A Teoria do Direito, a Era Digital e o Pós-Humano: o novo estatuto do corpo sob um regime tecnológico e a emergência do Sujeito Pós-Humano de Direito


PorJefter Gerson- Postado em 01 setembro 2019

Autores: 
Eduardo C. B. Bittar

A Teoria do Direito, a Era Digital e o Pós-Humano: o novo estatuto do corpo sob um regime tecnológico e a emergência do Sujeito Pós-Humano de Direito

The Theory of Law, the Digital Age and the Post-Human: the new status of the body under a technological regime and the emergence of the Post-Human Subject of Law

Eduardo C. B. Bittar1  
http://orcid.org/0000-0002-4693-8403

 

1Universidade de São Paulo, São Paulo, São Paulo, Brasil. E-mail: edubittar@uol.com.br.

 

 

RESUMO

Este artigo discute o estatuto jurídico que se atribuirá ao cyber-corpo. A emergência do Pós-Humano terá enorme impacto social, e, por isso, se trata de pensar como o Direito reagirá a estas transformações, e como se poderá promover a proteção da dignidade da pessoa humana, diante da emergência do Sujeito Pós-Humano de Direito, algo que afeta inclusive um dos capítulos mais estruturantes da Teoria do Direito.

Palavras-chave:  Era digital; Pós-humano; Sujeito pós-humano de direito

ABSTRACT

This article discusses the legal status to be attributed to the cyber-body. The emergence of the Post-Human will have enormous social impact, and so it is a matter of thinking how the Law will react to these transformations, and how it can promote the protection of the dignity of the human person, in the face of the emergence of the Post-Human Subject of Law, something that affects even one of the most structuring chapters of the Theory of Law.

Keywords:  Digital age; Post-puman; Post-human subject of law

INTRODUÇÃO* *

A Teoria do Direito se vê francamente desafiada a repensar seus fundamentos e seus capítulos mais sensíveis,1quando se trata de pensar o impacto das novas tecnologias e a emergência da era digital,2 da era do numérico,3ou ainda, da era do cibernético e do espaço virtual. É decisiva, nesta perspectiva, a atitude de antecipação reflexiva, como forma de compreender os riscos e os impactos, tendo-se presente o papel social regulatório do Direito.4 Entende-se que o Direito na era digital tem o papel de circunscrever fronteiras, regras e parâmetros, ‘freando’ o caráter ‘desenfreado’ do desenvolvimento tecno-científico, ao mesmo tempo em que a condição humana é re-significada, e em que as formas de sociabilidade são re-definidas.

Em dois estudos anteriores, já se havia procurado demonstrar como a desumanização prejudica processos de socialização fundados na vitória da técnica e na reificação social, no artigo intitulado Technique, Dehumanization and Human Rights,5 e, também, como os avanços da tecnologia criam novos desafios para o campo de reflexões dos direitos humanos, no livro intitulado Os direitos humanos no espaço virtual.6 Não é possível aqui retomar as categorias, os conceitos e as análises já empreendidas nos espaços anteriormente definidos, que são tomados como pressupostos daquilo que se desenvolverá de modo mais específico no estudo contido neste artigo. Por isso, a tarefa aqui é a de dar continuidade à perspectiva crítica desenvolvida nos estudos anteriores, elaborando-se aqui um diagnóstico de época, concernente aos interesses da Teoria do Direito. Daí, neste presente estudo, a ideia de reforçar a importância de atentar para o legado reflexivo da Escola de Frankfurt (Frankfurter Schüle), partindo-se dos estudos sobre a história da modernidade e o processo de afirmação da razão instrumental (Instrumentelle Vernunft), dentro da tradição deixada por Theodor Adorno, Max Horkheimer,7 Walter Benjamin8 e Jürgen Habermas,9 apontando nesta forma de racionalidade própria do mundo moderno a estrutura que embasa a emergência da era do numérico, do digital e do ciberespaço. As categorias do pensamento frankfurtiano estarão embasando a análise de fundo ao longo do texto, enquanto se dialoga com a emergência de uma bibliografia mais atual, reflexiva e crítica sobre o estado da arte na área,10 fazendo-se desta opção metodológica a forma de enfrentamento do tema, de condução do presente estudo e de discussão da noção de sujeito pós-humano e seus impactos para o Direito contemporâneo.

E, de fato, na toada frankfurtiana, como já vem apontando Hartmut Rosa, a nova dimensão da técnica moderna é aquela marcada pelo elevado grau de aceleração.11 É ela que reforça hoje a importância da abordagem crítico-realista, para a qual a processualidade da condição humana figura agora premida pelas circunstâncias de uma evolução técnica sem precedentes. É aí que a Teoria do Direito, enquanto Teoria do Humanismo Realista, a partir da proposta teórica contida no livro Introdução ao Estudo do Direito: humanismo, democracia e justiça (2018),12deve responder aos desafios epocais, em tempos pós-humanos e trans-humanos. Isso evidencia a importância da crítica aos processos de desumanização que poderão surgir do hiper-enaltecimento da máquina, da mitificaçãodos processos tecnológicos, das ideologias da cyberculture, da fetichização do corpo-máquina reduzido à coisa-mercadoria, da servilização do homem à máquina. Ali onde a nova potência político-econômica promover barbarização, gerar exclusão e aprimorar processos de dominação, consideradas as novas fontes da violência cibernética, e a lógica eugênica vier a tornar banais as fontes de alimentação da conexão entre vida, respeito, integridade, dignidade e direitos, a reflexão da Teoria do Direito, enquanto Teoria do Humanismo Realista, deverá se retrair em busca de novos fundamentos para o Direito.

A revolução digital será aqui compreendida, portanto, como mais uma das etapas internas do mundo moderno, e a glorificação das novas tecnologias será interpretada como a ideologia que autoriza a emergência das novas fronteiras e conquistas da técnica moderna. Dentro de uma nova fronteira dos processos de modernização, será novamente a razão instrumental (Instrumentelle Vernunft) que fará emergir, no contexto atual, a substituição do ‘governo’ pela ‘governança numérica’, e o deslocamento da noção de ‘lei’ pela ‘noção de cálculo’, conforme aponta o filósofo francês Alain Supiot, o que se traduz em novos e graves desafios para o Estado Democrático de Direito.13 As inovações atuais são tão graves que se chega mesmo, nesta ‘nova era’, a colocar em questão o próprio papel da razão, inclusive, da razão moderna, como o faz filósofo tunisiano Pierre Lévy.14 Por isso, esta reflexão encontra atualidade e deve demarcar um espaço importante de trabalho, de modo que neste breve espaço se procurará tratar dos avanços da instrumentalidade ao nível da virtualidade, a galope de um processo de hipermodernização social, tendo-se presente o vocabulário do sociólogo francês Gilles Lipovtesky.15

A Teoria do Direito na Era Digital

A era digital corresponde ao período histórico em que a vida social, as relações de trabalho e boa parte das interações humanas passam a estar determinadas por ‘algoritmos’ e ‘operações digitais’. A emergência da era digital impõe novos desafios ao Direito. Desta forma, a Teoria do Direito não pode permanecer estática diante destes novos desafios. A Teoria do Direito depende de profundas modificações sociais, para creditar mudanças aos conceitos jurídicos, e, com isso, retorcer o Direito em torno das novas categoriais sociais em mutação.16Diante da tecnologia avançada, da inteligência artificial e da aceleração da vida, entra-se de fato numa ‘nova era’, a era da revolução digital, num novo estágio de desenvolvimento do capitalismo, e, portanto, do mundo moderno.

A partir daqui, já se podem apontar os fatores que estarão cada vez mais presentes na dinâmica de interferência das novas tecnologias,17 e que constituem os novos ingredientes da ‘era digital’: i.) a tecnologia da informação; ii.) as nano-bio-tecnologias; iii.) a tecnologia genética; iv.) a tecnociência; v.) a neurociência; vi.) a cloud computing; vii.) a robotização; viii.) a digitalização; ix.) as microtecnologias; x.) a inteligência artificial.18 Todos estes termos evocam um processo de auto-aprimoramento da técnica moderna. Isso torna possível enxergar o quanto se está diante de um hiper-aperfeiçoamento da razão técnica, das tecnologias e das fronteiras das ciências. Por isso, estes fatores aqui presentes não são tomados apenas como aspectos isolados do mundo contemporâneo, mas como conglomerados de fatores que constituem uma nova dinâmica, uma nova etapa dos processos de modernização, à qual se costuma chamar de ‘era digital’.

Diversos diagnósticos de época vêm sendo apontados, considerando os desafios impostos pela ‘era digital’, como apontam os estudos de sociólogos renomados de diversas tradições teóricas, a exemplo de Zygmunt Bauman, Gilles Lipovetsky e Alain Supiot. Em verdade, o que se processa é uma dessubstancialização da matéria e das relações, num processo social de modernidade líquida - considerando-se a leitura do sociólogo Zygmunt Bauman - em direção à sua transferência para o virtual, para o digital e para a hipervelocidade.19 Assim, em nossos tempos, emerge uma civilização da leveza - tendo-se presente a leitura do sociólogo francês Gilles Lipovetsky - cujas características apontam para as dimensões do impalpável, do imaterial, do virtual e, portanto, da leveza.20Aqui, se pode também dizer - nas palavras do filósofo francês Alain Supiot - que se está diante do império do numérico, este que instala a governança numérica e destrona o império da lei.21 Estes diagnósticos sociológicos contemporâneos são relevantes para uma apreensão mais profunda dos rumos e desrumos sociais dos processos de modernização. Junto com isso, evidentemente, a percepção de novos destinos ao universo do Direito e de suas práticas.

