''O capitalismo frente a poderes econômicos, estatais e democráticos''


PorLucimara- Postado em 07 maio 2013

Autores: 
Rios, Daniela Gil

 

Title:The capitalism upon economic, state and democratic power


 

Resumo:

O capitalismo, o feudalismo e o escravagismo, divergem em relação a forma de controle, de modo que o capitalismo utiliza-se do Direito e do Estado como garantidor do poder.

Além de garantidor, o Estado busca sua fatia de poder perante o particular e as outras Nações, sendo aquele que controla e detém o controle em muitas atividades passando a qualidade de “rentista”.

Embora o Estado detenha tanto poder, fundamental tratar da influência exercida pela pressão do particular, que conhece sua força de mudanças e decisões, defendendo seus interesses na confirmação de um Estado Democrático de Direito.

Abstract:

The capitalism, feudalism and slavery don´t come to a consensus when it comes to the control model, as capitalism is based on the state and law as a power guarantor.

Besides being a guarantor, the state searches its power share upon citizens which controls and detains control in several activities turning out to be a renter.

Although the state detains power, essential at dealing with the influence by the pressure of organizations, which is aware of its changing power and decision, defending its interests in a democratic state of law.

Palavras-chave: Capitalismo. Intervenção Estatal. Democracia.

Keywords: Capitalism.State intervention.Democracy.

Sumário: 1. Introdução. 2. Capitalismo em relação ao poder econômico e estatal. 3. O capitalismo em relação ao poder democrático. 4. Conclusão. 5. Bibliografia.


 

1 - Introdução

O presente estudo busca resgatar formas de atuação do Estado e do particular dentro do sistema capitalista.

Esse sistema é tão atrativo que se fortaleceu a ponto de modificar conceitos anteriormente completamente antagônicos, já que atualmente é possível a defesa da coexistência de “acumulação ilimitada” em um Estado Democrático.

Tal acumulação é perseguida, por particulares, mas também por nações que são fortalecidas pelo poder econômico em detrimento de qualquer fortaleza social, já que esta são as bases atuais para a soberania perante outras nações, já que de fato é poder econômico é o único valor universal dos tempos atuais.

Em que pese tal valor, verifica-se uma situação extrema de pressão e são justamente nesses momentos que geralmente os insatisfeitos se unem e eclodem movimentos que mudam a dinâmica de existência observada por determinado tempo.

A força desses movimentos, ainda está presente, mesmo que seja observada alteração na sua forma de atuação, já que hoje são muito mais democrática, afinal os insatisfeitos não se unem em pequenos grupos, mas em grandes ideais, que ultrapassam as fronteiras econômicas, políticas e sociais.

Que os assuntos abordados sirvam de reflexão, construção científica e social.

2. Capitalismo em relação ao poder econômico e estatal

A adoção do capitalismo gerou um distanciamento econômico ainda maior entre aqueles que concentram as riquezas e aqueles que não a possuem, Marx bem observou quando manifestou-se no sentido de que o capitalismo é o único sistema em que permite-se a acumulação de forma ilimitada.

Essa acumulação ilimitada é facilmente observada se compararmos ao escravismo e feudalismo, já que nesses últimos a proteção e tutela dos interesses davam-se de forma direta, em que o poder era sem intermediários e cada senhor somente poderia possuir aquilo que conseguisse controlar por seus esforços, de modo a haver a auto-tutela nessas relações, já que a este tempo o direito se prestava muito mais a tratar de questões incidentais.

Já no sistema capitalista o Estado assume papel fundamental no controle das relações econômicas, mesmo porque havendo a possibilidade deste terceiro “vigiar” aquilo que antes não estava ao alcance dos olhos, defendendo a propriedade em favor de seu dono, de modo que o direito passa a se preocupar com questões de maior relevância e alcance econômico.

As relações econômicas se expandindo tem como conseqüência a competição entre aqueles que fornecem produtos e serviços, de modo que para que essa competição seja saudável faz-se necessário estabelecer regras para a convivência dos detentores do poder econômico, já que dependentes entre si.

Carlos Alonso Barbosa de Oliveira bem observa que a estrutura concorrencial do capitalismo supõe a existência de aparelho industrial integrado, sistema de crédito que garanta a mobilidade do capital entre as diferentes esferas da atividade econômica, bem como uma classe de trabalhadores livres.

