Prescrição de multas de Trânsito e Transporte


Porwilliammoura- Postado em 14 dezembro 2011

Autores: 
MIRANDA, Gilmar Pereira

 

Prescrição de multas de Trânsito e Transporte*

 

Gilmar Pereira Miranda

 

Advogado, Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito do Largo São Francisco (FD-USP), Pós-Graduando em especialização de Direito Público pela Universidade do Sul de Santa Catarina (UNISUL)

 


 

Trata o presente de análise jurídica acerca da prescrição de multas aplicadas pelo Secretário de Transportes na competência de fiscalização de trânsito e de transporte quando do cometimento de infrações correlatas e não pagas.

1. O trato da aplicação e exigibilidade das multas municipais de trânsito e de transporte são distintos, por decorrerem de estruturas jurídicas distintas, as primeiras decorrentes da Lei Federal nº 9.503/97 e as outras da Lei Municipal nº 11.263/2002.

1.1. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) estabeleceu o Sistema Nacional de Trânsito (art. 7º), constituíndo, entre tantos órgãos, pelos Municípios (incs. III e IV), competindo a estes a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar medidas adminsitrativas cabíveis, as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações de circulação, estacionamento, parada, excesso de peso, dimensões e lotação de veículos, previstas no Codex, notificando os infratores e arrecadando os valores (art. 24, inc. VI, VII e VIII).

Em qualquer das hipóteses, para se chegar à aplicação da multa correlata, o legislador federal estabeleceu um iter a ser seguido, o qual visa a garantir a possibilidade de o autuado se manifestar e, aplicada a penalidade, recorrer a juntas constituídas especificamente para tal intento.

Lavrado o auto por agente de trânsito (art. 280), a autoridade de trânsito determinará a notificação da autuação ao proprietário do veículo (art. 281, par. único, II), no prazo máximo de 30 dias, para apresentação de defesa prévia. Posteriormente, julgará a autoridade de trânsito a subsistência ou insubsistência do auto (art. 281, caput), sendo que mantido, será aplicada a multa. Aplicada, deve ser expedida nova notificação, agora da penalidade, ao proprietário do veículo (art. 282), acompanhada de boleto bancário, com data de vencimento para pagamento (art. 284) e informações do prazo para interposição de recurso à JARI (art. 285). Da decisão da JARI, sendo o recurso julgado indeferido, cabe a interposição de recurso ao CETRAN-SP (art. 288), no prazo de trinta dias, sendo neste caso a exigência do prévio recolhimento da multa (art. 288, §2º).

Nas atribuições conferidas ao CONTRAN (art. 12, I), foi expedida a Resolução nº 149/2003, que regulamenta o procedimento supra.

Ao mesmo tempo, sempre será exigido o pagamento de multas aplicadas pela Municipalidade quando o proprietário realizar o licenciamento anual do veículo (art. 131, §2º) ou na sua transferência de propriedade (art. 124, VIII).

1.2. No que tange às multas de transporte, a Lei Municipal de Transportes (LMT) dispõe que o não cumprimento de suas disposições, bem como de seus regulamentos e outras normas que venham a ser editadas, serão aplicadas aos operadores as penalidades de advertência, multas, intervenção na execução dos serviços e cassação (art. 31 e incs.), sendo graduado o valor da multa conforme a natureza da infração (art. 31, §2º e incs.). Também é objeto de fiscalização e aplicação de penalidades a prestação de serviço de transporte coletivo de forma clandestina, acumulando multa e apreensão do veículo (art. 33 e incs.). Para a análise de recursos das penalidades aplicadas, cabe à EMDEC constituir uma CIP (art. 34).

No que tange ao processamento dos autos de infração de transporte, até a cobrança da multa, foi aprovado o Regulamento de Infrações e Penalidades pelo Decreto nº 15.487/2006, o qual disciplina o processamento de autuação, a notificação de infrações e os recursos cabíveis.

Constatada a infração, lavrar-se-á o auto e notifica-se o operador (art. 19), sendo esta expedida em até trinta dias (art. 20, §2º), acompanhada de boleto com data de vencimento, exceto os casos de desconto direto no repasse (art. 21). Recebida a notificação, o autuado tem 15 dias para recorrer junto a CIP (art. 22). No caso exclusivo do serviço seletivo, a permissão será suspensa quando constatada a acumulação de 3 ou mais multas vencidas, não pagas ou não recorridas (art. 28).

2. Como visto, ambos os sistemas de aplicação de penalidades de multas esclarecem o surgimento do fato (autuação), o processamento (aplicação) e cobrança (notificação de penalidade), com as possibilidades de recursos administrativos.

Entretanto, em alguns casos, é possível que o infrator deixe de pagar a penalidade no prazo, sem qualquer ato capaz de suspender ou interromper sua exigibilidade. É o caso dos proprietários que deixam de licenciar o veículo pela existência de multas, no caso do trânsito, e do serviço seletivo, no caso do transporte.

Também, existem casos em que o infrator se beneficia de medidas judiciais (Mandado de Segurança, Ação de Anulação de Multa), logrando êxito em suspender a exigibilidade, perdendo posteriormente, com trânsito em julgado, reativando sua plena legalidade de cobrança.

Portanto, são várias hipóteses que influem diretamente na questão da prescrição da exigibilidade dos valores contidos na notificação de penalidade, as quais merecem melhor aprofundamento.

3. De início, cabe esclarecer o que é a prescrição.

O ponto de partida é o Código Civil, o qual estabelece, em seu art. 189, que, quando “violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206”.

O diploma civilista não define o que é a prescrição, mas define o momento em que começa a correr a contagem de seu prazo, consubstanciado no fato da violação do direito.

Baseado nos estudos de Agnelo Amorim Filho, Cesar Fiuza, in “Direito Civil: Curso Completo”, 8ª edição, Belo Horizonte, Del Rey, 2004, pg. 250, explica:

“Segundo ele, haverá prescrição quando se der a perda do direito de ação pela inércia de seu titular, que deixa expirar o prazo fixado em lei, sem exercê-lo”.

Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, in “Código Civil Comentado”, 4ª edição, São Paulo, RT, 2006, pg. 300/301, conceitua o instituto:

“Causa extintiva da pretensão de direito material pelo seu não exercício no prazo estipulado pela lei. O texto da lei é claro ao dar como objeto da prescrição a pretensão de direito material e não a ação, de modo que a classificação e a conceituação de prescrição e decadência apresentadas por Câmara Leal, restaram superadas pelo direito positivo vigente”.

Por sua vez, é divergente o posicionamento de Celso Antônio Bandeira de Mello, in “Curso de Direito Administrativo”, 19ª edição, São Paulo, Malheiros, 2005, pg. 971, para o qual:

“A prescrição, instituto concebido em favor da estabilidade e segurança jurídicas (objetivo, este, também compartilhado pela decadência), é, segundo entendimento que acolhemos, arrimados em lição de Câmara Leal, a perda da ação judicial, vale dizer, do meio de defesa de uma pretensão jurídica, pela exaustão do prazo legalmente previsto para utilizá-la”.

Esse é o mesmo entendimento de Hely Lpes Meirelles, in “Direito Administrativo Brasileiro, 28ª edição, São Paulo, Malheiros, 2003, pg. 700, para o qual, citando Odete Medauar,:

“Prescrição é a perda da ação pelo transcurso do prazo para seu ajuizamento ou pelo abandono da causa dirante o processo. Não se confunde com decadência ou caducidade, que é o perecimento do direito pelo não exercício no prazo fixado em lei.”

Contudo, em uma perspectiva crítica da definição clássica, Cesar Fiuza, ob. cit., afirma que o art. 189 do CC adota tese ultrapassada, baseada em tese concebida por Wach, em 1885, em que o direito de ação dependeria da concorrênca de requisitos de direito material.

Ele esclacere, às fls. 252/253, que:

“Ademais, a pretensão nascida da violação a um direito a uma prestação rigorosamente não se extingue que, se o pagamento for realizado espontaneamente, será válido, não tendo o devedor direito de repeti-lo (pedi-lo de volta). Se, por outro lado, apesar da prescrição, o credor acionar o devedor, exigindo o adimplemento da prestação, e este não alegar a prescrição em sua defesa, será proferida sentença condenatória favorável se concretizará, ão podendo ser repetido. (...) Estivesse a pretensão extinta pela prescrição, o credor não teria direito de receber, e o pagamento seria inválido”.

E conclui, às fls. 254:

“Sintetizamos, podemos definir prescrição como a extinção, pelo decurso de prazo, da responsabilidade do devedor de um direito a uma prestação, surgindo para ele a faculdade de opor uma exceção à pretensão do credor”.

Há de se entender tal posicionamento a partir de uma perspectiva de que toda obrigação possui, em sua gênese, dois elementos, segundo a teoria Alemã, chamados de Schuld e Haftung.

O Schuld é a concretização do débito existente decorrente da relação obrigacional surgida entre as partes. Por sua vez, o Haftung é a responsabilidade patrimonial do devedor em razão de seu débito.

O instituto prescricional visa, justamente, a estabilizar as relações jurídicas pela inércia do credor em prazo superior ao razoável, conforme o que a legislação estabelecer. Porém, o débito se manterá, até a sua devida quitação, independentemente do momento em que ocorra o adimplemento, apenas será fulminada a responsabilidade.

Assim, resta clara a razão pela qual o pagamento de dívida a princípio prescrita é válido, não gerando direito do devedor pelo reembolso do despendido. Contudo, por não mais ser responsável patrimonialmente pelo débito, surge como exceção à pretensão do credor, desde que alegada.

Concluo, seguindo a doutrina esposada por Cesar Fiuza, que a prescrição é a fulminação da responsabilidade patrimonial do devedor pela obrigação constituída diante do transcurso de certo lapso temporal, sem a realização pelo credor de medidas capazes de tornar efetiva a cobrança de seu direito, a partir de sua plena exigibilidade.

4. A prescrição do crédito está vinculada umbilicalmente com o transcurso de certo prazo sem que haja qualquer medida eficaz para tornar o devedor em mora e executá-lo.

