
O termo pena privativa de liberdade inserida no artigo 77 e repetida no artigo
80, ambos do Código Penal, logicamente, afastam a sua incidência em delitos
onde fora cominado pena restritiva de direitos ou multa penal, justamente pela
não privação da liberdade do indivíduo, caráter incompatível com a suspensão de
execução, pois, a liberdade não está sofrendo qualquer proibição, mas quando
depararmos com prisão simples, não persiste a vedação penal.
Esse período de prova é de 2 a 4 anos e se ocorrer algum fato delituoso imputado
ao réu, esse período de prova será revogado e o sentenciado deverá cumprir
efetivamente a pena.
4.2-) Requisitos Objetivos de Concessão:
a-) Reincidência em Tipo Penal doloso:
O artigo 77, I, Código Penal restringe a concessão, quando o agente for
reincidente em crime doloso, independentemente de qual for o tipo penal,
afastando a reincidência específica. Caso o réu, pratique um novo crime no
período de 5 anos após o cumprimento da pena, será para efeitos penais
considerado técnicamente reincidente (artigo 64, I, Código Penal). Ainda,
devemos Sobre isso, vejamos o que ensina Luiz Régis Prado: “Logo, não impede a
obtenção do sursis pela prática de crime culposo a anterior condenação por
delito doloso, e vice-versa” , e, pode ser concedido sucessivamente em crimes
culposos, pois, o tipo restringe a reincidência específica em crimes dolosos,
ainda, permitindo a concessão em delitos preterdolosos, o que permite a
concessão em sendo aplicada medida de segurança e em reincidência por
contravenção penal. No sentido colacionamos as decisões do TACrimSP:
“A concessão do sursis a réu reincidente era vedada pela lei anterior; com o
advento da Lei 7.209/84, a reincidência em crime culposo não é mais óbice à sua
concessão. Retroação da lois plus douce” (TACRIM – SP – AC – Rel. Juiz Segurado
Braz – JUTACRIM 82/314).
Ainda é possível, a concessão onde haja a prática de crimes dolosos, mas dentre
a sentença condenatória e a data do novo fato, devemos ter um lapso que afaste
a reincidência, ou seja, mais que cinco anos. Dessa sorte, mencionamos a lição
de Julio Fabbrini Mirabete: “Nada impede que uma pessoa possa obter duas ou
mais vezes a suspensão condicional da pena. Diante da adoção do critério da
temporariedade para o efeito da reincidência, decorridos mais de cinco anos
entre o cumprimento ou a extinção da pena (que pode ocorrer pelo decurso do
prazo do sursis sem revogação), volta o autor de novo ilícito à categoria de
não reincidente (art. 64, inciso I) podendo ser beneficiado novamente com a
suspensão condicional da pena” .
Heleno Cláudio Fragoso explica: “A anterior condenação por crime culposo não
impede a concessão do benefício. Por igual, a anterior condenação à pena de
multa, também não impedirá que o juiz conceda o sursis (art. 77, parágraf
único, do CP). A condenação a pena privativa da liberdade, se decorreram mais
de cinco anos desde que declarada a extinção da pena, será irrelevante, pois
não impedirá a concessão da medida. A condenação anterior, para obstar a
concessão do sursis deve ser definitiva, e deve referir-se a um crime. A
anterior condenação por contravenção penal, mesmo que tenha sido imposta pena
privativa de liberdade, não significa “reincidência em crime doloso”, mas pode
ser relevante, pois deve ser considerada nos antecedentes do agente. A
condenação por crime doloso no estrangeiro também impede a concessão do sursis.
Nesse caso, não se exige a homologação da sentença em nosso país” .
Uma hipótese interessante é aquela que se encontra na condenação anterior por
pena de multa. Nesse assunto, nos situamos com a maioria da doutrina e com a
vasta jurisprudência no sentido de não ser possível a recusa a concessão desse
benefício legal ao réu. Nesse sentido se pronunciaram o STF e o TJSC:
“Não se pode negar sursis ao argumento da reincidência se a condenação anterior
foi meramente pecuniária”(RT 639/387)
“As condenações anteriores à pena de multa não obstam seja concedida a
suspensão condicional da pena ao réu que cometeu nova infração penal, a teor do
77, parágrafo único, CP” (JCAT 59/283).