Neste contexto, é certo que uma nova fronteira da Ciência do Direito irá emergir. E, de fato, a esta terceira dimensão da realidade - chamada realidade digital pela filósofa Marcia Tiburi22 - já corresponde uma nova fronteira da Ciência do Direito, qual seja, o Direito Digital,23 também chamado de Direito Virtual. Este é apenas um aspecto da relação entre Direito e Tecnologia. O outro aspecto é propriamente aquele que implica novos desafios, e, com isso, um impacto das novas tecnologias que irá re-cambiar a Teoria do Direito, em múltiplas dimensões, especialmente em capítulos mais diretamente sensíveis às novas fronteiras das transformações sociais. E, em verdade, a Teoria do Direito – enquanto Teoria do Humanismo Realista - já começa a constatar este tipo de reconfiguração em algumas fronteiras, dimensões e interfaces específicas do Direito contemporâneo, em especial, considerando o abalo profundo no Direito Privado, na esfera dos Direitos da Personalidade, no âmbito do Direito Internacional, considerando-se a perda de fronteiras para a regulação da moeda e das interações comerciais virtuais, na esfera do Direito Penal, tendo em vista o surgimento dos crimes cibernéticos e do terrorismo virtual, e, ainda mais, na esfera dos Direitos Humanos, considerando-se as diversas ameaças à dimensões da dignidade humana.24 Por isso, mapear este tipo de questão é algo concernente aos domínios da Teoria do Direito, pois o tremor provocado por estas mutações haverá de se fazer ressoar em diversos ramos do conhecimento do Direito, afetando as Ciências do Direito em sua totalidade. E é diante desta encruzilhada que se terá que colocar a Teoria do Direito em reavaliação.

Direito, Ideologia e cyberculture

Toda era produz suas próprias ideologias. A ‘era digital’, quando emerge em todo o seu frescor nos tempos atuais, não seria uma exceção neste sentido. A era digital vem revestida de ideologias, trazidas pela cyberculture. Ora, as ideologias servem para justificar novos processos sociais e, por isso, tornam possível camuflar a emergência de novos poderes e formas de dominação. As ideologias são, assim, a face cultural - na forma de um sistema de ideias - de processos sociais mais basilares, ao nível da economia e do trabalho, das interações sociais e do controle social.25 Não por outro motivo, nossa época é farta em proporcionar a apologia das novas tecnologias. É assim que se torna possível que os indivíduos se tornem apêndices de seus gadgets, enquanto enxergam apenas nestes seus novos aliados. A tecno-dependência deixou de ser algo lateral, e a vida moderna impõe um uso irrestrito, imoderado, exaltado e tecnofílico de todo o aparato técnico que suporta a integração das novas tecnologias e a expansão dos novos instrumentos técnicos.

Afinal, os avanços técnicos já são tantos que, por projeções, hoje já é possível antever que um robô poderá substituir um humano para ler um discurso (2025), escrever um trabalho escolar (2026), compor um sucesso musical (2027), atuar como vendedor de loja (2030), e, afinal, substituir qualquer trabalho humano (2140).26As previsões do crítico norte-americano Andrew Keen apontam para o fato de que nos próximos quinze anos as tecnologias digitais irão reconfigurar por completo os relacionamentos humanos.27 É neste sentido que se podem localizar ‘utópicos das novas tecnologias’ a idealizar os traços da nova era a partir do Vale do Silício28 - o Vale das Tecnologias nos Estados Unidos da América -, estes que professam uma fé imoderada pelas novas tecnologias, de onde promanam promessas futuristas, entre elas a libertação do homem de seus fardos.29

Ora, fica claro por esta análise que existe uma ‘vociferação’ em torno das promessas das novas tecnologias. Como é certo que todo discurso tem seus entusiastas, a ideologia da cyberculture também tem seus filósofos-profetas, cientistas-futuristas, internautas-tecnofílicos, estes que são os sujeitos responsáveis pela exaltação das ‘novas tecnologias’, tendo-se em Donna H. Haraway, Ray Kurzweil e Nick Bostrom seus protagonistas.30 E, de fato, esta história não começou de hoje, e encontra seu passado recente nas últimas décadas do século XX, sabendo-se da importância do marco encontrado no escrito da filósofa norte-americana Donna J. Haraway, na perspectiva do feminismo, com o ensaio Manifesto for Cyborgs: Science, Technology, and Socialist-Feminism in the 1980s, publicado na Socialist Review (1985). No entanto, no início do século XXI, vem despontando o papel do Institute for Ethics and Emerging Technologies,31 o Extropy Institute,32 com Ray Kurzweil, e as inquietações expostas por Nick Bostrom, através do Future of Humanity Institute.33 A partir das preocupações que desperta e das promessas desmesuradas que carrega, são importantes as reflexões emergentes. No entanto, quer-se afirmar que aqui se está propriamente diante da ideologia futurista que qualifica e justifica a chegada de uma nova revolução da indústria - a partir do mundo desenvolvido e altamente tecnológico - com um olhar estriônico e hiper-exaltado.

A exaltação central da era digital escorre, portanto, para a exaltação da centralidade da máquina. Esta exaltação desloca o sentido do humano, e, com ele, o sentido da razão humana. Por isso, começa-se a professar um tipo de ideologia em que se encontra inscrita em seu interior uma lógica de exaltação da máquina e decretação de morte da razão. Eis aqui a ainda tímida e germinativa instauração de uma era pós-racional. Alguns, no campo da Filosofia, chegam inclusive a detalhar a dimensão dos limites da razão humana, ao compará-la ao ilimitado da máquina e aos apoios da memória sobre as coisas e as tecnologias, como o faz o filósofo francês Pierre Lévy.34Aqui, o próprio estatuto do pensamento é colocado em questão - e substituído por expressões mais sutis e leves - como a ideia de Pierre Lévy, de que pensar se torna um “...devir coletivo no qual misturam-se homens e coisas”.35 Neste sentido, torna-se possível imaginar que os efeitos negativos deste processo são apenas aspectos marginais, ou apenas riscos de efeitos colaterais, dos mais profundos avanços tecnológicos.36

Seja como for, onde se vê apenas a emergência da ideologia da auto-exaltação das novas tecnologias - enquanto expressão de uma nova revolução da indústria - se torna possível, sobretudo, o (i) rebaixamento do sentido do corpo humano, e, simultaneamente, a (ii) heroicização da máquina, e (iii) a proclamação da vitória do numérico/digital. Na contra-marcha deste processo, há aqueles que são protagonistas em apontar a críticas da revolução digital e de seus efeitos negativos, tal como o crítico norte-americano Andrew Keen, geralmente visto como uma voz isolada.37 Assim, a era digital, vista como era cognitiva, se torna a era que produz novas ideologias tecnofílicas, trazendo consigo enormes riscos de novas irracionalidades. São estes riscos que precisam ser considerados, na imoderação da ideologia da cyberculture. Daí a importância de serem mapeados, identificados, dosados e regulados, quando exatamente o mero enaltecimento não permite senão o encobrimento da estrutura das novas formas de dominação. Por isso, é tarefa da razão (Vernunft), e, especialmente, da razão crítica fornecer subsídios para a leitura e desmistificação das novas ideologias da era digital.

Por isso, pelo caminho da Kritische Theorie,38 é possível apontar para a crítica das irracionalidades tecnológicas, considerando-se os seguintes riscos, já atuais e presentes: i.) a sobrecarga informacional se torna uma nova forma de des-informação e des-orientação, com sensível perda de autonomia intelectual; ii.) o crescimento das formas de hipercontrole dos indivíduos pelo controle de dados derivados da vida digital dos sujeitos; iii.) o crescimento da dominação intelectual e da perda de liberdade de consciência, considerada a invasividade dos meios eletrônicos plugados ao corpo humano; iv.) a emergência da programação pela ‘governança numérica’, no lugar do governo pelo respeito ao povo soberano, como aponta Alain Supiot;39 v.) a perda da autonomia do sujeito, diante do império do visível, no lugar do reflexivo, como aponta Marcia Tiburi;40 vi.) o enfraquecimento da subjetividade, que se vê funcionalizada, absorvida e capturada pela técnica, como aponta Christian Dunker;41vii.) a emergência da pós-verdade, da verdade-consumo, como aponta Marcia Tiburi;42 viii.) o enfraquecimento da ética e dos liames que implica;43 ix.) a perda de rumo e o enfraquecimento dos liames sociais, com forte tendência de entrega e absorção dos poderes sociais pelas novas formas de poder digital.44

A Teoria do Direito, o Sujeito de Direito e a emergência do Pós-Humano

São múltiplas as mudanças que se farão sentir ao longo das próximas décadas. Entre elas, se encontra a nova relação que se manterá com o corpo humano, considerando-se os avanços da tecnociência - entendida aqui, em sua centralidade, como a aliança estratégica entre tecnologia avançada e ciência robotizada, enquanto um dos motores desta nova era45- será capaz de reconfigurar por completo as relações humanas e sociais, e, por isso, a fonte de motivação e justificação do Direito. Isto se diz, considerando-se, sobretudo, o fato de que boa parte da tradição em que se funda o Direito moderno, deriva da figura do Sujeito de Direito - a qual, por sua vez, nasce à imagem e semelhança da figura corporal do Homem, situado a partir da visão do humanismo ocidental antropocêntrico - levando-se a uma crise de definição da própria função do Direito, ao menos na forma moderna como é conhecido. Em verdade, com todas estas mudanças, é o capítulo acerca do Sujeito de Direito - aliás, um dos capítulos mais sensíveis a mudanças de toda a Teoria do Direito - que entrou em crise, como aponta o sociólogo Laymert dos Santos.46 Nesta perspectiva de análise, vale apontar que uma nova fronteira do conceito de Sujeito de Direito está em surgimento e formulação: a do Sujeito Pós-Humano de Direito.

