Notícia - Pirateiem meus livros


PorClarissa Vieira- Postado em 13 junho 2011

 

Pirateiem meus livros

PAULO COELHO – (OPINIÃO)FOLHA DE S. PAULO – 29/05/11

 

Em meados do século 20, começaram a circular na antiga União Soviética vários livros mimeografados questionando o sistema político. Seus autores jamais ganharam um centavo de direitos autorais. Pelo contrário: foram perseguidos, desmoralizados na imprensa oficial, exilados para os famosos gulags na Sibéria. Mesmo assim, continuaram escrevendo. Por quê? Porque precisavam dividir o que sentiam. Dos Evangelhos aos manifestos políticos, a literatura permitiu que ideias pudessem viajar e, eventualmente, transformar o mundo.

Nada contra ganhar dinheiro com livros: eu vivo disso. Mas o que ocorre no presente? A indústria se mobiliza para aprovar leis contra a "pirataria intelectual". Dependendo do país, o "pirata" -ou seja, aquele que está propagando arte na rede- poderá terminar na cadeia.

E eu com isso? Como autor, deveria estar defendendo a "propriedade intelectual". Mas não estou. Piratas do mundo, uni-vos e pirateiem tudo que escrevi! A época jurássica, em que uma ideia tinha dono, desapareceu para sempre. Primeiro, porque tudo que o mundo faz é reciclar os mesmos quatro temas: uma história de amor a dois, um triângulo amoroso, a luta pelo poder e a narração de uma viagem. Segundo, porque quem escreve deseja ser lido -em um jornal, em um blog, em um panfleto, em um muro.

Quanto mais escutamos uma canção no rádio, mais temos vontade de comprar o CD. Isso funciona também para a literatura: quanto mais gente "piratear" um livro, melhor. Se gostou do começo, irá comprá-lo no dia seguinte -já que não há nada mais cansativo que ler longos textos em tela de computador.

1 - Algumas pessoas dirão: você é rico o bastante para permitir que seus textos sejam divulgados livremente. É verdade: sou rico. Mas foi a vontade de ganhar dinheiro que me levou a escrever?

Não. Minha família, meus professores, todos diziam que a profissão de escritor não tinha futuro. Comecei a escrever -e continuo escrevendo- porque me dá prazer e porque justifica minha existência. Se dinheiro fosse o motivo, já podia ter parado de escrever e de aturar as invariáveis críticas negativas.

2 - A indústria dirá: artistas não podem sobreviver se não forem pagos. A vantagem da internet é a divulgação gratuita do seu trabalho.

Em 1999, quando fui publicado pela primeira vez na Rússia (tiragem de 3.000 exemplares), o país logo enfrentou uma crise de fornecimento de papel. Por acaso, descobri uma edição "pirata" de "O Alquimista" e postei na minha página. Um ano depois, a crise já solucionada, eu vendia 10 mil cópias.

Chegamos a 2002 com 1 milhão de cópias; hoje, tenho mais de 12 milhões de livros naquele país.

Quando cruzei a Rússia de trem, encontrei várias pessoas que diziam ter tido o primeiro contato com meu trabalho por meio daquela cópia "pirata" na minha página.

Hoje, mantenho o "Pirate Coelho", colocando endereços (URLs) de livros meus que estão em sites de compartilhamento de arquivos. E minhas vendagens só fazem crescer -cerca de 140 milhões de exemplares no mundo.

Quando você come uma laranja, precisa voltar para comprar outra.

Nesse caso, faz sentido cobrar no momento da venda do produto.

No caso da arte, você não está comprando papel, tinta, pincel, tela ou notas musicais, mas, sim, a ideia que nasce da combinação desses produtos.

A "pirataria" é o seu primeiro contato com o trabalho do artista.Se a ideia for boa, você gostará de tê-la em sua casa; uma ideia consistente não precisa de proteção. O resto é ganância ou ignorância.

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Análise:

A notícia trás um ponto de vista bastante atual sobre o assunto pirataria. Aborda o fato da pirataria de livros, levando em conta de que a mesma ajuda no processo de divulgação da obra literária e ainda divulga o autor, portanto influenciando de forma positiva a vendagem. Mas vale ressaltar que o caso dos livros é muito ajudado pelos seguintes fatores: -o desconforto de leitura causado pela fonte luminosa da tela (e outras características especificas do suporte informático que estiver em uso) e –o público alvo da literatura: o público dos livros impressos é bem definido, pessoas que compram livros para ler continuarão fazendo-o, mesmo que existam cópias piratas na internet (nesse caso, a cópia pirata poderia ajudar no primeiro, o que seria um ponto positivo.

Infelizmente não é tão simples, pelo contrário é muito complexo e cada ramo dessa manifestação pirata tem características diferentes de mercado e produto.

Analisando o caso da música: os arquivos mp3, shows e clipes em DVD, temos alguns diferenciadores: os “artistas de singles” não exerceriam uma motivação tão grande para compra de um CD ou DVD, o público escolheria na rede apenas a música que o interessa, a mesma tem qualidade proporcionada de forma semelhante ao original e não se paga pelo que não gosta – o que não desmerece o autor, apesar de várias músicas “ruins”, o mesmo possui autoria de TODAS. Porém, essa briga já mostrou-se inviável, pois os CDs e DVDs “originais” tem preço elevado para a faixa salarial brasileira e o compartilhamento desses arquivos na rede é incontrolável. Porém o público desses CDs e DVDs, assim como nos livros, hoje é bastante diferenciado e continua pagando por esse “diferencial”. Logo, no contexto atual a pirataria leva essa música a diferentes classes, divulgando-a e fazendo com que o público do artista aumente (o mesmo continua com a renda em shows, produtos, comerciais, direitos de imagem, eventos...).