No que tange às multas de trânsito e de transporte, as leis são silentes acerca do prazo para declaração da prescrição, possivelmente por criarem mecanismos de exigibilidade de quitação das multas para a manutenção da documentação em dia, além das hipóteses de desconto na fonte.

Especificamente quanto à matéria de trânsito, existe a Resolução CONTRAN nº 182/2005, que trata sobre a uniformização do procedimento administrativo para imposição das penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação da Carteira Nacional de Habilitação, dispondo que a pretensão punitiva prescreverá em cinco anos a partir da data do cometimento da infração que instaurar o processe administrativo (art. 22).

No entanto, entendo por ilegal a estipulação de prazo prescricional por meio de resolução, uma vez que o direito comum é norma supletiva, diante das omissões das normas especiais, no que lhe for compatível com os princípios atinentes à área, sendo que nesse caso o Código Civil explicita:

“Art. 189. Violado o direito, nasce para o titular a pretensão, a qual se extingue, pela prescrição, nos prazos a que aludem os arts. 205 e 206.
(...)
Art. 205. A prescrição ocorre em 10 (dez) anos, quando a lei não lhe haja fixado prazo menor.” (g.m.)

Em comentário sobre o disposto no art. 205 do Código Civil, Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, ob. cit., pg. 305, assim esclarecem:

“A pretensão condenatória é sempre sujeita à prescrição, pois somente os direitos à prestação pe que podem ser violados. Além disso, a prescrição existe em razão da seguranla que as relações jurídicas devem ter. Portanto, quando não houver previsão expressa na lei para o exercício de pretensão condenatória, o prazo de prescrição dessa pretensão é o determinado pela norma ora comentada: dez anos”.

Ou seja, somente a lei pode estipular o prazo de prescrição, sendo que na ausência de prazo específico, vigora o prazo decenal.

Portanto, o fundamento para o estabelecimento do prazo prescricional das multas deve estar contido na lei e, na ausência de lei específica regulamentando o prazo, vigorará o prazo decenal, estabelecido no Código Civil, ex vi o art. 205.

5. Na busca pela localização do preceito normativo que discipline o prazo prescricional para a cobrança de multas, tanto de trânsito como de transporte, há o indicativo constante no art. 174 do CTN, in verbis:

“Art. 174. A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em cinco anos, contados da data da sua constituição definitiva.”

Em comentário ao disposto no CTN, José Eduardo Soares de Melo, in Comentários ao Código Tributário Nacional”, coord. Marcelo Magalhães Peixoto e outro, São Paulo, MP, 2005, pg. 1269, leciona:

“A ação para a cobrança do crédito tributário prescreve em 5 (cinco) anos contados da data da sua constituição definitiva, que ocorre no momento em que a Fazenda passa a ter condição jurídica de ingressar com a ação judicial”.

Trata-se de norma com objetivo direto de desestimular a inércia e desinteresse da Fazenda no tocante ao recebimento de valores tributários, sob pena de extinção.

Contudo, a aplicação deste disposto está limitado aos tributos, assim definidos no art. 3º do CTN:

“Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.” (g.m.)

Em lecionado exposto por Paulo de Barros Carbalho, in “Curso de Direito Tributário”, 17ª edição, São Paulo, Saraiva, 2005, pg. 26, assim se manifestou, ao comentar a definiçaõ de tributo constante no Código Tributário Nacional:

“Traço sumamente relevante para acompreensão de ‘tributo’ está objetvado nessa frase [‘que não constitua sanção de ato ilícito’], em que se determina a feição de licitude para o fato que desencadeia o nascimento da obrigação tributária. Foi oportuna a lembrança, uma vez que os acontecimentos ilícitos vêm sempre atrelados a uma providência sancionatória e, fixando o catáter lícito do evento, separa-se, com nitidez, a relação jurídica do tributo da relação jurídica atinente às penalidades exigidas pelo descumprimento de deveres tributários. Como são idênticos os vínculos, isoladamente observados, é pela associação ao fato que lhe deu origem que vamos conhecer a índole da relação”.

Existe verossimilhança entre o tributo e a multa, por serem cobranças cogentes exercidas pela Administração sobre o patrimônio do contribuinte e do infrator, respectivamente. A diferença decorre da origem, enquanto o tributo possui sua cobrança originada de uma atividade lícita, a conduta ilícita é supedânea da aplicação da penalidade de multa.

Desta feita, ainda que possa oferecer um norte às diretrizes para estabelecer o prazo prescricional, a aplicação do art. 174 do CTN resta afastada, em decorrência do limite legal imposto pelo art. 3º do mesmo diploma.

6. O tratamento da prescrição administrativa para a sanção decorrente da polícia administrativa possui diversos entendimentos, como se demonstra a discussão na doutrina, na jurisprudência e para o próprio DENATRAN.

6.1. Passo, então, a analisar a posição de alguns dos principais administrativistas brasileiros.

De princípio, sustentou o saudoso Hely Lopes Meirelles, ob. cit., pg. 702:

“A prescrição das ações da Fazenda Pública contra o particular é a comum da lei civil ou comercial, conforme a natureza do ato ou contrato a ser ajuizado. Entretando, para a cobrança do crédito tributário, qualquer que seja a origem ou espécie, a prescrição é de cinco anos, consoante estabelece o Código Tributário Nacional (art. 174), e em igual prazo ocorre a decadência do direito de constituir esse crédito (art. 173). (...) Em relação às contribuições previdenciárias, os prazos de decadência e prescrição estão fixados em dez anos pelos arts. 45 e 46 da Lei 8.212, de 27.9.91”.

Para o ilustre jurista, portanto, será aplicável a prescrição, civil ou comercial, conforme a natureza jurídica do crédito, ressalvando as hipóteses do crédito tributário (cinco anos) e previdenciário (dez anos).

Ressalte-se que com relação ao crédito previdenciário, o Supremo Tribunal Federal editou recente Súmula Vinculante, nos seguintes termos:

“8. São inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5º do Decreto-Lei nº 1.569/1977 e os artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”.

Pela característica tributária das verbas previdenciárias, os artigos da Lei de Custeio da Previdência (nº 8.212/1991) que estabeleciam o prazo prescricional de dez anos restam por inconstitucionais, valendo apenas o disposto no art. 174 do CTN, e, atualizando o entendimento do saudoso Meirelles, todos os créditos tributários possuem o prazo prescricional de 5 anos.

A seu turno, esclarece Celso Antônio Bandeira de Mello, ob. cit., pg. 979/980:

“Não há regra alguma fixando genericamente um prazo prescricional para as ações judiciais do Poder Público em face do administrado. Em matéria de débitos tributários o prazo é de cinco anos, a teor do art. 174 do Código Tributário Nacional, o qual também fixa, no art. 173, igual prazo para decadência do direito de constituir o crédito tributário.
No passado (até a 11ª edição deste Curso) sustentávamos que, não havendo especificação legal dos prazos de prescrição para as situações tais ou quais, deveriam ser decididos por analigoa aos estabelecidos na lei civil, na conformidade do princípio geral que dela decorre: prazos longos para atos nules e mais curso para os anuláveis.
Reconsideramos tal posição. Remeditando sobre a matéria, parece-nos que o correto não é a analogia com o Direito Civil, posto que, sendo as razões que o informam tão profundamente distintas das que inspiram as relações de Direito Público, nem mesmo em tema de prescrição caberia buscar inspiração em tal fonte. Antes dever-se-á, pois, indagar do tratamento atribuído ao tema prescricional ou decadencial em regras genéricas de Direito Público.
Nestas, encontram-se duas orientações com tal caráter:
a) a relativa à prescrição em casos inversos, isto é, prescrição de ações do administrado contra o Poder Público. Como dantes se viu, o diploma normativo pertinente (Decreto 20.910, de 6.1.32, texto com força de lei, repita-se, pois editado em período no qual o Poder Legislativo estava absorvido pelo Chefe do Executivo) fixa tal prazo em cinco dias. Acresça-se que é este também o prazo de que o administrado dispõe para propor ações populares, consoante o art. 21 da Lei da Ação Popular Constitucional (Lei 4.717, de 29.6.65). Em nenhuma se faz discrímen, para fis de prescrição, entre atos nulos e anuláveis. O mesmo prazo, embora introduzido por normas espúrias (...), também é o previsto para propositura de ações contra danos causados por pessoa de Direito Público ou de Direito Privado prestadoras de serviços públicos, assim como para as ações de indenização por apossamento administrativo ou desapropriação indireta ou por danos oriundos de restrições estabelecidas por atos do Poder Público;
b) a concernente ao prazo de prescrição para o Poder Público cobrar débitos tributários ou decadencial para constituir o crédito tributário. Está fixado em cinco anos, conforme há pouco foi mencionado. Também já foi referido que, a teor da Lei 9.873, de 23.11.99 (...), foi fixado em cinco anos o prazo para prescrição da ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, a menos que esteja em pauta conduta criminosa, hipótese em que vigorará o previsto para ela. É, outrossim, de cinco anos o prazo para a Administração, por si própria, anular seus atos inválidos dos quais hajam decorrido efeitos favoráveis ao administrado, salvo comprovada má-fé (...) consoante dispõe o art. 54 da Lei 9.784, de 29.1.1999, disciplinadora do processo administrativo. Também aí não se distingue entre atos nulos e anuláveis”.

E conclui:

“Ademais, salvo disposição legal explícita, não haveria razão prestante para distinguir entre Administração e administrados no que concerte ao prazo ao cabo do qual faleceria o direito de reciprocamente se proporem ações”.

Assim, para o eminente autor, ressalvada norma explícita(ad exemplum, art. 37, §5º da Constituição da República), o prazo de prescrição nos casos de ações judiciais propostas pela Administração em face de seus administrados é de 5 anos.

Por sua vez, ensina Maria Sylvia Zanella Di Pietro, in “Direito Administrativo”, 16ª edição, São Paulo, Atlas, 2003, pg. 611, que:

“Com relação as prazos para punir, que são estabelecidos em favor do administrado, são fatais para a Administração. (...)
Quando se trata de punição decorrente do exercício do poder de polícia, a Lei nº 9.873, de 23-11-99, estabelece prazo de prescrição de cinco anos para a ação punitiva da Administração Pública Federal, Direta e Indireta, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado”.

