Mídia, Opinião Pública ativa e Esfera Pública democrática.


Porjulianafachin- Postado em 04 setembro 2012

 

Jorge Almeida*

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Resumo:

Neste trabalho, estudamos o nascimento e a decadência da opinião pública e da esfera pública burguesa e dialogamos com diversas abordagens sobre esta temática. Criticamos a situação vigente mas advogamos a possibilidade de construir, dentro de certas condições políticas, com base nas novas tecnologias e nos mídia, e a partir de novos sujeitos sociais e de espaços no Estado, uma opinião pública ativa e uma esfera pública democrática.

1. Introdução.

A relação entre esfera pública, opinião pública e cena política tem sido abordada, nos estudos da comunicação, principalmente a partir da cena política e de sua gramática. Menos importância tem sido dada às conseqüências da cena política midiatizada para a democracia e para as transformações que tem provocado sobre a esfera pública e a produção da opinião pública. Por isso, é fundamental abordar, nos estudos de comunicação e política, a relação das novas tecnologias, das novas sociabilidades, da emergência de novos sujeitos sociais e da cena política midiatizada com a opinião pública e a esfera pública contemporâneas.
Neste trabalho, partimos de Habermas em seu clássico Mudança estrutural da esfera pública (1984), e fazemos um estudo do nascimento da opinião pública e do surgimento, evolução e decadência da esfera pública burguesa. Criticamos e dialogamos com as suas abordagens iniciais e mais recentes, assim como com a de outros autores sobre a temática e os desafios atuais para o seu estudo, descrição e normatização. 
Atualmente, não encontramos uma esfera pública como aquela descrita inicialmente por Habermas. Ou seja: a reunião de um público, formado por pessoas privadas, que constróem uma opinião pública, com base na racionalidade do melhor argumento, e fora da influência do poder político e econômico, e da ação estratégica. Portanto, de modo geral, é correta a crítica que se faz a um processo de superficialização da política e do debate político; à inconsistência do que tem sido chamado de opinião pública; aos métodos quantitativos e qualitativos de apreensão desta opinião; à burocratização e mercadorização crescente do espaço público; à manipulação; e ao papel que mídia e marketing exercem neste sentido. 
Porém, isto não significa que a midiatização da sociedade e da política, tenha eliminado a existência da opinião pública e de outras mediações da sociedade ou que impossibilite a construção de uma efetiva esfera pública democrática. Assim, é preciso discutir seu processo de produção e em que circunstâncias as opiniões podem ser mais ativas. 
Além da existência de outras mediações políticas, sociais e culturais e de espaços de relativa autonomia da recepção, os grandes meios de comunicação de massa, desde que democratizados e desmercadorizados, são instrumentos indispensáveis para a democratização da produção de opiniões públicas. Além disso, as novas tecnologias telemáticas, criam as condições materiais para o funcionamento de uma esfera pública ampla, ativa e com novos canais de democracia direta. Isto - ao lado do desenvolvimento de esferas de participação da cidadania, como os conselhos populares que estão se viabilizando em várias prefeituras municipais brasileiras - pode levar os sujeitos sociais emergentes (na forma de organizações da sociedade civil ou esferas públicas autônomas) a construírem uma nova esfera pública e uma nova democracia que combine mecanismos representativos, participativos e plebiscitários de decisão.

2. Habermas e a mudança estrutural da Esfera Pública.

Em Mudança estrutural da esfera pública, escrita em 1961, Habermas (1984) deixa claro que a sua tarefa nesta obra não é o estudo da esfera pública em geral, mas a análise das origens e transformações da esfera pública burguesa como categoria historicamente definida e ligada ao desenvolvimento da sociedade burguesa, nascida na Europa, durante o “outono” da idade média. Mas reconhece a existência histórica de outras variantes como a esfera pública plebéia, a helênica e a esfera de representação pública feudal - que não era uma esfera de comunicação política pública, mas de “representação” pública do poder, da autoridade e do brilho da nobreza que precisavam ser exibidos.

2.1. A gênese da opinião pública e da esfera pública burguesa. 

A opinião pública e a esfera pública burguesa vão surgir na trilha da troca de mercadorias e da troca de informações iniciadas com o capitalismo financeiro e mercantil, desenvolvidas com as feiras e os burgos e o surgimento dos primeiros correios e imprensa. 
O crescimento do comércio, o surgimento das companhias e das sociedades por ações, o desenvolvimento cada vez maior do mercado exterior, vão exigindo maiores garantias institucionais, ou seja, no caso, políticas e militares. Paralelamente, temos o desenvolvimento do Estado-nação, que nacionaliza economias antes mais localizadas, e do Estado moderno como centralização política, com administração e exército permanentes: é a consolidação do chamado “poder público”, sendo, aqui, “público” sinônimo de “estatal”. Portanto, há um fortalecimento do Estado e da burguesia, porém o Estado sendo dirigido pela nobreza e a burguesia sendo privada do poder. Estão aí os elementos fundamentais da contradição que levará ao surgimento da esfera pública burguesa: a força emergente e paulatinamente hegemônica na economia está desprovida de poder político. Ou, dito de outra maneira, é fraca no “poder público” mais vai assumindo uma posição central no “público”. Por outro lado, vai se tornando também mais educada (letrada) e se constituindo como um público economicamente poderoso que consome informações (imprensa), discute suas preocupações culturais e materiais em variados fóruns informais (como cafés e salões de festas) ou formais (como clubes de leitura) e busca influir nos rumos políticos. 
Portanto, a “esfera pública burguesa pode ser entendida inicialmente como a esfera de pessoas privadas reunidas em um público” (Habermas, 1984) para defender a sua liberdade econômica e atacar o próprio princípio de dominação vigente, ou seja, torná-lo racional: não baseado numa superioridade determinada por uma origem hereditariamente nobre, mas no melhor argumento racionalmente submetido à opinião pública. A esfera pública burguesa surge em “espaços culturais tornados públicos” num campo tensional entre Estado e sociedade civil, ou seja, como uma ponte entre a sociedade decadente representada pela corte e a nova sociedade emergente. 
O processo de transição que se dará, terá claras marcas nacionais. Na Inglaterra, mais negociado entre a burguesia e a aristocracia em torno de uma maior abertura na esfera pública parlamentar ainda com a participação da corte e com o governo encabeçado pelo monarca. Processo facilitado pelo hibridismo econômico de certos setores feudais e burgueses: proprietários de terra que investem no comércio, enquanto burgueses compram terras. Na França, com a ruptura mais radical da Revolução Francesa. Na Alemanha também de forma mais negociada e menos pública devido a uma relativamente menor força da burguesia. 
Entretanto, mesmo com suas particularidades, segundo Habermas, a esfera pública burguesa mantém uma série de característica básicas semelhantes: a reunião permanente de pessoas privadas num público buscando formar racionalmente uma opinião pública baseada no melhor argumento; onde a autoridade do melhor argumento se sobrepõe à hierarquia social e se contrapõe a esta, colocando-se, neste sentido, o burguês como um ser humano com direitos universais e não inferior ao aristocrata. Mas, a esfera pública burguesa nasce como esfera de proprietários privados. Dela ficavam fora as mulheres e os empregados, pois eram vistos como pessoas sem autonomia para decidir em razão do melhor argumento. Mesmo assim, esta “ficção de uma esfera pública” (Habermas, 1984) ganha legitimidade naquele contexto de luta da sociedade civil contra a mercantilismo e o absolutismo, pois convergia os interesses dos proprietários privados com o das liberdades individuais pois a propriedade privada era vista como a base da liberdade e mesmo da igualdade, permitindo com que a burguesia identificasse a sua emancipação política com a emancipação política em geral e mesmo com a emancipação humana.

2.2. A institucionalização da esfera pública política como órgão do Estado e sua relação com a opinião pública extra-parlamentar. 

