A VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA CONTRA A MULHER NA INTERNET


Porjuliawildner- Postado em 31 março 2015

A VIOLÊNCIA PSICOLÓGICA CONTRA A MULHER NA INTERNET

Por Alyne Andrade de Oliveira Bezerra

 

No dia 08 de março comemoramos o Dia Internacional da Mulher. Há quase 160 anos começou a história desta data, quando no dia 08/03/1857, 129 operárias morreram queimadas por patrões e policiais nos EUA, após protestarem contra a jornada de trabalho de 16 horas e por melhores salários.

A mulher viveu por séculos subordinada aos homens, convivendo com sentimentos, pensamentos, interesses e vontades reprimidos.

Ao longo dos últimos 70 anos, a mulher vem vencendo obstáculos sociais, culturais, físico e intelectuais. Desde o século XX, as mulheres marcaram os seus novos rumos para o século XXI. As mudanças do papel da mulher na sociedade decorreu de vários fatores: mudanças na taxa de fecundidade, nos níveis educacionais, na participação no mercado de trabalho, não dependem financeiramente do marido e adiam casamento e filhos.

As mulheres, sem desigualdade de gêneros e raça, estão espalhadas por toda a parte e constroem um novo mundo, mais forte e competitivo.

A Constituição Federal estabelece no seu art. 5º, inciso I, que homens e as mulheres são iguais em direitos e obrigações. Entretanto, a realidade é outra. A violência contra a mulher é uma realidade histórica no Brasil e em outros países. O ex-marido, ex-companheiro, ex-namorado pensam possuir direitos ad perpetum sobre a mulher. A vingança do homem era física, hoje o homem reage com a violência simbólica ao expor a privacidade da mulher ao público(1).

O presente artigo pretende intensificar a necessidade das mulheres, pais e responsáveis de adolescentes de atentarem para as situações que possam levar as mulheres e jovens a sofrerem crimes contra a sua honra e qualquer tipo de violência psicológica.

No ano de 2013 foi veiculado diversos acontecimentos sobre a divulgação de vídeos e fotos com intimidades sexuais na internet de mulheres de diferentes faixas etárias, incluídas as crianças e as adolescentes.

Alguns dos crimes cometidos contra a mulher no ambiente virtual são: ameça, calúnia, difamação e injúria.

A sexualidade feminina ainda sofre formas específicas de repressão, para além da repressão sexual geral. A mulher exposta nessa cena sexual ou de nudismo virtual sofre uma maior rejeição social e afetiva do que o homem no mesmo tipo de situação(2) . 

O perfil dos agressores que praticam este tipo de violência são ex-maridos, ex-companheiros e ex-namorados que divulgam a intimidade para se vingar de alguma rejeição da parceira. O comportamento de revanche afetiva (ou revenge porn) provoca um intenso sofrimento emocional à vítima quando tem a imagem expostas ao público na Internet e nas redes sociais(3). Os homens sabem que a sexualidade feminina será recriminada. Os julgamentos das mulheres expostas em cenas íntimas são humilhantes, degradantes e vexatórios.

Destacamos também que a nova geração de jovens experimenta uma facilidade na divulgação de conteúdos sem autorização dos envolvidos, age como se a Internet fosse terra de ninguém.

Os mecanismos jurídicos de proteção à mulher vítima de revanche afetiva estão previstos no Código Penal e a Lei Maria da Penha.

Os crimes cometidos na Internet são previstos pela legislação penal e o autor pode ser punido criminalmente, porém o difícil é materializar o delito da autoria, ou seja, formalizar as provas necessárias para incriminar o autor. No Código Penal aplicam-se os crimes contra a honra e na Lei Maria da Penha(4), o artigo 5.º conceitua a violência doméstica e familiar contra a mulher. No art. 7.º, prevê 5 espécies de violência, com destaque para o inciso II, que trata da “violência psicológica”. O art. 22 relata as medidas protetivas de direito(5). Quando o crime é praticado contra crianças e adolescentes, aplica-se a regra do art. 241/A, do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que considera crime grave a divulgação de fotos, vídeos ou imagens de crianças ou adolescentes em situação pornográfica ou de sexo explícito.

