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A natureza jurídica das astreintes e seu termo a quo e termo ad quem
Antônio Ferreira Leal Filho*
1. A Natureza Jurídica
das Astreintes e sua Alterabilidade. 2. Termo a quo das Astreintes. 3. Termo ad
quem das Astreintes. 4. Peroração. 5. Bibliografia.
1. NATUREZA JURÍDICA DAS
ASTREINTES E SUA ALTERABILIDADE
Embora venha clarificado na literatura plasmada do
art. 461, §4º, do CPC, que a natureza jurídica das astreintes se constitui em
uma sanção pecuniária de natureza diária, alguns doutrinadores tentam
subvertê-la, aduzindo que essa multa pode ser fixa ou periódica. Não há razão
para essa dicotomia, é o que assevera a lição dos grandes mestres.
Consoante a clássica lição do grande mestre Orlando Gomes, as astreintes têm
origem no direito francês e "consiste numa condenação acessória, na qual o
juiz fixa determinada multa que o executado deve pagar por dia de atrasono atendimento da condenação
principal.
Observa-se que essa multa processual foi
incorporada a nossa cultura jurídica e se encontra capitaneada no art. 461 do Código de Processo Civil, consiste
numa multa periódica, isso quer
dizer que sua alterabilidade dar-se-á de forma diária, ou pode levar em conta
outra periodicidade.
Assinala Araken
de Assis, " os arts. 644 e
645 do CPC, auxiliados, no âmbito da tutela antecipatória, pelo art. 461, § 4º,
consagram a técnica executiva da astreinte, como visto, ela consiste na
condenação do obrigado ao pagamento de uma quantia por cada dia de atraso no cumprimento de obrigação, livremente
fixada pelo juiz e sem relação objetiva
alguma com a importância econômica do vínculo.1
Conforme ensina HUMBERTO THEODORO JUNIOR, "a
astreinte é uma condenação condicional, a termo, de valor variável. A multa diária ou astreintes tem por objetivo coagir
o devedor a satisfazer, com maior retidão, a prestação de uma obrigação, fixada
em decisão judicial. Daí dizer que a multa diária é medida coativa (ou
coercitiva e não reparatória ou compensatória) e tem características
patrimonial e psicológica. É a combinação de dinheiro e tempo. lição da
Professora Teresa Arruda Alvim a multa pode ser fixada de
ofício pelo Juiz, ela não é um pedido da parte-autora, ela é uma ferramenta,
uma técnica de tutela que a parte-autora pode sugerir ou não, há, no art. 461, uma
aproximação do direito substancial em relação ao direito processual. Vale
dizer, através de sanção pecuniária, possível initio litis, verifica-se
finalisticamente que se deseja obter o mais rapidamente possível a satisfação
do direito substancial. 2
2. TERMO A QUO DAS ASTREINTES
Pode-se afirmar que o termo inicial para execução
da multa diária, o momento em que se encontra perfeita para produzir seus
efeitos, é a data do trânsito em julgado da sentença. Todavia, haverá retroação
desde o dia da publicação da sentença, quando a impugnação desta se der por
meio de recurso desprovido de efeito suspensivo. Ademais, quando se tratar de
decisão interlocutória que comande certa obrigação, as astreintes incidirão
desde findo o prazo dado pelo juiz para cumprimento desta.
Na lição de Dinamarco se infirma, que ao se fixar a
multa cominatória na sentença, não seria legítimo cobrá-la do devedor, se ele,
podendo recorrer contra sua fixação, o faz, no que tem a possibilidade de
vencer a demanda. Por isso que, "o valor das multas periódicas acumuladas
ao longo do tempo só é exigível a partir do trânsito em julgado do preceito
mandamental.
Havendo descumprimento inquestionável, consoante
entendimento do STF, na tutela das obrigações de fazer e de não fazer do art.
