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CRIMES CONTRA A SAÚDE PÚBLICA: LEIS 9.677/98 e 9.695/98
Jaques de Camargo Penteado





Sumário: 1. Introdução 2. Breve noção de Incolumidade Pública 3. Breve noção de perigo 4. Glossário dos crimes contra a saúde pública 5. Da falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de substância ou produtos alimentícios 6. Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais 7. Invólucro ou recipiente com falsa indicação 8. Substância destinada à falsificação 9. Aumento de pena por morte ou lesão corporal de natureza grave 10. Dos efeitos da condenação 11. Crime hediondo 12. Aspectos processuais 13. Conclusão.

1. Introdução

O homem é animal social. Realiza-se na vida comunitária. Tem aptidão para evoluir construindo uma sociedade fraterna e, ao mesmo tempo, é capaz de se destruir e aos demais. Racional, quer o bem que a inteligência desvenda. Falível, faz o mal que o desnatura. A ordenação social implica o conhecimento desta realidade e invoca uma orientação harmônica que, preservando a individualidade, permita o progresso de todos. Surge o Direito como indutor da coesão social que assegure um estado propício ao desenvolvimento de cada um segundo as suas potencialidades.

Esse estado jurídico traduz-se na paz social, no estabelecimento imperativo de uma ordem tranqüila, na disposição conveniente na vida de relação e na proteção dos bens necessários à existência humana. A finalidade de estabelecer situação propícia ao crescimento da humanidade solicita o emprego dos meios suficientes à contenção da irracionalidade e o incentivo dos comportamentos conducentes ao bem comum. Emprega a força como instrumento de harmonização da vida social. Opera-se a substituição do poder do mais forte, voltado para a satisfação dos seus próprios interesses, pelo poder vinculado ao bem da coletividade, restringindo o raio operacional de cada pessoa em benefício da harmonia global dos concidadãos. Surge a força do Direito que, sem olvidar cada pessoa e seus bens-interesses protegidos, organiza a sociedade para que todos possam buscar a perfeição.

A busca da perfeição interessa a todos e a cada um dos membros da sociedade. Compreende o respeito pela pessoa, o provimento das necessidades básicas do ser humano e a fixação de uma ordem justa e permanente.

Esta visão do bem comum deve ser compreendida no estágio de civilização em que o espaço territorial foi intensamente reduzido pela tecnologia dos transportes e os meios de comunicação avizinharam os povos mais distantes. As populações migraram para as grandes cidades e a vida de relação desenvolve-se em sociedades de massa. O fenômeno da globalização expõe uma atividade econômica multifacetada e sem base territorial fixa. Um produto é confeccionado pela junção de componentes fabricados em diversos países. As fábricas podem ser mudadas de endereço com muita agilidade. É possível escolher a lei a ser aplicada à produção final ou fazer a lei que discipline este mesmo produto no país eleito.

A crise de eficácia do direito é investigada na economia global, passa pelo crime organizado em que as operações de narcotráfico atentam contra a humanidade, chegando à própria estrutura clássica da tripartição dos poderes e à aptidão judicial para realizar a justiça. O Poder Executivo legisla com intensidade jamais vista e julga com desenvoltura inimaginável. O Poder Legislativo é incapaz de promulgar códigos de leis que mantenham um sistema jurídico consagrado, atua perifericamente na elaboração dos orçamentos e não julga com um mínimo de rigor os casos de sua competência. O Poder Judiciário, chamado à solução de conflitos individuais, desprovido de boa legislação e despreparado para resolver conflitos coletivos, desestrutura-se diante de ameaças de controle externo e vinculação de julgamentos ou desestabiliza-se com a dinâmica espontânea que gera a perda de sua neutralidade. (2)

Temos lacunas insuperáveis ao mesmo tempo em que convivemos com uma inflação de normas. Os poderes estatais não conseguem implementar o bem comum e os mais fortes fazem o direito que lhes interessa ou conseguem a aplicação do direito segundo a forma que lhes convém. A concentração de rendas atinge grau perverso, não é possível controlar a produção, a criminalidade organizada cresce assustadoramente e as relações familiares não escapam ao abuso imperdoável dos que se fazem imunes à norma porque capazes de infringi-la descaradamente. São tantas as tentativas de equiparações de instituições diferentes e são tantas as proposituras de uniões de iguais - são tantas as tentativas de unificar o tratamento penal de shampoo e remédio contra o câncer - que, vigorando sentimento de anomia e impotência, corre-se o risco de uma legislação casuística e formal ser aplicada por um poder destituído de sua neutralidade asseguradora de confiança e, portanto, um poder sem independência imporia um direito aparente aos que dependem da vida social para realizar os seus fins primários. Trocar-se-ia a ordem pelo caos.

O jurista não opera no caótico, mas realiza o direito para consecução da justiça. Não trabalha com a norma ilegítima, mas busca na ciência do direito, o instrumento do justo. Sabe tomar da principiologia a regra que disciplina a vida de relação para estabelecer o bem comum. O direito é ciência unitária que a pedagogia divide para fins didáticos. Direito Público ou Privado, Direito de Família ou Penal, sempre direito, sempre ciência voltada à justiça.

A justiça é para o homem e o homem merece a atenção do jurista para repudiar o que de direito não deveria ter sequer o nome e, preservada a ordem jurídica, ser assegurada a cada um a esperança de ser feliz.