Elemento que podemos extrair do conceito supramencionado é que o poder de subordinação chegado junto ao capitalismo, diferencia-se dos sistemas anteriormente experimentados, já que a partir da existência desse novo há uma dependência tanto daqueles que detém o poder econômico, quanto da massa, esta última refém de sua força de trabalho, de modo que a liberdade do trabalhador supramencionada, deve ser relativizada, já que o indivíduo é dependente de fatores econômicos.

Nas primeiras investidas do sistema capitalistas já pode ser observada a centralização do capital, contudo, essa centralização se fazia divergente e mais frágil em relação com a vista na atualidade, posto que anteriormente a tecnologia simplificada e montante de investimentos, para ingresso no mercado, era infinitamente menor que o aporte necessário nos tempos atuais, a saber:

“Por sua vez, a tecnologia simples, as modestas dimensões de plantas e os reduzidos montantes de capitais exigidos para os investimentos tornam viável o surgimento de novos capitais individuais.”(OLIVEIRA, 2003, p. 173-258)

Com a centralização das riquezas nas mãos dos investidores e donos de indústrias, percebemos que poder encontra-se na economia, de modo que o Estado fortalece a possibilidade de acumulação, por meio de uma aparente exterioridade:

“E afirmamos que a relação de exterioridade é aparente porque é a própria dinâmica da estrutura econômica a característica não intervencionista do Estado liberal.”(OLIVEIRA, 2003, p. 173-258)

Contudo, seria simplista imaginar que o Estado realmente está fora do sistema ou mesmo que sua atuação se restrinja ao controle daquilo que está em poder dos particulares, de modo que partilhamos da idéia de equilíbrio entre público e privado, conforme descrito por Adolfo Gurrieri em Vigência de Estado Planificador em la Crisis Atual:

“ En efecto, su ideal consitía mas bien em encontrar um equilíbrio entre lo público y lo privado, entre Estado y el mercado, que aprovechara los aspectos positivos de cada uno, facilitara su complementatión y evitara las consecuencias negativas que produce el predomínio excessivo de alguno de ellos sobre el resto”.

O Estado como garantidor da defesa do interesse público em detrimento do particular, por óbvio também terá o interesse no desenvolvimento da economia estatal, razão pela qual historicamente pode-se observar que este se posiciona no sentido de financiar não só o desenvolvimento da infra-estrutura local para escoamento dos produtos, mas também “trabalha” o crédito aos investidores.

A partir disso, entende-se que o Estado não se posiciona somente como controlador das medidas que influenciarão no mercado, mas também é o mais forte de todos os atuantes afinal, além de disputar mercado ele ainda tem para si uma vantagem em relação aos demais, já que está no centro das decisões políticas.

Geralmente essa vantagem existe, podendo ser percebida inclusive na reserva de monopólio ao Estado prevista no ordenamento jurídico ou pela regulamentação de interesses econômicos estatais, desnecessário mencionar que os interesses aqui enfatizados são os interesses legítimos, portanto diferentes daqueles pessoais dos representantes em situação.

Vale dizer que o monopólio em de uma empresa em particular, via de regra, não traz benefícios à sociedade, afinal os preços e condições centralizadas no interesse individual gera coloca a cadeia consumerista em relação de maior dependência.

Entretanto, ainda assim, em alguns momentos faz-se necessária a concessão de monopólios, justificável em poucas e específicas situações como nos momentos em que há interesse em fortalecer um Estado ou mesmo fomentar a pesquisa, observado o caso do desenvolvimento de medicamentos, razão pela qual atualmente existe o resguardo através da patente.

Porém, necessário faz-se entender o motivo pelo qual vivencia-se esse tipo de situação protecionista, que anteriormente não era tido como regra, a título de ilustração, vale o comentário de Fernando Haddad, sobre o lucro inicial das inovações:

“ Segundo o modelo schumpeteriano (e marxista), a empresa inovadora gozará de um lucro extraordinário até o ponto em que o comportamento reflexivo de seus concorrentes, na ânsia por obtê-lo, acaba por eliminá-lo”(HADDAD, 1992, p. 103-128).

Por vezes, acontece do Estado intervir de forma tão incisiva no capitalismo que passa a assumir as funções do capitalista, criando assim o “Estado capitalista”, que implementa plano econômico próprio, passando a regulamentação de mercado para algo complementar.

Conforme entendimento de Frederick Pollock, no sistema de capitalismo de Estado, o particular torna-se um “rentista” do Estado, sendo que este último tem por finalidade a busca do pleno emprego, da matéria prima adequada à tecnologia disponível e permitir a expansão dentro de limites pré-estabelecidos.