É interessente mencionar a Lei nº. 12.737/12, apelidada de Lei Carolina Dieckmann, que criminaliza a invasão de computadores para obter vantagem ilícita, como a falsificação de cartões de crédito e a interrupção de serviço telegráfico, telefônico, informático, telemático ou de informação de utilidade pública. No ano de 2012, a atriz teve o computador invadido e fotos pessoais divulgadas na internet.

A lesão psicológica destrói a vida da mulher. A restruturação emocional, da auto-estima e do bem-estar levam anos, talvez impossível de ser restabelecida. Para que estes crimes sejam punidos, a vítima precisa denunciar o agressor. O medo de uma maior exposição é latente.

As exposições de fotografias e filmagens da sexualidade feminina custam caro. É um fetiche que pode ocasionar um desespero na mulher ao ponto de praticar suicídio! Tal circunstância aconteceu com duas adolescentes no final do ano de 2013 após terem descoberto que suas fotos íntimas estavam disponibilizadas na Internet.

A Internet funciona para 1/3 da população mundial. Ou seja, cerca de 2/3 dos habitantes não têm acesso à rede mundial de computadores nem às redes sociais. Atualmente temos uma população mundial de quase 7 bilhões de habitantes e uma média de 2,2 bilhões de pessoas têm acesso à Internet e aos conteúdos disponíveis, e milhares de homens têm uma perversa capacidade de provocar danos morais e dores emocionais nas mulheres a níveis mundiais com apenas um “click” ou “send”, com o uso descontrolado e sem responsabilidade da Internet.

De acordo com o relatório anual da União Internacional de Telecomunicações (UIT) – “Medindo a Sociedade de Informação 2013”- a banda larga móvel se tornou o segmento que mais cresce do mercado mundial da Tecnologia de Informação e Comunicação. Quase 50% de todas as pessoas do mundo estão agora conectadas por uma rede 3G(6).

A Internet é uma ferramenta poderosa que nos conecta em tempo real com qualquer lugar do mundo. Infelizmente, em muitos casos, não é utilizada para um uso justo e a utilização é direcionada para a prática de crimes, a exemplo do terrorismo, tráfico de armas, tráfico humano, fraudes bancárias, pedofilia e bullying.

A utilização saudável da Internet é banalizada por alguns agressores de mulheres. Tais homens adultos ou jovens atuam sem respeito, sem limites e sem qualquer educação. Estes homens têm a consciência dos efeitos avassaladores da divulgação de fotografias e vídeos íntimos que provocam nas vítimas, nas famílias das vítimas e no seu círculo social.

Acrescentamos ainda que milhares de adolescentes e jovens têm um comportamento sexual precoce e sem as devidas orientações. A atual geração pretende curtir aquele momento, não imaginam que no futuro próximo tais atos criminosos podem refletir na sua vida profissional, numa entrevista de emprego ou num concurso público. 

Um novo modelo desenvolvido pela UIT (União Internacional de Telecomunicações) para o relatório deste ano estima o tamanho da população nativa digital em todo o mundo, mostrando que em 2012 havia cerca de 363 milhões de nativos digitais em uma população mundial de aproximadamente 7 bilhões. Isso equivale a 5,2% do total da população mundial e 30% da população mundial de jovens. O modelo define nativos digitais como a juventude de 15 a 24 anos, com cinco ou mais anos de experiência online. O relatório mostra que, globalmente, os jovens são quase duas vezes mais conectados que a população mundial como um todo, com a diferença de idade mais acentuada nos países em desenvolvimento. Os jovens são os adeptos e usuários mais entusiasmados das TICs (Tecnologia de Informação e Comunicação). São eles quem moldarão a direção da nossa indústria nas próximas décadas e suas vozes devem ser ouvidas”, disse o diretor do escritório de desenvolvimento das telecomunicações, Brahima Sanou, que produziu o relatório anual(7).

