Sucessão empresarial


Portiagomodena- Postado em 10 junho 2019

Autores: 
Elis Teixeira

INTRODUÇÃO

A reforma trabalhista trouxe uma importante mudança no que tange a sucessão empresarial, passou a prever expressamente a responsabilidade do sucessor e do sucedido.

A sucessão empresarial caracteriza-se com a transferência do estabelecimento sem que ocorra paralização da atividade, este fenômeno jurídico tem por objetivo proteger e garantir a manutenção dos benefícios do empregado que foram adquiridos no curso do contrato de trabalho, quando existir alteração na estrutura jurídica-econômica na empresa.

Essas alterações na estrutura da empresa não podem prejudicar o empregado, tendo em vista que o contrato de trabalho não está vinculado ao empregador, mas sim a empresa, a pessoalidade é um requisito indispensável apenas do empregado, ao empregador cabe a impessoalidade, com exceção do empregador doméstico, que não há sucessão trabalhista, incumbindo aos herdeiros o pagamento das verbas rescisórias devidas ao obreiro do lar.

Portanto, resta configurado nova pessoa jurídica quando ocupar o mesmo lugar, explorar o mesmo ramo e fazer uso dos mesmos utensílios. Independente da forma legal adotada, são elementos fáticos que caracterizam a alteração na propriedade sucedida, não sendo necessário que o empregado preste serviço para a empresa sucessora e o patrimônio que guarnece o estabelecimento serve como garantia para os créditos trabalhistas.

Com o advento da nova legislação, o empregador sucessor assume todas as obrigações decorrentes do contrato de trabalho, restando ao empregador sucedido, apenas responsabilização solidária se restar comprovado fraude na transferência.

O presente artigo, tem por objetivo discorrer sobre o instituto da sucessão trabalhista, abordando a regra após a entrada em vigor da lei nº13.467/2017, seus efeitos com relação aos créditos trabalhistas, hipóteses e requisitos para sucessão e a responsabilidade do sucessor.

 

 

SUCESSÃO EMPRESARIAL APÓS A REFORMA TRABALHISTA

 

A sucessão empresarial é um instituto previsto, originalmente, nos artigos 10 e 448, da CLT que continuam em vigor, tendo como fundamento os princípios da continuidade do trabalho, despersonalização do empregador e da inalterabilidade contratual lesiva, uma vez que a atividade econômica da empresa compradora continuaria existente. Ademais, a responsabilidade pelas dívidas e contratos de trabalhos anteriores à venda eram somente do sucessor.

Os princípios em conjunto com os avanços jurisprudenciais e doutrinários sobre a sucessão empresarial contraídos ao do desenvolvimento do Direito do Trabalho no país, foram utilizados de maneira basilar com intuito de dirimir os conflitos acerca do tema. Para Rogério N. Renzetti os princípios que regem a sucessão de empregadores são:

 

  1. Princípio da continuidade da relação de emprego - este princípio, visa manter o vínculo de emprego, preservando a relação de trabalho existente, mesmo na hipótese em que ocorra a sucessão de empregadores.
  2. Princípio da despersonalização da figura do empregador - a relação de emprego não é intuitu personaeem relação à figura do empregador.
  3. Princípio da intangibilidade objetiva do contrato - este princípio implica a manutenção integral das cláusulas e condições de trabalho (RENZETTI, 2018, p.147).

 

Com a nova legislação o artigo 448-A, parágrafo único, foi inserido na regência normativa e passou a prever que a responsabilidade das obrigações trabalhistas são do sucessor e caso configurada fraude, o sucedido responderá solidariamente com o sucessor, o legislador não mudou o entendimento que estava consolidando previamente pela jurisprudência e doutrina.

Com objetivo de compreender a sucessão de empregadores, Renato Saraiva e Rafael Tonasi conceituam:

 

Sucessão de empregadores é a alteração subjetiva do contrato de trabalho (polo do empregador), com a transferência da titularidade do negócio de um titular (sucedido) para outro (sucessor), assumindo o novo titular do empreendimento todos os direitos e dívidas existentes.

O contrato de trabalho em relação ao empregado é intuitu personae, ou seja, o obreiro deve prestar os serviços pessoalmente, não podendo fazer-se substituir por outro empregado (caráter infungível).