Mas, para que se aprofunde este ponto, é necessário estudar o impacto dos avanços tecnológicos na auto-compreensão do corpo humano. E, para efeitos desta análise, o ‘corpo’ será tomado como um campo complexo de disputas sociais, e, por isso, é visto como o lugar de manifestação dos novos avanços da tecnociência e das novas fronteiras do capitalismo. Aqui, o ‘corpo’ é considerado - mais do que como expressão físico-biológica da humanidade -, o lugar-síntese de processos de socialização, de trocas entre ego e alter, sendo por isso o locus da cultura e das práticas de um tempo, permitindo registros significativos acerca da relação que se tem com o ‘corpo-biológico’ (proibição; medo; dominação; ódio; exploração; comiseração; martírio; extermínio; risco; limite; hedonismo; etc.). Daí, sua importância estratégica e reveladora, quando se quer pesquisar e compreender a nossa ‘era’.47 Por isso, ter-se-á presente na dimensão do corpo físico a emergência de uma nova disputa por re-configuração de nossa própria humanidade.

É assim que o individualismo contemporâneo é tão extremo que encapsulou a nova revolução dentro de si, pois ela é agora uma revolução do ‘corpo’ pela tecnologia, em direção à leveza.48 Ali, onde estas duas pontas se encontram, se inicia uma nova história. Seja pela via da body modification, seja pela via da hipercodificação de dados do ‘corpo humano’, seja pelos neurochips, fato é que a tecnociência e as promessas da cyberculturerompem o horizonte do conhecido, como aponta o antropólogo italiano Massimo Canevacci.49 E isto porque, o ‘corpo humano’ é o último nicho de ‘natureza’ que ainda resta a ser ‘substituído’ e ‘superado’ pelo mundo moderno, no extremo de sua fronteira tecnológica. Por isso, ele deve ser ‘escrutinado’, ‘investigado’, ‘observado’ para ser ‘substituído’, ‘reformado’, e, no limite, ‘superado’. Por isso, a ‘era digital’ quer consagrar a tecnologia e declarar a obsolescência do corpo humano. Na obsolescência do corpo humano, se constrói o espaço para a emergência do pós-humano, do pós-orgânico, do trans-humano, ali onde a modernidade se acirra - e, se manifesta como hiper-modernidade, na definição do sociólogo francês Gilles Lipovestky -50 e dialeticamente consome o ‘corpo’ do qual emergiu na figura do Sujeito Moderno cartesiano, na relação entre res cogitans e res extensa.51

Está-se a caminhar a passos largos em direção à ideia do ‘corpo-total’, ou seja, do ‘corpo-máquina’ - este que se coloca no lugar do ‘corpo-físico’, do ‘corpo-biologia-natureza’ - dimensão contra a qual a modernidade se constituiu como insurgente e insubordinada, na tentativa de ‘controlá-la’ e ‘superá-la’, instalando em seu lugar a vitória do homem moderno sobre a natureza, na figura do Sujeito Moderno. O ‘corpo’ é agora a porção de natureza que a modernidade quer superar. Ali, onde a modernidade instaura a morte do paradigma do homem-velho - ou seja, do detentor do corpo-físico-biológico não modificado, em toda a sua diversidade étnica - e proclama o nascimento do paradigma do homem-novo - o ‘cyborgue’, o ‘homem-máquina’, ou seja, o corpo humano aprimorado pela tecno-ciência - completa-se a vitória da máquina (e a vitória da técnica moderna) sobre o homem, na inversão civilizatória promovida pela modernidade, em que o apêndice-máquina se torna o centro da sociedade - na forma anunciada pela crítica da Escola de Frankfurt -,52 e, por isso, a razão de ser da existência.53 Aqui, com clareza, percebe-se que a tríade moderna formada pela economia, pela técnica e pela ciência segue os seus rumos desembestados, em direção ao futuro dominado pela tecnologia.54

O que se percebe, portanto, pela análise deste movimento, é que a construção social da irrelevância do corpo humano não é uma invenção ‘nova’, mas sim ‘moderna’, e, ainda, pode-se dizer, ‘moderna demais’. Aliás, este parece ser o último elo a definir que o homem é animal humano, e, portanto, corpo-biologia-natureza, envolvendo a vocação para a superação dos limites biológicos da vida.55 Agora, se trata de levar o ‘corpo’ em direção à sua máxima potência, instaurando-se um ‘novo paraíso’, ali onde o ‘corpo’ desabita o mundo,56 ou ainda, expandindo-se suas qualidades normais em direção à ‘hiper-qualidades’.57 É assim que a nova era se revela ao promover o enaltecimento da superação das características do corpo humano, quais sejam, a imperfeição, a limitação, a incompletude, o defeito físico, a mortalidade, a finitude. Por isso, na ruptura que encapsula, o hiper-corpo é o sonho da hiper-modernidade.58

Assim, de forma mais sintética, pode-se dizer que o ‘hiper-corpo’ (ou seja, o corpo que não adoece, não perece, não sofre) é a codificação histórica da condição pós-humana. E tudo que é marginal ao hiper-corpo deve ser excluído (ou seja, a fraqueza, a feiúra, a velhice, a doença, a deficiência, o limite).59 Aqui está a geração da tendência social ao desprezo das dimensões do humano em face do pós-humano, considerando-se os aportes possíveis da tecnociência e da tecno-modificação do corpo. É neste domínio que se manifesta um novo campo de saber, mas também, com ele, um novo campo de economia e, portanto, um novo campo de poder. Eis aí, a aparição do nanopoder.60

É importante grifar que a modernidade contém um projeto não-reconciliado com a natureza, expresso pela razão instrumental, o que faz com seu caráter seja, dialeticamente, destrutivo; aí, este projeto se revelar como um projeto de dominação.61 A modernidade se manifesta na destrutividade do ar, da água, do solo, da vida vegetal, da vida animal e, por consequência, da vida humana e planetária.62 Agora, a nova fronteira dos processos de modernização envolve o controle, a dominação, a redefinição e a medição laboratorial do ‘corpo humano’. Ali onde se tentou dominar, controlar e modificar a natureza, o homem gerou efeitos colaterais verificáveis. O mesmo se dará com os processos de modificação do ‘corpo humano’, pois se trata de ‘controlá-lo’, ‘modificá-lo’, ‘moldá-lo’, ‘aprimorá-lo’, ‘superá-lo’ -63 a pretexto de ‘melhorá-lo’ -64 o que implica fazê-lo capaz de viver numa intensidade, leveza e velocidade sem precedentes,65 todas estas que acompanham as novas rítmicas do mundo do trabalho virtualizado e da economia numérica.66 Assim, conclusivamente, se verifica que uma natureza aprimorada pela técnica se torna uma ‘outra-natureza’, artificializada, uma natureza-produto, ou seja, a natureza trans-humana.67 O quanto este projeto contém de violência, ainda se haverá de aquilatar, num futuro próximo. Mas, desde já, percebe-se o quanto este processo se ocupa de destruir as concepções até então vigentes. Assim, começa a se manifestar – na figura prototípica da nova era, o ‘cyborg’ - o fim da cadeia evolucionária do ser humano, do macaco ao hominídeo, e deste, ao homem-máquina, ou seja, ao homem hibridizado à máquina.68

A Teoria do Direito e os Sujeitos Pós-Humanos de Direito

Até aqui se pôde estudar de mais perto como a ‘era digital’, da tecnologia avançada, produz novas condições de socialização. A partir daqui, se trata de perceber como o Direito irá lidar com estas novas condições. E o primeiro passo é o de reconhecer que a noção de Sujeito Moderno forjou a concepção que se tem, no Direito Moderno, de Sujeito de Direito. Aliás, esta é uma noção capaz de abrigar conceitos em constante mutação, em seu interior, daí sua enorme versatilidade histórica.69 Diante da ‘era digital’, é normal imaginar que esta categoria volte a se re-configurar, para abranger aí também o ‘homem-máquina’. É aqui que se esboça, para o Direito contemporâneo, o novo estatuto dos Sujeitos Pós-Humanos de Direito. A categoria Sujeitos Pós-Humanos de Direito abriga a nova qualidade do humano, uma vez hibridizado com a máquina por processos tecno-científicos. Mas, aqui, a preocupação não se reduz à necessidade de regulamentar o tratamento da matéria. A preocupação se estende no sentido da re-construção da Teoria do Direito - no sensível capítulo teórico acerca do Sujeito de Direito -, com vistas ao tratamento dos desafios impostos pela revolução digital e tecno-científica sobre o ‘corpo humano’.