No processo, o Parlamento, como instância muito especial da esfera pública, passa a ser um órgão do Estado, com poder de decisão; temos então Maioria e Minoria no Parlamento, com esta última buscando a “esfera pública” para reforçar seus argumentos. Assim, o Parlamento, nas palavras de Habermas, já aparece como parte separada de outra parte da esfera pública. O resultado é o surgimento de uma oposição sistemática (e não mais um razoável debate em torno de argumentos) e o intermediário deixa de ser uma esfera pública em geral para ser o “gabinete-fantasma” organizado pela oposição que, minoritária no Parlamento, não consegue dar os rumos para o gabinete oficial. Porém, mesmo que, algumas vezes, a esfera pública (extra-parlamentar) conseguisse provocar recuos da Maioria parlamentar, isto não significava um predomínio da opinião pública. 
A disputa de opinião pública vai se dar fora do parlamento: out-doors. E os partidos montam estratégias para isto: além do “gabinete-fantasma”, petições, associações políticas, reuniões públicas, até a organização de comitês locais e a publicação de programas eleitorais. E isto quando apenas cerca de 2% dos Ingleses tinha direito de voto. 
Assim, a esfera pública política burguesa desenvolvida e institucionalizada no Estado de Direito burguês não apaga a sua contradição: surge apresentando uma idéia de oposta à dominação, mas sua base social (a propriedade privada) não permitia o fim da dominação. “Enquanto os assalariados estão obrigados a trocar a força de trabalho como a sua única mercadoria, os proprietários privados se correlacionam como donos de mercadorias através da troca de artigos. Só estes são seus próprios senhores, só eles devem ter o direito de votar, de fazer uso público da razão em sentido modelar” (Habermas, 1984). Assim, a esfera pública tende a estar ligada aos interesses da burguesia e o Estado a intervir na sociedade para ajudar o capital e o mercado.

2.3. Mudança da estrutura social da esfera pública política e da composição da opinião pública. 

Por outro lado, há a entrada dos trabalhadores na cena política. Numa situação desfavorável na disputa direta na esfera privada contra o capital, os mais fracos vão se contrapor também por meios políticos àqueles que são mais fortes no mercado. Tratava-se, afinal, de cobrar a promessa do Estado burguês de garantia de acesso igual para todos. Portanto, não somente os sindicatos reforçam suas ações no mercado de trabalho, como lutam por conquistas na própria legislação, através dos partidos socialistas. 
Assim, o Estado amplia suas funções de estruturação da sociedade civil: confia tarefas públicas a pessoas privadas; coordena atividades econômicas privadas através de planos econômicos; investe na produção e distribuição; regula preços de mercadorias inclusive da força de trabalho; define direitos legais de trabalhadores, inquilinos e outros usuários. Segundo Habermas, neste sentido o “mundo trabalhista” se estabeleceu “como uma esfera sui generis entre o setor público e o setor privado” (Habermas, 1984). Entretanto, em geral, “as intervenções do Estado, mesmo onde tenham sido obtidas contra interesses ‘dominantes’, estão no interesse da manutenção de um equilíbrio do sistema que não possa ser mais assegurado através do mercado-livre” (Habermas, 1984).

2.4. Da esfera pública literária ao consumismo de cultura.

 
A esfera pública literária também entra em decadência, pois não era um simples espaço de consumismo cultural, nem a cultura burguesa uma mera ideologia. Agora, as leis do mercado “também penetram na esfera reservada às pessoas privadas enquanto público, o raciocínio tende a se converter em consumo e o contexto da comunicação pública se dissolve nos atos estereotipados da recepção isolada” (Habermas, 1984). 
Os mídia ampliam a esfera publica, mas esta, midiatizadamente ampliada, perde o conteúdo político para poder vender mais e temos o raciocínio perdendo espaço para a forma, e uma diminuição da distância entre fato e ficção. Os mídia e seus produtos digeríveis e descartáveis tiram uma visão totalizadora do real e mudam a própria forma de comunicação e raciocínio. O público leitor dá lugar ao consumidor: o mundo criado pelos mídias só na aparência ainda é esfera pública. 
Enfim, depois de chegar e se consolidar no poder a burguesia já não precisa ser crítica e nem sustentar uma esfera pública crítica.

2.5. A decadência da esfera pública burguesa: a esfera pública manipulada e a opinião não pública. 

O poder é exercido num jogo entre associações originárias da esfera privada, partidos originários da esfera pública e o aparelho do Estado os quais, através dos mídia favoráveis, buscam o apoio ou, ao menos, a tolerância do público que, a rigor, não é mais público mas apenas destinatário de uma publicidade subvertida em seu papel original: agora a publicidade deixa de ser uma forma de controle público do poder para ser um instrumento de manipulação de uma opinião (não) pública. 
O Parlamento está penetrado por interesses privados e as leis surgidas por esta via, deixando de ser verdades constituídas no melhor argumento, passam a ser uma obrigatoriedade. “O público [agora também a massa de assalariados] enquanto tal só esporadicamente é inserido neste circuito do poder" e só para aclamar (Habermas, 1984) . 
Há uma refuncionalização da esfera pública ligada à evolução da imprensa: a “instituição por excelência da esfera pública”, se comercializa e supera a diferença entre circulação de mercadorias e público. No início do século XIX, "torna-se instituição de determinados membros do público enquanto pessoas privadas - ou seja, pórtico de entrada de privilegiados interesses privados na esfera pública” (Habermas, 1984). 
Com os novos mídias do século XX (rádio, cinema falado e televisão), a esfera pública se amplia, perde vitalidade e se modifica com os interesses privados que se fazem presentes de modo privilegiado através do “jornalismo-publicitário” dirigido a um ‘público’, que agora, ao invés de ver a imprensa intermediando a opinião pública, passa a ver uma opinião (não) pública ser cunhada primeiro através dos midia. 
Enquanto isto, desenvolvem-se as técnicas de publicidade e de relações públicas, através das quais grandes empresas capitalistas passam a “trabalhar a opinião pública” e têm como tarefa central a construção do consenso e de uma opinião pública encenada. Mas consenso fabricado não é opinião pública. A crítica cede lugar ao conformismo e o consenso passa a ser uma boa vontade conquistada com a publicidade. A esfera pública burguesa assumiu a característica feudal de ser um espaço de representação diante do público. Publicidade era desmistificação da dominação política e agora é um instrumento de dominação. Era transparência, agora é mecanismo de guardar segredos. É a refeudalização da esfera pública. As grandes instituições jornalísticas vão criar “um aparelho que certamente representa um máximo de público e um mínimo de opinião” (Habermas, 1984) que vai romper com o ideal liberal de opinião pública. 
Com o afastamento do público das decisões, a esfera pública só é mobilizada periódica, temporária e transitoriamente para as eleições. Porém, a rigor, nem aí se organiza uma esfera pública argumentativa, mas uma esfera “estatuída de modo demonstrativo e manipulador” (Habermas, 1984). Daí a força que obtém as pesquisas de opinião e o marketing político como instrumento para vender a política apoliticamente. 
Neste quadro, o eleitorado desintegra-se enquanto público; os meios de comunicação são simples transmissores de propaganda; e as atividades massivas passam a ser manifestações publicitárias onde o público é composto de figurantes gratuitos para as transmissões de TV. Enfim: ao invés de opinião pública, há apenas um "clima de opinião”. De uma opinião não-pública, sem autonomia e racionalidade, mas que pressiona, como consumidor, o atendimento de certas necessidades levantadas e medidas por pesquisas de opinião e introduzidas nos programas eleitorais, pois a manipulação tem limites e precisa atender uma parte de suas demandas. Temos, assim, a nova esfera pública burguesa: desenvolvida, demonstrativa, manipulativa e temporariamente estabelecida. 
O Estado da social democracia burguesa não é uma ruptura, mas uma continuidade do Estado liberal de Direito. Nele, para que se garanta a comunicação pública, não basta uma liberdade de opinião privada, é preciso uma “liberdade pública de opinião”. Ou seja, não basta uma lei que impeça o Estado de proibir a liberdade de expressão. É preciso legislar para que esta liberdade seja garantida positivamente através dos mídia.