O direito à vida. O direito à vida que a ciência moderna pode prolongar à terceira idade. O direito à vida saudável. O direito à prevenção e à cura de doenças interessa vivamente à sociedade como um todo e a cada pessoa em particular. Trata-se de bem jurídico que, desconsiderado, atinge a substância da própria vida gregária. Os seres humanos que se reúnem para somatização de potencialidades podem ser globalmente vilipendiados pela ação de uns poucos. É função jurídica proteger a sociedade para manutenção da segurança de todos, sem a todos submeter à violação do sentimento de justiça. A incolumidade pública deve ser resguardada segundo os princípios constitucionais de subsidiariedade e proporcionalidade. (3)

2. Breve noção da Incolumidade Pública

Tratando do que se conhece por dupla couraça, Soler didaticamente explica a razão de punibilidade de condutas que negativamente afetam a sociedade como um todo. Inicialmente, demonstra que a punibilidade dessa categoria especial de crimes é obra da legislação moderna e não está totalmente encerrada. Enfatiza que a dificuldade de fixar o bem jurídico tutelado decorre justamente de se invocar a segurança pública como razão para a criminalização de condutas. Não deixa de reconhecer que se "destaca por su corrección el C. del Brasil, arts. 250 y sigs". (4)

Prosseguindo, mostra que na hipótese de incêndio provocado pelo meu vizinho, na sua casa, evidente que a minha residência também corre perigo imediato, além do perigo mediato que advém de todo crime, pois o incendiário impune poderá futuramente atear fogo em minha moradia. "Descartado esse punto de vista, resulta claro que la ley, además de acriminar, por razones genéricas de seguridad, la violación o destrucción de ciertos bienes jurídicos, en algunos casos prohibirá determinadas acciones no ya en cuanto ellas importan la violación o destrucción de esos bienes, sino el peligro de que se pierdan. En tales casos, podría decirse que el bien jurídico final está defendido por una doble coraza. Valora el derecho en tan alta medida aquellos bienes, que hasta acuerda protección a su libre y tranquilo disfrute esento de riesgos. Pero si buscamos el bien jurídico próprio directo y específico de esas normas protectoras de segundo grado, pronto advertiremos que es el de la seguridad, pues ellas no piensan directamente en cubrir los biens de los daños, sino has de los riesgos. El correlativo de la idea de seguridad es la idea de peligro, no ya la de lesión. Los delitos que ahora examinamos, son de peligro común, considerados desde el punto de vista de los biens materiales que pueden destruir, pero son de lesión, en cuanto positivamente vulneram el bien jurídico de la seguridad, que es protegido en sí mismo y en forma autónoma". (5)

O Código Penal Argentino abre um título denominado "Delitos contra La Seguridad Comun" e, a seguir, em diversos capítulos, trata do incêndio "y otros estragos", da explosão, "estrago", (6) dos delitos contra a segurança dos meios de transporte e de comunicação, pirataria e, por fim, os crimes contra a saúde pública. (7) O crime de envenenamento ou adulteração de substância alimentícia ou medicinal é punido com pena privativa da liberdade de 3 a 10 anos.

O Código Penal Italiano emprega a expressão "delitti contro l'incolumità pubblica" para, em sucessivos capítulos, definir os crimes de "strage", (8) incêndio, inundação, desmoronamento, avalanche, naufrágio, desastre aéreo, desastre ferroviário e crimes correlatos para, em seguida, tipificar os crimes "di comune pericolo mediante frode" (art. 438 e segs.), destacando-se a epidemia, o envenenamento de água ou substância alimentar (punição com reclusão não inferior a 15 anos), a adulteração ou contrafação de substância alimentar (reclusão de 3 a 10 anos; aumento de 1/3 se afetar substância medicinal), adulteração ou contrafação de outras coisas com dano à saúde pública, comércio de substância alimentar contrafeita ou adulterada, comércio ou fornecimento de substância medicinal estragada, comércio de substância alimentar nociva, fornecimento de substância medicinal de modo perigoso à saúde pública (reclusão de 6 meses a 2 anos e multa). Prevê confisco obrigatório "delle cose che costituiscono il prezzo del reato" (art. 240, no 1). Vê-se que as penas mínimas giram em torno de 3 anos de privação da liberdade (4 na hipótese de substância medicinal).

Finalmente, nesta breve comparação com textos legais próximos do nosso sistema penal, vale a pena citar o recente Código Penal Português. Essa norma prevê um título que denomina "Dos crimes contra a vida em sociedade" e, a seguir, em capítulo próprio, "Dos crimes de perigo comum" (art. 282 e segs.), pune a corrupção de substâncias alimentares ou medicinais (prisão de 1 a 8 anos), a propagação de doença, alteração de análise ou de receituário ( prisão de 1 a 8 anos) e a recusa de médico (omissão de socorro pelo médico - prisão até 5 anos). Além de fixar penas sensivelmente inferiores - demonstração concreta da tendência mundial moderna de substituir penas graves por certeza de punição - estimula a conduta tendente à remoção voluntária do perigo (atenuação de pena - art. 286). (9)

Entre nós, a sistemática adotada guardava bastante semelhança com essas legislações, inclusive no tocante às sanções previstas, proporcionadas à gravidade das condutas respectivas, sem contar que a doutrina e a jurisprudência não reclamavam alteração legislativa alguma, nada obstante se mostrassem vacilantes os tribunais pátrios quanto à qualificação jurídica da alteração de uísque. (10) O Código Penal Brasileiro consagrou um título para cuidar dos "Crimes contra a incolumidade pública" e o dividiu em três capítulos: "Crimes de perigo comum", "Crimes contra a segurança dos meios de comunicação e transporte e outros serviços" e "Crimes contra a saúde pública". A doutrina salienta que é a "incolumidade pública a objetividade jurídica tutelada neste título. Compreende o complexo de bens e interêsses relativos à vida, à integridade corpórea e à saúde de todos e de cada um dos indivíduos que compõem a sociedade. Característico dêsses crimes é que ultrapassam a ofensa a determinada pessoa, para se propagarem, ou, pelo menos, poderem estender-se a indeterminado número de indivíduos, prejudicando ou ameaçando a segurança da convivência social. É exatamente êste critério de coletividade e indeterminação, referente a pessoas, que distingue êsses crimes dos contra a pessoa ou de certos delitos contra a indústria e o comércio, ou contra o patrimônio". (11)

