A IMPORTÂNCIA DAS REDES SOCIAIS NOS PROTESTOS URBANOS, DA REDE ÀS RUAS


Porjuliawildner- Postado em 26 março 2015

A IMPORTÂNCIA DAS REDES SOCIAIS NOS PROTESTOS URBANOS, DA REDE ÀS RUAS

Irley David Fabrício da Silva

Universidade Federal da Paraíba – PB

RESUMO: O trabalho tem como objetivo compreender a articulação dos protestos sociais viabilizados pelas redes sociais digitais e presenciais, observando esse fenômeno como extensão da experiência democrática, exercício da cidadania, dos direitos e garantias fundamentais. Tudo isso é muito recente e os seus desdobramentos e consequências sociais, econômicas e políticas vão depender da maneira como os indivíduos, atores em rede, eleitores, cidadãos, consumidores farão uso das novas redes sociais colaborativas, participativas. Tal condição – evidentemente – apresenta novos desafios e exige novos sistemas de resposta que podem trazer elementos para enfrentarmos as complexidades do contexto sociopolítico, cultural e técnico-comunicacional contemporâneo. Apontamos os movimentos sociais ocorridos recentemente no Brasil como elemento evidente da sinergia entre tecnologia, sociedade e democracia.

PALAVRAS CHAVE: Democracia; Ativismo; redes sociais.

INTRODUÇÃO

O trabalho propõe uma análise dos movimentos sociais agenciados em rede, pela comunicação digital, reconhecendo que estes se perfazem também de modo orgânico, presencial. De acordo com a pesquisadora Raquel Recuero, as redes sociais digitais podem ser definidas como estruturas compostas por atores e organizações, conectados por um ou vários tipos de relações, partilhando valores e objetivos em comuns.

No que concerne aos protestos urbanos, observados nas ruas e em redes sociais, observamos que forjam as experiências de interatividade, criatividade, sociabilidade, mas, sobretudo, este fenômeno representa a extensão da inteligência coletiva e empoderamento coletivo, expressando objetivos comuns, principalmente nas lutas sociais e políticas, incluindo “novas temáticas”, como etnia, gênero e meio ambiente.

O fenômeno da inclusão digital (gerada pelo acesso à internet) pode ser refletido analogicamente pela “alegoria da caverna”, de Platão, que nos permite compreender a passagem do senso comum ao senso crítico, da opinião (doxa) ao conhecimento (episteme), da obscuridade à clarividência. Assim, as redes podem ser vistas como a configuração de espaços sociais discursivos, constituintes de uma esfera pública (informacional), que estimula novas formas de percepção, cognição e ação política.

Com a democratização da informação, da comunicação e a imersão do conhecimento, o homem comum passou a utilizar as redes sociais como espaço de vivência cidadã, justiça social, consciência política e ambiental.

Etimologicamente, a palavra democracia é derivada do grego, composta por “demos’’, que significa ‘‘povo’’, e que traduz a idéia de força ou poder; isto é, o governo feito pelo e para o povo. As redes sociais promovem a liberdade comunicacional e o direito do cidadão de expor as suas concepções políticas e sociais. Encorajam o engajamento social nas lutas contra a corrupção, contra o abuso de poder, as ilegalidades morais e éticas praticadas pelas pessoas públicas e privadas.

Podemos perceber por meio da análise empírica do nosso objeto de estudo, que os atores sociais têm se adaptado à metamorfose cultural propiciada pelos equipamentos tecnológicos, tornando-se seres críticos e vigilantes no que diz respeito à ordem social, política e ambiental, buscando o bem-estar individual e coletivo. Isto é, fazer uso das parafernálias tecnológicas visando o bem individual e coletivo. De acordo com a reflexão de Pierre Lévy sobre a tecnologia e vida social na cultura contemporânea, um dos grandes méritos da cibercultura é nos confrontar com as experiências da liberdade e responsabilidade. Obviamente que o campo virtual possui restrições, entretanto, observa-se que, dentre as demais mídias – as convencionais –, o ciberespaço é o veículo que mais se aproxima dessa ideia de liberdade, permitindo ao ator social emitir sua opinião, interagir, buscar as várias interfaces de um suposto fato. A internet é um espaço de comunicação complexo, encarnando a presença da humanidade, pois neste nicho todas as culturas, disciplinas, discussões para o bem comum aí se entrelaçam, manifestando as aspirações humanas que refletem essencialmente, a busca da liberdade, bem-estar e felicidade.

Hoje, encontra-se em vigência um novo paradigma sócio-comunicacional e sócio-político, expresso pelas designações “comunicação em rede”, “mídias sociais” e “redes sociais”, etc. Nessa direção, apontamos as manifestações coletivas recentes (como a Primavera Árabe e os protestos urbanos no Brasil), que se utilizam do ciberespaço, internet, hipermídias e redes sociais, como o Orkut, o Facebook e o Twitter.

