Direitos Políticos na Constituição Federal de 1988


Porvinicius.pj- Postado em 01 novembro 2011

Autores: 
ACOCELLA, Mariana

INTRODUÇÃO

Os direitos políticos, ou de cidadania, resumem o conjunto de direitos que regulam a forma de participação popular no governo. A Constituição Federal elenca um conjunto de preceitos, os quais proporcionam ao cidadão a participação na via pública do País.

O direito democrático de participação do povo no governo, por seus representantes, exigiu a formação de um conjunto de leis, denominado direitos políticos.

José Afonso da Silva citando Pimenta Bueno, esclarece como sendo direitos políticos: “as prerrogativas, os atributos, faculdades ou poder de intervenção dos cidadãos ativos no governo de seu país, intervenção direta ou só indireta, mais ou menos ampla, segundo a intensidade de gozo desses direitos”[1]

Nesse sentido, prescreve o artigo 1º da Constituição Federal: “todo poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos ou diretamente, nos termos desta Constituição”.

Os direitos políticos compreendem os institutos constitucionais relativos ao direito de sufrágio, aos sistemas eleitorais, às hipóteses de perda e suspensão dos direitos políticos e às regras de inelegibilidade.

1. Do sufrágio

A lei deveria ser a expressão da vontade geral, ou seja, deveria representar a vontade comum. Os representantes do povo, eleitos por meio do voto, deveriam criar leis pautando-se na vontade maior, ou seja, de maneira a atingir as convicções do povo.

O Poder Legislativo, o qual tem o poder/dever de criar leis, é composto por representantes escolhidos pelo povo, por meio do voto.

Para resguardar o direito político representado pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, o artigo 14 da Constituição Federal estabelece que: “A soberania popular será exercida pelo sufrágio universal e pelo voto direto e secreto, com valor igual para todos, e, nos termos da lei, mediante: I – plebiscito; II – referendo; III – iniciativa popular”.

O sufrágio universal surgiu com a Revolução Francesa, antes da reivindicação burguesa, o povo não tinha direito à escolha de seus representantes. Pelo contrário, o voto era censitário, constituindo direito da minoria detentora das riquezas e do poder.

O voto nada mais representava do que a expressão da vontade particularizada da minoria detentora do poder, ou seja, os representantes eram membros da classe detentora do poder e escolhidos por essa mesma classe, sendo que, desse modo, somente os interesses da minoria eram preservados e observados.

O sufrágio universal deslocou o fulcro do poder político, possibilitando ao povo a participação na escolha de seus representantes.

O direito de sufrágio não é mero direito individual, pois seu conteúdo, que predica o cidadão a participar da vida política do Estado, transforma-o em um verdadeiro instrumento do regime democrático, que, por princípio, só pode realizar-se pela manifestação dos cidadãos na vida do Estado.Bem por isso, o sufrágio constitui simultaneamente um direito e um dever.[2] 

O direito de sufrágio expressa-se pela capacidade de eleger e ser eleito.

No tocante à capacidade de eleger, constitui-se ela por meio do voto, o qual é obrigatório para maiores de dezoito anos (artigo 14, I, da Constituição Federal), sendo facultativo para analfabetos, para os maiores de setenta e para os maiores de dezesseis e menores de dezoito anos.

1.1. Características

Como bem assinala José Afonso da Silva:

“As palavras sufrágio e voto são empregadas comumente como sinônimas. A Constituição, no entanto, dá-lhes sentido diferentes, especialmente no seu art. 14, por onde se vê que o sufrágio é universal e o voto é direito, secreto e tem valor igual. A palavra voto é empregada em outros dispositivos, exprimindo a vontade num processo de participação do povo no governo, expressando: um, o direito (voto); outro, o seu exercício (voto),e outro, o modo de exercício (escrutínio)”.[3]

O sufrágio é universal, ou seja, todos os cidadãos que atendam as condições, indicadas no texto constitucional, têm o direito/dever de votar (capacidade eleitoral ativa) e o direito de ser votado (capacidade eleitoral passiva).

O legislador constituinte ao estabelecer condições para a capacidade eleitoral ativa (direito de votar) não tirou o caráter universal do sufrágio, à medida que este somente seria desvirtuado caso a Constituição não estabelecesse prévia, genérica e abstratamente os requisitos para a capacidade eleitoral ativa, impossibilitando uma aplicação comum a todos os cidadãos.