No entanto, em relação ao empregador, a regra é que o contrato de trabalho não seja intuitu personae, operando-se a vinculação do pacto de emprego com o empreendimento empresarial, independentemente de seu titular, prevalecendo o princípio da despersonalização do empregador, que permite a alteração contratual subjetiva da figura do empregador (SARAIVA, 2018, p. 79 e 80).

 

Outrossim, a atividade do empregado exige o preenchimento do requisito da pessoalidade, mas o empregador pode ser substituído a qualquer tempo na relação empregatícia, sendo a despersonificação uma das principais características do empregador e serve para assegurar a efetividade do princípio da continuidade da relação de emprego, possibilitando a existência da sucessão, o vínculo do empregado se estabelece em relação a empresa e não em relação à pessoa do empregador.

Outra característica do empregador é a alteridade, o risco da atividade econômica deve ser suportado pelo empregador. O empregado não suporta os riscos da atividade econômica. Deste modo, pouca produção e baixa lucratividade não autoriza o empregador a redução de salários dos seus empregados.

 

 

HIPÓTESES E REQUISITOS PARA SUCESSÃO

 

São hipóteses de sucessão para fins trabalhistas, a mudança na propriedade da empresa ou alguma alteração significativa na sua estrutura jurídica, como fusão, incorporação e cisão de empresas, contratos de concessão e arrendamento e também as privatizações de antigas estatais, a empresa continua utilizando-se dos serviços dos empregados da sucedida.

Para que ocorra a sucessão empresarial é imprescindível o preenchimento de dois requisitos, a transferência do estabelecimento, possibilitando que o sucessor continue explorando a atividade econômica do sucedido, cumpre ressaltar que a transferência de uma parte, sem que possibilite a continuidade da atividade, não configura sucessão, a não ocorrência de paralisação da atividade é o segundo requisito, depois da sucessão, o sucessor deve dar continuidade ao empreendimento, sem interrupção da prestação de serviço. 

Destarte, nas palavras de Mauro Schiavi:

 

(...) são requisitos da sucessão para fins trabalhistas:

a) transferência de uma unidade empresarial econômica de produção de um titular para outro;

b) inexistência de solução de continuidade do contrato de trabalho, vale dizer: o empregado da empresa sucedida deve trabalhar para a empresa sucessora.

 

Contudo, parte da doutrina, com apoio da jurisprudência, entende não ser necessário que o empregado tenha prestado serviços para a empresa sucessora, apenas a transferência de uma unidade de produção da empresa para outra é suficiente para caracterizar a sucessão para fins trabalhistas. Nesse diapasão Schiavi esclarece:

 

Pensamos estar correta a moderna doutrina ao exigir apenas o requisito da transferência da unidade econômica de produção de um titular para outro para que se configure a sucessão, pois os arts. 10 e 448, da CLT não exigem que o empregado tenha trabalhado para a empresa sucedida. Além disso, tal interpretação está em consonância com o princípio protetor e propicia maior garantia de solvabilidade do crédito trabalhista (SHIAVI, 2018, p. 136).

 

Ainda que a sucessão tenha se dado apenas de forma parcial, o sucessor é responsável pelas obrigações trabalhistas a ela relativas. A alteração na estrutura jurídica-econômica da empresa, não afeta o direito dos trabalhadores já desligados da parte do empreendimento por ela compreendida, a exemplo da cisão, caso em que o sucessor responde pelas obrigações trabalhistas que a ela dizem respeito, pois possui a propriedade da produção de determinado produto.

Desta forma, entende-se apropriada a exigência somente da transferência da unidade econômica de produção de um titular para outro para que se confirme a sucessão, pois essa interpretação protege o trabalhador, tendo em vista a natureza alimentar dos créditos trabalhistas.

 

 

REPONSABILIDADE DO SUCESSOR

 

A responsabilidade das empresas antes da reforma trabalhista ficava determinada pela doutrina e jurisprudência, pois não havia regramento específico, embora tal fenômeno já estivesse presente nas redações dos artigos 10 e 448 da CLT, o sucessor assumia o bônus e o ônus decorrentes da sucessão.