E isso impõe sentido à experiência do Direito contemporâneo, na perspectiva de tratar de configurações ainda diáfanas e mal elucidadas, seja na perspectiva prática, seja na perspectiva teórica de sua abordagem. Mas, de toda forma, os riscos já estão presentes, e são a razão suficiente para o tratamento das questões que acaba por impor. Aliás, como aponta o sociólogo francês Alain Supiot, o risco é o fundamento do Direito em nossos tempos, na medida dos próprios efeitos da crise econômico-financeira e numérica de 2008.70 Afinal, são mais do que concretos os riscos a que expõe a vida, podendo-se destacar uma série mínima (e atual) destes já bem identificados: i.) o risco da eugenia,71 e o controle de um mercado de seleção genética da vida, como face macabra do nanopoder; ii.) os riscos decorrentes das aplicações das novas tecnologias na guerra, considerando-se os avanços da robótica militar e, inclusive, a possibilidade de refundar a competição em escala global por estes novos armamentos;72 iii.) o risco da superação do homem pela máquina, diante de uma crescente atitude de desmoralização do corpo em prol da vitória técnica; iv.) o risco da escravidão de seres humanos criados laboratorialmente, pela manipulação genética da vida, conservando-se a propriedade jurídica sob o condicionamento de empresas; v.) o risco da coisificação da vida humana; vi.) o risco da construção de uma hierarquização entre seres ‘hiper-humanos’, corporalmente modificados, que sejam tornado superiores em capacidades e habilidades, e seres ‘humanos’, corporalmente inalterados, e, portanto, inferiores em capacidades e habilidades.

Diante destes riscos, parece significativamente importante a rota em direção às seguintes orientações a serem traduzidas nas preocupações da Teoria do Direito, em novas regulamentações e em novos corpos legislativos:

1. clonagem do corpo humano: a proibição legal da clonagem humana, tendo-se como preocupação que o homem se converta, de Sujeito de Direito, em Objeto de Direito.73 Deve-se evitar que o corpo-objeto da indústria farmacêutica, da engenharia genética e da nanomedicina faça do corpo-físico-biológico um sucedâneo da substitutividade do mundo das mercadorias - para que se crie uma nova realidade de substitutividade do corpo-humano-serial - agora feito corpo-coisa e, por isso, rebaixado ao seu novo estatuto objetual. Nesta perspectiva, em três importantes artigos da década de 1990, intitulados Escravidão genética? Fronteiras morais dos progressos da medicina da reprodução (1998),74 Não é a natureza que proíbe clonar. Nós mesmos devemos decidir (1998), 75 A pessoa clonada não seria um caso de dano ao direito civil (1998),76 o filósofo alemão da 2ª. geração da Escola de Frankfurt, Jürgen Habermas, acende o alerta filosófico e nos fornece argumentos contundentes contrários à clonagem humana, aos avanços indiscriminados da biogenética e das ciências biomédicas e da neo-eugenia;77

2. corpos híbridos: os corpos híbridos entre homem e máquina, ou o ‘cyborgue’, devem ser objeto de proteção legal personalíssima, no âmbito dos Direitos da Personalidade, na medida em que aqui se configura apenas uma nova dimensão física do corpo humano modificado, conhecendo-se a necessidade de cura de doenças, o uso de próteses e a liberdade estética que cada qual possui ao lidar com o seu próprio corpo físico, cujos limites ainda não se conhece por completo.78 Na era em que tudo se define como ‘-pós’, o corpo-humano-modificado também passa a ser requalificado como ‘pós-corpo’, sabendo-se que este também deve ser alvo de proteção jurídica e política.79 Nesta perspectiva, fica claro que o fundamento desta proteção legal repousa nos Direitos da Personalidade, na forma como o próprio Código Civil brasileiro atualmente os reconhece (arts. 11 a 21 do C.Civil 2002). Com isso, cria-se aqui, o que alguns autores estão chamando de cidadania cyborgue, como aliás nos lembra David Le Breton;80

3. robôs e inventos mecanizados: os robôs e os inventos mecanizados, criados pela indústria, devem receber o tratamento de Objetos de Direito. Afinal, a repetitividade matricial e serial do objeto-máquina patenteado faz de sua essência uma posse espiritualizada da indústria. Para lidar com isso, o Direito Civil comum, especialmente considerado o Direito de Propriedade Intelectual, e a Teoria da Responsabilidade Civil e o Direito do Consumidor, criaram fórmulas e conceitos que conferem tratamento adequado a esta matéria, sendo objeto de propriedade, e, portanto, o proprietário é responsável por todos os atos e defeitos que decorrem do uso e dos atos maquinais promovidos pelo robô.

A Teoria do Direito, os Direitos Humanos e a regulação cibernética

Por fim, tendo-se presente o que se disse anteriormente, enquanto o aumento da presença da máquinadesmancha, desordena e torna incerta a vida contemporânea, bem como as relações sociais, a forma do trabalho, as interações digitais, considerando-se as categorias que organizaram a modernidade pesada,81 o Direito tem a tarefa de regular os efeitos negativos deste processo, atuando na perspectiva da preservação de direitos e deveres, especialmente tomada a situação dos Direitos Humanos no espaço cibernético.82 Por isso, no Brasil, como em tantos outros países do mundo, a exemplo da França, começa a avultar uma legislação específica sobre as matérias digital e virtual, como apontam os mais de 11 textos legais sobre temas do Direito Digital, ou Direito Virtual.83

A tarefa do Direito, para fazer face à era do numérico e à era do digital, é a de consolidar a quarta dimensão dos direitos humanos - correspondendo à regulação da engenharia genética84 - e avançar, no sentido de tonar ainda mais claro o surgimento da chamada quinta dimensão dos direitos humanos - correspondendo à regulação da tecnologia da informação85 -, tendo-se em vista a importância de contornar por camadas de regras jurídicas o núcleo central da dignidade da pessoa humana.86 A exemplo do que ocorre na França, começa a despontar na legislação o tratamento dos seguintes temas, a serem traduzidos em termos de ‘novos direitos’: i.) um direito de abertura e circulação de dados (droit d´ouverture et de circulation des données);87 ii.) um direito ao apagamento dos dados pessoais (droit à l´effacement des données personnelles);88 iii.) diante das ideologias do corpo-máquina que afetam o direito ao envelhecimento, a defesa da dignidade humana na velhice;89 iv.) a luta contra a cibercriminalidade (la lutte contre la cybercriminalité);90 v.) a invasão da privacidade em face da liberdade de expressão (ménaces à la privacité en face de la liberté d´expréssion);91 vi.) a inovação nos métodos de participação política e a forma da democracia representativa.92 Estas são já algumas das possíveis perspectivas de ‘novos direitos’ em afloramento, considerada a experiência legislativa francesa. Mas, este é apenas o início de um mais longo processo - que não se pode aqui adiantar, e nem adivinhar -, considerando-se os desafios que ainda estão por vir, e que reclamarão, da Ciência do Direito e da Teoria do Direito, enormes esforços no sentido de sua re-invenção.

CONCLUSÕES

Este artigo procurou identificar - numa perspectiva teórico-crítica - o conjunto de mutações operadas pelo impacto das novas tecnologias, especialmente considerados os desafios para a Ciência do Direito - tendo-se presente o papel do Direito Digital -, para a Teoria do Direito - tendo-se presente o sensível capítulo dos Sujeitos de Direito -, e para os Direitos Humanos - tendo-se presentes os desafios para a proteção da dignidade da pessoa humana. Em especial, procurou-se abordar o problema do quanto os desafios trazidos pelas novas tecnologias re-modelam a Teoria do Direito, em muitas de suas categorias. Ali onde a revolução digital traz consigo inúmeras inovações - e altera a configuração das relações humanas e sociais - esta acaba por carregar também riscos e desafios, que foram aqui identificados e mapeados, sabendo-se que estes acabam por reclamar a implementação de novos direitos. É assim que na fronteira dos processos de modernização o Direito se renova e se redimensiona.

Tendo-se em vista estas reflexões, pode-se concluir que o reconhecimento de dignidade ao ‘cyborgue’ - à fusão homem-máquina - indica que a dignidade não é atributo do corpo-físico, ou ainda, muito menos, de seu estatuto epocal, enquanto ‘corpo-pós-trans-tecno’. O queer do ‘corpo’, em sua atual condição histórico-social, remodela a significação da categoria do Sujeito de Direito, incluindo-se aí a categoria do Sujeito Pós-humano de Direito, que é definido como sendo todo ‘corpo humano’ que foi alvo de modificação corporal por força da intervenção da tecno-ciência. O que se procurou demonstrar e defender neste artigo aponta para a ideia de que a dignidade é um atributo da pessoa humana, não importando a sua qualidade física ou biológica, modificada ou não, ou ainda, a aparência estética do corpo físico. A pessoa humana é merecedora da condição de Sujeito de Direito, mesmo que o ‘corpo físico’ se hibridize à ‘máquina’, ou ainda, que as modificações impostas pela nanotecnologia, pela tecnociência e pela biomedicina venham a acarretar significativas transmutações físico-corpóreas em indivíduos. Esse mesmo status não é atribuído ao ‘robô’, às ‘invenções robotizadas’ e ‘mecanizadas’, que devem ser entendidas como Objetos do Direito, alvo de simples status de propriedade.

Na fronteira de um novo tempo, onde os avanços são medidos em alta velocidade, os riscos são imediatamente maiores. Por isso, os avanços da nanotecnologia, da tecnologia da informação, da realidade virtual devem ser alvo de politização,93 de redemocratização94 e de discussão legal-jurídica, considerando seus efeitos e potencialidades de danos a direitos. Neste ponto, a observação crítico-reflexiva destas mudanças, a partir de um olhar teórico realista - fornecido pela Teoria do Humanismo Realista -95 tornou possível uma posição vantajosa de observação, na medida em que esta restabelece o sentido da centralidade da dignidade da pessoa humana como lugar de reflexão. Em verdade, no exercício de não se essencializar a pessoa humana, evitou-se o recurso ao antropocentrismo moderno - que isola o ‘corpo-homem’ da ‘natureza-objetificada’ -, e, permitiu-se enxergar nos dilemas humanos tudo aquilo que concerne aos desafios naturais, humanos, sociais e técnicos que venham a afetar a dimensão do humano, e suas derivações. Daí, a importância dos avanços da Ciência do Direito, conjuntamente com a renovação de fronteiras de compreensão da Teoria do Direito, em face destes novos e imensos desafios da ‘era digital’.

