O PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ E A NOVA REALIDADE DO PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO


Porfertiesca- Postado em 04 novembro 2012

 

UNIVERSIDADE DO OESTE DE SANTA CATARINA – UNOESC

CAMPUS DE SÃO MIGUEL DO OESTE

PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL

PROCESSO ELETRÔNICO

PROFESSOR AIRES JOSÉ ROVER

PÓS-GRADUANDO FERNANDO ERNESTO TIESCA PEREIRA

 

 

O PRINCÍPIO DA IDENTIDADE FÍSICA DO JUIZ E A NOVA REALIDADE DO PROCESSO JUDICIAL ELETRÔNICO

 

 

O Princípio da Identidade Física do Juiz está disciplinado no art. 132 do Código de Processo Civil, no qual vincula ao dever de julgar a lide tanto o magistrado titular quanto o substituto que concluir a audiência, somente excepcionando nos casos de convocação, licença, afastamento por qualquer motivo, promoção ou aposentadoria, quando, então, deverá entregar os autos ao seu sucessor. No parágrafo único, permite-se ao juiz que proferir a sentença, caso entenda necessário, mandar repetir as provas já produzidas.

Tal imposição legal advém da premissa de que o juiz que acompanha e encerra a instrução do processo possui subsídios maiores para prolatar a sentença, haja vista que colheu provas de forma oral, mantendo contato direto com as partes, testemunhas e demais sujeitos envolvidos, o que o legitimaria a julgar com mais qualidade e presteza, preservando-se, assim, as suas impressões e observações psicológicas e de experiência enquanto magistrado para a melhor resolução da lide.

Nessa linha de raciocínio, Araújo Cintra, Grinover e Dinamarco (2012, p. 362) aduzem que “(...) o magistrado deve ser o mesmo, do começo ao fim da instrução oral, salvo casos excepcionais, para que o julgamento não seja feito por um juiz que não teve contato direto com os atos processuais”.

Wambier e Talamini (2011, p. 73) se posicionam no mesmo sentido, assinalando que “(...) o juiz que tiver contato direto, na audiência, com as partes e testemunhas, tem mais e melhores condições de proferir uma sentença satisfatória, isto é, em que efetivamente se aplique o direito, do que aquele que não tenha presidido a audiência”.

Cumpre ressaltar que não basta por si só a conclusão da audiência para que o juiz permaneça vinculado, porquanto indispensável que colha a prova oral, conforme pontua Gonçalves (2012, p. 78): “Se, na audiência, ele não ouve ninguém, nem o perito, nem as partes em depoimento pessoal, nem as testemunhas, não há razão para que seja ele a julgar”. E arremata destacando que “o princípio pressupõe que o juiz que colheu a prova é o que está mais habilitado a proferir sentença, porque o contato pessoal com as partes e testemunhas pode ajudar no seu convencimento”.

Todavia, o princípio em análise prossegue como objeto de discussão na seara do Novo CPC.

Inicialmente, o PL 166/10, amplamente debatido no Senado Federal, manteve o princípio inserido na nova codificação com o mesmo sentido, mas com uma redação terminológica diferenciada no art. 112. No entanto, ao ser conduzido para debate na Câmara dos Deputados, na qual recebeu o n. 8.046/10, sob a revisão do Relator-Geral, Senador Valter Pereira, o projeto sofreu alterações consideráveis em inúmeros dispositivos, sendo, inclusive, suprimido o princípio. Por ora, encontra-se eliminado do projeto, mas nada impede o debate e eventual inserção novamente ou, quiçá, mantê-lo distante do novo ordenamento com a edição do projeto final, devidamente revisado, aprovado e sancionado para sua entrada em vigor.

Acontece que, sob a perspectiva do novo ordenamento e à luz das diretrizes inovadoras do processo judicial eletrônico, tendo por base a celeridade e economia processual, e que vem, aos poucos, sendo implantado na Justiça brasileira, não haveria mais razão para a manutenção de certos preceitos e princípios, que, em verdade, acabam se tornando entraves, em total dissonância com a nova realidade que se apresenta.

Pois bem, se nos novos moldes virtuais do processo, a colheita da prova oral se dá por intermédio de meios eletrônicos de registro em áudio e vídeo, incabível a vinculação estrita do juiz ao julgamento da lide quando acompanha e encerra a instrução processual, visto que as provas colhidas permanecerão registradas de forma fiel, podendo ser facilmente consultadas e apreciadas por qualquer magistrado que receber os autos para resolução.

Ademais, frise-se que, por questões de organização judiciária, carência de julgadores e a enorme demanda de processos, obviamente que nem sempre o que colhe a prova conseguirá julgar a lide. Por tais motivos, revela-se como sem necessidade a existência de princípio vinculativo no ordenamento processual, diante do registro fiel da prova oral no processo eletrônico, sendo esta uma das faces da moeda.

Do ponto de vista da outra face da moeda, a subsistência do princípio encontraria fundamentos na sua própria acepção, quando vincula ao julgamento da lide o magistrado que mantém contato direto com as partes e demais sujeitos envolvidos na audiência para colheita da prova oral, eis que efetuou os questionamentos pertinentes e obteve as informações fundamentais para formar com qualidade e coerência o seu convencimento, tendo subsídios suficientes para resolução do conflito.

Destarte, não há uma certeza de qual caminho o legislador processualista seguirá, se mantendo ou não o princípio no ordenamento processual, pois o debate do Novo CPC não findou.

Porém, à vista do exposto e com fulcro na forte carga principiológica que irradia todo o sistema, conclui-se que o princípio não pode ser plenamente suprimido da nova realidade processual, mas deve ser preservada parte de sua essência ao assumir novos contornos.

Ou seja, como na sistemática do parágrafo único do art. 132, ainda em vigor no CPC, mostra-se relevante a permissão conferida ao juiz que proferir a sentença, caso entenda necessário, em mandar repetir as provas já produzidas, com a finalidade precípua de resguardar o seu convencimento qualitativo para a melhor resolução da lide, em especial quando não é o mesmo que colheu a prova oral, buscando-se, portanto, preservar a coerência, o equilíbrio e a segurança jurídica da sua decisão, que estará embasada em provas robustas.

Do contrário, de nada adianta um processo judicial eletrônico mais célere, econômico e de duração razoável sem respeitar determinadas garantias e princípios fundamentais.

 

REFERÊNCIAS:

BRASIL. Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973. Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ ccivil_03/leis/L5869compilada.htm>. Acesso em: 03 nov. 2012.

 

BRASIL. Quadro comparativo entre a redação original do projeto de Lei do Senado n.º 166, de 2010, o Código de Processo Civil em vigor e as alterações apresentadas no substitutivo do Senador Valter Pereira. Disponível em: <http://www.senado.gov.br/atividade/materia/getPDF.asp?t=84496>. Acesso em: 03 nov. 2012.

 

BRASIL. Projeto de Lei n. 8.046, de 22 de dezembro de 2010. Novo Código de Processo Civil. Disponível em: <http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=490267>. Acesso em: 03 nov. 2012.

 

CINTRA, Antônio Carlos de Araújo; GRINOVER, Ada Pellegrini; e DINAMARCO, Cândido Rangel. Teoria Geral do Processo. 28 ed. São Paulo: Malheiros, 2012.

 

GONÇALVES, Marcus Vinicius Rios. Direito processual civil esquematizado. 2 ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2012.

 

WAMBIER, Luiz Rodrigues; TALAMINI, Eduardo. Curso avançado de processo civil: teoria geral do processo e processo de conhecimento. v. 01. 12 ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.