O teor da jurisprudência supra, nos revela que nos casos de pena de multa,
criminosos de pouca ofensividade social são condenados, por isso, a
reincidência aqui não pode ser negada, para que ao invés, apliquemos uma
condenação a uma privativa de liberdade, contrariando as políticas criminais e
remanejando esse réu ao ambiente inóspito da penitenciária e ao convívio com
réus de maior potencial criminológico, que poderão levá-lo ao crime de maior
gravame/impacto social.
Convém, elucidarmos que nada impede a concessão simultânea de sursis, que terão
validade, mas, contudo não deverá ser esta sentença condenatória, pois, caso
seja, afastada estará o sursis, justamente pela incompatibilidade da medida com
a pena privativa.
b-) Circunstâncias Judiciais favoráveis ao Agente:
O mérito pessoal do agente é levado em consideração (artigo 77, II, Código
Penal: “a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do
agente, bem como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do
benefício”), onde o juiz deve proceder à analise dos valores pessoais do
agente. O juiz vai fazer um juízo de necessidade e suficiência da medida
apenatória que irá verificar se o condenado faz jus ao benefício, ponderando a
eficiência da suprimissão da condenação em conjunto com o teor de eficiência da
suspensão, em grau de recuperação do condenado. O condenado deverá ter
características suficientes que o façam merecer o sursis e de acordo com esses,
o juiz fixa os benefícios.
A abstração do juiz quando do juízo de admissibilidade da concessão deverá
estar fulcrado nos méritos subjetivos do réu, que deverá reunir condições para
que o juiz conceda a benesse. Interessante é a lição de César Roberto
Bitencourt: “Esses elementos têm a delicada função de subsidiar a previsão da
conduta futura do condenado, que se for favorável, isto é, de que provavelmente
não voltará a delinqüir, autorizará a suspensão da execução da pena imposta,
mediante o cumprimento de determinadas condições. Se, ao contrário, essas
condições demonstrarem que provavelmente voltará a praticar infrações penais, a
execução da pena não deverá ser suspensa” .
c-) Prazo de Condenação e Impossibilidade da Substituição por Pena Alternativa:
O pressuposto de aplicação do sursis é o temporal, onde a condenação deve ser
por no máximo dois anos a pena privativa de liberdade, portanto, se a
condenação for a pena restritiva ou multa penal exclusivamente, obstada estará
a medida. Essa substituição da pena é por quatro anos e somente sendo cabível
quando não for possível a substituição da pena por uma restritiva de direitos.
Então, se o réu não reunir os elementos do artigo 44 e incisos, Código Penal,
que indiquem a substituição da pena, autorizado estará o magistrado a conceder
o sursis.
O sursis poderá ser possível quando não for cometido o crime com grave ameaça
ou violência, assim, o criminoso que valeu-se dos elementos supra - indicados
poderiam ter o benefício, mas ficam vedados quando o juiz fazer o juízo de
avaliação da prescindibilidade da medida alternativa do inciso II, art. 77,
Código Penal.
V-) O Sursis, o concurso de crimes e condenações sucessivas:
Julio Fabbrini Mirabete possui o seguinte entendimento : “Para a concessão do
sursis, em caso de concurso de crimes, é de se levar em consideração a soma das
penas aplicadas. Excedendo de dois anos as penas cumuladamente aplicadas, não
pode o sentenciado ser beneficiado com a suspensão condicional da pena, pouco
importando que qualquer delas, isoladamente considerada, não exceda o limite a
que se refere o art. 77 do CP” .