Este novo paradigma se instala com a expansão das tecnologias de comunicação e informação, a partir de 1975, com a fusão das telecomunicações analógicas com a informática (telemática), possibilitando a veiculação, sob um mesmo suporte – o computador – com diversas formatações de mensagens (LEMOS, 2004, p.68). Ainda, segundo Lemos:

Essa revolução digital implica, progressivamente, a passagem dos mass media (cujos símbolos são a TV, o rádio, a imprensa e o cinema) para formas individualizadas de produção, difusão e estoque de informação. Aqui a circulação de informações não obedece à hierarquia da árvore (um-todos), e sim à multiplicidade do rizoma (todos-todos). (LEMOS, 2004, p.68).

O ciberativismo chega ao Brasil em meados de 1990, com o avanço da WEB e a entrada de ativistas políticos, sociais e ambientalistas na rede. Para estes, o uso da internet é um meio de “driblar” os meios de comunicação hegemônicos, que, na maioria das vezes, não oferecem oportunidade para que a opinião pública se manifeste. Assim, a rede se torna um “espaço público” em que os ativistas podem se manifestar,otimizando o impacto de suas ideias.

O ciberativismo consiste em um conjunto de estratégias favoráveis ao exercício dos direitos humanos, políticos, sociais e ambientais. Em sua base, as inteligências coletivas conectadas informam sobre a realidade política, econômica e social, e ampliam a autonomia da sociedade. Deste modo, o ciberativismo permite aos atores sociais comunicarem os desejos e expectativas coletivas, o que contribui para formar novos vínculos sociais, que transitam pela interface virtualpresencial e presencial-virtual. E no estágio atual dos movimentos sociais mediados pelas cibermídias, as demandas coletivas migram das redes digitais para o modo presencial, através dos protestos nas ruas.

Destarte, convém assinalar uma plataforma que ganha notoriedade no campo ativista, um elemento essencial e participativo na democracia contemporânea. Chamado metaforicamente de a ‘’ tecnologia da libertação ‘’, capaz de gerenciar o controle dos meios de produção da comunicação. Os dispositivos móveis; celulares, smartphones, iphone, Ipad, Tablet, entre outros, nunca se destacou tanto quanto hoje, capaz de registrar o cotidiano, as injustiças, as lutas sociais, os movimentos e sociais, o neojornalismos em ação. Todos podem ser, de maneira intermitente, consumidores e produtores da cultura. Anarquistas, reacionários e progressistas, todos podem se registrar as demandas sociais e lança-las nas redes digitais, onde também se organiza a diversidade que leva às ruas as massas conscientes do valor de suas reivindicações. A passeata é a expressão física da mobilidade na comunicação digital.

Tecnologia, sociedade, democracia e o (Movimento passe livre)

Está consagrado no artigo 5º da constituição brasileira que todos os cidadãos têm o direito de se reunir pacificamente em locais abertos ao público, com ou sem autorização do estado. A carta magna ainda assegura a liberdade irrestrita de expressar opinião ou pensamentos. Estes trechos da lei maior do país ganharam uma força que nunca antes foi vista a partir dos atos organizados pelo movimento ‘’passe livre’’

. Os protestos recentes no Brasil, inicialmente em defesa da redução das passagens dos transportes urbanos, foram o início de alerta do povo brasileiro para começar uma série de protestos em outros campos – como a educação e a saúde. O princípio democrático – na base dos movimentos sociais – ganhou notória repercussão em todos os estados federativos do Brasil, das capitais aos municípios.

No atual cenário da sociedade, as redes sociais consistem em um meio eficaz de disseminação de ideias comuns entre os usuários, bem como a sua utilização para organizar a sociedade coletiva para levar as suas demandas às ruas. Apontando para as manifestações ocorridas recentemente no Brasil, percebemos haver algo novo, inovador, as redes sociais como plataforma discursiva dos interesses do povo, o elemento imprescindível para organizar as demandas sociais, politicas e ambientais da coletividade.

Todos, polifonicamente, em uma só voz, conclamando o slogan ‘’ o gigante acordou ‘’, ‘’Vem pra rua você também ‘’, com o intuito de comover os atores em rede a aderirem à causa repercutida nacionalmente.