 

1A pesquisa sobre os novos direitos registra de forma aguçada esta sensibilidade teórica. A este respeito, consulte-se Wolkmer, Leite (orgs.) Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas, 3.ed., 2016. Neste sentido: “Os avassaladores avanços da tecnologia, da tecnociência, da inteligência artificial, dos sistemas de robótica e da informática avançada colocam, ainda uma importante questão, de instigante importância para a teoria dos sujeitos de direito” (BittarIntrodução ao estudo do direito: humanismo, democracia e justiça, 2018, p. 117).

2Cf. Pinheiro, O Direito Digital como paradigma de uma nova era, in Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas (WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato, orgs.), 3.ed., 2016, ps. 401-433.

3“Quelques précisions de vocabulaire doivent d´ores et déjà être livrées, afin d´expliquer pourquoi les termes de ‘numérique’, d´‘internet’, et de ‘cyberespace’ seront ici mobilisés dans un sens large”; “Algumas definições de vocabulário devem já estar presentes, a fim de explicar porque os termos ´numérico´, ´internet´´, e de ´cyberespaço’ serão aqui mobilizados em um sentido amplo” (tradução livre) (Giraudeau, Les obligations étatiques à l´ère du numérique: obligations nouvelles ou renouvelées?, in Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque (CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry), 2017, p. 130). ).

4“Em meu entender, tudo leva a crer, então, que o Direito se encontra tensionado por duas tendências contraditórias. De um lado, se o processo perverso prosseguir de modo ilimitado, acaba implodindo o próprio Direito através da ‘loucura’ do direito subjetivo. De outro lado, para continuar existindo, o Direito precisa afirmar a sua razão de ser, a sua normatividade, e estancar essa ‘loucura’, traçando limites para o mercado e para a atividade tecnocientífica” (SantosPolitizar as novas tecnologias: o impacto sociotécnico da informação digital e genética, 2.ed., 2011, p. 244-245).

5A este respeito, consulte-se estudo anterior: Bittar, Technique, Dehumanization and Human Rights, in Human Rights, Rule of Law and the Contemporary Social Challenges in Complex Societies: Proceedings of the XXVI World Congress of Philosophy of Law and Social Philosophy of the Internationale Vereinigunf für Rechts-und Socialphilosophie (GALUPPO, Marcelo; LOPES, Mônica Sette; SALGADO, Karine; GONTIJO, Lucas; BUSTAMANTE, Thomas, editors), 2015, ps. 1684-1711.

6Para uma visão mais ampla do problema, consulte-se estudo anterior: Bittar, Regulação do ciberespaço, fronteiras virtuais e liberdade: desafios globais, in Os direitos humanos no espaço virtual, Galileu: Revista de Economia e Direito (BITTAR, Eduardo C. B.; CAMPOS, Diogo Leite de), vol. XVII, no. 1/no. 2, 2012, 2012, ps. 37-80.

7Adorno, Horkheimer, Dialética do esclarecimento, 1985.

8 Benjamin, A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica, in Obras escolhidas, 7. ed., 1994, ps. 165-197.

9 HabermasTécnica e ciência como ideologia, 2001.

10Assim, as contribuições específicas e pontuais dos Autores(as) seguintes: BALLY, Romain, De nouveaux droits pour un nouveau Droit, in Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque (CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry), 2017; CANEVACCI, Massimo. Corpos polifônicos e tecnologias digitais, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, ps. 33-64; CAMARGO, Wagner Xavier; VAZ, Alexandre Fernandez.De humanos e pós-humanos: ponderações sobre o corpo queer na arena esportiva, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, ps. 119-144; CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry (sous la direction). Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque. Paris: Mare & Martin, 2017; COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre (orgs.). O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas. Rio de Janeiro: Vozes, 2012; DUNKER, Christian (et all.). Ética e pós-verdade. Porto Alegre: Dublinense, 2017.ENGELMANN, Wilson, O direito em face das Nanotecnologias: novos desafios para a Teoria Jurídica no século XXI, in Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas (WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato, orgs.), 3.ed., 2016, ps. 435-460; GIRAUDEAU, Géraldine, Les obligations étatiques à l´ère du numérique: obligations nouvelles ou renouvelées?, in Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque (CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry), 2017, p. 132; KEEN, Andrew, Inteligência artificial vai mudar todos os relacionamentos humanos, in Folha de São Paulo, Entrevista a Silas Martí, Segunda-Feira, 05 de Março de 2018, A 10; LE BRETON, David, Adeus ao corpo, in O home-máquina: a ciência manipula o corpo (NOVAES, Adauto, org.), São Paulo, Companhia das Letras, 2003, ps. 123-138; LÉVY, PierreAs tecnologias da inteligência: o futuro do pensamento na era da informática. 2.ed. Tradução de Carlos Irineu da Costa. São Paulo: Editora 34, 2016; RONDE, François Rossignol de laDroit des Technologies avancées. Tome 1. Libertés, Données et Fichiers. Bruxelles: La Charte, 2017. .

11Neste ponto, são vários os diagnósticos que confirmam esta análise, entre eles, na Alemanha, o de Hartmut Rosa: “By means of successive waves of acceleration through revolutions in transportation, transmission, and, most recently, transplantation (i.e., increases in speed through the organic fusion of body and machine, of genetic engineering and computer technology) we arrive at the victory of time over space” (RosaSocial acceleration: a new theory of modernity, 2015, p. 56). E, também, na França, o de Pierre Lévy: “A velocidade: jamais a evolução das ciências e das técnicas foi tão rápida, com tantas consequências diretas sobre a vida cotidiana, o trabalho, os modos de comunicação, a relação com o corpo, com o espaço, etc.” (LévyA inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço, 4.ed., 2003, p. 24).

12Sobre os fundamentos teóricos da Teoria do Humanismo Realista, consulte-se Bittar, Introdução ao estudo do direito: humanismo, democracia e justiça, 2018, p. 57 e ss. Nesta obra, poderá ser encontrado um tratamento mais aprofundado a diversas categorias que são mencionadas neste artigo, mas não desenvolvidas, a exemplo dos termos ´modernidade´, ´barbárie´, ´razão´, ´dignidade humana’, ´realismo’, termos estes que são de fundamental importância para a compreensão interna dos escopos da Teoria do Humanismo Realista.

13“Il y a toutefois des raisons scientifiques de douter qu´un tel avenir puisse jamais avenir. Poursouivant l´utopie d´une normativité entièrement calculable, la gouvernance par les nombres sape les bases même d´un calcul rationnel”; “Existe, no entanto, razões científicas para duvidar que um tal futuro pudesse chegar. Perseguindo a utopia de uma normatividade interiamente calculável, a governança pelos números sabota as bases de um cálculo racional” (tradução livre) (SupiotLa gouvernance par les nombres, 2015, p. 245). (SUPIOT, 2015).

14“O que significa que não há razão pura nem sujeito transcendental invariável” (LévyAs tecnologias dainteligência, 2.ed., 2016, p. 163).

15“Agora, a manifestação por excelência da potência da racionalidade instrumental não se expressa mais tanto na conquista do pesado, mas por meio da extrema miniaturização das tecnologias e do controle do infinitamente pequeno” (LipovetskyDa leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 124).

16“A entrada no mundo da nanotecnologia exigirá do Direito uma necessária revisão dos seus pressupostos integrantes da teoria jurídica, pois se trata de uma revolução tecnocientífica, que atinge os paradigmas científicos aceitos até o momento” (Engelmann, O direito em face das Nanotecnologias: novos desafios para a Teoria Jurídica no século XXI, in Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas (WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato, orgs.), 3.ed., 2016, p. 457).

17“Com a época hipermoderna, está em andamento uma segunda revolução que tem como centro os micros e as nanotecnologias, as tecnologias da informação e da comunicação (TIC). Revolução da miniaturização, das nanotecnologias e do digital: vivemos o tempo da leveza-mundo conduzida pelas novas tecnologias. Ela está no centro da civilização nascente do leve” (Lipovetsky, Da leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 115).

18“A passagem do século XX para o novo milênio reflete uma transição paradigmática da sociedade industrial para a sociedade da era virtual. É extraordinário o impacto do desenvolvimento da cibernética, das redes de computadores, do comércio eletrônico, das possibilidades da inteligência artificial e da vertiginosa difusão da internet sobre o campo do Direito, sobre a sociedade mundial e sobre os bens culturais do potencial massificador do espaço digital” (Wolkmer, Introdução aos fundamentos de uma Teoria Geral dos Novos Direitos, in Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas (WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato, orgs.), 3.ed., 2016, p. 32).

19Há íntima percepção destas mudanças já na obra de Zygmunt Bauman, como demonstram os trechos: “Nesse aspecto, nada mudou com a passagem da modernidade pesada à leve” (BaumanModernidade líquida, 2001, p. 139); ou ainda, neste outro trecho: “O trabalho sem corpo na era do software não mais amarra o capital: permite ao capital ser extraterritorial, volátil e inconstante” (Bauman, Modernidade líquida, 2001, p. 141).