Outra hipótese interessante é a da compatibilidade da aplicação de dois sursis
em concurso de crimes, simultâneamente. Alguns doutrinadores entendem que será
possível o cumprimento de dois benefícios em conjunto. A execução ficaria, portanto,
condicionada ao limite legal de dois a quatro anos. Se o magistrado ao efetuar
a somatória das penas verificar que ela atravessar o patamar máximo da previsão
legal, teremos a proibição na aplicação desse benefício. Caso não supere, será
possível, desde que haja a compatibilidade entre as sentenças condenatórias
permitindo, portanto o período de prova, com uma não excluíndo a outra. Com o
aresto do TACrim merecendo transcrição:
Se o réu for sucessivamente julgado e condenado em dois processos que admitem
sursis e se acharem preenchidos os requisitos legais, deverá o benefício ser
repetidamente outorgado. Será cassado se as duas condenações transitarem em
julgado. Será mantido se uma só das condenações tiver sido confirmada” (TACRIM
– SP – HC – Rel. Juiz Cid Vieira – RT 545/352 e JUTACRIM 69/67).
VI-) Sursis Etário, Profilático, Simples e Especial:
O sursis possui diversas modalidades previstas todas na lei penal. O sursis
pode ser: etário, profilático, simples e especial.
O sursis etário visa a concessão do benefício a pessoas com idade superior a 70
anos, sendo possível a aplicação do mesmo, sob o fundamento por questões da
falta de saúde que a pessoa enfrenta. Nesse sursis, o tempo de condenação
deverá ser de até quatro anos e uma condição imperiosa será a existência de um
problema que cause abalo na saúde, estando o estado fisiológico do sentenciado
fragilizado, debilitado, para fazer jus ao disposto nos termos do art. 77, §
2º, Código Penal. O sofrimento do réu ou a avançada idade fazem com que o juiz
verifique que a imposição de uma pena irá causar efeitos gravosos ao réu, isto
porque, ele já está sofrendo com a elevada idade e suas complicações naturais
ou pelo estado de saúde grave que importa em elevada dor e proximidade com a
morte, por isso o sursis tem seus limites estendidos, com vistas a humanizar o
direito penal e respeitar a dignidade humana.
No sentido, Mirabete explica a criação do instituto: “Inovação da Lei nº 7209,
porém, foi a inclusão de exceção à regra geral, permitindo-se a concessão de
sursis ao condenado à pena não superior à quatro anos quando maior de 70 anos
de idade – sursis etário. Trata-se, novamente, de se levar em conta a
decadência ou degenerescência provocada pela senilidade e a menor
periculosidade dos anciãos” .
As razões de saúde que motivam o sursis profilático ou humanitário estão para
um estado precário, deficiente de saúde por parte do réu que sofre com alguma
insuficiência que afeta diretamente sua imunologia, estando o mesmo tendente a
sofrer em decorrência a problemas de saúde que poderão ser agravados caso se
operasse a condenação. César Roberto Bitencourt nos ensina que: “A nova redação
do § 2º do art. 77 deixa claro que “razões de saúde” podem justificar a
concessão de sursis, também para pena não superior a quatro anos,
independentemente de idade. Cuida-se, na verdade, de uma nova espécie de sursis
e não simplesmente de um novo requisito do “sursis” etário. Por outro lado,
representa uma nova alternativa de sursis para penas de até quatro anos, sendo
alternativo e não simultâneo ou concomitante à maioridade de setenta anos. Em
outros termos, para ter direito ao sursis, por razões de saúde, não precisa ser
maior de setenta anos de idade”
O sursis simples ocorre quando o juiz faculta ao réu a suspensão do cumprimento
da pena, mas ficando a mesma condicionada ao cumprimento de alguns pressupostos
normativos, estabelecidos pelo magistrado na sentença pelo prazo de um ano, que
são algumas das restritivas de direitos. O período de provas é o tempo de
suspensão onde o sentenciado ficará sujeito as restrições comportamentais.
Durante o primeiro ano o réu estará sujeito a prestação de serviços a com
unidade ou a limitação de fim de semana, ficando a critério subjetivo do juiz a
escolha (v.g. 78, § 1o, Código Penal). Essas penas restritivas de direito são
impostas ao sentenciado como uma condição para a aplicação do sursis, devendo
seguir as regras dos artigos correspondentes aos artigos 46 e 48, Código Penal.