Diante da apresentação deste relatório é essencial explicar aos jovens sobre a utilização segura da Internet.

Para evitar transtornos futuros, é importante que a mulher siga algumas orientações:

1) Não tirar fotos íntimas em câmaras dos celulares, fotográficas ou filmadoras, tablets;

2) Não expor a intimidade na web cam ou ferramentas como o Facetime;

3) Não compartilhar fotos, em aplicativos como whatsapp, viber ou outros semelhantes;

4) Não armazenar fotos íntimas no computador, nem no celular, nem no tablet, nem no sistema de nuvens ou emails;

5) Não se deixe influenciar por pedidos de fotos e filmagens íntimas.

Após o acontecido, identificamos algumas dicas:

 

1)      Imprimir a página onde as ofensas ou imagens foram publicadas ou guardar as informações como links, url e os perfis que retransmitiram;

2)      Registre uma queixa na delegacia da Mulher ou numa delegacia mais próxima;

3)      Havendo testemunhas forneça os dados pessoais;

4)      Não esconda o problema dos parentes, amigos e vizinhos;

5)      Não subestime e não tenha medo. Quem pratica tais atos é um criminoso e você não deve ter medo de denunciá-lo;

6)      Haja rápido: denuncie os crimes o mais rápido possível para facilitar a ação da polícia na perseguição de seu agente, para eficácia de provas material do delito.

7)      Procure a assistência de um advogado. Na justiça o advogado pode abrir dois tipos de processos: o criminal e o cível.

Deixar-se fotografar em momentos íntimos não é prova de amor. Pode ser um fetiche que milhões de pessoas do mundo inteiro podem ter acesso. A melhor memória é a memória da sua cabeça. É importante fazer o uso consciente das tecnologias para não ter um possível transtorno por incansáveis anos.

A Delegacia dispõe de recursos para identificar quem foi o autor da divulgação de fotos ou vídeos, rastreando de qual máquina saiu o material. A delegacia rastreará o site denunciado, levando a descoberta do Protocolo de Internet (IP) emitido pela máquina do autor do crime. A vítima pode e deve solicitar ao mesmo servidor de acesso à Internet que retire a página do ar, para tanto é só enviar a cópia do registro de ocorrência para o provedor e todo o processo será feito num curto espaço de tempo(8).

A apuração dos crimes cometidos na Internet podem demorar, pois as informações colhidas dependem dos provedores de Internet, e geralmente há bastante burocracia para se chegar até eles. Entretanto por meio de ordem judicial, os provedores de Internet devem passar a informação, caso tenha, pois as informações  são arquivadas por tempo determinado até a exclusão. Outro fator que pode influenciar nas investigações da polícia é quando o autor pratica o crime virtual por meio de cadastro frio – elaboram sites de relacionamentos com informações falsas e o pratica em lan house.(8)

Quando uma fotografia ou vídeo são divulgados na Internet, é quase impossível conter a propagação e o compartilhamento das mesmas. É importante ter bastante cuidado com o que se permite gravar ou fotografar.

Podemos citar dois Projetos de Lei n.º 6.630/2013 e n.º 5.555/2013 (Projeto da Lei Maria da Penha Virtual), de titularidade dos deputados federais Romário e do João Arruda, respectivamente, que pretendem tipificar como crime a conduta de divulgar vídeos íntimos com terceiros.

O projeto de Lei do deputado Romário pretende tornar crime a divulgação indevida de material íntimo. O acusado da divulgação poderá pegar pena de até três anos de detenção, além de ser obrigado a indenizar a vítima por todas as despesas decorrentes de mudança de domicílio, de instituição de ensino, tratamentos médicos e psicológicos e perda de emprego(9).