E ressalva, à frente:

“Essa lei somente se aplica na esfera federal”.

Dessa forma, o poder de polícia, para a Administração Pública Federal, Direta e Indireta, prescreve em cinco anos, nos termos da Lei Federal nº 9.873/99 (art. 1º).

Isso demonstra que a doutrina não está plenamente sedimentada em um diploma legal, vez que a aplicação da Lei Federal nº 9.873/99, a princípio é aplicada diretamente aos entes federais, com possibilidade de extensão aos estados e municípios, seguindo os ditames de paridade das prescrições decorrentes de ações de ressarcimentos aos administrados. Ainda existe o entendimento que se aplica a lei geral, civil ou comercial, conforme a natureza da cobrança.

6.2. A jurisprudência, por sua vez, tem se consolidado em afirmar que as penalidades em multa, decorrentes de poder de polícia, prescrevem em cinco anos, conforme se observa nos arestos a seguir:

“MULTA ADMINISTRATIVA. AÇÃO DE COBRANÇA. PRESCRIÇÃO. Na falta de lei específica prevendo prazo de prescrição para ação de cobrança de multa de natureza administrativa, há que considerar por questão de isonomia, o mesmo prazo qüinqüenal previsto do Decreto nº 20.910/32, para a cobrança de débitos da Fazenda Pública. Transcorridos mais de dez anos entre a lavratura do auto de infração e a inscrição na dívida ativa, tem-se por inexigível a dívida pela Fazenda Pública, em face da sua inércia em exercer seu direito. Recurso provido.” (TRT – 4ª Região, 3ª T., 02655-2005-232-04-00-4 (RO), rel. Des. MARIA HELENA MALLMANN, publ. 10/10/2007, por maioria).

“APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO DECORRENTE DE MULTA POR INFRAÇÃO DE TRÂNSITO - APLICAÇÃO DO PRAZO DECADENCIAL ESTABELECIDO PELO CTN - IMPOSSIBILIDADE - TRIBUTO NÃO SE CONFUNDE COM MULTA. A multa, diferente do tributo, constitui-se em sanção por ato ilícito, sendo, portanto, instituto jurídico distinto. Assim, é de se rejeitar a aplicação subsidiária, ou mesmo analógica, do CTN a uma sanção por ato ilícito tão peculiar como é a multa por infração da lei de trânsito, mesmo porque em que pese a lei de execuções fiscais ser aplicável à dívida ativa da Fazenda Pública tributária e não-tributária, o débito decorrente da sanção sequer foi inscrito. PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA DA MULTA DE TRÂNSITO - CTB OMISSO QUANTO AO PRAZO - APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DA LEI N. 9.873/99. Tendo em vista a omissão do Código de Trânsito Brasileiro quanto ao prazo prescricional para a cobrança da multa, a prescrição ocorrerá, regra geral, no lapso temporal de cinco anos, contados da data da infração administrativa (art. 1º da Lei n. 9.873/99).” (TJSC, Apelação 2005.018965-5, rel. Des. Volnei Carlin, j. 15/9/2005, v.u.).

“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. O prazo da prescrição da ação para desconstituição de multa administrativa aplicada por infração ao trânsito e repetição do valor pago é de cinco anos. RECURSO DESPROVIDO.” (Apelação Cível Nº 70019288877, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 25/04/2007).

“APELAÇÃO CÍVEL. DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. O prazo da prescrição da ação para desconstituição de multa administrativa aplicada por infração ao trânsito é de cinco anos. JULGARAM EXTINTO O FEITO, PREJUDICADO O EXAME DAS APELAÇÕES”. (Apelação Cível Nº 70019513837, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Liselena Schifino Robles Ribeiro, Julgado em 23/05/2007).

“APELAÇÃO CÍVEL. ADMINISTRATIVO. PRESCRIÇÃO. AÇÃO. INFRAÇÃO DE TRÂNSITO. NULIDADE. SANÇÃO. PRESCRIÇÃO. EMPRESA PÚBLICA. 1. A polícia administrativa do trânsito é atividade pública típica submetida ao regime jurídico administrativo. As sanções aplicadas pela prática de infrações ao trânsito são disciplinadas pelas normas de direito público. 2. A EPTC - Empresa Pública de Transporte e Circulação - é sociedade anônima criada pelo Município de Porto Alegre que tem por objeto o exercício do poder de polícia do trânsito confiado aos Municípios pelo Código Nacional de Trânsito. Conquanto tenha personalidade de direito privado, a polícia administrativa do trânsito executada pela EPTC submete-se às normas de direito público, não se aplicando as normas do Código Civil. 3. O prazo da prescrição da ação para desconstituição de multa administrativa aplicada por infração ao trânsito e repetição do valor pago é de cinco anos. Precedentes do STJ. Decorridos mais de cinco anos a contar do encerramento do processo administrativo que impôs a penalidade, é de ser reconhecida prescrição. Cabia ao autor comprovar causa interruptiva ou suspensiva da prescrição. Negado seguimento ao recurso por ato do Relator. Art. 557 do Código de Processo Civil.” (Apelação Cível Nº 70018731901, Vigésima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Maria Isabel de Azevedo Souza, Julgado em 07/03/2007).

DIREITO ADMINISTRATIVO. MULTA DE TRÂNSITO. PRESCRIÇÃO. O Decreto nº 20.910/32 é aplicável à multa de trânsito imposta via auto de infração lavrado pela Empresa Pública de Transporte e Circulação, porquanto esta, embora detenha personalidade jurídica de direito privado, exerce, por delegação da União, cf. art. 24 do CTB, atividade pública de poder de polícia de trânsito. RECURSO DESPROVIDO”. (Apelação Cível Nº 70018109645, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Roque Joaquim Volkweiss, Julgado em 14/02/2007)

“ADMINISTRATIVO – EXECUÇÃO FISCAL – ARTS. 165, 458 E 535 DO CPC – VIOLAÇÃO NÃO OCORRIDA – MULTA AMBIENTAL – IBAMA – PRESCRIÇÃO – APLICAÇÃO DO DECRETO 20.910/32 – PRINCÍPIO DA ISONOMIA. 1. Não ocorre ofensa aos arts. 165, 458 e 535 do CPC, se o Tribunal de origem decide, fundamentadamente, as questões que a parte alega não terem sido apreciadas. 2. Aplica-se a prescrição qüinqüenal, nos termos do art. 1º do Decreto n. 20.910/32, às ações de cobrança de multa administrativa decorrente de ilícito ambiental. 3. Recurso especial parcialmente provido, para acolher a exceção de pré-executividade e julgar extinta, com resolução do mérito, a execução fiscal.” (STJ – Segunda Turma, REsp 1063728 / SP, Rel. Min. Eliana Calmon, j. 28/10/2008, v.u.).

“ADMINISTRATIVO. EXECUTIVO FISCAL. MULTA ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO. ARGÜIÇÃO. EXCEÇÃO DE PRÉ-EXECUTIVIDADE. ADMISSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO QÜINQÜENAL. ORIENTAÇÃO DESTA CORTE. I - Consoante posicionamento do STJ, a prescrição das ações judiciais para a cobrança de multa administrativa ocorre em cinco anos, à semelhança das ações pessoais contra a Fazenda Pública, prevista no art. 1º do Decreto nº 20.910/32. Em face da ausência de previsão expressa sobre o assunto, o correto não é a analogia com o Direito Civil, por se tratar de relação de Direito Público. Precedentes: REsp nº 905932/RS, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, DJ de 28.06.2007; REsp nº 447.237/PR, Rel. Min. FRANCISCO PEÇANHA MARTINS, DJ de 10.05.2006, REsp nº 539.187/SC, Rel. Min. DENISE ARRUDA, DJ de 03.04.2006 e REsp nº 436.960/SC, Rel. Min. CASTRO MEIRA, DJ de 20.02.2006. II - Incidência, na espécie, do Decreto 20.910/32, porque à Administração Pública, na cobrança de seus créditos, deve-se impor a mesma restrição aplicada ao administrado no que se refere às dívidas passivas daquela. Aplicação do princípio da igualdade, corolário do princípio da simetria (AgRg no Ag nº 957.840/SP, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJe de 25.03.2008). III - Agravo regimental improvido.“ (STJ – Primeira Turma, AgRg no REsp 1061001 / SP, rel. Min. FRANCISCO FALCÃO, j. 09/09/2008, por maioria).

“PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ART. 544 DO CPC. MULTA ADMINISTRATIVA. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO. DECRETO 20.910/32. PRAZO QÜINQÜENAL. INAPLICABILIDADE DO PRAZO VINTENÁRIO PREVISTO NO CÓDIGO CIVIL. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 282 DO STF. VIOLAÇÃO AO ARTIGO 535, II DO CPC. INOCORRÊNCIA. 1. O recurso especial é inadmissível para a cognição de matéria sobre a qual não se pronunciou o tribunal de origem, porquanto indispensável o requisito do prequestionamento. 2. Ademais, como de sabença, "é inadmissível o recurso extraordinário, quando não ventilada na decisão recorrida, a questão federal suscitada" (Súmula 282/STF). 3. Os embargos declaratórios não são cabíveis para a modificação do julgado que não se apresenta omisso, contraditório ou obscuro. 4. Não há violação ao artigo 535, II do CPC, quando a matéria não analisada pelo aresto recorrido não foi objeto de recurso de apelação. 5. A Administração Pública, no exercício do ius imperii, não se subsume ao regime de Direito Privado. 6. Ressoa inequívoco que a inflição de sanção às ações contra as posturas municipais é matéria de cunho administrativo versando direito público indisponível, afastando por completo a aplicação do Código Civil a essas relações não encartadas no ius gestionis. 7. A sanção administrativa é consectário do Poder de Polícia regulado por normas administrativas. 8. A aplicação principiológica da isonomia, por si só, impõe a incidência recíproca do prazo do Decreto 20.910/32 nas pretensões deduzidas em face da Fazenda e desta em face do administrado. 9. Deveras, e ainda que assim não fosse, no afã de minudenciar a questão, a Lei Federal 9.873/99 que versa sobre o exercício da ação punitiva pela Administração Federal colocou um pá de cal sobre a questão assentando em seu art. 1º caput: "Prescreve em cinco anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado." 10. A possibilidade de a Administração Pública impor sanções em prazo vintenário, previsto no Código Civil, e o administrado ter a seu dispor o prazo qüinqüenal para veicular pretensão, escapa ao cânone da razoabilidade, critério norteador do atuar do administrador, máxime no campo sancionatório, onde essa vertente é lindeira à questão da legalidade. 11. Outrossim, as prescrições administrativas em geral, quer das ações judiciais tipicamente administrativas, quer do processo administrativo, mercê do vetusto prazo do Decreto 20.910/32, obedecem à qüinqüenalidade, regra que não deve ser afastada in casu. 12. Destarte, esse foi o entendimento esposado na 2ª Turma, no Resp 623.023/RJ, Rel. Min. Eliana Calmon, DJ 14.11.2005: "PROCESSO CIVIL E ADMINISTRATIVO - COBRANÇA DE MULTA PELO ESTADO - PRESCRIÇÃO - RELAÇÃO DE DIREITO PÚBLICO - CRÉDITO DE NATUREZA ADMINISTRATIVA - INAPLICABILIDADE DO CC E DO CTN - DECRETO 20.910/32 - PRINCÍPIO DA SIMETRIA. 1. Se a relação que deu origem ao crédito em cobrança tem assento no Direito Público, não tem aplicação a prescrição constante do Código Civil. 2. Uma vez que a exigência dos valores cobrados a título de multa tem nascedouro num vínculo de natureza administrativa, não representando, por isso, a exigência de crédito tributário, afasta-se do tratamento da matéria a disciplina jurídica do CTN. 3. Incidência, na espécie, do Decreto 20.910/32, porque à Administração Pública, na cobrança de seus créditos, deve-se impor a mesma restrição aplicada ao administrado no que se refere às dívidas passivas daquela. Aplicação do princípio da igualdade, corolário do princípio da simetria. 3. Recurso especial improvido." 13. Precedentes jurisprudenciais: REsp 444.646/RJ, DJ 02.08.2006; REsp 539.187/SC, DJ 03.04.2006; REsp 751.832/SC, Rel. p/ Acórdão Min. LUIZ FUX, DJ 20.03.2006; REsp 714.756/SP, REsp 436.960/SC, DJ 20.02.2006. 14. Agravo regimental desprovido.” (STJ – Primeira Turma, AgRg no Ag 951568 / SP, rel. Min. LUIZ FUX, j. 22/04/2008, por maioria).

“AÇÃO DE COBRANÇA. CET de Santos. Multas por infração à legislação de trânsito. Prescrição qüinqüenal com base no Decreto 20.910/32. Precedentes. Dupla notificação regulamentada após à expedição das notificações e, portanto, sem efeito retroativo. Recurso parcialmente provido.” (TJSP, 6ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 606.186-5/4-00, rel. Des. Oliveira Santos, j. 15/12/2008, v.u.).

“Preliminar deduzida pelo apelado repelida - Reexame necessário - Valor de alçada - Recurso não interposto pelo juízo 'a quo'. Anulação de ato administrativo que excluiu o autor do procedimento liatatório de prestação de serviço de transporte público coletivo (lotação) - Pedido julgado procedente - Requerente acometido de doença renaí no dia determinado para a escolha da linha - Alegação de interposição de recurso administrativo dentro do prazo prescricional - Documento juntado que não comprova o protocolo administrativo realizado junto à Prefeitura Municipal de Guarulhos - Prescrição qüinqüenal reconhecida, nos termos do art. Io, do Decreto n° 20.910/32 - O termo inicial para a contagem do prazo prescricional é a data da prática do ato - Sentença reformada - Recurso provido.” (TJSP, 6ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 702.449-5/5-00, rel. Des. Leme de Campos, j. 15/12/2008, v.u.).

“EXECUÇÃO FISCAL- PRESCRIÇÃO- APLICAÇÃO DO ART IoDO DECRETO 20910/32 - PRAZO QÜINQÜENAL - RECONHECIMENTO DE OFÍCIO- NECESSIDADE A prescrição da pretensão de cobrança do crédito não-tributáno ocorre com o transcurso de cinco (5) anos entre a sua constituição definitiva e a propositura da execução fiscal (Decreto n° 20 910/32), o que deve ser reconhecido de oficio -art 219, §5°. doCPC RECURSO PREJUDICADO PRESCRIÇÃO RECONHECIDA DE OFÍCIO” (TJSP, 18ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 795.762-5/9-00, rel. Des. Carlos Alberto Giarusso, j. 25/09/2008, v.u.).

“Ação de cobrança - Multas de trânsito - Prescrição trienal suscitada com base no Código Civil - Inadmissibilidade - Prescrição qüinqüenal, com base no Decreto 20.910, de 1932 - Precedentes - Prescrição não configurada no caso em exame - Inconsistência da alegação de venda do veículo - Incidência, ademais, do disposto no artigo 134 do Código de Trânsito Brasileiro - Sentença de procedência da ação - Desprovimento do recurso.” (TJSP, 5ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 577.164-5/0-00, rel. Des. Osvaldo Magalhães, j. 11/09/2008, v.u.).

“VEÍCULO - Multa - Cobrança - Prescrição qüinqüenal - Aplicação do Decreto n.° 20.910/32 - Improcedência mantida - A cobrança de multas de trânsito prescreve no prazo de 5 anos, aplicável a regra do Decreto n° 20.910/32 também contra a Administração”. (TJSP, 11ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 768.892-5/9-00, Rel. Des. Luis Ganzerla, j. 25/07/2008).

A quase unanimidade de julgados tem se pautado pela prescrição quinquenal, considerando, principalmente, o princípio da isonomia, pelo tratamento dado aos administrados em acionar a Adminsitração Pública para se ressarcir de danos.

Os parcos votos vencidos sustentam a aplicação do Código Civil, quando não envolver questões de direito tributário, como sustentou o Min. Teori Albino Zavascki, em voto-vencido no Recurso Especial nº 539.187/SC, julgado em 21/02/2006.

Nesse sentido, localizei um julgado, nos seguintes termos:

“COBRANÇA – Multas de trânsito. 1) A lei 9.873/99, regula exclusivamente a prescrição da pretensão punitiva estatal no âmbito administrativo da União. Não se aplica à ação de cobrança de multa por infração de trânsito movida pela autoridade municipal. 2) A concessão de desconto para o tempestivo adimplemento da obrigação não implica renúncia aos encargos resultantes do inadimplemento. 3) Ação de pequena complexidade e média relevância econômica não autoriza arbitramento da honorária ao percentual de 20%. 4) Ação julgada parcialmente procedente. Sentença parcialmente reformada. Recurso parcialmente provido”. (TJSP, Apelação nº 765.556-5/4-00, rel. Des. Coimbra Schmidt, j. 16.06.2008, v.u.).

Em que o relator assim consignou a natureza jurídica da Lei Federal nº 9.873/99:

“Não é lei nacional, mas federal, pois ‘estabelece prazo de prescrição para o exercício de ação punitiva pela Administração Pública Federal, direta e indireta’. Dispõe sobre direito penal administrativo. Regula a prescrição administrativa, no âmbito da Administração Federal, e só. Ainda que assim não fosse, o prazo quinquenal é estabelecido para a ação punitiva da Administração. Não se confunde com o da cobrança judicial das multas que dela se irradiam, que corre em sequência, uma vez tornada exigível a penalidade. Na falta de norma espefícica, no caso a prescrição é a comum, estabelecida no Código Civil: dez anos (art. 205)”.

Para o magistrado, a Lei Federal nº 9.873/99 tem caráter federal, vinculando-se exclusivamente ao ente correlato, sem força vinculante aos demais entes federativos, por sua especificidade do objeto contido no art. 1º, refutando-se a idéia de uma norma nacional.

Assim, a maioria dos julgadores se filiam à prescrição quinquenal, com parcos julgados entendendo como aplicáveis as normas gerais privadas de prescrição, na ausência de disposição específica.

6.3. Com relação às multas de trânsito, exclusivamente, o DENATRAN elaborou a Nota Técnica (NT) de nº 129/2007, de 30 de abril de 2007, de lavra do Coordenador Geral Rodrigo Junot, na qual discorre sobre a prescrição de tais penalidades.

A NT é decorrente de questionamento formulado pela Municipalidade de Sâo José do Rio Preto/SP, quanto os prazos prescricionais das multas estaduais e municipais de trânsito.

Foi reconhecida a inexistência de norma explícita no sentido de definir o prazo prescricional das multas de trânsito, mas resssalta o poder de o juiz, ao interpretar o caso concreto, se utilizar da analogia, de modo a integrar o Direito.

Esclarece que a questão da prescrição das multas não está alçada no objeto da Política Nacional de Trânsito conferido ao CONTRAN, o que motivou a revogação da antiga Resolução nº 812/96, que tratava das prescrições de multas de trânsito, pela Resolução nº 148/03.

Ressalta, também, que a Lei Federal nº 9.873/99, em seu art. 1º determina que as ações punitivas da Administração Pública Federal, Direta ou Indireta, no exercício do poder de polícia, prescrevem em cinco anos, a contar da data da infração, sendo sua aplicação restrita à União.

Por sua vez, vê como não invocável o Decreto nº 20.910/32, porque seu objeto é a invocação da prescrição de ações contra a Fazenda, em geral, sendo situação inversa. Também são rechaçadas as aplicações subsidiárias do Código Civil e do Código Tributário Nacional.

Assim, conclui que o DENATRAN se manifesta pela aplicação da Lei Federal nº 9.873/99, suprindo a lacuna legislativa, estabelecendo o lustro prescricional.

Em parecer nº 1487/2007, da Consultoria Jurídica do Ministério da Cidade, há o delineamento seguido pela NT, concluindo pela aplicação da Lei Federal nº 9.873/99, como norma integradora do sistema.

7. A questão é, de fato, polêmica pela inexistência de disposição especial acerca da prescrição de tais valores devidos a título de multa de trânsito ou de transporte.

Primeiramente, há de se considerar a competência constitucional para estabelecer as normas de prescrição das referidas dívidas.