Miguel Reale Júnior apresenta aspectos interessantes sobre o sursis simples: “O
sursis simples, apesar da denominação de suspensão condicional da pena, implica
verdadeira execução de sanção penal, já que o sentenciado deverá cumprir por um
período as reprimiendas estabelecidas pelo art. 46 ou pelo art. 48. Ciente da
finalidade retributiva e de prevenção especial da sanção penal, entendeu o
legislador modificar a suspensão da pena, de molde a tornar mais eficaz o
instituto, nele encartando condições que correspondem às penas restritivas de
direitos mencionadas” .
O sursis especial está expresso no artigo 78, § 2o, CP, sendo menos gravosa que
a anterior. Se o condenado reparar o dano e as circunstâncias judiciais do
artigo 59 forem favoráveis, ficará o réu somente adstrito a freqüentar
determinados ambientes, tais como, lupanários, boates, bares, lugares que
possam de alguma maneira incitar ou estimular o réu a levar nova atividade
delituosa a cabo. Essa restrição veda o condenado a requerer autorização
judicial para sair da comarca e deve ainda o réu se apresentar periódicamente
frente ao juízo das execuções criminais para justificar seus atos em sociedade.
O instituto do sursis traz consigo algumas incongruências, não só adstritas a
esse instituto, mas assim como a toda a esfera jurídica penal. O Direito Penal fica
entre o pragmatismo e a utopia, onde deve-se ter uma readequação preventiva e
dos estabelecimentos de cumprimento de pena. O juiz impõe as condições ao réu,
em atendimento aos preceitos normativos penais, mas o sistema penal fica
carente, pois, não tem condições de fiscalizar o cumprimento de todas as
condições feitas ao réu, ficando esse insitituto sendo um teatro, onde o réu
finge que cumpre os pressupostos normativos e o juiz finge que acredita. Por
isso, o Ordenamento repressivo pátrio necessita de políticas criminais antes de
mais nada, possíveis na sua amplitude, não deixando nosso estatuto repressivo
inócuo e ineficaz.
Ao magistrado fica livre o direito de poder fixar novas condições, porque a lei
lhe faculta essa possibilidade, vez que fica em aberto ao mesmo a determinação
dessas imposições legais. Nesse sentido exclarece Mirabete que: “Além dessa
condição alternativa obrigatória, de prestação de serviços à comunidade ou
limitação de fim de semana, o juiz pode impor outras, que devem sempre ter
relação com o fato criminoso ou a pessoa do condenado. Citam-se, como exemplos,
a obrigatoriedadede freqüentar curso de habilitação profissional ou de
instrução escolar, atender aos encargos de família, submeter-se a tratamento de
desintoxicação quando envolvido o condenado com bebidas, drogas etc. Não tendo
qualquer condição imposta qualquer relação com a prática delituosa, deve ser
ela cancelada” .
O importante é a existir a compatibilidade entre o delito praticado e a
condição a ser obedecida pelo réu, com o tipo penal praticado pelo sentenciado,
além do respeito pelos direitos individuais e constitucionais do réu, com
fulcro no artigo 5º, II, Constituição da República.
VII-) Revogação Obrigatória e Facultativa do Sursis:
A revogação do sursis consiste no desaparecimento da suspensão, passando a pena
a ser cumprida normalmente, nos termos em que o juiz havia fixado antes de
verificar a possibilidade de aplicação do insituto, sendo destituído o sursis
concedido. A revogação poderá ser facultativa nos termos do artigo 81, § 1o, CP
ou obrigatória por força do artigo 81 do CP.
O período de prova não se confunde com o tempo de cumprimento efetivo de pena,
não sendo computado como tempo decrescido da condenação. Independentemente da
injustiça nítida, a pena será cumprida integralmente não sendo possível a
aplicação desse lapso temporal como fundamento para a detração penal.
A suspensão será obrigatoriamente revogada em algumas hipóteses previstas no
disposto no artigo 81, Código Penal, onde:
“A suspensão será revogada se, no curso do prazo, o beneficiário:
I - é condenado, em sentença irrecorrível, por crime doloso;
II - frustra, embora solvente, a execução de pena de multa ou não efetua, sem
motivo justificado, a reparação do dano;
III-descumpre a condição do § 1º do art. 78 deste Código”.