2.6. A esperança de Habermas na auto-geração de uma autêntica esfera pública. 

Apesar do tom de degradação completa da esfera pública burguesa, no final desta sua obra Habermas ainda vê a possibilidade de reconstrução de uma esfera pública, pois não existe somente a “publicidade demonstrativa e manipulativa” já descrita, mas também uma “publicidade crítica” que disputa com esta. Mas a condição de existência de uma autêntica esfera pública politicamente ativa, é a sua auto-geração, instituição e concorrência com a decadente esfera pública política burguesa demonstrativa e manipulativa.

3. A crítica de Lipovetsky a Habermas. 

Lipovetsky vai fazer uma dura crítica a Habermas em seu O império do Efêmero (Lipovetsky, 1989), pelo fato deste analisar “o pronto-para-consumir midiático como instrumento de redução da capacidade de fazer o uso crítico da razão”. Esta seria uma concepção elitista-intelectualista pois manifesta a idéia de que “o que diverte não poderia educar o espírito, o que distrai só pode desencadear atitudes estereotipadas, o que é consumido só pode opor-se à comunicação racional, o que seduz a massa só pode engendrar opiniões irracionais, o que é fácil e programado só pode produzir o assentimento passivo” (Lipovetsky, 1989). Para ele "é preciso operar uma revisão de fundo: o consumo midiático não é coveiro da razão, o espetáculo não abole a formação da opinião crítica, o show da informação prossegue a trajetória das Luzes” (Lipovetsky, 1989). Ele reconhece que os mídia não criam um espaço de comunicação como teria sido aquela esfera pública burguesa. Entretanto, isto não é suficiente para se falar em desintegração da esfera pública, se a consideramos como o “lugar onde se formam a opinião e a crítica do público”. 
Lipovetsky não chega a estas conclusões por acaso. O centro do seu trabalho é um elogio à moda como eixo estruturador do mercado e como maneira de viver que cimenta não só este mercado, como também o Estado, os mídia, o individualismo e a publicidade demonstrativa. Esta é a forma moda na comunicação, que chega a todos os lugares inclusive o Estado e a política em geral. A forma moda que se manifesta no superficial, nos truques, na sedução frívola. Na verossimilhança e não na verdade. Por isto a publicidade tem um futuro cor de rosa. O marketing político é a forma moda na política da era frívola quando estrutura e superestrutura estão submetidas à moda. Mas também há espaço para a persuasão, para argumentos que mostrarem a credibilidade das mensagens, para as razões para crer e argumentos plausíveis (mas isto é tendência em recuo). E os mídia garantiriam a democracia porque nada impõem. 
Poderíamos citar diversos trabalhos que mostram o oposto das afirmações deste autor sobre os mídia, ou seja, a fabricação de notícia (Orozco, 1994-a), a produção do real, a construção de cenários políticos (Lima, 1995), ou como a publicidade constrói referências culturais (Ortiz, 1994), mesmo que isto não signifique uma aceitação automática e acrítica de parte dos receptores (Martin-Barbero, 1997 e Orozco, 1997). Mas não poderia haver nada mais elucidativo do que o próprio texto de Lipovetsky. Como ele nos ensina, os mídia tudo divulgam, mas dentro da ordem, da “ideologia moderna” e do individualismo. Porém, mantém distância de ideologias tão perigosas quanto misteriosas, como aquelas "ortodoxas", "monolíticas", "fora da ordem", "maniqueístas", "maximalistas", "revolucionárias", "que estão fora do consenso universal", "globais", ou "demiúrgicas". O que ele quer dizer com tudo isto não fica explícito e talvez só duas entidades saibam: Lipovetsky e os mídia. Portanto, o que ele próprio acaba dizendo é que os mídia tomam distância de opiniões críticas ao mercado. E este autor ainda afirma que, agindo assim, não há comunicação ideológica, mas apenas "publicitária"...
Habermas e Lipovetsky: duas perspectivas bem diferentes. Enquanto o primeiro descreve e critica a decadência da esfera pública burguesa pretendendo normatizar e sustentar a reconstrução de uma outra esfera pública para salvar a construção de uma autêntica democracia, Lipovetsky pretende salvar a esfera pública como ela está. Para Habermas a modernidade ainda não se completou, enquanto para Lipovetsky, “Luzes” é isso aí. Para Habermas, a esfera pública burguesa decaiu. Para Lipovetsky, todo poder é da moda e do “mercado-rei”. Como bem destaca Gomes (1997), para ele a combinação de mídia e marketing ajuda a secularizar do poder. Mas, em O Império do Efêmero, é seu autor quem promove uma sacralização do mercado, dos mídia e da moda. A história da modernidade, afinal de contas, mostraria seu sentido: rei morto, rei posto. E, no ato de posse, cobre-se um santo para descobrir a nova santíssima trindade.

4. Habermas e as novas esferas públicas autônomas. 

Em suas obras posteriores, Habermas continua buscando uma “esfera pública autêntica” e vendo, como uma das condições de sua existência, a sua “auto-geração”, instituição e concorrência com a publicidade não crítica. Nesta atitude intelectual de crítica e busca, Habermas (1980) afirma que “o projeto da modernidade ainda não se cumpriu” pois modernidade não é uma simples modernização econômica e administrativa: esta depende "de padrões do que chamaríamos racionalidade comunicativa” (Habermas, 1980). Daí ele chega aos conceitos de “mundo da vida” e “sistema” e vê as novas esferas públicas autônomas surgindo no mundo da vida, na forma de solidariedade, em contraposição aos poderes do "sistema" (administrativo e econômico)(1). 
Do mesmo modo que ele afirmava que “não me parece necessário gastar mais palavras sobre o fundamento de classe das revoluções burguesas” (Habermas, 1975), parece que agora chega à conclusão de que o fundamento de classe das “novas esferas públicas autônomas” é o de serem não burguesas, apesar de serem difíceis de definir socialmente. “O processo da implementação social somente se efetua em conseqüência de conflitos políticos e movimentos sociais, de iniciativa de grupos marginais inovadores, e assim por diante” (Habermas, 1987-b) ...“não elimina a ação voltada ao entendimento”. 
Na Alemanha fortalecem-se reações - que partem da base - ainda localizadas e fragmentadas. São tendências contrárias: de um lado “setores oficiais ressecados” e de outro grupos resistentes “difíceis de definir em termos sócio-estruturais (...) que se tornaram o núcleo de esferas contra-públicas autônomas - velhos e jovens, feministas e homossexuais, deficientes e desempregados ativos, profissionais radicais, donas-de-casa suburbanas etc.” (Habermas, 1987-b). “O problema parece ser muito mais o de como os potenciais de auto-organização podem ser suficientemente desenvolvidos e em esferas públicas autônomas, de modo que os processos orientados para formação da vontade do mundo da vida orientado por valores de uso possam manter sob seu controle os imperativos sistêmicos do sistema econômico e do aparelho de Estado, e tornando ambos os subsistemas controlados pela mídia dependentes de imperativos do mundo da vida. Não consigo imaginar que isto seja possível sem uma abolição gradual do mercado de trabalho capitalista e sem um enraizamento democrático radical dos partidos políticos em suas esferas públicas” (Habermas, 1987-b). Mas seria difícil antecipar como isto se daria, pois a modernidade deve extrair a sua normatividade dela mesma. 
A legitimação do Estado do bem estar social se deu via barganha salarial, eleições gerais, sindicatos e partidos autônomos dos trabalhadores, além da capacidade de intervenção do Estado na economia, provocando uma pacificação dos conflitos de classe. Mas hoje há uma crise de difícil solução pois “o capitalismo desenvolvido nem pode viver sem o Estado social nem coexistir com a sua expansão contínua” (Habermas, 1987-a). Contra os "legitimistas" e os "neoconservadores", ele aposta numa postura crítica de novos movimentos, que são dissidentes deste tipo de economia e buscam uma alternativa para que o "mundo da vida" não continue ameaçado pelo mercado e a burocracia do Estado. Estes herdam o mais avançado do Estado social, mas ainda não têm uma alternativa a ele. 
Trata-se, então, de construir um novo “poder”: “Eis o que quero dizer: o poder de integração social da solidariedade deveria ser capaz de resistir às ‘forças’ dos outros dois recursos, dinheiro e poder administrativo” (Habermas, 1987-b). O caminho é a constituição de “esferas públicas autônomas”, que não lutariam “diretamente por dinheiro ou poder, mas por definições”. Como exemplo, apresenta os movimentos regionais, feministas e ecologistas. Estas “esferas públicas autônomas” também “se põem em comunicação uma com as outras tão logo o potencial é aproveitado para a auto-organização e para o emprego auto-organizado dos meios comunicação” (Habermas, 1987-a).