461 do CPC, concedeu-se ao juiz a faculdade de exarar decisões de eficácia
auto-executiva, caracterizadas por um procedimento híbrido no qual o juiz,
prescindindo da instauração do processo de execução e formação de nova relação
jurídico-processual, exercita, em processo único, as funções cognitiva e
executiva, dizendo o direito e satisfazendo o autor no plano dos fatos. Fixada multa diária antecipadamente ou na
sentença, consoante o § 3º e 4º do art. 461, e não cumprido o preceito dentro
do prazo estipulado, passam a incidir de imediato e nos próprios autos as
ASTREINTES. Recurso especial não conhecido. (REsp 663.774/PR, Rel.
Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 26.10.2006, DJ 20.11.2006
p. 301).
E, ainda:
DIREITO PROCESSUAL CIVIL - MEDIDA CAUTELAR ESPECÍFICA
EXIBIÇÃO DE DOCUMENTOS - ALEGAÇÃO DE SAQUE INDEVIDO EM CONTA CORRENTE BANCÁRIA
E DE RECUSA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA EM PRESTAR ESCLARECIMENTOS AO CORRENTISTA
NO ÂMBITO ADMINISTRATIVO - LIMINAR CONCEDIDA. Determinação da exibição dos
documentos solicitados no prazo de dez dias sob a cominação de multa - Sentença
final julgando procedente a lide - Presença dos pressupostos do 'fumus boni
juris' e do 'periculum in mora'. RECONHECIMENTO DE LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ E
APLICAÇÃO DE MULTA COM TEMPERAMENTO - LEGITIMIDADE DO DECISUM - NÃO INCLUSÃO NA
CONDENAÇÃO DA MULTA PELO CUMPRIMENTO A DESTEMPO DA EXIBIÇÃO - DESNECESSIDADE. -
ASTREINTES automática exigibilidade a
partir do trânsito em julgado da sentença definitiva. Apelos
desprovidos. (Apelação Cível nº 0227005-3 (17509), 1ª Câmara Cível do TAPR,
Curitiba, Rel. Ronald Schulman. j.
19.08.2003, DJ 05.09.2003).
Desde a intimação da liminar e estando em
descumprimento a ordem judicial, incidirá as astreintes, se protraindo no tempo
a inadimplência com a confirmação da liminar na sentença final.
3.0. TERMO AD QUEM DAS
ASTREINTES
Constitui elemento intrínseco a natureza jurídica
das astreintes o seu recrudescimento diário que lhes empresta um caráter de
atemporalidade até que seja cumprido o comando judicial. Isto é, enquanto
perdurar a mora, perpetuam-se no tempo os efeitos da multa, renovando-se a cada
dia. Daí dizer que a multa diária é medida coativa (ou coercitiva e não
reparatória ou compensatória3) e tem características patrimoniais e
psicológicas. É a combinação de dinheiro e tempo4. Portanto, os
recursos interpostos, os agravos e as objeções, não têm a capacidade de
interromper ou suspender o curso de sua aplicação. O único fator determinante
capaz de elidi-la é o cumprimento do comando judicial.
À guisa de exemplo e como forma de ilustração,
realçamos a figura mitológica da ''HIDRA DE LERNA'' na obra clássica ''Os Doze
Trabalhos de Hércules''. Este ser era impossível de ser vencido, pois ao se
cortar uma de suas cabeças, no lugar nasciam outras duas, igualmente venenosas
e mortais. A forma singular de pôr fim a vida da temível criatura era decepar
sua cabeça e, logo após, queimá-la com uma tocha. Só assim, cabeça por cabeça,
a lendária HIDRA DE LERNA era eliminada.
Assevera ANTÔNIO LEAL5, tal qual a
HIDRA, apenas o cumprimento da decisão judicial tem o condão de pôr fim a
incidência das astreintes. Se o devedor permanecer inadimplindo no que tange à
obrigação de fazer ou não fazer, a multa continuará incidindo. Poderá o
exeqüente, a qualquer tempo, requerer a atualização do cálculo e promover nova
execução pelo valor acrescido.
O mestre ARAKEN DE ASSIS 6, acolitando
com a exegese mais oxigenada dos Tribunais, aduz que ''não há dies ad quem, porque a multa, no sistema em vigor, é
infinita. Ela se vence dia a dia, interrompendo seu curso apenas com o
cumprimento da prestação.''
