Livro - O sujeito do conhecimento na sociedade em rede


Poraires- Postado em 21 outubro 2010

ROVER, Aires José; CARVALHO, Marisa Araújo (org). O sujeito do conhecimento na sociedade em rede. Florianópolis: Fundação José Arthur Boiteux, 2010. 374 p.

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PREFÁCIO

Os artigos organizados neste livro têm como base a Teoria da Complexidade, passando por autores como Maturana e Morin, objeto da disciplina Complexidade, Conhecimento e Sociedade em Rede, do programa de pós-graduação em Engenharia e Gestão do Conhecimento-EGC/UFSC.

A visão sistêmica vem emergindo nas últimas décadas, de forma aberta e pluralista, a partir dos mananciais de tradições milenares da humanidade e das descobertas contemporâneas em diversas áreas do conhecimento. A Teoria da Complexidade é hologramática, ou seja, mostrando-nos que não é através de um único parâmetro que se tem a dimensão da realidade. É uma nova maneira de entender a Ciência, unindo o singular com o todo.

Complexidade é a qualidade do que é complexo que por sua vez significa o que abrange muitos elementos ou várias partes. Trata-se da congregação de elementos que são membros e partícipes do todo, e, suas ações integradas e dependentes assumem outra forma de expressão e novas faces.

O pensamento complexo surge como uma possibilidade de compreender as dinâmicas humanas e organizacionais, procurando demonstrar que os sistemas humanos são, de fato, os tipos de sistemas de que trata a Teoria da Complexidade.

O pensamento complexo tem como objetivo dar conta das articulações entre domínios disciplinares que são quebrados pelo pensamento disjuntivo; este isola o que ele separa e oculta tudo que o liga, interage e interfere. Com este propósito os artigos estão organizados para compor o livro em três partes não distintas e sim interligadas.

A primeira parte trata do sujeito do conhecimento.

O homem enquanto sujeito que conhece é  um ser vivo, portanto complexo e sistêmico. A experiência básica como ser humano que conhece é de se ver separado do seu objeto de conhecimento. Nesse sentido, acessa a realidade do mundo como se houvesse uma realidade objetiva exterior a ele.

A epistemologia complexa insere o sujeito no contexto da construção das realidades, como também na produção científica. Ela incorpora seriamente a subjetividade, como uma dimensão que torna as organizações menos objetivas e simples do que poderia parecer.

Porém, quanto mais autêntica e consciente a visão de mundo do sujeito, mais essa realidade se torna objetiva (objetividade entre parêntesis), isto é, a relação com o mundo não pressupõe que este existe independentemente do observador. O sujeito observador possui uma estrutura e organização que determinam o seu viver. A sua história ontogenética é o conjunto de suas mudanças estruturais, sua adaptação ao meio, mantida a sua organização que lhe dá identidade.

Dessa dinâmica autopoiética surge uma biologia que no ser humano se caracteriza como biologia do conhecer e do amar. Todo ato de conhecer faz surgir um mundo, pois ele não decorre do simples ato  fazer, é um conhecer e todo conhecer é um fazer. Por outro lado, todo ser humano é  ontogeneticamente social, se realiza dentro de um contexto cultural e a linguagem surge para permitir essa interação entre indivíduos de um grupo.

A segunda parte do livro trata do conhecimento.

A compreensão do conhecimento na sociedade atual aceita o sistema como complexo, porque avança para uma visão de mundo ampla e sistêmica, pois o modelo cartesiano baseado em representações mentais de uma realidade objetiva e separada do observador não consegue mais dar conta dos fatos da vida. Este pensamento preconiza que o sucesso das organizações depende da busca da estabilidade e do controle sobre os meios e os fins.

A ciência mecanicista com sua intenção de conhecer o que é desconhecido, tem visão restrita em sua própria intenção. Não conhece o próprio processo de conhecer. Não admite o incognoscível, o intuitivo. Seu avanço hegemônico na sociedade moderna, com seu objetivismo gerou o materialismo.