5. Habermas, ação comunicativa, ação estratégica e a formação da opinião. 

Seguindo nesta direção, Habermas vai reconhecer que a prática destes movimentos ultrapassam a ação comunicativa e isto não é ruim. Em Três modelos normativos de democracia, Habermas introduz duas questões importantes: uma é o conceito de “formação mais ou menos racional” outra é a de “rede de comunicação dos espaços públicos políticos”. Espaços públicos autônomos, que têm como base social a sociedade civil. Diferentemente, portanto, dos modelos republicano e liberal, respectivamente, a sociedade não estaria centrada nem no Estado (poder administrativo) nem no mercado (dinheiro). Ao contrário: a força de integração social seria a solidariedade e se afirmaria contra estes dois outros poderes: “As implicações normativas saltam à vista: a força da integração social que tem a solidariedade social, não obstante não mais poder ser extraída somente de fontes da ação comunicativa (grifos nossos), deve poder desenvolver-se com base em amplamente diversificados espaços públicos autônomos e em procedimentos de formação democrática da opinião e de vontade políticas, institucionalizadas em termos de Estado de Direito; e, com base no meio do Direito. Deve ser capaz de afirmar-se também contra os outros dois poderes - o dinheiro e o poder administrativo” (Habermas, 1991)(2). 
Em outro de seus textos mais recentes, Habermas (1996) vai valorizar a existência histórica da esfera pública plebéia e, por outro lado, reforçar o papel do receptor (a partir da leitura de Stuart Hall, 1980) segundo o qual, além de leituras dominantes do código da produção midiática, pode haver também uma leitura negociada ou oposicionista. Mesmo que as duas primeiras estejam dentro do campo do discurso hegemônico, a existência da leitura oposicionista e mesmo da negociada, abre espaço para a construção de alternativas políticas contra-hegemônicas. Assim, estas duas revisões, vão deixar mais claro a sua posição de construir uma esfera pública autêntica a partir de novos sujeitos sociais solidários e em contraposição ao Estado burocrático e o capital.

6. A abordagem de outros autores sobre esfera pública e opinião pública. 

Para Sérgio Costa, tanto o modelo funcionalista (onde os atores atuam estrategicamente na defesa de seus próprios interesses) quanto no modelo teórico-discursivo das obras mais recentes de Habermas, há problemas pois, por um lado, os atores também fazem relações públicas além do esforço argumentativo. Por outro, isto não impede que possam participar “do processo de constituição da base de legitimação de um poder fundado comunicativamente” (Costa, 1995) desde quando estas organizações permaneçam permeáveis aos impulsos da base e os transporte para a esfera pública. 
O autor cita ainda uma série de movimentos, que chegam a ocupar importantes espaços midiáticos internacionais e no Brasil, onde, da sociedade civil, têm emergido de forma mais informal e flexível ou mais institucionalizada. Entretanto, “sua contribuição para o revigoramento da vida pública encontra-se na possibilidade de tornar conhecidas demandas e questões que surgem nas franjas dos núcleos institucionais de decisão e deliberação”, sejam elas “de resistências” ou “de cultura da proposição”, sendo o mais importante que mantenham sua legitimação em “seu enraizamento nas teias de resistência” (Costa, 1997). 
Para Gilberto Almeida (1996), há um franco declínio da “fase social democrata do capitalismo” desde a década de 80 mas, por outro lado, “fortalecem-se novas organizações ou agrupamentos, de corte não governamental, ampliando a esfera pública, que hoje é fragmentada em dezenas de representações" (Almeida, G.,1996). Fato que autor valorizará como sendo uma renovação da sociedade civil o que se dá “constantemente através das esferas públicas que se organizam em seu seio”. E procura recuperar Gramsci no sentido de que este explicita “como é possível ocorrer a resistência, no seio da sociedade civil, aos discursos ideológicos hegemônicos, através da ação deliberada contra-hegemônica, produzida por intelectuais engajados, movimentos sociais, enfim, por segmentos da sociedade não comprometidos com a burguesia, e não necessariamente oriundos do mundo da produção” (Almeida, G., 1997). 
John Keane (1996), considera que esta fragmentação da esfera pública é irreversível assim também como não é possível a sua limitação ao espaço territorial nacional, o que exige uma revisão do conceito. Os antigos cafés e salões têm agora sua correspondência em inúmeras micro esferas públicas características dos movimentos sociais com objetivos mais localizados. As médias são aquelas que têm correspondência mais ou menos com os Estados nacionais e são mediadas por jornais de grande circulação e pela mídia eletrônica. 
Já as “macro esferas públicas de centenas de milhões de cidadãos, são a conseqüência (não buscada) da concentração internacional das empresas de comunicação de massa anteriormente pertencentes e operadas no nível do Estado-nação”(3). A globalização dos mídia faz parte deste processo, no qual se inclui a Internet como uma forte estimuladora do crescimento de macro esferas públicas não somente em termos de rede(4) mas também distribuindo informações entre diversas organizações civis “que trabalhem por um meio ambiente sustentável, justiça social e econômica, e direitos humanos”(5). 
Mas Keane vai mais adiante quando critica o conceito habermasiano de esfera pública presa a um espaço entre o “mundo do poder e do dinheiro e as associações grupais pré-políticas da sociedade civil”. Pois, “esferas públicas podem se desenvolver - e de fato o fazem - dentro de vários domínios da sociedade civil e instituições estatais, incluindo o suposto território inimigo dos mercados de consumidores e do mundo do poder que jaz para além do alcance dos Estados-nações ...”, sendo este “tema para uma grande investigação”. Quanto aos mídia, Keane (1996) considera que “todas as classes políticas (...) procuraram aumentar seu poder utilizando-se de certos meios de comunicação para limitar e controlar os espaços nos quais seus súditos vivem”. Porém, deixa uma questão: o atual poder dominante vai manter isto indefinidamente ou “o futuro verá uma variedade de tendências contraditórias, incluindo não apenas novas formas de dominação, mas também batalhas públicas sem precedentes por definir e controlar os espaços nos quais os cidadãos aparecem?” (Keane, 1996). 
Para Schudson (1994), o conceito de esfera pública é indispensável como modelo de sociedade, sendo uma noção central para a teoria social e política, que permite estabelecer questões a responder sobre a política no passado e no presente. Mas existem particularidades nacionais e nos EUA pode ser encontrada no começo da sua história ou em situações excepcionais como no debate sobre o impeachment de 1974. 
Mas Schudson (1995) se afasta do conceito que Habermas vem utilizando “quase como sinônimo de sociedade civil, isto é, aquelas instituições, espaços e fóruns que não pertencem nem à vida privada (a família), nem constituem parte do Estado enquanto tal, nem fazem parte da economia”. Schudson, assim, ao contrário da maioria dos autores estudados, considera o Estado como parte de uma esfera pública e não como algo fora dela. O Parlamento é uma esfera pública dentro do Estado e, por ter poder de decisão, é uma esfera pública forte, sendo a esfera pública da sociedade civil fraca, porque emite opinião mas não decide. Ele também não concorda com uma visão de sociedade civil como oposição ao Estado e ao poder econômico. Mais: a relação entre Estado e esfera pública é indissolúvel porque não existe opinião pública fora do Estado e muito menos em estado puro. Além disso, não é possível existir opinião pública sem partidos, ocorrendo, neste caso, apenas tendências vagas de opinião. 
Schudson concorda com os diagnósticos de que há uma pequena participação política dos cidadãos dos EUA mas, com exceção de poucos momentos, nunca foi muito diferente disso. No mais “não se trata de uma maior ou menor participação ou decisão ou racionalidade no debate político”, pois o voto continua sendo o momento central numa democracia, para o qual converge a discussão. 
Finalmente, ele vai discordar também daqueles que defendem uma visão de várias esferas públicas. Para ele, podem emergir discursos de várias bases da sociedade civil e isto é positivo. Mas devem convergir para uma única esfera pública dentro de uma jurisdição onde se tomam as decisões. Portanto, não vivemos numa idade de ouro da participação política, mas qualquer solução deve ser indicada a partir da realidade contemporânea, mesmo que se busque um ideal. 
Dominique Wolton (1995), faz um estudo das contradições do espaço público midiatizado e alargado, mostrando que “a comunicação, em sentido lato, é hoje a condição funcional e normativa do espaço público e da democracia de massa, mas ela não pode, por si própria, garantir a qualidade do funcionamento deste espaço público democrático”. 
Uma das questões que perpassam várias destas contradições é o “papel regular da opinião pública através das sondagens”, que “constróem uma representação permanente da opinião pública” e passam, assim, junto com as informações dos mídia, a ser uma “condição para o funcionamento do espaço público alargado da democracia de massa”. Além disso, o público não vota sobre a grande maioria das questões que são abordadas pelas sondagens e as sondagens são usadas como complemento da legitimidade política, sem que possuam este significado. 
Portanto, “visto que não há continuidade entre a visão da sociedade fornecida pelos mídia, pelas sondagens e pela política, mesmo se todos eles falam, evidentemente, da mesma realidade. É desejável conservar esta heterogeneidade da representação” (Wolton, 1995) (entre mídia, sondagens e política) para preservar a representação política e evitar uma homogeneização artificial da representação da sociedade.