No inciso primeiro quando for o réu condenado por crime tipificado como doloso
e tiver sua sentença transitada em julgado, não possibilitando a interposição
em grau recursal visando a modificação da decisão proferida em primeira
instância. Para Mirabete: “Tratando-se, portanto, de crime doloso, a revogação
é de rigor, tenha sido o delito praticado antes ou depois daquele que originou
o sursis ou ainda durante o prazo de suspensão condicional da pena. Basta que
haja nos autos a comprovação de que a sentença condenatória transitou em
julgado antes de escoado o prazo da suspensão para que se revogue o benefício”
.
O segundo inciso revela a ligação com a possibilidade economica do condenado.
Sendo ele solvente, e não cumprindo o pagamento da pena de multa ou reparando o
dano advindo do delito, o benefício será revogado. Antes da revogação do
instituto, deverá o juiz proceder em conformidade com o artigo 164 e ss, Lei de
Execução Penal, ou seja, efetuando a prévia notificação do réu para efetuar o
pagamento no prazo legal, afim de que o mesmo quite o débito, mas em não o
fazendo, o juiz obrigatoriamente efetuará a revogação do benefício sendo o réu
reconduzido ao cumprimento da pena a que fora condenado.
O terceiro apresenta o descumprimento da prestação de serviços à comunidade ou
a limitação de final de semana, injustificadamente pelo réu. O mesmo deverá
apresentar ao juiz seus motivos no tempo concedido pela lei, caso não o faça,
deverá obrigatoriamente o juiz suspender o benefício. O réu ao
injustificadamente faltar ao cumprimento da restrição condicional da norma,
deverá se apresentar ao magistrado e fazer uma exposição fática e probatória,
carreando ao juiz os elementos que justifiquem o desrespeito a condição
restritiva imposta pelo magistrado. O juiz ao se convencer nas justificativas
do réu manterá o benefício legal, se o mesmo não apurar a veracidade nos
depoimentos do réu, revogado estará o benefício e, o mesmo será reconduzido ao
cumprimento do restante do tempo de condenação.
Ao revés, a revogação será facultativa quando o magistrado se deparar com a
situação prevista no artigo 81, § 2o do Código Penal: “A suspensão poderá ser
revogada se o condenado descumpre qualquer outra condição imposta ou é
irrecorrivelmente condenado, por crime culposo ou por contravenção, a pena
privativa de liberdade ou restritiva de direitos”. O ato de revogar o
benefício, deverá vir fundamentado e justificado pelo magistrado, a falta de
motivação ao revogar o sursis levará a interposição de recurso e eventual
reformatio in mellius do decreto condenatório.
Se o réu descumprir alguma das outras condições impostas pelo magistrado ou se
foi irrecorrivelmente condenado por crime culposo ou contravenção penal, o
benefício será revogado. A essas condições fixadas pelo magistrado, são as
condições judiciais.
A prorrogação do período de prova é o aumento do mesmo, sendo indefinido o
período probatório. O limite determinado pelo juiz será inobservado, sendo
automático e obrigatório quando o réu estiver sendo processado por outro delito
culposo ou contravenção, sendo o prazo dilatado até a conclusão da nova ação
penal contra ele, ficando, pois, no aguardo da sentença definitiva do processo
(v.g. 81, § 2o, Código Penal).
Quando a revogação for facultativa poderá o magistrado ao invés de revogar o
benefício prorrogar, postergar a duração do mesmo, aumentando-o até o limite de
quatro anos, o máximo definido no artigo 77, caput, do Código Penal, em
subsituição a revogação, medida mais drástica. (v.g. artigo 81 § 3o, Código
Penal).
Se decorrido o período de prova sem a violação de qualquer condição extinta
estará a pena (v.g. artigo 82, Código Penal) subsistindo os demais efeitos da
condenação, tais como, a reincidência.