Diz-se que o Estado faz do particular um “rentista” a medida que toma para si as atribuições próprias do capitalista, a fim de desenvolver a economia e centralizar as riquezas, utilizando inclusive o investidor como forma de obtenção de lucro, já que o particular terá sua atividade diretamente dependente das concessões estatais.

Essa forma de Estado a princípio não possui qualquer espécie de restrição, uma vez que soberano, contudo os principais obstáculos são verificados no âmbito político e em relação aos demais países, a medida que não há que se falar em completa independência em um Estado capitalista, ainda que sob a influência de um “capitalismo de Estado”.

3. O capitalismo em relação ao poder democrático

Historicamente podemos verificar que as mudanças substanciais observadas no direito decorrem de pressão, a título de exemplo pode-se citar as mais diversas situações, como a história social do movimento trabalhista europeu:

“As duas investidas do movimento trabalhista inglês entre as duas revoluções de 1830 e 1848 proporcionaram também aos trabalhadores no continente o esquema de suas próprias lutas classistas. Com os resultados avançados, os trabalhadores ingleses haviam dado a prova concreta de que era possível, através das ações do proletariado, levar o poder público a intervenções sócio-políticas, a forçar, pela luta sindical imediata, concessões em matéria de política salarial e a melhorar o padrão de vida e o nível educacional da classe obreira, em contraposição às tendências – ‘naturais’ sem luta de classes – de depauperamento das massas.”(ABENDROTH, 1977, p.13 -71 )

A pressão para mudança pode ser dar por manifestação popular e aí temos a expressão de democracia, já que o direito se presta a regulamentar as relações sociais, nada mais justo que a sociedade manifestar-se em relação a seus interesses.

Na tentativa de ilustrar a importância da democracia, Carlos Ayres Britto a coloca como base estrutural de todo o ordenamento jurídico, a saber:

“A Democracia está no centro dos princípios constitucionais, tanto quanto os princípios constitucionais estão no centro da Constituição e a Constituição está no centro do sistema jurídico”(BRITO, 2003, c. V).

Em que pese a discordância em relação a um princípio central, a democracia atualmente é um valor nacional de extremada relevância, manifestando-se tanto nas diretrizes em relação aos particulares, quanto nas questões abordadas pelo direito administrativo, como por exemplo, quando temos a gestão pautada na supremacia do interesse público em relação ao particular.

Apesar de vivenciarmos uma democracia representativa, não podemos esquecer que em caso de inadequação desta, o representado e titular do direito, qual seja o povo, poderá manifestar sua insatisfação e exigir que a adequação ou mesmo exercer sua vontade de forma direta, a fim de modelar o Estado, que deve ser o reflexo do desejo de seus integrantes.

Aristóteles bem observou que “não há homem justo numa polis injusta” de modo que simplesmente acusar representantes de agir de forma indevida ou mesmo o poder econômico de ser indiferente a questões sociais e nada fazer é o mesmo que consentir as atitudes por este tomadas.

A partir disso, evidente que a omissão também é reprovável, bem assevera Rudolf Hilferding:

“Sempre me surpreendo com a afirmativa, ainda ocasionalmente pronunciada, de que a democracia é um assunto da burguesia. Tal pretensão revele ignorância sobre a história da democracia e é uma frágil tentativa intelectual de deduzir sua história a partir dos escritos de um punhado de teóricos.” (HILFERDING, 2002, p. 515-530).

Os cidadãos em geral subestimam seu poder de mudança e sua importância dentro da sociedade, pelo temor reverencial ao poder econômico, colocando-se em oposição a estes, não observando que a dependência é mútua e que a regulamentação de responsabilidades muitas vezes são criadas justamente pela força do cidadão e suas exigências.

O grande valor da democracia está na “voz” que é dada a todos que desejam reivindicar, sendo certo que de modo algum essa “voz” deve ser tida como somente liberdade de expressão, posto que consistente em um direito muito mais amplo, fugindo inclusive da mera informação, com amplitude de manifestação de vontade.

Como princípio constitucional assegurado a todos, não se pode excluir o interesse de determinados segmentos da sociedade, por entender que na condição de “detentores do poder econômico” já possuem demasiadamente em relação a sociedade e que por esse motivo seus interesses seriam “caprichos” e não legitimados.