7. Mídia, opinião pública ativa e esfera pública democrática. 
7.1. Adotando o conceito de Habermas. 

Como vimos, a esfera pública política burguesa entrou em decadência e existem hoje diversos entendimentos do seu significado atual. Neste sentido, alguns se dedicam mais a descrever aquilo que vêem como esfera pública realmente existente; outros irão procurar normatizá-la; outros entendê-la como utopia desejável; e outros ainda buscam viabilizar a sua operacionalização. A partir dos textos estudados e de outras referências que iremos acrescentando, procuraremos a seguir clarear nossa opinião. 
Para começar nosso diálogo, adotaremos o conceito inicial de Habermas de esfera pública sintetizado por Wilson Gomes (1997): "a esfera pública é um âmbito da vida social protegido de influências não-comunicativas e não-racionais, tais como o poder, o dinheiro e as hierarquias sociais. A pública argumentação que nela se realiza constringe por princípio os parceiros do debate a aceitar como única autoridade aquela que emerge do melhor argumento. A esfera pública como que impõe uma paridade inicial entre os sujeitos de pretensões até que a sua própria posição se torne discurso; depois disso, há de se submeter apenas às regras internas ao processo de conversação ou debate público”. 
Como vimos, uma esfera pública política com estas características não pode ser comprovada pois, mesmo se no alvorecer da esfera pública burguesa houvesse estas características discursivas, ela era restrita aos burgueses, ou seja, proprietários privados do sexo masculino.

7.2. Discutindo as condições e os sujeitos. 

Não sendo útil para descrever a realidade atual, não pode ser visto como um conceito descritivo. Serviria então como referência para avaliar a qualidade de uma democracia concreta e/ou como projeto de futuro. Alguns autores o encaram, então, como um conceito normativo(6). Outros, como Emiliano José, preferem considerá-la uma utopia desejável e possível: "uma esfera pública capaz de permitir o acesso de todos à discussão e à capacidade de decidir sobre o que está sendo discutido, não é algo tranqüilo, embora em princípio possível, e desejável, como ideal a ser conquistado" (José, 1996-a). 
Seja como utopia possível ou como conceito normativo, sustentamos que a defesa da necessidade de uma esfera pública política com estas características, requer a definição de condições para sua existência. Habermas, desde Mudança... , procurou avançar nesta linha, tanto apontando a necessidade de excluir as influências do Estado e do dinheiro, como sugerindo medidas no sentido de desmercadorização progressiva da sociedade. A nossa hipótese é a de que sob o capitalismo ou qualquer outra sociedade em que permaneça a existência do Estado enquanto poder político, podem ser conquistados avanços democráticos, porém a realização desta esfera pública somente seria possível numa sociedade como aquela descrita por Gramsci (1978) como “sociedade regulada”: sem classes e sem Estado. Ou, como disse Marx: “Uma vez desaparecidas as diferenças de classe ao longo do desenvolvimento e estando concentrada toda a produção nas mãos dos indivíduos associados, então o poder público perde o caráter político”(7) e deixaria de existir um governo sobre as pessoas para restar uma administração das coisas e do processo produtivo. Também seria fundamental que fossem superados outros fatores que impedem uma situação de equilíbrio discursivo como as discriminações de gênero, raça e etnia(8), e onde os mídias deixassem de ser instrumento de privados para disputa do público e passassem a ser realmente um instrumento de visibilidade e estímulo do debate público. 
Por outro lado, se coloca também a discussão sobre quem seriam os sujeitos desta nova esfera pública, na medida em que a burguesia, desde que institucionalizou a sua esfera pública como poder de Estado, em geral não tem demonstrado interesse em uma efetiva democratização do Estado e da sociedade. Ao contrário, as conquistas democráticas mais significativas sob o capitalismo, foram comumente resultado de pressões populares originadas fora do Estado de Direito burguês, mesmo que muita vezes contasse com apoio de frações minoritárias das classes dominantes(9). Isto também mostra que, em matéria de democracia burguesa, o proletariado e outras classes e camadas populares mostraram mais vocação universal e democrática do que a própria burguesia (especialmente a grande burguesia)(10). Aqui, ficaremos com Habermas que, mesmo considerando difícil defini-los socialmente, não tem dúvidas de localizá-los (os novos sujeitos) fora da burguesia e dentro do que poderíamos chamar, talvez, na falta de um conceito mais claro, de privados e excluídos do poder e da propriedade dos grandes meios de produção e comunicação
Entretanto, qualquer que seja o caminho percorrido, é lúcido pensar que se chegarmos a uma “sociedade regulada” este será o resultado de um processo prolongado, durante o qual, continuarão existindo, de formas diversas, Estado, propriedade privada dos meios de produção e outras formas de desigualdades sociais e políticas que colocarão homens e mulheres (de idades, raças, credos, classes, idéias, interesses, opções, culturas, etc diferentes ou contraditórios e até antagônicos) em disputa pelos rumos do Estado, da economia, das comunicações e da cultura. Disputa que se fará também na esfera pública, para muitos, como o espaço privilegiado. E uma disputa que, como salienta Fraser (1996) não deve evitar estas diferenças, mas ressaltá-las, pois a esfera pública não deve ser vista apenas como um espaço de debate, mas de afirmação política e cultural. Diríamos mais, como espaço de disputa de hegemonia e de formação de blocos sociais, políticos e culturais que construam uma opinião pública ativa e capaz de realizar uma nova esfera pública autenticamente democrática. 
Sim, porque é razoável pensar que uma opinião pública ativa se construa não somente formando opinião na esfera pública política, mas também sobre os canais de debate, sobre os poderes deliberativos (o que deliberar) e formas deliberativas (como deliberar) pertinentes a esta esfera e suas instâncias.