20“Um dos traços mais característicos das sociedades modernas está vinculado ao avento das mudanças técnicas, sociais e culturais. O fenômeno não poupa nenhum setor: quer seja na produção, nos transportes, na comunicação, nas instituições, no direito, nas relações inter-humanas, na vida cotidiana, em toda parte há um aumento da velocidade, tudo sempre vai mais rápido...” (Lipovetsky, Da leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 111).

21“Le renvèrsement du règne de la loi au profit de la gouvernance par les nombres s´inscrit dans l´histoire longue du rêve de l´harmonie par le calcul, dont le dernier avatar – la révolution numérique – domine l´imaginaire contemporain”; “A reversão do reino da lei em favor da governança pelos números se inscreve dentro da longa história do sonho de harmonia pelo cálculo, do qual o último avatar – a revolução numérica – domina o imaginário contemporâneo” (tradução livre) (Supiot, La gouvernance par les nombres, 2015, p. 23).

22“O virtual é uma espécie de nova natureza. Assim como dizemos que a cultura é uma segunda natureza, podemos dizer que o virtual é a nossa terceira natureza” (TiburiPós-verdade, pós-ética: uma reflexão sobre delírios, atos digitais e inveja, in Ética e pós-verdade (DUNKER, Christian (et all.)), 2017, p. 120).

23A este respeito, vide Pinheiro, Direito digital, 4.ed., 2011.

24Para um diagnóstico mais preciso e detalhado destas mudanças, numa visão geral, mas ainda assim inicial do problema, consulte-se o estudo em Co-Autoria, publicado em Portugal: Bittar, Regulação do ciberespaço, fronteiras virtuais e liberdade: desafios globais, in Os direitos humanos no espaço virtual, Galileu: Revista de Economia e Direito (BITTAR, Eduardo C. B.; CAMPOS, Diogo Leite de), vol. XVII, no. 1/no. 2, 2012, 2012, ps. 37-80.

25Para um estudo detido do termo ‘ideologia’, leia-se De MeloDireito e ideologia, 2.ed., 2013.

26Cf. Kato, A nova arma de guerra, In Exame, 07/03/2018, Ano 52, N. 04, 2018, ps. 58-60.

27“It changes everything” (KeenThe internet is not the answer, 2015, Introduction).

28“A convergência das nanotecnologias, das biotecnologias, da robótica, das técnicas da informação e das ciências cognitivas abriu o caminho aos tecnoprofetas, às utopias pós-humanistas e transhumanistas que anunciam o advento do ciborgue, a fusão da humanidade e da máquina, o crescimento ilimitado de nossas capacidades físicas e mentais, a juventude eterna, a superação de nossa condição humana imperfeita e mortal” (Lipovetsky, Da leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 126).

29“A técnica torna-se uma religiosidade, um tecnoprofetismo, um caminho de salvação para libertar o homem de seus antigos limites, doravante sentidos como pesados fardos” (Le Breton, Individualização do corpo e tecnologias contemporâneas, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, p. 26).

30A exemplo de McLuhanOs meios de comunicação como extensão do homem, 1969.

31A este respeito, https://ieet.org/index.php/IEET2/more/pearce20140920, Acesso em 26.03.2018.

32 Consulte-sehttp://www.extropy.org. Acesso em 26.03.2018.

33 A este respeitohttps://www.fhi.ox.ac.uk/, Acesso em 26.03.2018.

34“Uma boa parte daquilo a que chamamos de ‘racionalidade’, no sentido mais estrito do termo, equivale ao uso de um certo número de tecnologias intelectuais, auxílios à memória, sistemas de codificação gráfica e processos de cálculo que recorrem a dispositivos exteriores ao sistema cognitivo humano” (Lévy, As tecnologias dainteligência, 2.ed., 2016, p. 156).

35Lévy, As tecnologias da inteligência, 2.ed., 2016, p. 171.

36“Mas quaisquer que sejam os horrores cometidos pelas armas avançadas, ou na ocasião de desastres ecológicos, da destruição de meios de vida tradicionais, ou do estabelecimento de ambiente inumanos, é a coletividade humana que é responsável por tais agressões contra si mesma e contra outras formas de vida, não uma entidade exterior e separável que poderíamos culpar por todos os males, como uma espécie de bode expiatório conceitual” (Lévy, As tecnologias da inteligência, 2.ed., 2016, p. 197).

37“A tecnologia é tão perigosa quanto o nosso amor por ela” (Keen, Inteligência artificial vai mudar todos os relacionamentos humanos, in Folha de São Paulo, Entrevista a Silas Martí, Segunda-Feira, 05 de Março de 2018, A 10).

38A este respeito, consulte-se: Adorno; HorkheimerDialética do esclarecimento. Tradução de Guido Antonio de Almeida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985; Benjamin, A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: Obras escolhidas. Tradução de Sergio Paulo Rouanet, 7ª ed., São Paulo: Brasiliense, 1994, p. 165-197; HabermasTécnica e ciência como ideologia. Tradução de Artur Morão. Lisboa: Edições 70, 2001. Ademais, para um estudo aplicado ao campo do Direito, com pressupostos bem estabelecidos na reflexão sobre técnica e sociedade, videBittar, Ética, técnica e direitos humanos, in Revista Brasileira de Estudos Políticos, Revista de Pós-Graduação da Faculdade de Direito da UFMG, n. 103, Jul./Dez. 2011, ps. 139-182.

39“Animée par l´imaginaire cybernétique, la gouvernance ne repose plus, contrairement au gouvernement, sur la subordination des individus, mais sur leur programmation”; “Animada pelo imaginário cibernético, a governança não repousa mais, contrariamente ao governo, sobre a subordinação dos indivíduos, mas sobre a sua programação” (tradução livre) (Supiot, La gouvernance par les nombres, 2015, p. 48).

40“Um dos traços da cultura atual é a proliferação de textos. Nunca se escreveu e se leu tanto, ainda que o analfabetismo funcional e político continue crescendo e aparecendo. Ideias e opiniões configuram-se como narrativas em um universo de textualidades diversas. A pós-verdade transita entre textos verbais e imagéticos como uma produção publicitária, a verdade para ver, sem necessariamente ser verdade.” (Tiburi, Pós-verdade, pós-ética: uma reflexão sobre delírios, atos digitais e inveja, in Ética e pós-verdade (DUNKER, Christian (et all.)),2017, p. 114).

41“Fica claro que a pós-verdade não pode ser pensada apenas como expressão e desdobramento de uma cultura pós-moderna. Ela inverte as narrativas da cidade, da viagem e do corpo em uma disciplina personalista da vontade. Ela parasita a educação com valores regressivos ligados à família. Ela retorna à figura parasita do pai-chefe administrador eficiente como forma de desviar-se da política. Em todos os casos, temos uma inversão sem contradição e, portanto, uma subjetividade que pensa com dificuldade sua própria temporalidade...” (Dunker, Subjetividade em tempos de pós-verdade, in Ética e pós-verdade (DUNKER, Christian (et all.)), 2017, p. 40).

42“Ao espectro da verdade pertence o termo pós-verdade. Conceito que coloca em questão o fim da verdade como um valor maior. Se não seu fim, pelo menos está em jogo a sua inutilidade. Com a ideia de pós-verdade, trata-se de falar de uma verdade útil. Da verdade consumível e consumida. A verdade possível quando a forma mercadoria dita que ela mesma é a verdade” (Tiburi, Pós-verdade, pós-ética: uma reflexão sobre delírios, atos digitais e inveja, in Ética e pós-verdade (DUNKER, Christian (et all.)), 2017, p. 107).

43“A partir dessas considerações extemporâneas, da reflexão sobre ao não lugar da ética, parece evidente que a era da pós-verdade é a época em que nenhuma ética é mais possível” (Tiburi, Pós-verdade, pós-ética: uma reflexão sobre delírios, atos digitais e inveja, in Ética e pós-verdade (DUNKER, Christian (et all.)), 2017, p. 112).

44“O sujeito pós-moderno e fragmentário, aprisionado ao fluxo do consumo e aos sinais que ele deixa perceber, externamente, carece de interioridade” (Le Breton, Individualização do corpo e tecnologias contemporâneas, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, p. 23).

45A concepção é de Pierre Lévy: “Longe de permanecer a guardiã de um templo reservado, a tecnociência é um motor que traz consigo a evolução acelerada, caótica das sociedades contemporâneas” (Lévy, A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço, 4.ed., 2003, p. 179).

46“Tudo isso parece indicar que na verdade, com a perda do humano, o próprio sujeito de direito entrou em crise” (SantosPolitizar as novas tecnologias: o impacto sociotécnico da informação digital e genética, 2.ed., 2011, p. 240).

47“Pensar o corpo é uma outra maneira de pensar o mundo e o vínculo social: uma desordem introduzida na configuração do corpo é uma desordem introduzida na coerência do mundo” (Le Breton, Adeus ao corpo, in O home-máquina: a ciência manipula o corpo (NOVAES, Adauto, org.), 2003, p. 136).

48“É por meio desse ‘trabalho’ sobre o corpo sensível que se busca a leveza contemporânea” (LipovetskyDa leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 77).

49“É um processo disjuntivo que se afirma em não pura evolução modificada do terreno biológico em relação àquele tecnológico. São mutações constitutivas de corpos pós-orgânicos que constroem novos processos multissensoriais, por conta do novo transdisciplinar. Infobiologia, tecnologia da informação, cultura cibernética, neurochips” (Canevacci, Corpos polifônicos e tecnologias digitais, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, ps. 54-55).

50Cf. Lipovetsky, Da leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 77 e seguintes.