Olvidando o tridimensionalismo jurídico (fato, valor e norma), o legislador atual adota o unidimensionalismo e, com base exclusiva em fatos alardeados pelos meios de comunicação social, relegando ao mais completo oblívio o conceito de valor e de norma, promoveu uma reforma que precisou ser complementada praticamente em seguida, na qual destacam-se, entre outros, um exagerado aumento das sanções (4 a 8 anos de reclusão para a falsificação de produto alimentício, e, 10 a 15 anos de reclusão para a falsificação de produto terapêutico ou medicinal), uma radical qualificação do crime de falsificação de produto terapêutico ou medicinal como hediondo, a inclusão dos produtos terapêuticos, bem como matérias primas, insumos farmacêuticos, cosméticos, saneantes e produtos usados para diagnóstico, a reacomodação típica (alimentos no art. 272 e os produtos terapêuticos ou medicinais e equiparados no art. 273), a solução para o problema do uísque (incide no art. 272 a conduta voltada a bebida com ou sem teor alcoólico), e, propicia aparente equiparação de crimes de perigo abstrato e de perigo concreto.

A alteração legislativa abrange o campo administrativo, pois reforma a legislação sanitária (Lei no 6.437/77), prevendo sanções de caráter extra-penal, elevando substancialmente as multas, possibilitando a intervenção em estabelecimentos, ampliando os casos de infração por falta de licença do órgão sanitário ou contrariedade às normas legais.

Essa reforma está sendo alvo de fortes críticas pelos estudiosos. (12) Há defesa do rigorismo governamental. (13) É muito interessante o debate que se trava sobre a criação de uma Agência de Vigilância Sanitária. (14) A magnitude dos bens jurídicos protegidos por esse capítulo do Código Penal justifica um sério esforço interpretativo que, superando essas objetivas dificuldades apontadas, atinja o equilíbrio na aplicabilidade dessa norma, tornando-a suficientemente eficaz para proteger a saúde da população, sem macular os direitos e garantias individuais dessa mesma população. A construção da sociedade livre, justa e solidária implica a adoção de um sistema repressivo de intervenção mínima e proporcionado ao bem jurídico penalmente protegido.

3. Breve noção de perigo

Como antecipamos, os delitos enunciados protegem bens jurídicos especialmente importantes para a vida social e, destarte, até mesmo na modalidade culposa, o legislador não espera a ocorrência de lesão efetiva, incriminando os comportamentos que o coloquem em risco.

Dizer isso é invocar o conhecido tema dos delitos de dano e de perigo. Para uns, a distinção é apenas uma questão de ponto de vista. Assim, os crimes integrantes dêste título serão de perigo, uma vez considerados quanto à probabilidade de lesão dos bens tutelados, e serão de dano desde que encarados como lesivos da incolumidade pública ou segurança pública. Outros, todavia, distinguem, dizendo como GRISPGNI, que o dano consiste na impossibilidade ou na diminuição de gôzo de um bem. Na verdade, o Direito tutela exclusivamente os indivíduos, o homem. Essa proteção, porém, não se pode efetuar senão garantindo à criatura humana o gôzo pacífico do bem. Conseqüentemente, como se tem dito, dano existe sempre que há impossibilidade ou diminuição de fruir de um bem, que se pode verificar por várias maneiras: pela destruição ou perda da coisa, por sua diminuição ou alteração, ou, enfim, por alteração da situação do fato (modificação da relação) entre o indivíduo e a coisa, de modo que se torna difícil ou impossível sua disponibilidade por êle, embora não haja destruição ou alteração dela (ex. furto de uso). Mas como a relação entre o indivíduo e a coisa constitui um bem, não é inexato afirmar que o dano consiste sempre na perda ou diminuição dêle. Crime de perigo é aquêle em que não se produz efetiva impossibilidade ou diminuição do gôzo de um bem, mas que determina uma probabilidade de lesão para êle, ou, como acrescenta MANZINI, se causa uma lesão, esta não é de natureza a modificar o título do crime". (15)

O perigo é visto por três teorias: subjetiva, objetiva e objetivo-subjetiva. Consoante a primeira o perigo é "mera criação de nosso espírito" sem existência objetiva. A teoria objetiva sustenta que o perigo é "um estado de fato, um trecho da realidade". "O evento nada mais é que o resultado de condições favoráveis que se impuseram a outras que o impediam, donde haverá perigo sempre que houver possibilidade de as primeiras vencerem as segundas". A tensão entre forças contrárias indica o perigo. Finalmente, a terceira teoria entende que o perigo é uma realidade objetiva, mas há um juízo mental sobre o mesmo. (16)

O perigo é abstrato ou concreto. "Perigo presumido (ou abstrato) é o considerado pela lei em face de determinado comportamento positivo ou negativo. É a lei que o presume juris et de jure. Não precisa ser provado. Resulta da própria ação ou omissão" (caso de omissão de socorro). O legislador baseia-se em regras de experiência para o identificar e inserir no tipo. Perigo concreto é o que precisa ser provado" (caso de exposição de recém-nascido). (17) Deve ser investigado e provado em cada caso individualmente considerado.

No que toca à quantidade, alguns sustentam que bastaria a possibilidade de lesão, o que não pode ser aceito na área penal, pois limitaria demasiadamente a esfera de liberdade da pessoa humana. Assim, é exigível a probabilidade de dano.