Nos ensina Mauricio Godinho Delgado:

 

Sucessão de empregadores é figura regulada pelos arts. 10 e 448 da CLT. Consiste no instituto justrabalhista em virtude do qual se opera no contexto da transferência de titularidade de empresa ou estabelecimento, uma completa transmissão de crédito e assunção de dívidas trabalhistas entre alienante e adquirente envolvidos (DELGADO, 2007, p.408).

 

Como dito anteriormente a CLT não possuía dispositivo correspondente ao atual artigo 448-A, por isso cabia a jurisprudência e doutrina a determinação da responsabilidade do sucessor. O novo titular assume não apenas o ativo, mas também o passivo do novo negócio, incluindo os contratos de trabalho que estão em curso.

Assim, os contratos de trabalho em vigor no momento da sucessão são de responsabilidade da empresa sucessora, todas as obrigações trabalhistas, inclusive as precedentes à sucessão, são transferidas diretamente.

Desse modo, a transferência de reponsabilidade é a regra geral sucessória. Todavia, existem exceções no que se refere a regra geral reproduzida pelo caput do art. 448-A.

O disposto na OJ 225 da SDI-1 do TST, menciona os efeitos da sucessão trabalhista em contratos subsequentes de concessão de serviço público. No seu inciso I traz a hipótese de rescisão do contrato de trabalho após a entrada em vigor da concessão, a segunda concessionária, na condição de sucessora, responde pelos direitos decorrentes do contrato de trabalho, sem prejuízo da responsabilidade subsidiária da primeira concessionária pelos débitos trabalhistas contraídos até a concessão.

Como complemento o inciso II da mesma, no que tange ao contrato de trabalho extinto antes da vigência da concessão, a responsabilidade pelos direitos dos trabalhadores será exclusivamente da antecessora.

Ademais, a nova lei trabalhista traz uma exceção no que tange a responsabilidade em situações fraudulentas nas operações interempresariais sucessórias. O parágrafo único do art. 448-A, prevê expressamente que quando ficar comprovada fraude na transferência, a empresa sucedida responderá solidariamente com a sucessora.

Parte da doutrina e jurisprudência, tem entendido que, a reponsabilidade subsidiária subsiste, mesmo não havendo fraude, em circunstâncias que a empresa sucessora não possua patrimônio suficiente para solver as obrigações trabalhista.

Nesse lastro, observa Schiavi:

A responsabilidade subsidiária da empresa sucedida se justifica como medida inibidora de fraudes e encontra suporte nos princípios constitucionais da livre-iniciativa, valores sociais do trabalho, dignidade da pessoa humana do trabalhador (arts. 1o e 170, da CF) e também da função social da empresa e da propriedade (art. 5o da CF) (Schiavi, 2018, p.139).

 

No mesmo sentido Renato Saraiva:

 

(...) a doutrina e a jurisprudência trabalhista têm admitido a responsabilização subsidiária da empresa sucedida, integrando o polo passivo de eventual reclamação trabalhista (litisconsórcio), quando verificado que a sucessão deu-se com intuito fraudatório, objetivando lesar os direitos trabalhistas dos obreiros, ou mesmo nos casos em que, embora não configurada a má-fé, a empresa sucessora não possua saúde financeira para arcar com os créditos trabalhistas dos pactos laborais anteriormente mantidos com a sucedida (SARAIVA,2018, p. 83).

 

Para demonstrar a sucessão, a prova pode ser apontada através de indícios e presunções, de transferência do fundo de comércio, transferência do principal bem imaterial da atividade, dentre outros elementos. Entretanto, a mera transferência de maquinas e de objetos utilizados para produção ou a simples compra do imóvel empresarial não configuram sucessão.

A sucessão trabalhista pode ser reconhecida em qualquer fase processual, ocasionando, inclusive, o direcionamento da execução contra empresa que não fez parte do processo de conhecimento.  

Nesse sentido, Mauro Schiavi expõe que:

 

A sucessão de empresas pode ser reconhecida pelo Juiz do Trabalho em qualquer fase do processo, inclusive na execução, uma vez que o sucessor tem a chamada responsabilidade patrimonial, independentemente de ter figurado na fase de conhecimento, seus bens podem ser atingidos (SCHIAVI, 2018, p.137).

Ainda que não tenha participado da fase de conhecimento, o sucessor pode figurar no polo passivo da execução, resguardando o direito constitucional de resposta, sendo concedido ao sucedido a oportunidade de defender-se amplamente, passando o novo titular a responder imediatamente pelos contratos de trabalho que lhe forem transferidos.