51“O eu que, após o extermínio metódico de todos os vestígios naturia como algo mitológico, não queira mais ser nem corpo, nem sangue, nem alma e nem mesmo um eu natural, constituiu, sublimado num sujeito transcendental ou lógico, o ponto de referência da razão, a instância legisladora da ação” (Adorno, Horkheimer, Dialética do esclarecimento, 1985, p. 41).A este respeito, consulte-se: BittarO direito na pós-modernidade,3.ed., 2014, p. 27 e seguintes.

52“Para a civilização, a vida no estado natural puro, a vida animal e vegetativa constituía o perigo absoluto” (Adorno, Horkheimer, Dialética do esclarecimento, 1985, p. 42).

53“Já não é mais o computador que é visto como um instrumento, mas o homem, que se torna um apêndice irrisório daquele, e que freia seus desempenhos” (Le Breton, Individualização do corpo e tecnologias contemporâneas, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, p. 30).

54Cf. Habermas, Técnica e ciência como ideologia, 2001.

55“Seria o caso, contudo, de indagar se o avanço da tecnociência já não tornou obsoletos os critérios que balizavam a concepção moderna do homem” (Santos, Politizar as novas tecnologias: o impacto sociotécnico da informação digital e genética, 2.ed., 2011, p. 265).

56“No mundo gnóstico do ódio ao corpo que é antecipado por parte da cultura virtual, o paraíso é necessariamente um mundo sem corpo, equipado de chips eletrônicos de modificações genéticas ou morfológicas” (Le Breton, Adeus ao corpo, in O homem-máquina: a ciência manipula o corpo (NOVAES, Adauto, org.), 2003, p. 136).

57“Corpos espetaculares, potencializados, hígidos, eficientes, performantes e ciborguizados pela técnica! Corpos amalgamados às máquinas, chips, fármacos, próteses, antidepressivos, estimulantes, estratégias genéticas que objetivam prolongar a vida e potencializar a existência” (Goellner, Silva, Biotecnologia e neoeugenia: olhares a partir do esporte da cultura fitness, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, ps. 187-188).

58“A época hipermoderna é aquela que faz com que o princípio da leveza passe do estágio estético ao estágio demiúrgico tecnocientífico” (Lipovetsky, Da leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 112).

59Daí, a tarefa de transferência do espírito para dentro das máquinas: “Somente o computador é um lugar infinitamente propício para abrigar o espírito, visto que o homem é uma criatura fisicamente imperfeita demais” (Le Breton, Individualização do corpo e tecnologias contemporâneas, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, p. 31).

60Gilles Lipovetsky discute este conceito: “Não será mais o ´biopoder´(Foucault) exercendo-se por meio de medidas maciças sobre as populações, mas um nanopoder que, ao investir no infinitamente pequeno, decompõe e recompõe a matéria como em um jogo de Lego” (Lipovetsky, Da leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 125). Na mesma linha, Pierre Lévy: “Assim como a nanotecnologia constrói suas moléculas átomo por átomo, a nanopolítica cultiva seus hipercórtex comunitários da maneira mais fina, mais precisa, mais individualizada possível, favorecendo a conexão delicada das capacidades cognitivas, das fontes frágeis de iniciativa e imaginação, qualidade por qualidade, de modo a evitar todo desperdício da riqueza humana” (Lévy, A inteligência coletiva: por uma antropologia do ciberespaço, 4.ed., 2003, p. 57).

61Vide Adorno, Horkheimer, Dialética do esclarecimento, 1985, p. 39 e ss. A este respeito, consulte-se: Bittar, O direito na pós-modernidade, 3.ed., 2014, p. 27 e ss.

62A este respeito, videMarcuse, Ecologia e crítica da sociedade moderna, in Herbet Marcuse: a grande recusa hoje(LOUREIRO, Isabel, org.), 1999, ps. 143-154. Também, vide Fromm, Anatomia da destrutitividade humana, 2.ed., 1987, p. 435 e seguintes.

63“Mas agora, as relações de implicação e de hibridação entre homens, máquinas, seres vivos e seres inanimados são tantas e de tamanha envergadura que a própria natureza humana parece posta radicalmente em questão, suscitando inclusive a indagação sobre o futuro da espécie, não mais em virtude de um perigo de extinção criado pelo holocausto nuclear, mas pela sua ‘superação’ ” (Santos, Politizar as novas tecnologias: o impacto sociotécnico da informação digital e genética, 2.ed., 2011, p. 271).

64“As novas ciências da vida sonham com a possibilidade de reprogramar os corpos humanos para torná-los imunes às doenças, driblando assim as penúrias da velhice e a fatalidade de morte” (Sibilia, Imagens de corpos velhos: a moral da pele lisa nos meios gráficos e audiovisuais, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), 2012, p. 146). (SIBILIA, 2012).

65“Estamos agora em um cosmo dominado simultaneamente pela velocidade e pela corrida da miniaturização e da desmaterialização” (Lipovetsky, Da leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 112).

66“Autorisant une extériorisation de certaines facultes cérébrales de l´être humain, il ouvre une ère nouvelle dans notre rapport aux machines, aussi bien que dans le contenu et l´organization de notre travail”; “Autorizando uma exteriorização de certas faculdades cerebrais do ser humano, abre-se uma nova era na nossa relação com as máquinas, tanto quanto com o conteúdo e a organização do trabalho” (tradução livre) (Supiot, La gouvernance par les nombres, 2015, p. 42).

67“O trans-humanismo persegue o sonho de um homem não sofredor, inalterado pelas emoções, mestre de si mesmo e imortal. Última versão a ser teleinstalada de uma velha história” (Le Breton, Individualização do corpo e tecnologias contemporâneas, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, p. 31).

68“A análise política ficcional parece conceber o cyborg como o último elo na linha evolutiva macaco-homem-cyborg; este configuraria o devir da espécie humana, assim como o macaco configurou o seu passado” (Santos, Politizar as novas tecnologias: o impacto sociotécnico da informação digital e genética, 2.ed., 2011, p. 278).

69“Sujeitos de direito são todos os seres e entes dotados de capacidade para adquirir ou exercer titularidades de direitos e respondem por deveres jurídicos. Nesse sentido, o conceito de sujeito de direito é mais amplo que o de pessoa jurídica, que fica abrangido por ele. Em outras palavras, há sujeitos de direito que não são pessoas físicas ou jurídicas” (LôboDireito Civil: Parte Geral, 3 ed., p. 99).

70“Comme toute idéologie ayant perdu le sens de la limite, l´anarcho-capitalisme est condamné à trouver sa limite catastrophique. (...). L´implosion financière de 2008 nous a donné un avant-goût de cette limite catastrophique (...)”; “Como toda ideologia que perceu o senso do limite, o anarco-capitalismo está condenado a encontrar seu limite catastrófico. (...) A implosão financeira de 2008 nos deu o gosto deste limite catastrófico (...)” (tradução livre) (Supiot, La gouvernance par les nombres, 2015, p. 409).

71“Se na eugenia a centralidade era ocupada pelos corpos hereditariamente bem-nascidos, na eugenia isso já não faz tanto sentido, sobretudo porque carrega o desejo de superação pela biotecnologia. São justamente os investimentos nos corpos deficientes que se tornam elementos fundantes dessa neoeugenia” (GOELLNER, Silvana Vilodre; SILVA, André Luiz dos SantosBiotecnologia e neoeugenia: olhares a partir do esporte da cultura fitness, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, p. 197).

72Neste ponto, prevê-se um crescimento do setor de 16,8 bilhões (2017) para 30 bilhões (2022). Cf. KATO, Rafael. A nova arma de guerra. In Exame, 07/03/2018, Ano 52, N. 04, 2018, ps. 58-60.

73Foi esta a tese discutida e defendida neste artigo, fundada na defesa dos Direitos da Personalidade. A este respeito, consulte-se: Bittar, Clonagem: fenômeno e disciplina jurídica, in Repertório IOB de Jurisprudência, 2ª quinzena de junho de 1998, nº 12/98, texto 3/ 14482.

74“Escravidão é uma relação jurídica e significa que uma pessoa dispõe de uma outra como de sua propriedade. Portanto, ela é incompatível com os conceitos constitucionais vigentes hoje em dia de direitos humanos e de dignidade humana” (Habermas, A constelação pós-nacional: ensaios políticos, 2001, p. 201); “De qualquer modo, no âmbito da ordem jurídica democrática, os cidadãos só podem usufruir da autonomia igualitária, privada e pública caso todos se reconheçam reciprocamente como autônomos” (Habermas, A constelação pós-nacional: ensaios políticos, 2001, p. 211).

75“A biologia não pode nos tomar as reflexões morais. E a bioética não deveria nos levar por descaminhos biológicos” (Habermas, A constelação pós-nacional: ensaios políticos, 2001, p. 214).

76“O designer fixa de modo irrevogável e assimétrico a figura inicial do seu produto – fundamentalmente sem deixar aberta a possibilidade de uma troca de papéis” (Habermas, A constelação pós-nacional: ensaios políticos, 2011, p. 218).

77“Indicações como essas apontam a emergência de um neoeugenismo, pois, de certo modo, trazem para outro tempo e lugar alguns preceitos edificados pela eugenia, ciência da melhoria da espécie; um movimento político e científico que visava melhorar a condição hereditária humana” (Goellner, Silva, Biotecnologia e neoeugenia: olhares a partir do esporte da cultura fitness, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), 2012, p. 189).