O trato legislativo relativo às normas de trânsito está privativamente concentrado nas mãos da União, que deverá estabelecê-las em caráter Nacional, não restrito a um ou alguns entes, vide o art. 22, XI, da Constituição Federal.

De forma geral, compete à União, aos Estados e ao Distrito Federal legislarem concorrentemente sobre direito tributário, financeiro e econômico, cabendo à União limitar-se sobre normas gerais (art. 24, I e §1º da CF).

Por sua vez, o poder de polícia é partilhado entre todos os entes, que podem legislar sobre sua atuação, dentro dos limites constitucionais traçados.

De forma específica, cabe aos Municípios o trato da organização do transporte coletivo, ex vi o art. 30, V da CF.

Por serem multas decorrentes de norma federal, de aplicação nacional, a prescrição das multas de trânsito somente pode ser disciplinada pelo legislador federal, mas em norma de caráter nacional.

Ainda que com o advento do Codex especial de trânsito, este foi lacônico no trato da prescrição de multas decorrentes de infrações de trânsito.

No que se refere às multas de transporte,será o Município o ente público capaz para definir as normas de prescrição, por ser matéria acessória ao trato da organização do transporte coletivo. Infelizmente, o legislador municipal não se prontificou a tanto.

Nesta toada, não há que se afastar a aplicabilidade subsidiária do Código Civil, sob argumento de ser norma de Direito Privado, porque sua função é superior à primitiva distinção de Ulpiano, ao estabelecer normas gerais de Direito.

Portanto, o Código Civil é norma subsidiária de todo ordenamento jurídico, sendo inaplicável apenas quando for totalmente incompatível com as normas vigentes.

Ademais, a subsidiariedade decorre da inexistência de norma expressa a respeito e a integração do Direito, em um sistema uno, sem situações de anomia, assim disciplinado pela Lei de Introdução ao Código Civil, art. 4º.

A partir desse raciocício, a conclusão lógica seria pela aplicabilidade do art. 208 do Còdigo Civil, que estabelece o prazo prescricional decenal.

Contudo, a existência da Lei Federal 9.873/99 advoga em sentido contrário, ao afirmar que prescreve em 5 anos as ações punitivas em decorrência da polícia adminsitrativa.

Esta norma, permissa vênia, deve ter sua interpretação restrita, nos termos de sua redação.

Isso porque o legislador foi absolutamente claro, tanto na ementa, quanto na redação de seu art. 1º, ao afirmar claramente:

“Art. 1º Prescreve em 5 (cinco) anos a ação punitiva da Administração Pública Federal, direta e indireta, no exercício do poder de polícia, objetivando apurar infração à legislação em vigor, contados da data da prática do ato ou, no caso de infração permanente ou continuada, do dia em que tiver cessado”.

O texto legal é expresso em vincular a sua aplicação à Administração Pública Federal, centralizada ou descentralizada, não sendo lícito ao intérprete estender os efeitos aos demais entes, por se tratar de norma expressamente Federal, não Nacional.

Portanto, considero afastada a aplicabilidade da norma contida na Lei Federal nº 9.873/99 quanto a definir a prescrição das multas de trânsito e de transporte.

Ao seu turno, a jurisprudência vem se consolidando em afirmar que se aplica, de forma analógica, o disposto no Decreto Federal nº 20.910/32, que dispõe:

“Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Muicípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em 5 (cinco) anos, contados da data do ato ou fato do qual se originarem.”

Tal norma é complementada pelo Decreto-Lei Federal nº 4.597/42, que amplia a aplicação daquele Decreto, nos seguintes termos:

“Art. 2º O Dec. 20.910, de 6 de janeiro de 1932, que regula a prescrição quinquenal, abrange as dívidas passivas das autarquias, ou entidades e orgãos paraestatais, criados por lei e mantidos mediante impostos, taxas ou quaisquer contribuições exigidas em virtude de lei federal, estadual ou municipal, bem como a todo e qualquer direito e ação contra os mesmos.”

Ambas as normas regulam o prazo prescricional de o administrado mover, em face das Fazendas corrrelatas, a ação de cobrança do crédito existente, a partir do ato que o originar.

Em julgamento proferido no Resp nº 623.023/RJ, concluído em 03/11/2005, referência em outros julgados do mesmo STJ, a Min. Relatora Eliana Calmon assim considerou o trato da questão:

“(...)Não tem aplicação à hipótese dos autos a prescrição constante do Código Civil, porque a relação de direito material que deu origem ao crédito em cobrança foi uma relação de Direito Público, em que o Estado, com o seu jus imperii , impôs ao administrado multa por infração.
Afasta-se também do tratamento da matéria a disciplina jurídica do CTN, porquanto não se questiona, in casu, o pagamento de crédito tributário, mas de valores cobrados à título de multa, sanção pecuniária de natureza eminentemente administrativa. O que não se deve olvidar, na busca de uma solução adequada para a resolução do impasse, é a existência do Decreto 20.910, de 06 de janeiro de 1932, que, no seu art. 1º, contém a seguinte disposição:
[omissis]
O dispositivo, perceba-se, trata da prescrição para as dívidas passivas da União,dos Estados e dos Municípios, fixando em cinco anos o prazo para que os administrados exerçam o direito de ação em desfavor da Fazenda Pública.
Reconheço que o mencionado artigo não faz referência à dívida ativa daqueles entes públicos, todavia entendo que, por aplicação do princípio da igualdade, corolário do princípio da simetria, deve-se impor à Administração Pública a mesma restrição para a cobrança de seus créditos.
Penso então que, na ausência de definição legal específica, o prazo prescricional para a cobrança da multa, crédito de natureza administrativa, deve ser fixado em cinco anos, não podendo a União, o Estado ou o Município gozar de tratamento diferenciado em relação ao administrado, porquanto não se verifica, nesse entendimento, risco de prejuízo ao interesse público.
À propósito, a Primeira Seção desta Corte, no julgamento do REsp 380.006/RS, de Relatoria do Min. Peçanha Martins, já se posicionou no sentido de que a prescrição administrativa opera-se com o decurso do prazo de cinco anos. Questionava-se, então, a cobrança de multa imposta pelo BACEN por infração cambial ocorrida há mais de dez anos da data do ajuizamento da ação.
Naquela oportunidade, não só o disposto no art. 1º do Decreto 20.910/32 serviu de fundamento para a decisão, mas também o art. 174 do CTN e o teor do art. 1º da Lei 9.873/99, de seguinte redação:
[omissis]
Portanto, entendo não merecer reparo a conclusão do TJ/RJ, mesmo que se tenha fundamentado o acórdão em disposição do CTN.”

Ainda que não aplicável diretamente as normas jurídicas aplicáveis, a MM. Ministra entendeu que o prazo de prescrição dos créditos das Fazendas decorre da aplicação do Princípio da Simetria com os créditos dos adminitrados em face das referidas.

Trata-se, pois, de aplicação analógica do direito para suplantar omissão legislativa na regulamentação das disposições prescricionais.

No mesmo julgado, em voto-vista, o Min. Castro Meira, consignou, se filiando à tese da Relatora:

“Trata-se de recurso especial interposto pelo Estado do Rio de Janeiro contra acórdão que aplicou o prazo qüinqüenal à multa por infração às normas do meio ambiente por considerá-la de natureza tributária.
A eminente Relatora, mesmo reconhecendo o equívoco na fundamentação do julgado, tendo em vista que se cuida de multa administrativa, negou provimento ao recurso, fazendo remissão a precedente da Primeira Seção, reportando-se também à Lei 9.873/99. Desse modo, não aceitou a tese do recorrente que pretendia estabelecê-la em vinte anos, norma geral prevista no Código Civil revogado.
Pedi vista para melhor exame, trazendo agora meu voto.
A tese do recorrente encontra respaldo em precedentes dos Tribunais Regionais Federais da 1ª, 2ª, 3ª e 4ª Região. Em sentido contrário, há precedente da 5ª Região, como demonstra o Procurador Federal Bruno Lemos Rodrigues, em trabalho recentemente publicado sobre o tema ("Prazo de Prescrição da Ação de Cobrança das Multas Administrativas,"Revista DCAP IOB, nº 06, junho/2005, pp. 11-23).
A divergência também subsiste na doutrina. A dificuldade existe porque a lei não é expressa quanto ao prazo para a cobrança das infrações administrativas. O próprio termo prescrição é inadequado para o caso, em que se verifica a perda do direito de a Administração promover a cobrança do seu crédito. Seria melhor falar-se em decadência, como lembra Maria Sylvia Zanella Di Pietro.
Nas últimas edições de sua obra, Celso Antônio Bandeira de Mello, revendo o posicionamento que adotara até a 11ª, quando preconizava a aplicação analógica do Código Civil, passou a reconhecer que se deve aplicar o prazo de cinco anos, por ser uma constante nas disposições gerais instituidoras de regras do Direito Público nessa matéria, a menos que se cuide de comprovada má-fé, quando seria de invocar-se a regra do Código Civil, agora estabelecida em dez anos.
Nesse mesmo sentido, já se fixara o mestre Caio Tácito, em estudo sobre a pena disciplinar, invocando como paradigmas a Lei 8.112/90 (art. 142), a Lei nº 6.383/80, o art. 174 do CTN, o Decreto 20.910/32 e o Decreto-Lei nº 4.597/42 (BDA nº 3, março de 1996, Editora NDJ Ltda, S. Paulo).
Com essas considerações, acompanho o voto proferido pela Sra. Ministra Relatora.”

Nesse sentido, a jurisprudência se filiou ao posicionamento da aplicação do lustro prescricional aos créditos das Fazendas, incluindo a administração descentralizada, de modo a ratificar a simetria dos prazos.

Sigo o mesmo entendimento, uma vez que se ao administrado lhe é dado o prazo de cinco anos, nada mais franco aos adminsitrados em débito que se valham do mesmo prazo, de modo a suprimir as lacunas decorrentes da ausênica de norma expressa a respeito.

Aliás, é função do magistrado integralizar o direito, suprindo lacunas legislativas, a partir da analogia, dos costumes e dos princípios gerais de direito, ex vi a LICC:

“Art. 4º Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.”

