GLOBALIZAÇÃO E CRISE ECONÔMICA E JURÍDICA. EXISTIRÁ SOLUÇÃO?


PorKarina Alves Te...- Postado em 14 setembro 2011

A globalização se refere a um processo revolucionário que embora tenha evoluído paulatinamente, eclodiu de fato no século XX, onde tudo o que ocorre em uma determinada região é sabido em qualquer esfera do mundo em questão de segundos. Por evidente que este processo trouxe reflexos ao âmbito social, cultural, econômico e principalmente jurídico, o que inevitavelmente desencadeou uma séria crise que carrega a sociedade para o caos, tendo chegado a hora da reformulação do sistema jurídico, ou ao menos de sua cogitação.

A partir do avanço da globalização a informação se tornou instantânea e o que antes ocorria “do outro lado do mundo”, passou a ser transmitido em tempo real do “outro lado da tela”, seja do computador, seja do televisor, ou por meio de qualquer outro meio de comunicação, o que resultou numa “aldeia global”, onde todas as consequências de atos e fatos econômicos, sociais, culturais, políticos e jurídicos de grandes proporções que anteriormente eram sufocados dentro de suas fronteiras, contemporaneamente são experimentados e também vistos e acompanhados por todo o mundo.

Economicamente, a globalização acarreta a integração das economias privadas e estatais mundiais, formando um todo, contudo, a globalização não é apenas econômica possuindo características culturais, provocando uma maior integração entre os povos – podendo se tomar como exemplo a futura realização da “festa do rock” – Rock in Rio – que se realizará no Brasil em setembro deste ano, onde se celebrará a transmissão de culturas entre todos os povos através de suas manifestações musicais.

A troca de informações culturais promove na aldeia global, além do conhecimento do “diferente”, também a identificação dos elementos da cultura do próprio sujeito que está sendo açambarcado pela informação cultural. Esta transformação se dá em tamanha proporção e velocidade que se impõe reivindicações hodiernas para que o Direito e seus aplicadores voltem suas atenções às necessidades da norma jurídica ser criada e aplicada conforme as novas exigências sociais.

De inopino o mundo se tornou menor... há facilidade para um trânsito maior de produtos importados e informações, além disso as pessoas viajam mais, seja a lazer ou a trabalho, o que provoca uma maior aproximação entre as pessoas em razão da tecnologia e a dinâmica das novas relações, sendo um fenômeno, sobretudo, econômico.

A globalização atinge toda à sociedade e consequentemente o Direito, entrando na pauta das discussões jurídicas modernas mundiais, mormente pela sua interferência direta e indireta na vida social.

Desta feita, tem-se que a globalização vem impondo um modelo de vida que compromete significativamente a organização da vida em sociedade, em outras palavras, compromete a eficácia do Direito, o que não deve ser confundido com a validade deste.

Um dos maiores problemas da globalização surgiu com o fim do Estado Social[1]e a crise do Estado Nacional[2], oportunidade em que muitas das competências do Estado deixaram de possuir eficácia, vendo o ente estatal enfraquecer o seu poder de editar regras, principalmente no setor econômico, entrando as “normas econômicas” no limbo jurídico.

De acordo com Ferrajoli, a crise do Estado Nacional é justamente a crise do direito!

Com a reformatação dos Estados Nacionais e as privatizações de estatais e serviços públicos reformatou-se os Estados, passando os mercados a elaborarem suas próprias regras, passando o Estado a ser regido por uma nova fonte normativa, a economia.

Surge assim uma problemática mundial que se origina justamente no vazio de normas de direito público internacional (regras, limites e vínculos que garantam a paz e os direitos humanos diante dos novos poderes transnacionais que ocupam o lugar do poder estatal), haja vista que foi retirada a competência dos Estados para a normatização, transferindo este encargo para a economia.

Neste escólio, não houve outra vertente a ser seguida senão a de preencher este vazio de normas de direito público internacional com um direito privado contratual (direito de produção contratual de acordo com a lei do mais forte).

Na era da globalização o futuro de cada Estado depende cada vez menos da política interna e cada vez mais das decisões externas tomadas em sedes políticas supranacionais ou por poderes econômicos globais, foi rompido o nexo entre democracia e povo!

Sob a ótica jurídica, a globalização vem provocando uma séria crise nos sistemas jurídicos locais, haja vista que os ordenamentos que adotam a Civil Law (sistema jurídico inspirado pelo Direito Romano, com a característica principal de as leis serem escritas e codificadas, o que não ocorre no sistema da Common Law[3]), como no caso do Brasil, não mais conseguem acompanhar as necessidades sociais jurídicas alteradas periodicamente por uma sociedade que se transmuta a cada dia.