VIII-) O Sursis e a sua Inconstitucionalidade configurar dupla punição:
Alguns doutrinadores levantam que esse instituto guarda incompatibilidade
horizontal (entre a revogação e a execução da pena) com a norma constitucional,
estando, pois, inconstitucional, se configurando num bis in idem. A maioria não
vê incompatibilidade porque não é pena, mas sim uma condição porque o sursis
não é obrigatório, é facultado ao réu, que tem a opção de escolher entre
cumprir a pena normalmente ou se sujeitar a esse requisito normativo, o que
fundamenta o disposto no início quando demos ao sursis caráter de acordo
judicial também. Assim, o cômputo do período de prova estaria vedado, pela
disposição expressa de que a detração é caracterizada pela imposição de pena e
não de uma condição, que não tem o condão real de pena.
O TACRIM em suas decisões fundamenta a nossa posição e em conformidade com a
segunda corrente:
“Inocorre bis in idem na fixação da prestação de serviços à comunidade como
condição do sursis, vez que a Lei Penal estabelece tal medida como pena
autônoma e substitutiva da privativa de liberdade, e também a comina a título
de condição obrigatória da benesse” (RJDTACRIM 25/383)
“A fixação da prestação de serviços à comunidade como condição do sursis,
prevista no art. 78 § 1o, CP, não constitui ilegalidade ou bis in idem, vez que
este consiste na suspensão da execução da pena privativa de liberdade e aquela,
por ser sanção restritiva de direitos, possui natureza diversa” (RJDTACRIM
29/173).
Luis Augusto Freire Teotônio argumenta pela inconstitucionalidade do período de
prova do sursis revogado tornar-se pena a ser cumprida e aduz: “Mas, pela
sistemática atual do instituto, se durante o período de prova houver revogação
do sursis o condenado cumprirá por inteiro a pena que se achava suspensa, ou seja,
com a execução suspensa, não se abatendo o período de prova já cumprido. Ora,
sendo dessa forma, há possibilidade de dupla punição do condenado. Tal não se
justifica. Ninguém pode ser punido mais de uma vez pelo mesmo delito (regra –
non bis in idem). Aliás, a nossa Lei Maior a proíbe (arts. 1º e 5º, XXXIX).
Assim, pensamos que, se durante o período de prova ocorrer revogação do sursis
o condenado não pode cumprir por inteiro a pena que se achava com a execução
suspensa, sem que haja abatimento do período de prova já cumprido. Dessa
maneira, revogado o sursis, o condenado tem direito a abater o período de prova
anteriormente cumprido, pois que se trata de “pena” já cumprida” .
No entanto e para concluir, entendemos ter razão, o insigne magistrado paulista,
pois, apesar de não ser pena, suas características a elevam ao patamar de pena,
impondo verdadeira restrição de direitos ao réu, que ficará sujeito as
condições arbitradas pelo magistrado na pena, que são na verdade algumas das
penas alternativas inseridas com a Lei 9714/98.
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REALE JÚNIOR, Miguel. Novos Rumos do sistema criminal. Forense.RJ/RJ. 1983.
TEOTÔNIO, Luis Augusto Freire. Suspensão Condicional da Pena e Livramento
Condicional: Dupla Punição no Direito brasileiro. RT 662 – Dezembro 1990. RT.
SP/SP. 1990.
Sobre o autor: Estagiário credenciado do Ministério Público do Estado de São
Paulo atuando junto a Promotoria de Justiça Criminal de Ribeirão Preto –
Presidente do Instituto de Estudos de Direito Penal e Processo Penal e
Estudante da 8ª Etapa do Curso de Direito da Universidade de Ribeirão Preto
(UNAERP), palestrante na 1ª Semana de Estudos de Direito Penal da Unaerp
(Consentimento do Ofendido), articulista na revista da Faculdade de Direito
Laudo de Camargo “Paradigma”, em sites jurídicos, bem como no jornal da própria
faculdade.
http://www.argumentum.com.br/artigos/mostraartigo.php?titulo=A%20Suspensão%20Condicional%20da%20Pena%20no%20Direito%20Penal%20pátrio:%20Noções%20Gerais%20e%20a%20ocorrência%20de%20“bis%20in%20idem”%20na%20revogação%20do%20período%20de%20prova%20e%20não%20detração&data=19/12/2002&dia=19&mes=12&ano=2002&categoria=Penal&id=359&busca=
http://www.argumentum.com.br/artigos/artigo.php?categoria=Penal