7.3. Ampliando democraticamente os canais de participação e decisão na esfera pública midiaticamente ampliada. 

Isto significa dizer que é necessário discutir o que se pode propor como melhor forma de democracia para transitar para uma esfera pública conforme descrita por Gomes no inicio desta seção, mesmo que não haja consenso sobre o conjunto das condições históricas para a sua realização. 
Trata-se, assim, de começar com uma profunda democratização do Estado e da sociedade que possam permitir uma mais ampla e consciente participação da cidadania no debate, na formação de opinião e na deliberação. Por um lado, medidas de controle do poder econômico, do Estado e dos mídia, no sentido do direito positivo. Portanto, que venham permitir ampliação da participação e não somente restringir a intervenção estatal e do dinheiro. Além disso, uma nova organização das instâncias deliberativas da esfera pública de modo que, ao lado da instância composta por representantes (como o Parlamento) possamos ter instâncias de maior poder participativo e direto dos cidadãos. Ou seja, a reanimação do debate público e da constituição de uma opinião pública ativa, estão diretamente ligados ao poder participativo e deliberativo desta opinião pública. 
A forma dos conselhos populares, como é o caso dos conselhos do Orçamento Participativo mais ou menos como os existentes em algumas administrações municipais brasileiras, apesar de ainda limitados em termos de poder de decisão, pode apontar para uma linha de democracia participativa, pois permite que todos os cidadãos possam participar de uma assembléia, numa determinada jurisdição; apresentar, ouvir e contrapor propostas e argumentos; formar uma opinião individual e votar uma opinião pública majoritária sobre, por exemplo, quanto, onde e como aplicar determinados recursos; e escolher pessoalmente os seus representantes para os níveis superiores do Conselho. Apesar de ainda ser uma experiência minoritária, e que depende da iniciativa ou boa vontade das forças políticas que estão no executivo, os exemplos em funcionamento têm mostrado que se pode conseguir não somente uma maior democratização de recursos (sempre parcos), como também, e principalmente, um avanço da cidadania e da democracia (Rodrigues, 1997; Genro e Souza, 1997). Em vários casos já se tem, inclusive, iniciado a discussão sobre outros temas, como salários do funcionalismo público, política tributária e planejamento mais global das ações das administrações. Sendo que as reações da esfera pública estatizada e decadente (as Câmaras de Vereadores) têm sido diferenciadas: a maioria acatando, gostando ou não; outras não respeitando as decisões do orçamento participativo; e outras até podendo passar por uma oxigenação e se revitalizando. Há ainda os casos em que todos os candidatos nas últimas eleições, mesmo os de oposição municipal, defenderam o Orçamento Participativo devido a uma certa imposição da opinião pública. 
Porém, ainda são instâncias que têm a participação dos mais preocupados com os interesses públicos e, seguramente, em número menor do que os que votam para a eleição dos vereadores e deputados. E este é um dos fatores que nos leva a defender a manutenção de esferas públicas representativas. Mas estas, para serem realmente consideradas públicas, precisam passar por um profundo processo de democratização e transparência, desde o momento eleitoral até o seu funcionamento cotidiano.

7.4. Convergência tecnológica e democracia. 

Por outro lado, ao falar em esfera pública como âmbito do debate público da sociedade sobre seus rumos, não podemos nos limitar a instâncias onde vão os mais interessados (concelhos) ou a eleições que ocorrem de 4 em 4 anos, único momento em que a esfera pública (ampliada) se instala (mesmo que seja, como vimos, temporariamente) como um todo. Isto só pode ser obtido pela democracia direta. Claro, existe o argumento de que, em sociedades geograficamente extensas e complexas como as nossas, é impossível reunir todos para deliberar. Que isto só seria possível na ágora das cidades-Estado gregas. Correto, se pensarmos em reunir todo o público. Mas porque não se faz na forma de plebiscitos freqüentes sobre as questões mais importantes para uma determinada jurisdição? Por exemplo, em nível nacional, por que não utilizar freqüentemente o plebiscito para a decisão de questões mais importantes como a reforma política, da previdência ou a privatização das empresas mais importantes e estratégicas para o país? 
Aqui há duas contraposições mais comuns e públicas: uma, de caráter prático, porque dá muito trabalho e sai muito caro fazer plebiscito regularmente: deslocamento de pessoas, fiscais, mesários, dinheiro público, feriado nacional, etc. A outra, de caráter mais doutrinário, de que uma esfera pública plebiscitária, a rigor, também não seria uma esfera pública, pois não houve a reunião de todo o público, etc. Quanto ao aspecto dos argumentos práticos e técnicos, a revolução tecnocientífica e a convergência tecnológica em curso parece que os colocou por terra (Negroponte, 1995 e Pretto, 1996). O novo plebiscito pode ser digital e midiático, através de qualquer telefone público, residencial ou comercial, com um “disque TSE(11)”, com número de título e senha individual e secreta. Em grande parte dos países, como o Brasil, a estrutura já está praticamente montada. Não seria necessário que todos votassem no mesmo dia, permitindo assim uma maior flexibilidade e menos desarranjo da vida normal. E se faria com amplo debate democrático através dos mídia. 
O outro argumento, o doutrinário, no quadro em que se encontra a esfera pública política não percebe que esta prática pode realmente aumentar o debate e a reunião do público. E estimularia o debate pois este estaria ligado a uma decisão da qual cada um participaria. Além de debates originados através dos grandes mídia, de forma democrática e durante um certo tempo antes das decisões (plebiscito), este processo poderia estimular debates com públicos menores articulados por esferas públicas localizadas ou instituições da sociedade civil. Assim se viabilizaria uma situação de democracia deliberativa, direta, plebiscitária e com formação de opinião pública através dos mídia e da reunião do público. 
Pois, no complexo mundo contemporâneo, é preciso, em primeiro lugar, viabilizar espaços e formas de participação para os diversos níveis de interesse em participar da política: a) pessoalmente, de modo regular e freqüente, num conselho popular ou outra organização da esfera pública ou da sociedade civil, de opinião, mobilização ou de pressão; b) sempre que haja um tema importante, num determinado nível da esfera pública política (municipal, estadual ou nacional) através dos mídia e de outras instâncias de debate e manifestações públicas e do voto plebiscitário; c) de 4 em 4 anos, na escolha do executivo e de seu representante no Parlamento, também precedido de amplo debate nos mídia. 
Em segundo lugar, somente assim se criarão condições para a participação de todos os cidadãos: o poder de decisão plebiscitário direto, a participação pessoal num conselho popular e o uso dos mídia de modo democrático e de acordo com as necessidades do público, pode efetivamente permitir pensarmos em efetivamente constituir uma esfera pública de massas. Ou seja, algo muito superior, tanto ao consumo dos mídia atual (pois, ainda que não houvesse parcialidade e manipulação, não haveria o direito de decidir), quanto às esferas de debate restritas (ou aos mais interessados, ou mesmo a uma classe como era a esfera pública burguesa em suas origens). 
Portanto, a crítica à esfera pública burguesa no seu estágio atual (de real inexistência enquanto fórum de discussão argumentativa, racional, pública e democrática), não pode ser feita como nostalgia de tempos que não voltam mais (nem são desejados que voltem, pois eram fechados para a maioria da população) ou um oba-oba frívolo, como se a democracia demonstrativa, manipulativa, etc fosse a única possível num mundo complexo e midiatizado.