Finalmente, o perigo é comum no caso de afetar um número indeterminado de pessoas e individual quando se refere a pessoa determinada.

4. Glossário dos crimes contra a saúde pública

Antes de examinar os diversos tipos penais atinentes à saúde pública, parece válido fixar alguns conceitos sobre as ações físicas comumente empregadas nas violações dos bens jurídicos respectivos, bem como delinear os diversos objetos das condutas penalmente vedadas.

Corromper deriva de corrupção que advém do latim "corruptio, de corrumpere (deitar a perder, estragar, destruir, corromper), etimologicamente possui o sentido de ação de depravar (corrução de menores), de destruir ou adulterar (corrupção de alimentos)". (18) É comum opinião dos penalistas que consiste em desnaturar uma substância, alterar a sua essência para a inferiorizar (farinha podre na massa de pão: fazer queijo com leite tirado de animal doente).

Adulterar "é alterar para pior uma coisa" (urina de vaca ao leite, excrementos de animais ao café em pó, emprego de água poluída em medicamento). (19)

Falsificar "é a contrafação, a imitação da substância genuína. Para tanto, o agente emprega sucedâneos dos elementos que compõem a substância alimentícia ou medicinal. Exemplo: cerveja produzida com sucedâneos da cevada ou do lúpulo". (20)

Alterar significa, em regra, "a modificação que se promove em alguma coisa, substituindo-se o que era feito por nova coisa, que lhe modifica o sentido, o valor ou a espécie" (...) Na tecnologia penal, alteração tem também o sentido de adulteração ou modificação de uma substância alimentícia ou medicinal, de modo a modificar-lhe o valor nutritivo ou terapêutico". (21)

Fabricar é produzir, na fábrica ou em qualquer lugar. Manufaturar. Preparar.

Inculcar é apontar, apregoar, citar, indicar de forma elogiosa. Afirmar que um produto contém substância que não se encontra em seu conteúdo ou proclamar que está presente em quantidade superior à efetiva.

Deve ser salientado que a conduta de vender ou expor a venda não significa que os delitos ora estudados sejam próprios, isto é, passíveis de execução por comerciante. Basta um ato isolado de venda para a sua configuração nas hipóteses respectivas. É interessante realçar, por outro lado, que nos casos de comercialização profissional, a conduta dos proprietários deve ser examinada com cautela para se evitar a responsabilidade objetiva. (22)

Ensina-se que as substâncias podem ser nocivas à saúde, isto é, capazes de fazer mal, causar dano (latim, nocivus, nocere). A nocividade pode ser positiva: faz mal porque contém algo que provoca o dano, e, negativa: faz mal porque não tem o que deveria conter ou não tem a quantidade ideal.

Finalmente, nesta parte, cabem algumas considerações sobre o que seja alimento que, segundo os estudiosos, é toda substância, "sólida ou líquida, em estado natural, ou beneficiada, que serve de alimentação à pessoa humana, seja de modo principal ou secundário, imediato ou secundário, imediato ou mediato, de primeira necessidade ou voluptuária (veja-se art. 658 do Dec. 16.300/23)". (23) Revigora e vitaliza o corpo humano.

Substância medicinal "é a que, de uso interno ou externo, se emprega para fins curativos (ou preventivos) de moléstias do homem, antissépticos ou anestésicos (ainda que seja vendável ou distribuível por não farmacêuticos ou ainda que não conste da farmacopéia oficial)". (24) Para os léxicos, medicinal é termo relativo à medicina que, por sua vez, é a arte e ciência de prevenir, curar ou atenuar as doenças. Por sua vez, terapêutica é a parte da medicina que estuda e põe em prática os meios adequados para aliviar ou curar os doentes. Interessante notar que na legislação revogada, o Código Penal empregava corretamente os termos: alterar substância medicinal modificando-lhe a qualidade ou reduzindo-lhe o valor terapêutico (art. 273). Com a redação atual que se refere a produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, ter-se-á que conservar a expressão medicinal para expressar a prevenção, a cura ou a atenuação de doenças e, por sua vez, empregar o vocábulo terapêutico para abranger as atividades que, embora não reconhecidas pela ciência como especialidades médicas, são ministradas à população. Enquanto a homeopatia e a acupuntura são consideradas especialidades médicas, não se reconhece esta qualificação a atividades como a vinculada aos florais de bach e ao diagnóstico de doenças pelo estudo da íris (iridologia), entre outras. (25) Interessa ensejar a proteção penal a situações dessa natureza, eis que há um crescimento de terapias não aprovadas pela ciência médica que, com ou sem a ajuda da mídia, rapidamente entram em circulação. (26)

Deve ser esclarecido que, muitas vezes, os profissionais confundem substância nociva com substância imprópria. Algo pode ser impróprio e não atingir o grau de nocivo. "A simples impropriedade do produto para consumo não satisfaz a exigência contida na lei, que fala em nocividade à saúde, a ser pericialmente comprovada" (RT 632/282).

Outro termo bastante empregado na análise das infrações penais comentadas é matéria prima que significa "toda substância natural e corpórea que é utilizada para produzir outra espécie nova, em razão de sua transformação ou alteração". (27) Por sua vez, os léxicos informam que insumo é o que entra como matéria prima para se conseguir um produto final. Insumos farmacêuticos são as substâncias empregadas pela Farmácia que é a parte da Farmacologia que trata da maneira de preparar, caracterizar e conservar os medicamentos. Como é sabido, a Farmacologia é a parte da Medicina que estuda os medicamentos.