As redes interativas são vistas como forma de agregação e organização, são uma invenção e fenômeno do presente, instrumentalização do conhecimento e ciência como forma de detenção do poder. A concepção de rede baseia-se numa operação democrática e igualitária, que procura convergências no engajamento das demandas sociais. É um instrumento contra o poder das hierarquias que capturam as instituições democráticas e, ironicamente, fazem delas seu instrumento de dominação. A sociedade em rede perfaz a ideia de construir uma nova força política, com alianças alicerçadas por uma ética da urgência, tendo como horizonte a construção de um novo modelo de desenvolvimento que ancorem os princípios básicos da sociedade, a educação e a saúde, assim como a esperança de um país empenhado na erradicação da desigualdade socioeconômica.

Conforme se constata na eclosão dos movimentos sociais no Exterior e no Brasil, um número cada vez maior de pessoas vai à luta, de múltiplas maneiras, para intensificar a participação nas decisões públicas e mudar a natureza da ação política para sintonizá-la com as demandas nacionais e com os desafios das crises globais que clamam por respostas urgentes. Diretamente e indiretamente fazemos parte desse amplo movimento que almeja por mudanças e, com essa motivação, levam as angústias e desejos para a praça pública, juntamente com o auxílio das tecnologias de informação e comunicação, as redes interativas, utilizadas intensivamente em favor de ideias e da aglutinação de inteligências transformadoras, criativas, empreendedoras e democráticas.

As redes sociais foi o ponto decisivo para incentivar os protestos ocorridos recentemente no Brasil, assumiu grande potencial no processo de disseminação das passeatas e movimentos, e tornou-se um ambiente discursivo e de opinião, que por não ter uma organização/filtro, as informações acabam por serem incompletas, distorcidas, manipuladas e mal interpretadas, o que garante ao ator em rede atestar a veracidade, a legitimidade e a credibilidade informacional.

O expediente do ciberativismo exige um monitoramento atento, pois as modalidades de intervenção sociais mediadas pela tecnologia se perfazem em um ambiente em que atores e interesses distintos se instalam: de um lado, os detentores do copyright, o poder do mercado, a gestão das corporações, do outro, os defensores do copyleft, a luta pela democratização, os agenciamentos da cibercidadania.

RESULTADOS E DISCUSSÕES

Reconhecemos que as redes sociais têm o poder de conscientizar e colaborar na luta pelas causas sociais com rapidez e abrangência, e de abrir caminhos para a reivindicação dos direitos, em nível ambiental, político e social. As redes sociais digitais podem forjar comunidades de atividade ou interesse, distintamente dos grupos de opinião de imprensa ou das massas de consumo da mídia irradiada (ANTOUN, 2004a).

A internet coopera no compartilhamento dos protestos, assim como personifica o campo de convocação. Mas podem ir mais além: utilizando as redes, pessoas do mundo todo criam movimentos, levando outras pessoas a aderirem às suas causas. Inúmeros exemplos atestam o poder das mídias e redes sociais e sua influência nas ações afirmativas. Os atores sociais conectados podem compartilhar abaixo-assinados. Um bom exemplo neste sentido é o site Avaaz, que promove campanhas de mobilizações fortemente coletivas, e utiliza as redes sociais para difundir as suas demandas.

Como previsto no projeto original na internet, o anonimato e a integridade da comunicação entre aliados potencializa os processos de luta quaisquer que sejam (ANTOUN, 2004b). Além do mais, neste espaço que acolhe as reivindicações coletivas, notamos os indivíduos, atores-em-rede, fazendo valer os seus direitos. E isto vale também numa perspectiva crítica do consumo: pela internet e outros sistemas de hipermídia, os consumidores se unem para reclamar sobre os problemas na aquisição de produtos ou reivindicar a melhoria dos serviços de determinadas empresas.

Seja no plano social, político ou mercadológico, as inteligências coletivas conectadas levam os indivíduos a assumirem os seus papéis no exercício da cidadania.

É no âmbito da vida cotidiana que as pessoas sofrem as necessidades e dificuldades que podem determinar sua conscientização e politização; as redes, como vetores de cognição coletiva  conectada, encorajam modos de empoderamento, chegando a estimulá-las no engajamento na luta por demandas sociais. Com a internet, abre-se também a possibilidade da criação de certa simpatia às causas que afetam a todos em escala mundial, como ocorre em relação à questão ecológica, que desperta hoje uma modalidade singular de consciência e engajamento político. A integração dessas ações é resultado de um processo de socialização que integra simpatias, afetos, interesses e estima (Costa, 2008 p.29).

Por outro lado, as pessoas não se politizam apenas porque sofrem com determinadas injustiças sociais. Engajam-se nas lutas ao se reconhecerem como atores que podem se articular na busca pelo cumprimento dos direitos civis, na luta por melhores condições no âmbito político, social e ambiental, entre outras razões públicas.