7.5. Os mídias como esfera de visibilidade pública. 

Na busca para dar resposta à relação entre mídia e esfera pública e definir seu papel na formação da opinião pública, Gomes (1998) chega ao conceito de esfera de visibilidade pública. A esfera pública será entendida como esfera do debate público enquanto que os mídias seriam e esfera de visibilidade ao debate de temas originados na opinião pública, no campo político ou nos próprios mídias. Para Gomes (1998), não se pode "coerentemente falar de esfera pública midiática a não ser que se desfigure a noção de esfera pública ou que se exagere a importância dos fatos argumentativos e comunicativos que existem na cena midiática"(12). Porém, esta esfera de visibilidade permitiria que o público editasse as informações como se fosse uma esfera pública. Ou seja, a partir de seus conhecimentos, informações, interesse e competência receptiva, o público poderia fazer uma edição própria das mensagens dos mídias. Mas isto somente seria possível dentro de certas condições, entre elas, que os receptores possam aprofundar suas informações em meios mais satisfatórios (o que não é possível somente através da televisão) e a possibilidade do receptor "intervir nos debates que se processam no interior do sistema dos media" (Gomes, 1998). Por fim este autor afirma que "há de se notar que o que se afirma neste artigo é que a esfera de visibilidade pública mediática pode ser editada e vivenciada como autêntica esfera pública pelo seu usuário e não que ela de fato seja editada e vivenciada pela maioria deles" (Gomes, 1998). 
Este clareamento é importante pois mostra como os mídias podem vir a ter um papel fundamental para a efetivação de uma opinião pública ativa e uma autêntica esfera pública política massiva, coisa que não ocorre hoje. Basta lembrar que no Brasil, por exemplo, apenas 2% da população se informa regularmente pela imprensa escrita (segundo Gomes imprescindível para uma informação satisfatória), sugestivamente a mesma proporção da população inglesa com direito de voto em meados do século XIX. Mesmo assim, sendo os mídias um "fórum muito especial: tem a pretensão, e é, de ser público mas simultaneamente é privado, balizando-se por seus interesses de ente privado e de participante do bloco hegemônico de poder" (José, 1996-a)(13), consideramos que não basta melhorar as condições de recepção, mas também intervir ao nível da produção. Somente um controle público democrático dos mídias privados e/ou estatais pode permitir que estes avancem no sentido de se tornarem efetivamente esfera de visibilidade pública da opinião pública e não de visibilidade da opinião de privados que se dirigem ao público (14). Entretanto, é evidente que um público receptor com melhores condições materiais, culturais e educacionais e com acesso a uma melhor informação (qualitativa e diversificada) possa fazer uma leitura mais independente das informações codificadas na produção (Hall, 1980), formar uma opinião própria, participar da formação de opiniões públicas, e até mesmo influir para um controle público dos mídias.

7.6. Ação estratégica, publicidade e opinião pública ativa. 

Garantindo-se um efetivo poder de decisão e de publicização de opiniões através dos mídia e o controle para evitar fraudes, o abuso do poder econômico e o uso do aparelho de Estado, ficam minimizados os problemas decorrentes da publicidade demonstrativa e da ação estratégica, que não podem ser eliminados burocraticamente pois não parece possível definir claramente os limites de uma argumentação puramente racional para uma sedução publicitária. O mesmo vale para a dificuldade de separar totalmente ação comunicativa da ação estratégica. Por outro, porque, garantindo-se o poder de decisão, o estímulo ao debate e seu exercício de modo mais democratizado através dos mídia, do discurso argumentativo e da opinião racional, os efeitos da ação estratégica e do marketing serão menores. 
Neste termos, os mídia democratizados devem ser vistos como um instrumento indispensável e insubstituível para viabilizar uma esfera pública democrática, ampla e de massas. E a ação estratégica, a publicidade e as sondagens de opinião, deste modo, são inevitáveis, e devem ser vistas, em princípio, como instrumentos legítimos para o conhecimento da realidade e o convencimento. É evidente que existem pesquisas manipuladas, que existe a manipulação na divulgação das mesmas e que os dados colhidos são usados para elaboração de discursos demagógicos e para efeito de legitimação. É também importante questionar o caráter científico dos resultados (vistos isoladamente) de uma pesquisa de opinião (Bourdieu, 1980 e Champagne, 1998)(15), mesmo se uma "opinião" colhida em determinada circunstância não é apenas um "clima de opinião" ou uma "opção" momentânea de uma parte do público (Matos, 1998). Está claro que o pensamento predominante entre marketeiros eleitorais pode ser sintetizado no famoso “Voto é marketing... o resto é política” (Pacheco, 1994), e que isto atinja ou confunda até mesmo partidos que resistem e acabam tendo uma relação de amor e ódio pelos mídia, as pesquisas de opinião e o marketing (Almeida, 1996 e 1997). Mas, se mesmo hoje os seus efeitos são relativisados (Thiollent, 1989 e Venturi, 1995), com a ampliação e democratização dos canais de decisão e discussão da esfera pública, ou seja, com a constituição de uma esfera pública efetivamente pública e com espaços não simulados a todos os cidadãos, os aspectos mais negativos destes instrumentos poderão ser mais neutralizados e não serem impeditivos da construção de uma opinião pública ativa.

7.7. “Mundo da vida versus sistema” ou hegemonia e contra-hegemonia? 
Efetivamente, como já vimos na crítica de outros autores, não parece que dividir a sociedade entre “sistema” e “mundo da vida”, seja a melhor maneira de enfrentar o problema, como se existisse um "sistema" monoliticamente composto pelo Estado e a economia (aí incluindo-se o conjunto dos partidos, sindicatos e a esfera pública degenerada) do lado do mal e agindo estrategicamente e, do outro lado, um "mundo da vida" (composto por esferas públicas autônomas e/ou entidades da sociedade civil auto-organizadas) representando o bem e agindo comunicativamente. 
Concordamos que as principais energias transformadoras devem partir da sociedade civil (Almeida, 1998). Porém, mesmo organizações jovens ou temporárias, na medida em que saem do seu próprio círculo para disputar opinião na sociedade e nas esferas deliberativas do Estado, logo descobrem que o puro “melhor argumento”, nem sempre é o melhor argumento para atrair o público e o poder para ouvir seus argumentos. Organizações bem sucedidas no movimento social, na sociedade civil e nos mídia, como o MST brasileiro e os zapatistas mexicanos, mostram que mobilização social, pressão e confronto, aliados à argumentação racional, também são meios legítimos de disputar e formar opinião numa esfera pública como a que conhecemos. 
Em segundo lugar, porque o mundo não se divide assim, burocraticamente. Os limites éticos e ideológicos não correspondem automaticamente a limites organizativos ou estruturais, mesmo que cada organização, por regimento ou prática, articule maneiras de pensar e agir predominantes ou hegemônicas dentro de si. Assim, as posições do “sistema” podem estar fortemente presentes naquilo que foi chamado de “mundo da vida”, em esferas públicas ou entidades da sociedade civil auto-organizadas. E que estas não sejam de fato autônomas em relação às estratégias do "sistema". Neste sentido, o conceito de hegemonia (e Bloco Histórico, enquanto sistema hegemônico, Portelli, 1987) ainda parece melhor, tanto para descrever uma relação de forças como para entender ações comunicativas e estratégicas (16). Por outro lado, não se pode afirmar que não possam existir, mesmo dentro do Estado, segmentos políticos que tenham interesse e desenvolvam esforços para promover a auto-organização e a autonomia de esferas públicas ou entidades da sociedade civil. Sobre isto, Poulantzas, (1977 e 1978) já havia identificado que, apesar da existência de uma hegemonia de classe no Estado, este é também uma correlação de forças pois a luta social também se trava dentro dele. O caso do Orçamento Participativo, pode ser visto como um exemplo de democratização da esfera pública que parte de um governo local. Da mesma forma, nem todos os sindicatos (nem em qualquer lugar), têm o mesmo comportamento. Portanto, já tendo Habermas identificado qual a esfera pública degradada (a burguesa) e qual a classe que não está interessada em sua revitalização (a burguesia), fica a questão de identificar “quem são” (em termos de segmentos sociais) e “como estão” se organizando (em esferas públicas autônomas ou associações da sociedade civil, no Estado ou nos mídia) os movimentos, grupos sociais ou segmentos políticos que podem ser sujeitos de uma opinião pública ativa e de uma nova esfera pública política democrática e autêntica. Mas não é nosso objetivo ir adiante, neste texto, sobre este assunto, pois penso que o mais razoável parece deixar esta discussão para cada formação social (17).
Assim, haverá mais democracia e possibilidades dos cidadãos decidirem sobre sua vida, seu mundo e seu sistema: o futuro do Estado, da propriedade privada dos meios de produção e, portanto, sobre a evolução futura da esfera pública ativa e livre do dinheiro, da administração burocrática e dos mídia manipulativos. 
Resta saber se os sujeitos idealmente imaginados estão e mobilizando e se estarão dispostos a desenvolver um movimento para transformar idéias como estas em opinião pública hegemônica e se os ainda hegemônicos setores da economia, do Estado e dos grandes mídia aceitarão “comunicativamente” esta opinião prevalecer no público, ser transformada em lei e em fato materializado. Sobre este assunto, perto do final da entrevista que Habermas concedeu à New Left Review (Habermas, 1987-b), este foi perguntado se acreditava se a burguesia daria o consentimento democrático mesmo para a desapropriação do seu capital. A resposta de Habermas foi a mais sintética da longa entrevista: “Vocês estão querendo brincar comigo?”(18)