Cosméticos são os produtos utilizados para a limpeza, conservação ou maquilagem da pele.(28)

Saneantes são produtos que tornam sãos, hígidos, outras coisas. Podem ser os desinfetantes, isto é, os produtos que fazem desaparecer a infecção que é uma contaminação por uma bactéria, por exemplo.

Diagnosticar é saber o que é uma coisa, o seu gênero, espécie e extensão. Implica o conhecimento ou determinação de uma doença por seus sintomas e reflexos no organismo. Produtos de uso em diagnóstico são aqueles empregados para identificar uma doença.

5. Da falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de substância ou produtos alimentícios (art. 272, "caput", CP).

Objetividade jurídica: É a incolumidade pública. Protege-se especificamente a saúde pública. Há fraude e pode ocorrer dano patrimonial, mas o bem jurídico prevalente é a saúde pública. Trata-se de crime de perigo comum. Perigo concreto e, portanto, depende de demonstração pericial de nocividade positiva (aptidão para fazer mal). A reforma inseriu a expressão "ou reduzindo-lhe o valor nutritivo", o que indica nocividade negativa que, por igual, deverá ser comprovada por experts, pois é necessário apurar que valor nutritivo deveria conter e a sua insuficiência decorrente da conduta proibida. (29)

Sujeitos do delito: ativo é qualquer pessoa; passivo é a coletividade.

Ação física: as enunciadas pelos verbos do tipo e comentadas no glossário.

Elemento subjetivo: O dolo que deve compreender a vontade de corromper, adulterar, falsificar ou alterar a substância ou o produto alimentício, sabendo-o destinado a consumo e do perigo comum intercorrente. A figura culposa está prevista no § 2º.

Consumação: com a criação do perigo comum. Isso ocorre quando o produto ou a substância torna-se nocivo à saúde ou sofra a redução do valor nutritivo. É possível a tentativa.

Sanção: para o crime doloso: reclusão de 4 a 8 anos e multa. Para o crime culposo a pena é de detenção de 1 a 2 anos e multa.

A reforma criou uma forma nova de numeração dos parágrafos e inseriu um § 1o A antes do § 1º . Naquele, dispõe que incorrerá nas mesmas penas quem fabrica, vende, expõe à venda, importa, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo a substância alimentícia ou o produto falsificado, corrompido ou adulterado. Omitiu o termo alterado. O dolo deve compreender a vontade livre e consciente de praticar as condutas citadas com o conhecimento da falsificação, corrupção ou adulteração do objeto material. Quanto ao depósito para venda há o elemento subjetivo do tipo (fim especial de vender). Na forma culposa não se aceita a hipótese de falsificar (a idéia de fraude repele a idéia de culpa).

Segundo o § 1o, a ação física dirigida a bebidas, alcoólicas ou não, sujeita o autor às mesmas penas.

6. Falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, CP).

Objetividade jurídica: é a incolumidade pública. Protege-se especialmente a saúde pública. Há fraude e pode ocorrer dano patrimonial, mas o bem jurídico prevalente continua sendo a saúde pública. Trata-se de crime de perigo. A lei não menciona a ocorrência de nocividade positiva ou negativa. À primeira vista poder-se-ia admitir que se trata de perigo abstrato e, portanto, independente de comprovação específica. Todavia, deve ser ponderado que se pode alterar um produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais e o tornar melhor do que o original, surgindo a hipótese pouco razoável de punir aquele que em vez de prejudicar, beneficia. Além disso, não se pode esquecer a elevada sanção prevista. Por fim, é caso de relembrar que esta "relatività della distinzione tra reati di danno e reati di pericolo deve mettere in guardia contro la tentazione di formare costruzioni dottrinali specifiche per i reati di pericolo. La sola effetiva differenza rispetto ai reati di danno sta nella ragione della incriminazione; e il solo problema peculiare ai reati di pericolo sta nella necessità di una maggiore cautela nella formazione della fattispecie, ad evitare eccessive limitazioni della libertà dei cittadini". (30)

Ora, em face dessas considerações, acrescidas de que se trata de crime de ação múltipla, mostrando-se os verbos corromper e adulterar como provocadores da modificação para pior do produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, parece razoável exigir que o perigo seja concreto, isto é, apurado pericialmente em cada caso. Com isso, não se estará inibindo a defesa da incolumidade pública e se terá a vantagem de não se inibir a liberdade individual.

Sujeitos do delito: qualquer pessoa pode ser sujeito ativo. A vítima é a coletividade.

Ação física: aquelas expressas pelos verbos referidos e que estão explicados na parte quarta destas considerações.

Elemento subjetivo: É o dolo genérico. Corresponde à vontade livre e consciente de praticar as ações físicas mencionadas, sabendo que se trata de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais, criando situação de perigo comum. Valem para o tipo culposo as conclusões feitas para o crime precedente.

Consumação: Na conformidade das argumentações iniciais, opera-se a consumação com a ação física que torne nocivo o produto, colocando em risco número indeterminado de pessoas.

Sanção: para o crime doloso: reclusão de 10 a 15 anos e multa. Para o tipo culposo: detenção de 1 a 3 anos e multa.

Incorre nas mesmas penas quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo o produto falsificado, corrompido, adulterado ou alterado (§ 1o). O depósito para venda, como o precedente, importa especial fim de agir.

A seguir, no § 1o A, a reforma inclui entre os produtos a que se refere esse artigo os medicamentos, as matérias-primas, os insumos farmacêuticos, os cosméticos, os saneantes e os de uso em diagnóstico que foram comentados no glossário. Assim, como ficou dito, nem todo produto de toucador ou perfumaria estará abrangido pela expressão cosméticos que deve ser interpretada restritivamente.