Todavia, a partir de uma observação mais detida, percebemos que as redes sociais assumem um papel importante para democratização. Através delas as pessoas publicam suas produções, seus conhecimentos e exprimem livremente suas opiniões. Neste sentido, o termo “inteligência coletiva conectada” é fundamental para avançar a compreensão dos movimentos sociais atuais.

Convém entender que dentre os fatores geradores das mobilizações, além dos desejos, expectativas e aspirações do chamado “senso comum”, o fenômeno da sociabilidade (que confere sentido à vida social) e da cooperação (o motor que faz funcionar o trabalho e a vida social) são encorajadores para a afirmação de uma comunidade participativa e auto-organizada. Como afirma Pierre Lévy (2002), as comunidades virtuais são uma nova forma de se fazer sociedade. E tudo isso é possível com o apoio das novas tecnologias de comunicação (COSTA 2008, p. 45).

Contemplando o intenso fluxo de informação caracterizado pela onipresença e ubiquidade das mídias colaborativas, percebemos que a internet (e em especial, as redes sociais digitais) constitui um espaço propício para a ocorrência de um dado movimento ou manifestação; consiste em um espaço-tempo adequado para os atores sociais se organizarem, estruturarem-se e divulgarem seus objetivos. Contudo, é preciso notar, a eficácia da internet é limitada. Ela não faz o movimento só com cliques e trocas de mensagens; depois de estruturada nas redes sociais, é preciso trazer a ação para o mundo presencial, agir organicamente nas ruas, exercitando uma modalidade de comunicação face a face. Um exemplo forte nessa direção é o fenômeno da Primavera Árabe que demonstrou como as redes têm o seu valor, propagando os protestos para todo o norte da África e Oriente Médio.

A partir de várias observações, leituras e enquetes percebermos que - de fato - a rede social, além de constituir um dos principais vetores de mobilização social, apresenta-se como um meio pelo qual as pessoas têm grande de liberdade de expressão, principalmente, para reivindicar os seus direitos e compartilhá-los.

Tudo isso é muito recente e os seus desdobramentos e consequências sociais, econômicas e políticas vão depender da maneira como os indivíduos, atores em rede, eleitores, cidadãos, consumidores farão uso das novas redes sociais colaborativas. Tal condição – evidentemente – apresenta novos desafios e exige novos sistemas de resposta que podem trazer elementos para enfrentarmos as complexidades do contexto sociopolítico, cultural e técnico-comunicacional contemporâneo. Aqui, neste texto, por meio de uma observação detida dos acontecimentos sociais em rede, buscamos indicar alguns destes elementos, que – no fim das contas – podem esclarecer acerca das relações entre os movimentos sociais, o ciberativismo, a democratização da informação e as redes sociais.

REFERÊNCIAS

ANTOUN, Henrique (Org.). WEB 2.0 – Participação e Vigilância na era da comunicação distribuída. Rio de Janeiro, Maud, 2008.

CARDOSO, Ruth Côrrea Leite. A trajetória dos movimentos sociais. In: DAGNINO, Evelina (org.). Os Anos 90: Política e sociedade no Brasil. Editora Brasiliense. p. 81-90. Disponível em: . Acesso em: 13 de março de 2014.

COSTA, Rogério da. Por um novo conceito de comunidade: Redes sociais, comunidades pessoas, inteligência coletiva. In: Antoun, Henrique (org.). Participação e vigilância da era da comunicação distribuída. Rio de Janeiro: Mauad x, 2008. P. 29 – 49.

COSTA, Sérgio. Movimentos sociais, democratização e a construção de esferas públicas locais. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, vol. 12, n. 35, Feb1997. Disponível em:. Acesso em: 18 de março de 2014.·.

DINIZ, Iara Gabriela Faleiro; CALEIRO, Maurício. Web 2.0 e ciberativismo: O poder das redes na difusão de movimentos sociais. Revista Cientifica do Departamento de Comunicação Social da UFMA, São Luís - MA, Janeiro/Junho de 2011 - Ano XIX - Nº 8. Disponível em: Acesso em: 09 de março de 2014. 

RIGITANO, Maria eugenia Cavalcante. Redes e ciberativismo: Notas para uma análise do centro de mídia independente. In: I seminário interno do grupo de pesquisa em cibercidades, FACOM-UFBA. Outubro de 2003. Disponível em acesso em 05 de março de 2014.

SANTAELLA, L. a ecologia pluralista da comunicação. Conectividade, mobilidade, ubiquidade. São Paulo: Paulus, 2010;___ linguagens líquidas na era da mobilidade. Paulus, 2007. LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Ed. 34, 1999; ____ O que é virtual? São Paulo: Ed. 34, 1996.

 

Texto extraído de:  http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/anais_linguagem_tecnologia/article/view/5806

Autor: Irley David Fabrício da Silva