Diante da omissão, o magistrado utiliza-se de seu dever-poder de integralizar as normas vigentes, suprimindo omissões. Ainda que a omissão de prazo específico não se figura como omissão total, uma vez que vigente o prazo decenal geral do CC, a estipulação de prazo correlato ao caso inverso nada mais é do que a aplicação de princípios de paridade de armas entre as partes, além de proporcionar o auto-controle da Administração, para que não se quede inerte, mas utiliza os meios legais cabíveis para ver seu crédito satisfeito, em prazo razoável, e em benefício da coletividade.

De modo a corroborar com o entendimento, de forma análoga, há de se considerar a Súmula Vinculante nº 8, a qual dispôe:

“São inconstitucionais o parágrafo único do artigo 5º do Decreto-Lei nº 1.569/1977 e os artigos 45 e 46 da Lei nº 8.212/1991, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário.”

A inconstitucionalidade recentemente reconhecida em tais dispositivos decorrem da conflitância com as normas prescricionais tributárias, que são quinquenais, quando aquelas dispunham prazos decenais, restando todos quedados.

A inação da Administração, quando constituído o crédito, é de total afronta às normas constitucionais (Princípio da Eficiência) e se esquivar sob o argumento do prazo decenal nada mais é do que o comodismo sob sua ineficiência.

Desta feita, resta clara a prescritibilidade de seus créditos não tributários pelo prazo de cinco anos.

8. O próximo ponto a ser trabalhado é a definição do dies a quo do prazo prescricional.

Como já ressaltado, a prescrição nada mais é do que a fulminação da responsabilidade sobre o crédito pela inação do credor, por tempo superior ao definido em lei como aceitável, remanescendo, ainda o crédito. Ou seja, ele continua existente, mas não pode ser exigível.

Se a prescrição fulmina a responsabilidade pela inação, claro está que o prazo irá ter seu termo inicial a partir da sua exigibilidade. A par disso, citam Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, ob.cit., pg. 301, acerca do assunto, como resultado da Jornada de Direito Civil, junto ao STJ, o Enunciado sob nº 14:

“1. O início do prazo prescricional ocorre com o surgimento da pretensão, que decorre da exigibilidade do direito subjetivo; 2. O art. 189 diz respeito a casos em que a pretensão nasce imediatamente após a violação do direito absoluto ou da obrigação de não fazer.”

Desta feita, o gatilho temporal do lustro prescricional, no presente caso, se dará a partir do momento em que o crédito torna-se plenamente exigível e, por isso, responde patrimonialmente o devedor.

Como ressaltado no início, cada uma das multas possuem iter de surgimento e consolidação de seu valor, e por esse motivo, devem ter tratamento diferenciado.

Posto isso, mais uma vez se refuta a aplicabilidade da Lei Federal nº 9.873/99, uma vez que em seu art. 1º estabelece o dies a quo a data da infração, sendo que, adotando tal raciocínio, haveria transcurso de prazo prescricional sem a possibilidade de responsabilização do patrimônio do credor, porque não exigível, até o momento em que se estabelece a multa e consigna seu vencimento.

Sobre esse ponto em particular, mas em comentário à lei tributária, que possui tratamento semelhante à Lei Federal em comento, Paulo de Barros Carvalho, ob.cit., pg. 472, assim se manifestou:

“É fácil divisar, desde logo, que não se pode falar em curso da prescrição enquanto não se verificar a inércia do titular da ação. Todavia, o termo inicial do prazo, no Código Tributário, foi estipulado tendo em conta o momento em que o sujeito passivo é notificado do lançamento. Como aceitar que possa ter começado a fluir o lapso temporal se, naquele exato momento, e ao menos durante o período firmado no ato de lançamento, a Fazenda ainda não dispunha do meio próprio para ter acesso ao Judiciário, visando à defesa de seus direitos violados? O desalinho entre os pressupostos do instituto e o preceito do Código é indisfarçável. Não se preocupou o legislador em saber se havia possibilidade de exercício da ação judicial ou se o titular do direito se manteve inerte. Foi logo estabelecendo prazo que tem como baliza inicial um instante que não coincide com auqele em que nasce, para o credor, o direito de invocar a prestação jurisdicional do Estado, para fazer valer suas prerrogativas. Surpreende-se, neste ponto, profunda divergência entre a lógica do fenômeno jurídico e a lógica do fraseado legal. Como ficamos?
Temos inabalável convicção de que as imposições do sistema hão de sobrepor-se às vicissitudes do texto. Este nem sempre assume, no conjunto orgânico da ordem jurídica, a significação que suas palavras aparentam expressar.
A solução harmonizadora está em deslocar o termo inicial do prazo de prescrição para o derradeiro momento do período de exigibilidade administrativa, quando o Poder Público adquire condições de diligenciar acerca do seu direito de ação. Ajusta-se assim a regra jurídica à lógica do sistema.”

Com a devida vênia ao ilustre tributarista, que segue a linha tradicional de vincular a prescrição à perda de ação, teoria essa distinta da aqui adotada, o entendimento sobre o termo inicial é o mesmo, no qual, a partir do momento em que há a responsabilidade do devedor.

Tanto assim que estabelece o Código Civil:

“Art. 199. Não corre igualmente a prescrição:
(...)
II – não estando vencido o prazo;”

Trata-se de causa que impede a prescrição, começando a correr a partir do dia imediato de seu vencimento, tão-somente.

Agora, resta definir, entre as multas de trânsito e de transporte, qual o momento que se tem início a contagem do lustro prescricional, refutando, assim, a data da infração.

8.1. Como dito anteriormente, a multa de trânsito decorre de um iter, que surge a partir da lavratura do auto, passa por duas notificações e se conclui com o vencimento do boleto bancário.

Quando da lavratura do auto, a multa ainda é inexistente, por se tratar de mero germe de uma possível multa futura, dependende do processo administrativo correlato de trânsito, como ressalta o STJ:

“312. No processo administrativo para imposição de multa de trânsito, são necessárias as notificações da autuação e da aplicação da penalidade decorrente da infração.”

Tal enunciado decorre da idéia anterior dos órgãos de trânsito de que até a Resolução nº 149/03, o CTB estabelecia uma única notificação, já acompanhada da multa de trânsito correlata, sendo a dupla notificação inovação do CONTRAN.

Mais acertada a posição da jurisprudência, porque o próprio Codex estipula uma notificação da autuação, a ser expedida em até trinta dias, sob pena de insubsistência do auto (art. 281, par. ún., II) e a notificação após a aplicação da penalidade (art. 282). São atos sucessivos e por isso vigentes desde o início dos efeitos do diploma legal.

Lavrado o auto pelo agente de trânsito, excetuada a notificação pessoal no momento da infração (art. 280, VI do CTB), a autoridade de trânsito deverá notificar o proprietário do veículo em até 30 dias, devendo consignar na notificação o prazo não inferior a 15 dias, contados a partir da data da notificação, para que o proprietário apresente Defesa da Autuação e preencha, quando for o caso, o formulário de indicação de condutor (art. 3º, §2º da Resolução nº 149/03).

Recebida a Defesa, ou transcorrido o prazo in albis, a autoridade de trânsito julgará a subsistência, ou não, do auto de infração (art. 280 do CTB c/c art. 9º, §2º da Resolução nº 149/03). Se subsistente, aplicará a penalidade pecuniária prevista no CTB para o caso. Ou seja, somente neste momento surge a multa de trânsito.

Aplicada a penalidade, a autoridade notifica o proprietário de seu feito, indicando o prazo para recurso à JARI, nunca inferior a trinta dias da notificação (art. 282, §4º do CTB) e campo para autenticação para pagamento da multa (art. 9º, §3º da Resolução nº 149/03), além de consignar o desconto de 20% do valor original para pagamento na data consignada (art. 282, §5º c/c 284 do CTB).

Diante deste iter, a multa de trânsito, que somente surge mais de 45 dias após a autuação, terá sua data de vencimento em trinta dias após a emissão da notificação de penalidade, o que se conclui que somente a partir do vencimento dessa data inicia-se a prescrição.

Considerando o fato que o recurso à JARI não tem efeito suspensivo (art. 285, §1º do CTB – exceção é a demora no julgamento, superior a trinta dias, podendo suspender a cobrança, nos termos do §3º do mesmo artigo), desde o vencimento começa a transcorrer o lustro prescricional.

Mais, o vencimento estipula o prazo máximo de pagamento, sem o que a Fazenda credora não pode realizar qualquer ato constritivo. Somente vencido o crédito a Fazenda pode exigir seu valor, a partir do dia imediato ao consignado na Notificação de Penalidade.

Ressalto que já cheguei a cogitar o dies a quo a data imediatamente posterior ao término do prazo legal para realização do licenciamento anual do veículo. Esse entendimento estava sendo contruído a partir da rubrica do art. 284 do CTB, nesses termos:

“Art. 284. O pagamento da multa poderá ser efetuado até a data do vencimento expressa na notificação, por oitenta por cento do seu valor.” (grifei)

Pela utilização do verbo “poder”, significa dizer que o proprietário não estaria vinculado à data do vencimento contido no documento de cobrança, mas apenas uma liberalidade, à qual lhe retribuirá com o desconto de 20% do valor.

A obrigatoriedade somente se prefaziria em momento ulterior, junto ao licenciamento, ou registro do veículo pelo novo dono, conforme segue:

“Art. 124. Paa a expedição do novo Certificado de Registro de Veículo serão exigidos os seguintes documentos:
(...)
VIII – comprovante de quitação de débitos relativos a tributos, encargos e multas de trânsito vinculados ao veículo, independentemente da responsabilidade pelas infrações cometidas;
(...)
Art. 131. (...)
§2º O veículo somente será considerado licenciado estando quitados os débitos relativos a tributos, encargos e multas de trânsito e ambientais, vinculados ao veículo, independentemente da responsabilidade pelas infrações cometidas.” (grifei)

Dessa forma, seriam casos de impedimento de prescrição, até a consecussão do fato posterior, o registro ou o licenciamento, a partir do qual, sem o pagamento, seria dado o gatilho do prazo prescricional.