78“Se estamos no caminho de um corpo perfeito (eficaz, belo, jovem, duradouro e multissexuado), do aperfeiçoamentro sem fim, é preciso considerar que não somos movidos por um processo de tunning (incremento externo) da carcaça de nosso corpo. Não sabemos, ainda, quais serão as transformações que os componentes bioeletrônicos, moleculares e prostéticos extensores ao nosso corpo obsoleto, nos trarão no futuro” (Camargo, Vaz, De humanos e pós-humanos: ponderações sobre o corpo queer na arena esportiva, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), 2012, p. 138).

79“Se o queer produz desidentificação, caoticidade e tensiona o sistema-corpo da forma como ainda é colocado, independente de nossas concordâncias e discordâncias, há que se admitir que talvez estejamos diante de um momento pós de considerações sobre o bio/trans/tecno/metacorpo humano” (Camargo, Vaz, De humanos e pós-humanos: ponderações sobre o corpo queer na arena esportiva, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), 2012, p. 142).

80“Para Hugues, a cidadania não é mais privilégio do humano, mas doravante ela deve ser compartilhada com o citizen cyborg, tornado nosso próximo” (Le Breton, Individualização do corpo e tecnologias contemporâneas, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), Rio de Janeiro, Vozes, 2012, p. 27).

81“Com as novas tecnologias da informação e da comunicação (TIC´s), a desmateralização consiste na transformação de atividades físicas ou com suporte material em atividades imateriais tornadas possíveis pelas ferramentas informáticas” (Lipovetsky, Da leveza: rumo a uma civilização sem peso, 2016, p. 121).

82A este respeito, consulte-se Bittar, Regulação do ciberespaço, fronteiras virtuais e liberdade: desafios globais, in Os direitos humanos no espaço virtual, Galileu: Revista de Economia e Direito (BITTAR, Eduardo C. B.; CAMPOS, Diogo Leite de), vol. XVII, no. 1/no. 2, 2012, Lisboa, Portugal, 2012, ps. 37-80. Também: “Par son interpretation restrictive, il répond à la primauté donnée à l´humain, au citoyen, sur l´informatique qui doit demeurer à son servisse. Hier comme demain, l´informatique ne devra porter atteninte ni à l´identité humaine, ni aux droits de l´homme, ni à la vie privée, ni aux libertés individuelles ou pulbiques”; “Por sua interpretação restritiva, isto responde ao primado conferido ao humano, ao cidadão, sobre a informática que deve estar a seu serviço. Ontem, como amanhã, a informática não deverá atacar nem a identidade humana, nem os direitos humanos, nem a vida privada, nem as liberdades individuais ou públicas” (tradução livre) (Ronde, Droit des Technologies avancées, Tome 1, 2017, p. 188). “Um tema que perpassa os mencionados ‘novos direitos’, como um tema transversal, é o risco que as nanotecnologias poderão gerar em relação ao ser humano e ao meio ambiente, os quais são elementos estruturantes da noção de Direitos Humanos” (Engelmann, O direito em face das Nanotecnologias: novos desafios para a Teoria Jurídica no século XXI, in Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas (WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato, orgs.), 3.ed., 2016, p. 444).

83“Logo, o legislador também está estudando e aplicando o direito digital na formação de marcos legais mais específicos, tais como a Lei do Processo Eletrônico (2006), a Lei da Pornografia Infantil na Internet (2008), a Lei do Teletrabalho (2011), a Lei de Acesso a Informação (2011), a Lei de Crimes Eletrônicos (2012), a Lei de Digitalização (2012), o Decreto do Comércio Eletrônico (2013), a Lei de Obtenção de Provas Eletrônicas no Processo Penal (2013), a Lei do Marco Civil da Internet (2014) e as discussões dos anteprojetos de Proteção de Dados Pessoais (2015) e de Direitos Autorais (2015)” (Pinheiro, O Direito Digital como paradigma de uma nova era, in Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas (WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato, orgs.), 3.ed., 2016, p. 413).

84“São os ´novos´ direitos referentes à biotecnologia, à bioética e à regulação da engenharia genética. Trata dos direitos específicos que têm vinculação direta com a vida humana, como a reprodução humana assistida (inseminação artificial), aborto, eutanásia, cirurgias intrauterinas, transplantes de órgãos, engenharia genética (´clonagem´), contracepção e outros” (Wolkmer, Introdução aos fundamentos de uma Teoria Geral dos Novos Direitos, in Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas (WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato, orgs.), 3.ed., 2016, p. 29).

85“São os ´novos´ direitos advindos da sociedade e das tecnologias de informação (internet), do ciberespaço e da realidade virtual em geral” (Wolkmer, Introdução aos fundamentos de uma Teoria Geral dos Novos Direitos, in Os novos direitos no Brasil: natureza e perspectivas – uma visão básica das novas conflituosidades jurídicas (WOLKMER, Antonio Carlos; LEITE, José Rubens Morato, orgs.), 3.ed., 2016, p. 31).

86A este respeito, consulte-se Bittar, Introdução ao Estudo do Direito: humanismo, democracia e justiça, 2018, p. 83 e ss.

87Cf. Zolynski, Célia, La loyauté des plateformes pensée par la loi pour une République numérique, in Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque (CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry), 2017, p. 117).

88“Le droit à l´effacement est instauré aux fins de proteger l´individu”; “O direito ao apagamento é instaurado com a finalidade de proteger o indivíduo” (tradução livre) (Mallet-Poujol, Nathalie, Le droit à l´effacement des données personnelles, in Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque (CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry), 2017, p. 85).

89“Assim, em meio a uma crescente tirania das aparências juvenis, a velhice é censurada como algo obsceno e vergonhoso, que deveria permanecer oculto, fora da cena, e sem ambicionar a tão cotada visibilidade” (Sibilia, Imagens de corpos velhos: a moral da pele lisa nos meios gráficos e audiovisuais, in O triunfo do corpo: polêmicas contemporâneas (COUTO, Edvaldo Souza; GOELLNER, Silvana Vilodre, orgs.), 2012, ps. 149-150).

90Cf. Giraudeau, Les obligations étatiques à l´ère du numérique: obligations nouvelles ou renouvelées?, in Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque (CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry), 2017, p. 132.

91“La révolution numérique oblige également à repenser la façon dont doivent être mis en oeuvre les engagements étatiques existants. Ceci est particulièrement remarquable em matière de droits de l´homme, l´usage du numérique entraînant par exemple une menace pour le droit au respect de la vie privée et le droit à la liberte d´expression” (Giraudeau, Les obligations étatiques à l´ère du numérique: obligations nouvelles ou renouvelées?, in Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque (CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry), 2017, p. 137).

92“Il devient en quelque sorte un trait d´union, renforçant le lien social qu´il contribue à tisser. (...) cette initiative rompt avec la conception quelque peu malheureuse d´une démocratie représentantive où la participation du citoyen se résume et s´épuise dans le vote” (Bally, De nouveaux droits pour um nouveau Droit, in Numérique: nouveaux droits, nouveaux usages; actes de Colloque (CHATRY, Sylvain; GOBERT, Thierry), 2017, p. 258).

93“De todo modo, à biologização crescente da política, já apontada por Foucault desde meados dos anos 1970, devemos responder agora com a politização da biologia, da tecnociência e da tecnologia. Se a vida tornou-se uma questão política, a política tornou-se uma questão vital” (Santos, Politizar as novas tecnologias: o impacto sociotécnico da informação digital e genética, 2.ed., 2011, p. 318).

94“Un premier pas dans cette direction serait la restauration du principe de démocratie, non seulement dans la sphère politique où il est aujourd´hui mis à mal par l´Union européenne, mais aussi dans la sphère économique, en rendant à ceux qui travaillent une prise sur l´objet et le sens de leur travail”; “Um primeiro passo nesta direção seria a instauração do princípio da democracia, não somente na esfera política onde hoje se está mal colocado pela União Européia, mas também na esfera econômica, rendendo aos que trabalham uma capacidade de controlarem o objeto e de conferirem sentido ao seu trabalho” (tradução livre) (Supiot, La gouvernance par les nombres, 2015, p. 416).

95A este respeito, consulte-se Bittar, Introdução ao Estudo do Direito: Humanismo, Democracia e Justiça, 2018, p. 10 e ss.

 

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Sobre o autor

Eduardo C. B. Bittar Professor Associado do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo. Foi Presidente da Associação Nacional de Direitos Humanos (ANDHEP, 2009-2010). Foi Membro Titular do Conselho da Cátedra UNESCO de “Educação para a Paz, Direitos Humanos, Democracia e Tolerância” do Instituto de Estudos Avançados da USP (2007-2010). Foi Membro do Comitê de Área do Direito - CAPES (2010). Foi 2º. Vice-Presidente da Associação Brasileira de Filosofia do Direito (ABRAFI – IVR/ Brasil, 2009-2016). Foi Visiting Professor da Università di Bologna (Bologna, Itália, 2017). Foi Visiting Professorda Université Paris Nanterre (França, Paris, 2018). Foi Visiting Professor do Collège de Francde (França, paris, 2019). É Membro Titular do Grupo de Pesquisas Direitos Humanos, Democracia, Política e Memória do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo – IEA/ USP. É Pesquisador N-2 do CNPq. É Autor do livro Introdução ao Estudo do Direito: Humanismo, Democracia e Justiça (Saraiva, 2018), que contém a Teoria do Humanismo Realista, no campo da Teoria do Direito. E-mail: edubittar@uol.com.br

O autor é o único responsável pela redação do artigo.

 

A Teoria do Direito, a Era Digital e o Pós-Humano: o novo estatuto do corpo sob um regime tecnológico e a emergência do Sujeito Pós-Humano de Direito. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S2179-89662019000200933&lang=en>. Acesso em: 01 set. 2019.