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Notas: 
* Trabalho apresentado no GT Comunicación, Médios de Difusión y Política del IV Congreso Latinoamericano de Ciencias de la Comunicación (IV ALAIC). 12 a 16 de setembro de 1998. 
Agradeço as críticas e sugestões do Prof. Dr. Wilson Gomes e dos colegas do Grupo de Pesquisa em Mídia e Política da FACOM-UFBA, à primeira versão deste texto. 
*Mestrando em Comunicação e Cultura Contemporâneas da FACOM-UFBA (Universidade Federal da Bahia - Brasil). e-mail: jorgealm@uol.com.br . Site: http://jorgealm.sites.uol.com.br
1. Sieberneicher (1986), destaca em Habermas sua crítica à colonização do mundo da vida pelo sistema, ressaltando três estratégias para impulsionar transformações positivas: Liberar o potencial da cultura dos experts em política, ciência, arte e filosofia; recuperar a substância ética da tradição que foi desaprendida; e estabelecer e fortalecer instituições para orientar a modernização a uma direção não capitalista opressiva. 
2. Segundo Gabriel Cohn (1991), em seu “adendo editorial” a este texto de Habermas, nesta fase, o autor busca articular a teoria da ação comunicativa com a questão da constituição e das condições de operação da esfera pública e “isso o leva, para além dos agentes comunicativamente competentes, a tratar os agentes portadores de direitos e capazes de acioná-los no espaço público, como cidadãos - politicamente, portanto (Cohn, 1991)”. Nestes termos a ação da “solidariedade social”, acaba trabalhando para obter resultados, êxitos e indo além da ação comunicativa. Assim sendo, não estaria passando a ser uma ação estratégica? Jamile (1998), também ressalta corretamente esta preocupação estratégica em outro texto de Habermas (1996). Para ela, "Habermas, vale ressaltar, sustenta a necessidade de desenvolver estratégias para dar suporte aos processos comunicativos não subvertidos pelo poder".
3. Não somente os mídia. Alguns autores já entendem a existência de fato de um “proto-Estado mundial” dirigido pelo Grupo dos sete países mais ricos do mundo e uma estrutura executiva com quatro áreas: 1) Econômica (BM, FMI, OCDE, OMC); 2) Política (Conselho de Segurança da ONU); 3) Social/Ideológica (Assembléia Geral da ONU, UNESCO, PNUMA, PNUD, OIT); 4) Militar (OTAN) (Stefan, 1995). 
4. Miranda (1995), também aborda esta questão alertando para as conseqüências perversas de novas formas de controle ou sua revitalização através dos espaços virtuais, o que indica que “o novo espaço que está a ser constituído não é menos ambivalente que aquele que até agora tem vigorado”. 
5. Esta, de certa forma, é também a opinião de Octávio Ianni (1996), para quem "o palco da história deixou de ser apenas, ou principalmente, a sociedade nacional ou o Estado-nação; reconhecendo que esse palco já é também, e muitas vezes principalmente, a sociedade mundial. 
6. Ver, por exemplo, Jamile (1998): "A idéia da esfera pública definida nestes termos pode ser lida como uma forma de organização da sociabilidade política na qual acreditamos e, segundo a qual tentamos pautar nossas ações, partindo do pressuposto de sua imprescindibilidade para a construção de um Estado democrático. O caráter imprescindível ou, podemos afirmar, normativo, da esfera pública com relação à democracia, é apontado claramente por Habermas (1996)" 
7. Citado por Habermas (1984). 
8. E ficamos por aqui para não entrar numa discussão sobre o enquadramento da sociedade nas micro engrenagens (Foucault, 1989) nem na sua contraface de microfísica contra-disciplinar (De Certeau, 1994). 
9. Aquelas que Habermas identificou como as que, ficando em minoria dentro do Parlamento, apelavam para a esfera pública externa a ele. 
10. Sobre esta questão, ver também PT, marxismo e democracia (Almeida, 1991). 
11. Tribunal Superior Eleitoral do Brasil. 
12. Há ainda um outro problema de fundo: se seguimos Habermas, no sentido de que uma esfera pública autêntica deve estar afastada da influência do poder estatal e do capital, como poderiam ser esfera pública os mídia que são empresas capitalistas ou que são órgãos ou empresas de Estados burocráticos? 
13. Ver também: Imprensa e poder, ligações perigosas (José, 1996-b) 
14. Colocamos aqui um parênteses, para não deixar de registrar (pois não são objeto deste nosso trabalho), que as experiências de rádios comunitárias, mesmo que localizadamente, podem ser mais autenticamente consideradas esferas de visibilidade pública nos seus âmbitos de audiência. 
15. Esta é uma questão polêmica e difícil de ser aprofundada neste espaço. Podemos dizer então, rapidamente, que se, isoladamente, apenas pela leitura de seus dados (mesmo se obedecer seriamente critérios éticos e metodológicos) não se pode designar uma sondagem de "pesquisa científica", uma (ou melhor ainda, um conjunto ou ainda a combinação de pesquisas quantitativas e qualitativas) podem permitir um estudo científico "se sua leitura for feita com um bom embasamento da estrutura da sociedade, de sua história, da cultura do seu povo, e de como estão de desenrolando as lutas sociais e políticas (Almeida, 1996). Ver também Prandi (1979). 
16. Vejamos um trecho de Gramsci (1978-a) sobre a questão: “Por enquanto pode-se fixar dois grandes “planos” superestruturais: o que pode ser chamado de ‘sociedade civil’(isto é, o conjunto de organismos chamados comumente ‘privados’) e o da ‘sociedade política ou Estado’, que correspondem à função de ‘hegemonia’ que o grupo dominante exerce em toda a sociedade e aquela de ‘domínio direto’ ou de comando, que se expressa no Estado e no governo ‘jurídico’. Estas funções são precisamente organizativas e conectivas. Os intelectuais são os ‘comissários’ do grupo dominante para o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo político, isto é: 1) do consenso ‘espontâneo’ dado pelas grandes massas da população à orientação impressa pelo grupo fundamental dominante à vida social, consenso que nasce ‘historicamente’ do prestígio (e, portanto, da confiança) que o grupo dominante obtém, por causa de sua posição e de sua função no mundo da produção; 2) do aparato de coerção estatal que assegura ‘legalmente’ a disciplina dos grupos que não ‘consentem’, nem ativa nem passivamente, mas que é constituído para toda a sociedade, na previsão dos momentos de crise no comando e na direção, nos quais fracassa o consenso espontâneo”. 
17. Esta é uma discussão que requer um estudo específico. Resumidamente, podemos dizer que ela passa por compreender as classes e setores sociais que podem conformar um bloco contra-hegemônico, identificando as lutas parciais e setoriais de segmentos com potencial estratégico de longo prazo; as questões que podem ajudar a romper a fragmentação promovida pela revolução tecnocientífica e as novas configurações espaço-temporais (Harvey, 1992); as novas demandas, formas de luta e canais de participação que se abriram. Enfim, discutir a questão das classes e outros grupos sociais na transformação social, compreendendo não somente suas relações econômicas, mas também outros potenciais transformadores históricos e culturais. Portanto, não somente a pluralidade econômica e cultural dos trabalhadores, como também a pluralidade de sujeitos de modo geral. 
18. A esta questão, Gramsci talvez respondesse assim: “O fato da hegemonia pressupõe indubitavelmente que se deva levar em conta os interesses e as tendências dos grupos sobre os quais a hegemonia será exercida; que se forme um certo equilíbrio de compromisso, isto é, que o grupo dirigente faça sacrifícios de ordem econômico-corporativa. Mas também é indubitável que os sacrifícios e o compromisso não se relacionam com o essencial, pois se a hegemonia é ético-política também é econômica; não pode deixar de se fundamentar na função decisiva que o grupo dirigente exerce no núcleo decisivo da atividade econômica” (Gramsci, 1978-b).

 

FONTE: http://jorgealm.sites.uol.com.br/Esfera.html