4.0. CONCLUSÕES
Resta asseverado que as astreintes consistem em uma
multa periódica, que recrudescem diariamente ou em outro prazo fixado pelo
magistrado. Sendo obstado engessar a mutabilidade de seu valor.
A exigibilidade das astreintes é automática a
partir do trânsito em julgado da sentença definitiva. Por isso que, "o
valor das multas periódicas acumuladas ao longo do tempo só é exigível a partir
do trânsito em julgado do preceito mandamental.
Apenas o cumprimento da decisão judicial tem o
condão de pôr fim a incidência das astreintes. Se o devedor permanecer
inadimplindo no que tange à obrigação de fazer ou não fazer, a multa continuará
incidindo.
5.0. BIBLIOGRAFIA
ARRUDA ALVIM, José Manuel.
Manual de Direito Processual Civil, vol. 2, 7ª ed., Revista dos Tribunais, São
Paulo, 2000
ASSIS, ARAKEN. Comentários ao
Código de Processo Civil, vol. VI, Forense, Rio, 2000.
_______ "Manual do Processo de Execução".
5ª ed, São Paulo, Revista dos Tribunais, p. 420.
CARVALHO, Fabiano.
Execução da Multa Prevista (Astreintes) no art. 461 do Código de Processo
Civil. Escola Paulista de Direito – EPD, São Paulo, mai. 2006. Disponível em:
<http://www.epdireito.com.br/epd/publier4.0/dados/anexos/259_2.pdf>.
GRINOVER, Ada Pellegrini.
"Tutela jurisdicional nas obrigações de fazer e não fazer", in
Reforma do Código de Processo Civil, Coord. Min. Sálvio de FigueiredoTeixeira,
Saraiva, São Paulo, 1996.
KAZUO WATANABE. Tutela
Antecipatória e Tutela Específica das Obrigações de Fazer e Não Fazer, in
Reforma do CPC, Coord. Min. Sálvio de Figueiredo Teixeira, Saraiva, 1996.
LIMA, Alcides
Mendonça. Comentários ao CPC, Forense, Rio de Janeiro, 1974.
LEAL, Antônio Ferreira
Filho. Parecer em MS 33595-9/2002-2, impetrado junto a Turma Recursal Cível.
Salvador- Bahia. 2007
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Tutela Específica, Revista dos Tribunais, São Paulo, 2000.
NERY JUNIOR, Nelson e outra.
Código de Processo Civil Comentado, 6ª ed., Revista dos Tribunais, São Paulo,
2002.
WAMBIER, Luiz Rodrigues et alli.
Curso
Avançado de Processo Civil, vol. 2, Revista dos Tribunais, São Paulo, 1998.
WAMBIER, Luiz Rodrigues e
WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Anotações sobre a efetividade
do processo. Revista dos Tribunais ano 92,, n. 814, p.63- 70, agosto, 2003.
1 ASSIS, ARAKEM de. "Manual do
Processo de Execução". 5ª ed, São Paulo, Revista dos Tribunais, p. 420.
2. WAMBIER, Luiz Rodrigues e WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Anotações sobre a efetividade do processo. Revista dos
Tribunais ano 92,, n. 814, p.63- 70, agosto, 2003.
3KAZUO WATANABE. Tutela Antecipatória e Tutela
Específica das Obrigações de Fazer e Não Fazer, in Reforma do CPC, Coord. Min.
Sálvio de Figueiredo Teixeira, Saraiva, 1996, pág. 47.
4ALCIDES MENDONÇA LIMA. Comentários ao CPC,
Forense, Rio de Janeiro, 1974, pág. 775
5LEAL, ANTÔNIO FERREIRA FILHO. Parecer em MS
33595-9/2002-2, impetrado junto a Turma Recursal Cível. Salvador- Bahia. 2007
6ARAKEN DE ASSIS. Comentários ao CPC, Vol. VI,
Forense, Rio de Janeiro, 2000, pág. 426.
* Mestre em Direito Público pela Universidade Federal de Pernambuco.
Professor de Direito Constitucional Universidade Católica do Salvador. Promotor
de Justiça Ministério Público do Estado da Bahia
Disponível em:
Acesso em: 26 jun.
2008.