Justamente pela relevância econômica, liberdades ou restrições aos detentores do poder econômico, refletem em toda a sociedade, afinal atualmente não há mais como conceber que uma decisão a determinado grupo econômico ficará restrita a seu controlador e seus funcionários, posto que vivencia-se uma era em que as nações se fazem interdependentes.

As fronteiras entre os Estados são rompidas pela economia, a medida que grandes empresas escolherão onde colocar seus investimentos, o que possui influência direta em relação ao desenvolvimento e contribuição social de uma área geográfica, por vezes consistindo fator determinante para elevar a qualidade de vida de uma determinada região, pela geração de empregos e sobretudo pelos tributos que recolherá, através dos investimento no local, atração de mão-de-obra e moradores, o que requer a abertura para o comércio e novas oportunidades aos residentes no local.

De modo que seria ingenuidade imaginar que a impossibilidade de crescimento de uma empresa ou de um determinado segmento não traz reflexos para a população ou mesmo ao Estado, que poderá contar com novos investimentos e representatividade no cenário mundial de acordo com a economia de seu país.

Diante disso, resta evidenciado que é conduta conveniente do Estado ouvir as reivindicações da massa e também as expectativas das empresas. Por sua vez, as empresas devem buscar demonstrar as necessidades para desenvolvimento e contribuição com a coletividade ao invés de assumir papel de legislador ou mesmo de exercer pressão do Estado, que não pode ser inerte e deixar que o particular legisle.

O Estado não só deve estabelecer limites, mas também fomentar o desenvolvimento por meio de resguardo à livre iniciativa, não em virtude de interesses particulares dos empresários, mas justamente pelos reflexos dessa liberdade e pelos prejuízos decorrentes quando esta verificada ausente.

A categoria dos consumidores parece ser sempre a mais beneficiada com a livre iniciativa, até porque a partir dela opções são oferecidas a eles que poderão fazer suas escolhas a seu exclusivo critério de conveniência e não por imposição de monopólios, vale mencionar o posicionamento dos marginalistas em relação a importância do consumo em relação a economia:

“Ao afirmarem que a actividade econômica tem em vista a produção de utilidades com vista à satisfação das necessidades dos indivíduos, os marginalistas estão a defender que é o consumo – e não a acumulação – o principal factor impulsionador da economia, privilegiando a soberania do consumidor relativamente à soberania do capitalista-acumulador-investidor.” (NUNES, 2007, c. XII).

Não se trata de conceito uniforme a inclusão do consumidor, que pode ser entendido aqui como a representação da massa, no centro econômico e principal fator que impulsiona a economia de um país, a única coisa que não resta dúvidas é que este sim exerce um papel relevante e que pode ser definitivo para mudanças, desde o momento que exerce suas escolhas, mas principalmente quando atuante no exercício dos direitos democráticos.

4. Conclusão

A partir do observado, pode-se extrair que apesar de muitas vezes o capitalismo posicionar a massa e os detentores do poder econômico em lados opostos, ambos se relacionam de forma interdependente, cumprindo ao Estado estabelecer diretrizes e apontar as condutas que mais atendam o interesse da coletividade.

Deste modo, resta evidenciado que o Estado não pode ser inerte e deixar que a economia caminhe por si ou “pela mão invisível”, visto que os reflexos econômicos atingem a todos, principalmente o próprio Estado e o interesse público.

Decorrente da evolução da indústria, do desenvolvimento tecnológico e da expansão de mercado, a concorrência se fomenta pela demonstração do diferencial dos produtos e serviços em relação aos demais,.

A massa não pode ser tratada como mera expectadora do que ocorre no mercado, visto que estamos em um Estado Democrático de Direito em que a reivindicação e pressão fazem parte da pavimentação da evolução da sociedade, que tem por obrigação tomar posturas ativas ao invés de se manter inerte.

Nesse sentido, a Constituição de 1988, também tratada como “Constituição Econômica”, reflete as questões e inquietações sociais, sendo reflexo de um momento histórico. Importante ressaltar que apesar de ser norma rígida, o seu conteúdo pode e deve ser compreendido de modo diferente de acordo com tempo.

A postura esperada do Estado é que este observe as possibilidades de desenvolvimento por meio da contribuição econômica das atividades empresariais e as necessidades do cidadão, intervindo nessas relações quando lhe for solicitado ou mesmo nas situações em que se observe divergência entre os acontecimentos e o bem comum.

 

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