A eficácia de uma norma se vê atenuada a cada dia, haja vista que a expectativa normativa social aceita por todos se transmuta continuamente, não possuindo o ordenamento jurídico instrumentos eficazes capazes de atender as necessidades da sociedade. A velocidade das informações e transformações sociais (decorrentes da interação de diferentes povos) não são acompanhadas pela burocracia jurídica gerando uma considerável e séria problemática social, a qual pode acabar levando ao caos.

Exposto o dilema, a comunidade jurídica se indaga acerca de qual seria a solução mais adequada.

Penso que há chegada a hora da reformulação do sistema jurídico brasileiro para que se possa oferecer a cada pessoa que bate à porta do Poder Judiciário, buscando a solução para um determinado litígio, que muitas vezes trará repercussões não apenas em sua vida financeira, mas também em sua vida pessoal, uma solução rápida, atual e principalmente satisfatória, o que consiste na resolução de litígios antigos e atuais.

Sob esta esfera constata-se que para que a globalização deixe de ser um óbice, ao menos sob o enfoque jurídico, o sistema deve se desapegar do seu formalismo exacerbado, que mesmo evoluído (com as conquistas dos Juizados Especiais e Justiça do Trabalho) ainda se encontra veemente impregnado nas veias judiciais.

Para tanto, estaríamos ante uma nova problemática: seria o caso de diminuir a codificação de normas e aumentar as suas interpretações?

Por evidente que a resposta não se apresenta de forma simples, haja vista que de um lado positivo nos depararíamos com a atualização permanente do ordenamento jurídico, o qual se modificaria de acordo com a interpretação atual e eficaz de cada ato, fato ou negócio jurídico; doutro norte, na esfera negativa nos veríamos ante a interpretação extremamente subjetiva de cada julgador, o qual poderia inclusive traçar os caminhos da discricionariedade, levando à insegurança jurídica, havendo argumentações até mesmo no sentido da implementação da “ditadura da Toga”.

A problemática está lançada e sedenta de resolução, a globalização não pode mais ser ignorada pelo Direito, creio que as modificações sempre são benéficas, mesmo que estas tragam consigo algumas intempéries, os quais serão solucionados com o tempo.

A globalização iniciou um processo de transmissão rápida de informações, provocando na sociedade uma constante alteração de comportamento social e econômico, o que naturalmente desencadeia a necessidade de criação de novas leis que atendam as necessidade sociais – principalmente normas de direito público internacional, visto as leis contemporaneamente estarem perdendo a cada dia a sua eficácia, dando lugar um direito privado contratual.

No Brasil, onde as leis obrigatoriamente são codificadas o sistema legislativo precário não consegue alcançar a evolução social, gerando uma inevitável crise jurídica, que pode acabar levando a sociedade ao caos. Desta feita, não há outra alternativa senão a da reformulação do sistema jurídico brasileiro, onde não exista o temido e burocrático formalismo exacerbado.

 



[1]O Estado Social visa a superação da contradição entre a igualdade política e a desigualdade social. O Estado Social confere a seus nacionais direitos do trabalho, da previdência, da educação, bem como intervém na economia, regula o salário, a moeda, os preços, etc.

[2]A crise do Estado Nacional se dá uma vez que este não obtém êxito em controlar dinâmicas que extrapolam seus limites territoriais. Embora os Estados Nacionais permaneçam determinantes em seus territórios estes têm reduzido o seu poder de decisão. O fenômeno do enfraquecimento do Estado Nacional nos obriga a admitir uma tendência à superação dos Estados Nacionais, havendo a necessidade de substituição destes por um(ns) órgão(s) que possam solucionar os problemas mundiais. Sobre o assunto leia a Constelação Pós-nacional: ensaios políticos de Jürgen Habermas.

[3]Ordem constitucional governada por convenções, práticas que são consideradas obrigatórias e que somente em circunstâncias muito especiais podem ser modificadas ou ignoradas. A ordem é garantida, ademais, por regras legais, que mantêm a conformidade das condutas pela probabilidade de sanção, aplicada por autoridades competentes, no caso de desvio de conduta. SCURO NETO, Pedro. Manual de Sociologia Geral e Jurídica. 4ª. Edição. São Paulo: Saraiva. 2000. p. 177.