Prosseguindo, a reforma (§ 1o B) cuida de quem importa, vende, expõe à venda, tem em depósito para vender ou, de qualquer forma, distribui ou entrega a consumo produtos em quaisquer das seguintes condições: sem registro, quando exigível, no órgão de vigilância sanitária competente; em desacordo com a fórmula constante do registro previsto no inciso anterior; sem as características de identidade e qualidade admitidas para a sua comercialização; com redução de seu valor terapêutico ou de sua atividade; de procedência ignorada; ou adquiridos de estabelecimento sem licença da autoridade sanitária competente.

Torna-se mais intenso o rigor do legislador reformista e, caso não haja a interpretação supra-mencionada, exigindo a demonstração de perigo concreto, alguém pode ser punido com 10 anos de reclusão porque vende medicamento absolutamente em ordem, mas adquirido de estabelecimento desprovido de licença da autoridade sanitária competente, mesmo que esse vendedor trabalhe com um padrão de qualidade total. As eventuais infrações administrativas poderão ser punidas no âmbito próprio sem que se transforme o Direito Penal em instrumento pretensamente poderoso no combate à criminalidade e que, a final, reste banalizado, eis que dificilmente se aplicará sanção tão rigorosa diante de conduta que pode estar somente provocando possibilidade remota de dano.

7. Invólucro ou recipiente com falsa indicação (art. 275, CP).

A reforma introduziu no tipo a menção a produtos terapêuticos e elevou as reprimendas primitivas, de 1 a 3 meses de detenção e multa, para reclusão de 1 a 5 anos e multa.

8. Substância destinada à falsificação (art. 277, CP).

Igualmente, neste dispositivo, a reforma incluiu o produto terapêutico e aumentou as sanções que, antes, eram de 6 meses a 1 ano de detenção e multa e, agora, passam a reclusão de 1 a 5 anos e multa.

9. Aumento de pena por morte ou lesão corporal de natureza grave (art. 258, CP).

Segundo o art. 285, CP, aplicam-se aos delitos enunciados, o art. 258, do mesmo Estatuto, prevendo a forma qualificada dessas iliceidades penais. Destarte, se do crime doloso resulta lesão corporal de natureza grave, a pena corporal é aumentada da metade; se ocorre morte, é aplicada em dobro. No caso de culpa, se ocorre lesão corporal, a pena é aumentada da metade; se ocorre morte, aplica-se a pena cominada ao homicídio culposo, aumentada de um terço.

10. Dos efeitos da condenação

Na parte geral do Código Penal estão previstos os efeitos da condenação que podem incidir nas hipóteses estudadas e que implicam a obrigação de indenizar o dano causado pelo crime, a perda de instrumentos de uso proibido e do produto da ação delituosa. Pode ocorrer, ainda, a perda de cargo ou função pública (arts. 91 e 92, CP).

11. Crime Hediondo

A Lei no 9.677/98, preambularmente, asseverou que "altera dispositivos do Capítulo III do Título VIII do Código Penal, incluindo na classificação dos delitos considerados hediondos os crimes contra a saúde pública e dá outras providências". Contudo, dispositivo algum cuidou de configurar como hedionda quaisquer das figuras típicas alteradas e, assim, a pretensão do legislador frustrou-se. Sabidamente, os "títulos, as epígrafes e as rubricas da lei em conjunto, ou de capítulo ou parágrafo, não fazem parte, propriamente, da norma escrita, não foram discutidos nem votados, não contêm uma regra explícita". (31)

Sobreveio a Lei no 9.695, de 20.8.1998, incluindo na norma que trata dos crimes hediondos o inc. VII B ("falsificação, corrupção, adulteração ou alteração de produto destinado a fins terapêuticos ou medicinais (art. 273, caput e § 1o, § 1o A e § 1o B"). Portanto, a partir da publicação dessa norma, as condutas referidas são consideradas hediondas. (32)

A partir da vigência da norma ora comentada os autores da iliceidade penal mencionada ficarão sujeitos aos efeitos legais da lei que trata com extremo rigor os crimes considerados hediondos. (33)

12. Aspectos processuais

A busca e apreensão dos produtos e substâncias enunciados deve obedecer as formalidades legais, sob pena de nulidade (RJTJSP 98/457). "Tratando-se de delito que deixa vestígios, indispensável é o exame pericial para a sua configuração, lícito não sendo à autoridade destruir tais vestígios para substituir o corpo de delito direto pelo indireto" (RT 419/106). Em nosso Estado a colheita de amostras deve observar o Decreto Estadual no 12.342/78, sob pena de invalidade da perícia. É necessário o recolhimento de amostras para eventual contraprova (RT 302/93). Finalmente, é comum a simplista afirmação de que o produto é impróprio para o consumo, omitindo a fundamentação de nocividade concreta, o que gera inúmeras absolvições.

13. Conclusão

A vida comunitária gera riscos que devem ser afastados de forma civilizada. A segurança é necessária à vida social. Os mecanismos legais são aptos para a prevenção de danos a número indeterminado de pessoas, com a construção dos princípios que tratam da incolumidade pública. A especial relevância de bens jurídicos permite a dupla proteção legal. Pune-se a probabilidade de dano aos mesmos. Contudo, a extensão do conceito de perigo para alcançar meras possibilidades de dano ou a previsão de tipos de perigo abstrato com sanções exacerbadas, restringem excessivamente a esfera de liberdade dos cidadãos. A recente reforma do Código Penal, na parte dos crimes contra a saúde pública, porque se afasta dos movimentos internacionais que combatem o autoritarismo penal, promoveu mais uma alteração pontual que, além de não assegurar mais eficiente proteção à incolumidade pública, pode inocuizar o próprio sistema repressivo como um todo.