Chegar-se-ia, inclusive, ao entendimento que uma multa, lavrada em um determinado ano, somente se prescreveria em pouco mais de dez anos depois, porque, não realizando o proprietário o licenciamento anual, este prescreveria em cinco anos após a sua constituição definitiva, que ocorreria no último dia de prazo regulamentado pelo DETRAN de registro do veículo (art. 174 do CTN). A partir de então, começaria a correr o prazo prescricional das multas, por mais cinco anos.

Seria situação similar ao caso de Direito Tributário, quando do lançamento por homologação, em que a Fazenda tem o prazo decadencial de 5 anos para homologar o lançamento efetuado pelo contribuinte, a partir do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado (art. 173, I do CTN), sendo que decaido, o direito, consolida-se sobre o lançamento efetuado, iniciando novo prazo, agora prescricional, de cinco anos (art. 174 do CTN) para cobrança, se eventualmente não pago o tributo.

Contudo, ainda entendo por prematura esta tese quanto a prescrição da multa de trânsito, bem como desde seu vencimeto a Fazenda interessada poderá acionar judicialmente o devedor para cobrança dos valores, independentemente do licenciamento, o qual apenas é um meio célere para receber as multas, motivo pelo qual retorno ao entedimento de que o prazo prescricional se inicia a partir do dia imediato ao do vencimento da multa.

Assim, o dies a quo do lustro prescricional das multas de trânsito é o do dia imediatamente subsequente ao do vencimento da penalidade de multa, consignada na notificação de penalidade.

8.2. Definido o dies a quo da multa de trânsito, falta a definição referente à multa de transporte, estabelecida na Lei Municipal nº 11.263/02.

Como afirmado anteriormente, o processo de autuação e aplicação de penalidade é disciplinado pelo Decreto Municipal nº 15.487/06, devendo, após lavrada a autuação (art. 19), a autoridade de transporte aplica a penalidade e notifica o infrator, notificação essa acompanhada de documento de cobrança com data de vencimento, exceto quanto às concessionárias e às permissionárias que recebem valores por repasse, em que o desconto é automático (art. 21).

O recurso da penalidade é de 15 dias úteis da data da notificação e terá efeito suspensivo (interpretando a contrário senso o disposto no art. 24 do Decreto, ao dispor que o recurso não impede medidas administrativas nem responsabilidade, o que gera o efeito suspensivo da penalidade).

Claro que no que tange ao transporte, a penalidade de multa, para se determinar o termo inicial, somente tem interesse às multas aplicadas aos permissionários do serviço seletivo e aos casos de transporte clandestino, vez que nos demais casos o desconto é direto na fonte pagadora (Decreto Municipal nº 15.278/05).

A interpretação a ser dada é a mesma no que tange às multas de trânsito quando se trata de multa aplicada sobre o serviço seletivo.

Com relação ao transporte clandestino, como o pagamento é efetuado como condição para retirada do bem, em princípio, não haveria dificuldade em enfrentar a questão da prescrição. Todavia, em razão da liberação do veículo sem recolhimento da multa, o dies a quo será aquele da retirada do bem do pátio, exceto se vigorar decisão judicial suspendendo o início da contagem.

Desta feita, a prescrição das multas de transporte terá seu dies a quo, no caso do transporte seletivo, a data imediatamente após o vencimento da multa, enquanto que no transporte clandestino, a partir da retirada do bem, ressalvados os casos de suspensão ou interrupção por decisão judicial.

9. Outro ponto de interesse é a questão envolvendo a suspensão e a interrupção do prazo prescricional.

9.1. A suspensão é o estanque da contagem de prazo, até certo momento, quando se recomeça a contar, pelo tempo que resta para a conclusão, no caso da prescrição, dos cinco anos.

O Código Civil, em seus artigos 197 a 199, estabelece diversos casos em que o prazo prescricional não se iniciará, porque inexigível, ou suspenderá, porque corrente no momento, retomando sua contagem, de onde parou, até o fim, quando cessada a causa.

São elas:

“Art. 197. Não corre a prescrição:
I – entre os cônjuges, na constância da sociedade conjugal;
II – entre ascendentes e descendentes, durante o poder familiar;
III – entre tutelados ou curatelados e seus tutores ou curadores, durante a tutela ou curatela.
Art. 198. Também não corre a prescrição:
I – contra os incapazes de que trata o art. 3º;
II – contra os ausentes do País em serviço público da União, dos Estados ou dos Municípios;
III – contra os que se acharem servindo nas Forças Armadas, em tempo de guerra.
Art. 199. Não corre igualmente a prescrição:
I – pendendo condição suspensiva;
II – não estando vencido o prazo;
III – pendendo ação de evicção.”

Ao mesmo tempo, são causas de suspensão, de forma análoga aos créditos tributários, as causas previstas no art. 151 do CTN:

“Art. 151. Suspendem a exigibilidade do crédito tributário:
I – moratória;
II – o depósito do seu montante integral;
III – as reclamações e os recursos, nos termos das leis reguladoras do processo tributário administrativo;
IV – a concessão de medida liminar em mandado de segurança;
V – a concessão de medida liminar ou de tutela antecipada, em outras espécies de ação judicial;
VI – o parcelamento.”

Quanto a este dispositivo, em específico, Paulo de Barros Carvalho, ob.cit., pg. 473/474, diferencia de prescrição:

“Suspensão no curso do prazo prescricional não é a mesma coisa que suspensão da exigibilidade do crédito tributário. Frequentemente deparamos com a confusão das duas realidades juridicas, nas obras de bons autores. Para que se suspenda p lapso de tempo que leva à prescrição é iperativo lógico que ele se tenha iniciado, e, nem sempre que ocorre a sustação da exigibilidade, o tempo prescricional já terá começado a correr. Modelo significativo dessa disparidade encontramos no caso de impugnações e recursos interpostos nos termos das leis reguladoras do procedimento administrativo tributário. Lavrado o ato de lançamento, o sujeito passivo é notificado, por exemplo, a recolher o débito dentro de trinta dias ou a impugná-lo no mesmo espaço de tempo. É evidente que nesse intervalo a Fazenda ainda não está investida da titularidade da ação de cobrança, não podendo, por via de consequência, ser considerada inerte. Se o suposto devedor impugnar a exigência, de acordo com as fórmulas do procedimento administrativo específico, a exibilidade ficará suspensa, mas o prazo de prescrição não terá sequer iniciado.”

Diferentemente do sustentado pelo ilustre tributarista, constitui, sim, causa impeditiva ou suspensiva da prescrição, valendo-se apenas de critério distintivo se houve o transcurso de parte do prazo antes do fato indicado. Se não houve, é impedimento, sendo suspensão o inverso. Mas na prática, em todos os casos, a prescrição correrá, sempre, pelo tempo faltante, considerando se houve, ou não, prazo gasto anteriormente, motivo pelo qual entendo que as causas de inexigibilidade influem diretamente na prescrição, e devem ser consideradas.

A Lei Federal nº 6830/80, que trata da execução fiscal de Dívida Ativa, prevê como causa de suspensão:

“Art. 2º (...)
§3º A inscrição, que se constitui no ato de controle administrativo da legalidade, será feita pelo órgão competente para apurar a liquidez e certeza do crédito e suspenderá a prescrição, para todos os efeitos de direito, por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo.”

Por sua vez, a mesma Lei de Execuções Fiscais, ao trato das Dívidas Ativas em juízo, estabelece causa de suspensão:

“Art. 40. O Juiz suspenderá o curso da execução, enquanto não for localizado o devedor ou encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora, e, nesses casos, não correrá o prazo de prescrição.”

No âmbito do trânsito, as multas também sofrem suspensão quando o julgamento do recurso à JARI ou ao órgão de segundo grau demorar mais de trinta dias (art. 285, §3º c/c 289 do CTB).

Já as multas de transporte, sempre são suspensas se houver interposição de recurso, em interpretação do disposto no art.24 do Decreto Municipal nº 15.487/06.

9.2. A interrupção, por sua vez, é a cumulação da cessação da contagem de prazo com a nova recontagem do prazo, desconsiderando o que já ocorreu, em tese, nos termos do art. 202, par. ún, do CC, ocorrendo uma única vez.

Detalhe interessante decorre do texto legal do Decreto Federal nº 20.910/32, ao qual assim dispôs sobre o assunto:

“Art. 9º A prescrição interrompida recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu ou do último ato ou termo do respectivo processo.”

Ou seja, iniciado o prazo de prescrição e sobrevindo caso de interrupção, cessando este, recomeça a contagem do prazo, agora pela metade do prazo original, ou seja, de apenas dois anos e seis meses.

Foi a mesma solução adotada pelo Decreto-Lei Federal nº 4.597/42, assim dispondo:

“Art. 3º A prescrição das dívidas, direitos e ações a que se refere o Dec. 20.910, de 6 de janeiro de 1932, somente pode ser interrompida uma vez, e recomeça a correr, pela metade do prazo, da data do ato que a interrompeu, ou do último do processo para a interromper; consumar-se-á a partir do último ato ou termo da mesma inclusive da sentença nela proferida, embora passada em julgado, decorrer o prazo de dois anos e meio.”

Quanto ao prazo suplementar, para se evitar a perda dos cinco primeiros anos, o STF sumulou o seguinte entendimento:

“383. A prescrição em favor da Fazenda Pública recomeça a correr, por dois anos e meio, a partir do ato interruptivo, mas não fica reduzida aquém de cinco anos, embora o titular do direito a interrompa durante a primeira metade do prazo.”

Significa dizer que o prazo mínimo garantido em favor da Fazenda sempre será de 5 anos, ainda que o ato interruptivo ocorra em menos de dois anos e meio de transcurso do prazo, uma vez que tal hipótese redundaria na redução ilegal da prescrição.

Diante da interpretação adotada pelos tribunais pela aplicação dos dois diplomas como correlatos ao ponto de determinar o prazo prescricional dos créditos das Fazendas Públicas, a hipótese de retomada pela metade do período total após o ato também vincularia a Administração Pública?

Há de se considerar que, como demonstrado, a adoção do lustro prescricional decorreu justamente da sintonia de diversas disposições legais que envolvam a Administração Pública, ou seja, o prazo quinquenal decorrente de tais leis sobre créditos contra a Fazenda, a prescrição do crédito tributário, o disposto na Lei Federal 9873/99.