O projeto do deputado João Arruda prevê que qualquer divulgação de imagens, informações, dados pessoais, vídeos ou áudios obtidos no âmbito de relações domésticas, sem o expresso consentimento da mulher, passe ser entendido como violação da intimidade. “Essa violação de intimidade, pela proposta, passaria a ser considerada violência doméstica”, reforçou(10).

Destacamos uma recente pesquisa do professor Júlio Jacobo Waiselfisz, coordenador da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais, do grupo de Desenvolvimento Social da Unesco no Brasil, e ex-diretor do Instituto Sangari, que todas as brasileiras têm conhecimento sobre a Lei Maria da Penha. A Justiça brasileira recebeu 677.087 ações procedimentos - inquéritos, ações penais e medidas protetivas - desde que a lei foi decretada. Apesar disso, 700 mil mulheres continuam alvo dos seus parceiros. A cada cinco minutos uma mulher é agredida no Brasil. Em 2012, 5 mil foram assassinadas. Os dados espantam a outra cara do país: o machismo(11).

É essencial denunciar os casos de violência contra a mulher, de qualquer ordem e lutar por uma mudança na consciência do homem, para que este repense sua masculinidade no modo de agir com respeito pela integridade, psicológica, moral e física da mulher.

A prevenção do crime contra a mulher na vida fora da Internet e por dentro da própria Internet é a melhor opção para evitar a agressão psicológica. A caminhada será longa e não se sabe por quanto tempo. A divulgação e o compartilhamento de fotos e vídeos íntimos são recentes comportamentos criminosos decorrentes das novas tecnologias disponíveis na Internet que implicam no modo inconsequente da exposição da intimidade feminina.

Por fim, citamos um depoimento do Secretário Geral da ONU Ban Ki-Moon(12): “Precisamos nos unir. A violência contra as mulheres não pode ser tolerada, de nenhuma forma, em nenhum contexto, em nenhuma circunstância, por nenhum líder político nem por nenhum governo.”

 

Notas:

(1) Disponível em: http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/mulheres/cartilha_mulher.htm.

(2) Disponível em:http://www.cartacapital.com.br/politica/intimidade-na-internet-e-a-violencia-contra-a-mulher-5565.html.

(3) As mulheres devem ter cuidado com os relacionamentos virtuais para não serem vítimas de “sexting” (mistura de sexo com mensagens de texto, quando o casal troca fotos sensuais pelo celular). É uma nova modalidade de relacionamento entre casais adolescentes. Preocupado com a adesão cada vez maior a esta prática, a Safernet divulgou uma cartilha de orientação aos jovens sobre os riscos dos relacionamentos virtuais. Disponível em:http://www.crianca.caop.mp.pr.gov.br/arquivos/File/publi/safernet/cartilha_safernet_2012.pdf.

(4) Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm

(5) Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=11065&revista_caderno=3

(6) Disponível em: http://www.onu.org.br/onu-44-bilhoes-de-pessoas-permanecem-sem-acesso-a-internet/

(7) Disponível em: http://www.onu.org.br/onu-44-bilhoes-de-pessoas-permanecem-sem-acesso-a-internet/

(8) Disponível em:http://alexandre-atheniense.jusbrasil.com.br/noticias/2103190/mulheres-sao-maiores-vitimas-de-crimes-contra-a-honra-na-internet

(9) Disponível em:http://www.circuitomt.com.br/home/materia/37229

(10) Disponível em: http://www.romario.org/portfolio/all/pornografia-de-vinganca/

(11) isponívelem:http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=576366

(12) Disponível em: http://ndonline.com.br/florianopolis/noticias/91683-caso-pamela-retrata-a-impunidade-dos-crimes-contra-as-mulheres.html

 

Por Alyne Andrade de Oliveira Bezerra

 

Fonte: http://www.ibdi.org.br/site/artigos.php?id=280

Acessado em 31 de março de 2015