NOTAS:

(2) "Por outro lado, sem condições de assegurar uma eficaz regulação direta e centralizadora das situações sociais e econômicas, pressionado pela multiplicação das fontes materiais de direito, perdendo progressivamente o controle da coerência sistêmica de suas leis e ainda tendo seu ordenamento submetido a uma competição com outros ordenamentos, o Estado atinge os limites de sua soberania político-jurídica" (José Eduardo Faria, Direito positivo na economia global, O Estado de São Paulo, 8.8.1997, pág. A2).

(3) "Ora, ninguém desconhece que a Constituição Federal de 1988, conformadora do Estado Democrático e Social de Direito, possui, entre seus princípios fundamentais não formalizados, os da subsidiariedade e da proporcionalidade e ambos os princípios têm não apenas "uma dimensão negativa de limite do ius puniendi, mas também, por exigência do Estado social de Direito, uma parte positiva, que obriga, para evitar o que Roxin denomina 'fuga ao Direito Penal', a tomada de todas as possíveis medidas positivas de tipo jurídico ou político-social que ajudem a evitar os delitos sem que se tenha de recorrer ao Direito Penal" (Luzón Peña, Diego Manuel, in "Curso de Derecho Penal", Parte General, vol. I, Editorial Universitas, p. 83). Já, no Estado Constitucional de Direito, sustentado por um princípio antropocêntrico, não tem sentido, nem cabimento, a cominação ou a aplicação de pena flagrantemente desproporcionada à gravidade do fato. Pena desse calibre representa ofensa à condição humana, atingindo-a, de modo contundente, na sua dignidade de pessoa" (Alberto Silva Franco, Há Produto Novo na Praça, in Boletim do IBCCRIM, nº 70, pág. 6, edição especial).

(4) Sebastián Soler, Derecho Penal Argentino, 10ª reimpresion total, Buenos Aires, Tipografica Editora Argentina, 1996, vol. 4º, pág. 559.

(5) Sebastián Soler, op. cit., pág. 560.

(6) Art. 187 - "incurrirá según los casos, en la penas señaladas en el artículo anterior, el que causare estrago por medio de inundación, desmoranamento, derrumbe de un edificio o por cualquier outro medio poderoso de destrucción".

(7) "Para la existencia de un delito contra la salud pública es indispensable la existencia de un peligro común para las personas, un peligro indeterminado. Como en otros casos, la caracterización del hecho, pues lo que es sólo un peligro mirado desde cierto punto de vista, es ya una lesión, considerado en relación con la seguridad, la cual resulta efectivamente disminuida por la sola existencia de la indefinida posibilidad de daños" (Sebastián Soler, op. cit., pág. 649). (8) "È il più grave dei delitti contro l'incolumità pubblica, cioè di quei fatti caratterizzati dalla loro capacità di mettere in pericolo la vita, l'incolumità e la salute di un numero indeterminado di persone e puniti sulla sola base del sorgere di una situazione di pericolo, anche indipendentemente dal verificarsi della morte o di altri eventi dannosi per l'integrità fisica. In effetti, si é puniti a titolo di strage non solo quando viene cagionata la morte di una o più persone (in tale ipotesi si applica la pena dell'ergastolo), ma in ogni caso in cui venga comunque posta in pericolo la pubblica incolumità, com una pena che no può essere inferiore a quindici anni di reclusione. Per esempio, chi colloca una bomba in un luogo frequentato da più persone o si mette a sparare all'impazzata lungo una strada abitata viene punito per strage sai che la bomba esploda e i proiettili raggiungano i passanti, sai che nessuna persona venga colpita, in quanto anche nel secondo caso è stata posta in pericolo l'incolumità di un numero indeterminado di persone" (Enciclopedia Garzanti del Diritto, diretta da Silvio Riolfo Marengo, Milano, Garzanti Editore, 1993, verbete "strage", pág. 1.166).

(9) Manuel de Oliveira Leal-Henriques e Manuel José Carrilho de Simas Santos, Código Penal Anotado, 2ª ed., Lisboa, Rei dos Livros, 1996, vol. 2º, pág. 877 e segs.).

(10) Falsificar uísque ou encher garrafa de uísque estrangeiro com uísque nacional sempre foi objeto de intensa variação jurisprudencial (estelionato, fraude na entrega da coisa, fraude no comércio, invólucro ou recipiente com falsa indicação, produto ou substância com matéria não permitida ou com a falsa indicação anterior, alteração de substância alimentícia; outros sustentam que não se trata de alimento ou produto medicinal (Celso Delmanto et alii, Código Penal Comentado, 4ª ed., Rio de Janeiro, Renovar, 1998, pág. 473).

(11) E. Magalhães Noronha, Direito Penal, 4ª ed., São Paulo, Saraiva, 1969, vol. 3º, pág. 340.

(12) Alberto Silva Franco, op. et loc. cit.; Rogério Schietti Machado Cruz, Falsificação de Remédios e a Lei Desproporcional, http://www.neofito.com.br./artigos/penal50.htm; Alberto Zacharias Toron, Oportunismo político-eleitoral, Folha de São Paulo, 22.8.1998, pág. 1.3; Miguel Reale Júnior, Veja 1.564/50).

(13) Barjas Negri, Ação emergencial do governo, Folha de São Paulo, 22.8.1998, pág. 1.3.

(14) "O sucesso da experiência regulatória norte-americana deve-se à atenção dos legisladores aos princípios constitucionais democráticos, ao votar as leis que criaram suas agências reguladoras. O mais importante deles diz que, assim como deve o Estado fiscalizar todos os mercados privados em que o interesse público seja afetado - desde o mercado concorrencial, o de gás, ao de medicamentos -, os direitos de cada um dos consumidores devem ser protegidos contra eventual abuso ou omissão dessas agências" (Pedro Dutra, Agência de Vigilância Sanitária, O Estado de São Paulo, 21.8.1998, pág. A2).