Todos os prazos conduziam à conclusão de que a prescrição é a de cinco anos, ou seja, o lustro.

Contudo, quando da retomada do prazo por ato interruptivo, ainda que unânime a legislação sobre a sua ocorrência única, diferem de tratamento quanto a retomada do prazo.

Tanto a Lei Federal nº 9.873/99 é silente, como o Código Tributário Nacional, mas o entendimento quanto a este, ao dispor sobre a interrupção, nas lições de Paulo de Barros Carvalh, ob.cit., 473:

“As causas previstas no parágrafo único do art. 173, uma vez ocorridas, têm a força de interromper o fluxo temporal que termina com a prescrição. Interrompido o curso do tempo, cessa a contagem, começando tudo novamente, isto é, computando-se mais cinco anos. (...) Toda vez que o período é interrompido, despreza-se a parcela de tempo que já foi vencida, retornando-se ao marco inicial.”

Diante da discordância da legislação, a única solução passível é a aplicação da norma geral, civil, no qual se retoma por sua integralidade.

Entretanto, não está pacificado o caso, podendo, inclusive, haver tendência de se adotar, pela jurisprudência, a solução dada pelas leis pretéritas, pela retomada do prazo pela metade do prazo original, ressalvada a hipótese da Súmula 383 do STF.

São casos de interrupção, pela lei civil:

“Art. 202. A interrupção da prescrição, que somente poderá ocorrer uma vez, dar-se-á:
I – por despacho do juiz, mesmo incompetente, que ordenar a citação, se o interessado a promover no prazo e na forma da lei processual;
II – por protesto, nas condições do iniciso antecedente;
III – por protesto cambial;
IV – pela apresentação do título de crédito em juízo de inventário ou em concurso de credores;
V – por qualquer ato judicial que constitua em mora o devedor;
VI – por qualquer ato inequívoco, ainda que extrajudicial, que importe reconhecimento do direito pelo devedor.”

No âmbito do direito tributário, de modo análogo, também arrolo as seguintes hipóteses:

“Art. 174. (...)
Parágrafo único. A prescrição se interrompe:
I – pelo despacho do juiz que ordenar a citação em execução fiscal;
II – pelo protesto judicial;
III – por qualquer ato judicial que cosntitua em mora o devedor;
IV – por qualquer ato inequívoco ainda que extrajudicial, que importe em reconhecimento do débito pelo devedor.”

Também de modo análogo, a Lei Federal nº 9873/99 prevê as seguintes hipóteses:

“Art. 2º Interrompe-se a prescrição:
I – pela citação do indiciado ou acusado, inclusive por meio de edital;
II – por qualquer ato inequívoco, que importe apuração do fato;
III – pela decisão condenatória recorrível.”

Prevê, ainda, Hely Lopes Meirelles, ob.cit., pg. 701, a interrupção nos seguintes casos, ressaltando sua reiniciação do prazo:

“Observamos, neste ponto, que, se a interrupção da prescrição de ser pelo ajuizamento de ação ou mandado de segurança, susta-se a fluência do prazo desde a citação ou a notificação e só é restabelecido no final da demanda, qualquer que seja a decisão.”

Data vênia seus ensinamentos, entendo que tais casos refletem os efeitos suspensivos do lapso prescricional, e não interruptivos, em interpretação analógica ao disposto no CTN, reformando, inclusive, entendimento meu contrário, quando me filiava à tese do saudoso mestre.

Também, a Lei de Execuções Fiscais (Lei Federal nº 6830/80) estabelece como causa de interrupção de prescrição, quanto às Dívidas Ativas:

“Art. 8º (...)
§2º O despacho do Juiz, que ordenar a citação, interrompe a prescrição.”

10. Transcorrido todo o prazo quinquenal da prescrição, deixa o devedor de responder pela dívida, remanescendo o crédito, tornando-se direito potestativo do devedor pagar ou não o indébito.

Uma vez prescrita a dívida, ela não pode ser mais exigível do devedor, por faltar-lhe norma que o obrigue a tanto, e no trato da questão pelo viés da Administração Pública, centralizada ou descentralizada, a Constituição delineia o princípio da legalidade como um dos cânones a ser seguido (art. 37 da CF).

Se a norma constitucional vincula a Administração Pública à legalidade, e a norma legal estabelece como consequência da prescrição a irresponsabilidade do devedor sobre a dívida, fulminando a total exigibilidade do crédito, não poderá ela se calcar em atos capazes de intimidar a pessoa devedora para realizar o pagamento, ainda que indiretamente.

A lei diz exatamente que não responde mais pela dívida, cabendo inclusive ao juiz, em processo judicial, desde já, reconhecendo a prescrição, extinguir o feito antes mesmo da notificação da parte adversa, conforme preceitua o CPC:

“Art. 219. (...)
§5º O Juiz pronunciará, de ofício, a prescrição.
(...)
Art. 295. A petição inicial será indeferida:
(...)
IV – quando o Juiz verificar, desde logo, a decadência ou a prescrição;”

Prescrita a dívida decorrente de multa, tanto de trânsito como de transporte, não pode a Administração Pública realizar qualquer ato que impinge o administrado a característica de inadimplente.

Acerca desse tema, cabe destacar algumas disposições de profundo relevo estabelecidas no Código de Defesa do Consumidor:

“Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.”

Ainda que a aplicação do Código de Defesa do Consumidor possui restrita abrangência, nos termos da relação juríica calcada entre as partes definidas em seus arts. 2º e 3º, mais o elemento de disponibilização ao mercado de consumo, há doutrinadores que vêem em algumas de suas disposições a aplicação em todas as relações de direito, entre elas a do presente caso.

Ou seja, a disponibilização em consulta, via internet, das multas existentes e prescritas a qualquer administrado pode configurar a exposição ao ridículo, sendo que quem falhou foi a Administração Pública que não intentou as medidas jurídicas cabíveis para a realização da cobrança (Princípio da Eficiência).

Até mesmo pode impedir a realização de negócios sobre o veículo, em um negócio inter pars pela existência das multas no sítio da Administração Pública, que mesmo que não responsável, pode afastar interessados, ou mesmo negar a ajuda de instituição bancária no negócio, ou ser medida de caracterização de contumaz inadimplente.

No mais, cabe ressaltar que as hipóteses de expedição de Certidão Negativa de Débito, contida no CTN (arts. 205 e ss.), há de ser interpretado de modo que, somente será declarada a existência de dívida, se plenamente constituída e não ter seus efeitos e exigibilidades suspensos ou interrompidos.

Se por algum motivo o devedor deixou de ser responsável pela dívida, não lhe pode ser imputada a declaração de positivação de dívida, porque não mais responde, sequer a ressalva de sua prescrição deve ser exposta, porque uma ver prescrito, não lhe pode impingir qualquer efeito social de inadimplência.

Assim, toda dívida prescrita deve ser baixada de sistemas que publiqum sua existência, por qualquer modo que for, podendo a Administração Pública, para os devidos fins, mantê-la existente, vez que o pagamento eventual e espontâneo por parte do devedor é válido.

11. Uma vez prescrita, a Administração Pública pode revogar a multa?

Imposta a multa, por ato da autoridade de trânsito ou de transporte, somente pode ser competente para revogar a multa a mesma autoridade, quiça seu superior, nunca inferior.

A multa nada mais é do que a declaração da escorreita autuação realizada e a sua correlação com a norma legal vigente.

O ato jurídico de imposição de multa é um ato administrativo, sendo que sobre o tema, o STF, perfilhando a doutrina, assim consolidou sua jurisprudência, nos termos do enunciado a seguir:

“473. A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.”

Não há que se falar em atos nulos, porque constituídos regularmente, mas apenas extinguindo a responsabilidade patrimonial do devedor sobre o débito. Portanto, resta analisar a questão da revogação das multas prescritas.

Desde que comprovada a conveniência por parte da autoridade penalizante, dentro da oportunidade surgida pela prescrição do crédito, pode ser revogada a multa aplicada, deixando de produzir seus efeitos.

Contudo, uma vez revogada, outros efeitos surgirão, uma vez que deixou de existir no mundo jurídico a respectiva multa.

Há sempre o temor pela questão da dispensa de receitas, mas para o presente caso, inexistindo causa para responsabilizar o patrimônio do devedor, não há meios para a Administração Pública reaver esses valores, apenas e tão-somente pela vontade do devedor, que sempre pode renunciar o privilégio.

Outra questão decorre justamente da renúncia do priviléligo. Se o devedor pagar a dívida, inexistindo a multa porque revogada, caberá à Administração Pública realizar o reembolso daquilo que recebeu sem causa, pelo valor pago.

Entretanto, uma vez revogada a multa, e mesmo assim cobrada do devedo, e, pior, paga, a Administração Pública se verá na obrigação de devolver, em dobro, o valor recebido, por se configurar valor indevido pelo administrado (art. 42, par. ún, do CDC).

Desta feita, decidido pela revogação da multa, todos os meios usados para a cobrança deverão cessar, de modo a se evitar o envio desta, sob pena de a Administração, que possivelmente sequer receberia o crédito, ter que se desfazer deste e ressarcir pelo cobrado indevidamente, pelo equivalente pago.

12. Em conclusão do presente parecer, tenho que:

a.) o prazo de prescrição das multas de trânsito e de transporte, na medida em que inexiste norma federal de aplicação nacional, no primeiro caso, e de norma municipal, no segundo, será de cinco anos, calcado no Princípio da Simetria;

b.) o dies a quo do lustro prescricional será o do dia imediato ao da data de vencimento constante no boleto de cobrança;

c.) são aplicáveis as causas de suspensão e interrupção contidas na lei civil, tributária e de execuções fiscais;

d.) uma vez prescrita, a multa não pode mais constar em certidões e consultas, sob pena de se configurar meio coercitivo e vexatório de cobrança;

e.) após a prescrição, poderá a mesma autoridade que aplicou a multa revogá-la, com as devidas cautelas para não realizar a cobrança.

* Parecer elaborado à Empresa Municipal de Desenvolvimento de Campinas S.A referente a cobrança das multas de trânsito no Municipio de Campinas.