A empresa sucedida pode atuar na lide como terceira interessada, pois a empresa sucessora pode cobrar dela os créditos trabalhista que foi obrigada a dar quitação, do período em que o empregado laborou para a sucedida.

Nesse contexto, ainda que a empresa sucessora celebre com a sucedida contrato com cláusula que exclui sua responsabilidade pelos débitos trabalhistas, essa cláusula não possui validade perante a legislação trabalhista.

 

 

CONCLUSÃO

 

A lei 13467/2017 em seus artigos 10, 448 e 448-A que tratam do instituto da sucessão empresarial, consolidaram o entendimento jurisprudencial e doutrinário preponderante, o instituto não sofreu nenhuma contenção, ao contrário, foi ampliado e fortalecido com a reforma trabalhista.

 O complemento dado pela norma dispõe expressamente que as obrigações trabalhistas, inclusive, as contraídas a época que o empregado laborava para a sucedida, são empresa sucessora, destacando que a empresa sucedida reponde solidariamente com a sucessora, caso fique comprovada fraude.

A sucessora automaticamente passa a responder por todos os direitos e obrigações contratuais existentes, bem como todas as suas repercussões, com intuito de respaldar o empregado, para que as alterações na estrutura da empresa não afetam os pactos laborais.

Eventuais cláusulas contratuais restritivas de responsabilização, ou de não responsabilização da empresa sucessora, não possuem validade alguma para o Direito do Trabalho, em razão da natureza cogente das normas trabalhistas que regem o instituto sucessório.

Com exceção da hipótese de fraude, a empresa sucedida, não possui qualquer tipo de responsabilidade pelos créditos trabalhistas anteriores à transferência. Contudo, a jurisprudência e parte da doutrina, vem se posicionando no sentido de que a empresa sucedida responde subsidiariamente nos casos em que a transferência tenha gerado impossibilidade de adimplemento dos créditos trabalhistas.

Por fim, observa-se que as alteração advindas da reforma trabalhista, no que tange ao instituto da sucessão empresarial, trouxe maior garantia ao trabalhador, pois qualquer alteração na estrutura jurídica-econômica da empresa, não afetará os contratos de trabalho dos empregados, permanecendo o liame empregatício intangível com o novo empregador.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

REFERÊNCIAS

 

BRASIL. Lei nº 13.467 de 13 de julho de 2017. CLT – Reforma Trabalhista. 25. ed. - São Paulo: Saraiva, 2018.

CORREIA, Henrique. Direito do Trabalho para os concursos de analista do TRT e MPU. 11. ed. Salvador: Juspoivm, 2018.

DELGADO, Mauricio Godinho. A reforma trabalhista no Brasil: com os comentários à Lei n. 13.467/2017 I Mauricio Godinho Delgado, Gabriela Neves Delgado. São Paulo : LTr, 2017.

DELGADO, Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 16. ed. São Paulo: LTr, 2017.

PEREIRA, Leone. Manual de Processo do Trabalho. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2018.

RENZETTI, Rogério. Direito do trabalho I. - 4. ed. rev. atual. e ampl. – São Paulo: Forense, 2018; São Paulo: MÉTODO, 2018.

SARAIVA, Renato, Aryanna Linhares, Rafael Tonassi. CLT: Consolidação das Leis do Trabalho. 22. ed. Salvador: Juspodivm, 2018.

SARAIVA, Renato, Rafael Tonassi. Direito do trabalho para concursos público. 20. ed. Salvador: Juspodivm, 2018.

SCHIAVI, Mauro. A reforma trabalhista e o processo do trabalho: aspectos processuais da Lei n. 13.467/17. 1. ed. São Paulo. LTr, 2017.

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. OJ 225 da SDI-1. Disponível em: http://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/OJ_SDI_1/n_s1_221.htm#TEMA225. Acesso em 23/11/2018.

TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. OJ nº 261 da SDI-1. Disponível em: http://www3.tst.jus.br/jurisprudencia/OJ_SDI_1/n_s1_261.htm#TEMA261. Acesso em 23/11/2018.

VIVEIROS, Luciano. CLT comentada pela reforma trabalhista (Lei nº 13.467/2017). 9. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2018.