(15) E. Magalhães Noronha, op. cit., pág. 341.

(16) E. Magalhães Noronha, op. cit., pág. 342.

(17) Damásio E. de Jesus, Direito Penal, 10ª ed., São Paulo, Saraiva, 1985, vol. 1º, pág. 167.

(18) De Plácido e Silva, Vocabulário Jurídico, 12ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1996, vol. 1º, pág. 575.

(19) E. Magalhães Noronha, Direito Penal, 3ª ed., São Paulo, Saraiva, 1968, vol. 4º, pág. 28.

(20) Paulo José da Costa Jr., Comentários ao Código Penal, 2ª ed., São Paulo, Saraiva, 1990, vol. 3º, pág. 270.

(21) De Plácido e Silva, op. cit., pág. 140.

(22) "Repugna ao Direito Penal moderno a indigitação a título de incriminação objetiva. A responsabilidade penal é de índole subjetiva. Estando os proprietários do estabelecimento onde ocorreu o fato ausentes há meses do Brasil, não há como aferir-se ou atribuir-se-lhes imperícia ou negligência por despreparo prático ou insuficiência de conhecimento técnico pela impossibilidade total de ingerência no fato incriminado. O resultado de que depende a existência de crime, como é curial e preceitua a lei, só é imputável a quem lhe deu causa" (Ap. Crim. nº 62.863/98, TJRJ, 6ª Câm. Crim., v. un., Rel. Des. Eduardo Mayr, j. 5.5.98).

(23) Alberto Silva Franco et alii, Código Penal e sua interpretação jurisprudencial, 5ª ed., São Paulo, Revista dos Tribunais, 1995, pág. 2.745.

(24) Alberto Silva Franco et alii, op et loc. cit.

(25) "A resolução do CFM proibindo os médicos de práticas não-convencionais, entre as quais os Florais de Bach e o diagnóstico de doenças pelo estudo da íris (iridologia), foi divulgada quinta-feira. 'A medida foi tomada para proteger a sociedade, uma vez que não há ainda comprovação científica dos benefícios dessas terapias', explicou, em Brasília, o presidente" do Conselho Federal de Medicina (O Estado de São Paulo, 5.9.1998, pág. A14).

(26) Traçando a característica de certas sociedades em "sentir" em vez de pensar, disserta-se que: "Um traço comum a muitos dos sentimentais é a tendência a esperar soluções milagrosas. Esperam-se grandes vitórias num passe de mágica. Se a questão é econômica, pensa-se numa herança de um parente até então desconhecido; se o problema é a solidão, imagina-se o príncipe encantado descendo da sua carruagem, como nas fábulas; se a saúde não vai bem, busca-se o remédio miraculoso de uma erva amazônica que curará tudo à primeira poção..." (Luiz Fernando Cintra, O Sentimentalismo, São Paulo, Quadrante, 1994, pág. 26).

(27) Enciclopédia Saraiva do Direito, coord. R. Limongi França, São Paulo, Saraiva, 1977, vol. 52, pág. 5.

(28) No regime anterior a doutrina pertinente ao art. 274, CP, considerava que a expressão produto destinado a consumo abrangia os artigos de toucador e perfumaria (E. Magalhães Noronha, op. cit., pág. 41). O art. 274, CP, foi alterado apenas na sanção (elevação de 1 a 3 meses de detenção para 1 a 5 anos de reclusão e multa), de forma que se deverá aplicar restritivamente o vocábulo cosmético no que pertine ao atual art. 273, § 1º, já porque explícito, já porque a pena é de 10 a 15 anos de reclusão, o que não seria admissível em face de uso de produtos não destinados às finalidades citadas.

(29) Inverteu-se a opinião comum dos doutores sobre o tema, eis que antes da reforma se entendia que misturar, "p. ex., água pura no leite ou vinho; farinha de mandioca a de trigo para fazer pão, etc. não constituem o delito, pois o produto não apresenta nocividade à saúde; é inócua a modificação operada. Têm aplicação à espécie os dizeres de GALDINO SIQUEIRA, perante o Código passado: 'A nocividade exigida nesses dispositivos é a positiva, isto é, a absolutamente prejudicial, que se contrapõe à negativa, que ocorre quando os alimentos e bebidas sem prejudicar diretamente a saúde, causando-lhe perturbações patológicas, a prejudicam indireta ou mediatamente, privando o consumidor da suficiente alimentação ou dos benefícios que visava obter com o alimento'" (E. Magalhães Noronha, op. cit., pág. 30).

(30) Antonio Pagliaro, Istituzioni di Diritto e Procedura Penale, 3ª ed., Milano, Dott. A. Giuffrè Editore, 1996, pág. 83.

(31) Carlos Maximiliano, Hermenêutica e Aplicação do Direito, 9ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1980, pág. 266.

(32) "Ora, se o novo princípio legal derroga dispositivos do Código Penal que disciplinam a execução da pena, instituto eminentemente de direito material, não pode deixar de ser, também, penal. E, como tal, sendo mais severo do que as regras do artigo 33 do Código Penal, não tem efeito retroativo" (Damásio E. de Jesus, Lei penal mais severa não retroage, O Estado de São Paulo, 10.5.1991, pág. 21, cad. Justiça).

(33) Sobre a inconstitucionalidade do regime fechado integral: RT 674/286.
 
 

Jaques de Camargo Penteado
Advogado,
Professor do Centro de Extensão Universitária,
Membro da Academia Brasileira de Direito Criminal

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