O reducionismo e o determinismo dominaram por muito tempo os pensadores de várias teorias, que vêem na redução de qualquer fenômeno a suas partes e na identificação de leis universais que governam aquelas partes eram tidos como rota única para especificar a natureza do fenômeno e assim predizê-lo e controlá-lo.

 

A complexidade sempre existiu, se ampliando continuamente, basta observar na Natureza. Ela é o sentido da evolução da vida. O processo de conhecer é algo intrínseco a todos os seres vivos, pois é o sentir, o pensar e o fazer que constrói o conhecimento, num processo incessante e interativo de coordenações de comportamentos adaptativos. Todo o conhecimento é um processo de comunicação e linguagem, que são coordenação de coordenações. Enfim, todo conhecimento é dinâmico, portanto se amplia a cada a cada movimento.

À medida que certos aspectos da Complexidade são entendidos, outros se manifestam através do imprevisto, do incerto. A complexidade lida com sistemas compostos por muitos agentes interativos e que embora possam ser de difícil previsão, podem ter uma estrutura e permitir o desenvolvimento através de intervenção ponderada. Portanto, valorizam-se todas as tendências integrativas e auto-afirmativas porque estão presentes em todos os sistemas vivos, mas a ênfase numa delas, em detrimento da outra, gera o desequilíbrio. Enfatiza-se a contribuir no resgate da visão de totalidade para a construção do conhecimento.

A terceira parte trata da sociedade em rede.

A sociedade humana é complexa, portanto possui a forma de rede, cada vez mais mediada pela tecnologia da informação e comunicação. Sua evolução, à semelhança da filogenia como um fenômeno seqüencial reprodutivo dos sistemas vivos em que necessariamente depende da conservação e adaptação de sua organização, dá-se passo a passo conservando uma estabilidade transgeracional de comportamentos ontogeneticamente adquiridas na dinâmica comunicativa. Entende-se por comunicação, não apenas uma transmissão de informações, mas uma coordenação mútua de comportamentos entre sistemas vivos. Já o comportamento comunicativo aprendido e linguístico é típico dos seres humanos.

A Teoria da Complexidade promove conceitos que ampliam a forma de ver, atuar e responsabilizar do ser humano e as organizações na construção de relações e estruturas integrativas, saudáveis e sustentáveis. Redes sociais são auto-geradoras de um contexto comum de significados, portanto estabelecem o processo de comunicação como redes vivas, onde cada comunicação gera pensamentos e significados que originam novas comunicações gerando redes colaborativas.

As tecnologias influem no desenvolvimento do pensamento e da inteligência, que resultam de redes complexas em que todos os elementos interagem, transformando o meio cultural no qual as representações se propagam. As tecnologias são caracterizadas por atributos como interatividade, mobilidade, convertibilidade, interconectividade, globalização e velocidade que se apresentam por meio de redes.

A rede permite a comunicação de muitos para muitos sendo que as atividades sociais, econômicas, políticas e culturais estão sendo estruturadas por ela. A forma da sociedade em rede organizacional se caracteriza pela interação, pela transformação das bases materiais da vida, do espaço e tempo, bem como pela cultura. Redes de transmissão que conectam o mundo todo promovem novas formas de socialização e cultura, sendo esta cumulativa no sentido de interação, persistência e transformação.

Há dimensões sociais que influenciam as pressões que a sociedade humana exerce sobre a Natureza. Estas pressões podem ser alteradas por meio da vontade inteligente. Nesse sentido, o fluir histórico da sociedade humana se dá através da cultura que se estabelece, como uma rede fechada de conversações que todos compartilham através do emocionar. Mudando as emoções, mudam a cultura da rede de conhecimentos.

Por fim, os artigos aqui organizados neste livro é resultado de um esforço coletivo para compreensão da formação complexa do sujeito, do conhecimento e da sociedade em rede. Tornando-se este sujeito, que conhece a sociedade transformada por extensão em rede, nesse processo um agente a serviço do bem-estar da humanidade que exige conexões, parcerias e inter-relações, no sentido de ultrapassar a fragmentação e a divisão em todas as áreas do conhecimento, para surgir como resultado de uma visão sistêmica.

Florianópolis, maio de 2010.

Aires José Rover e Marisa Carvalho

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