O voto é exercido de forma direta, e, na lição no Professor Alexandre de Moraes, apresenta diversas características constitucionais, quais sejam, personalidade, obrigatoriedade, liberdade, sigilosidade, igualdade e periodicidade[4]

A característica da personalidade está presente porque o voto é direito personalíssimo, o qual deverá ser exercido de pessoalmente, não sendo possível outorgar procuração para votar, sob pena de nulidade do voto.

Por seu turno, o voto é obrigatório para os cidadãos maiores de dezoito anos e menores de setenta (idade a partir da qual o voto se torna facultativo). A obrigatoriedade do voto consiste no dever de o cidadão comparecer à eleição, assinado uma folha de presença, manifestando a escolha de seu representante, havendo sanção para aqueles que não comparecem à eleição (multa). 

A liberdade está presente no direito de escolher o representante conforme as convicções do eleitor e pela faculdade de anular o voto.

Já a sigilosidade consiste na proibição de revelação do voto. O voto não pode ser revelado nem por seu autor nem por terceiro fraudulentamente.

O voto é direto porque os eleitores elegem, no exercício do direito de sufrágio, por meio do voto (instrumento), por si, sem intermediários, seis representantes e governantes.

No tocante à periodicidade, ela está presente no artigo 60, § 4º da Constituição Federal o voto é garantia da temporariedade dos mandatos, uma vez que a democracia representativa prevê e exige existência de mandatos com prazo determinado.

Por último, a igualdade do voto se revela porque todos os cidadãos têm o mesmo valor no processo eleitoral. 

1.2. Direito de votar

Conforme já assinalado, sufrágio é o direito de votar e ser votado. Voto é o ato pelo qual se exercita esse direito.

Eleitores são todos os brasileiros (natos e naturalizados) que, à data da eleição, tenham dezesseis anos de idade, alistados na forma da lei.

O alistamento eleitoral é obrigatório para os maiores de dezoito anos e facultativo aos maiores de dezesseis e menores de dezoito anos analfabetos e aos maiores de setenta anos.

O direito de sufrágio exerce-se praticando atos de diversos tipos, No que tange à sua função eleitoral, o voto é o ato fundamental de seu exercício, que se manifesta também como ato de alguma função participativa: plebiscito e referendo.

O voto é a manifestação dos cidadãos tendente à escolha de seus representantes, sendo, por última análise, a vontade ver as pretensões do povo atendidas por meio do poder legiferante.

1.3. Plebiscito, referendo e iniciativa popular

O artigo 14, incisos I a III da Constituição Federal prescrevem que a soberania popular será exercida diretamente mediante o plebiscito, o referendo e a iniciativa popular.

A Lei nº 9.709/98, regulamentando os citados dispositivos constitucionais, indica, em seu artigo 2º, que plebiscito e referendo “são consultas formuladas ao povo para que delibere sobre matéria de acentuada relevância, de natureza constitucional, legislativa ou administrativa”.

O plebiscito é convocado com anterioridade ao ato, chamando o povo para aprová-lo ou rejeitá-lo pelo voto. O referendo, diferentemente, é convocado com posterioridade, de tal modo que a manifestação popular pelo voto cumprirá a função de ratificar ou rejeitar o ato legislativo ou administrativo já editado.

A iniciativa popular encontra-se disciplinada pelo artigo 13 da Lei nº 9.709/98 que estabelece que como requisitos para essa forma de deflagração do processo legislativo a apresentação de projeto de lei subscrito por, no mínimo, um por cento do eleitorado nacional, distribuído por pelo menos cinco Estados, com não menos de três décimos por cento dos eleitores de cada um deles.

2. Capacidade eleitoral passiva

O direito de ser votado, ou sufrágio passivo, traduz o direito que o cidadão tem de, satisfeitas as condições necessárias e livre dos impedimentos constitucionais, apresentar-se como candidato a um cargo eletivo.[5]

Assim como a alistabilidade diz respeito à capacidade eleitoral ativa (capacidade de ser eleitor), a elegibilidade se refere à capacidade eleitoral passiva, à capacidade de ser eleito. Tem elegibilidade, portanto, quem preencha as condições exigidas para concorrer a um mandato eletivo. Consiste, pois, a elegibilidade no direito de postular a designação pelos eleitores a um mandato político no Legislativo ou no Executivo.[6]

A elegibilidade está prevista no artigo 14, § 3º da Constituição Federal, o qual prevê as condições para que o cidadão exerça o direito ao sufrágio passivo, a saber:

“I – a nacionalidade brasileira[7];

II – o pleno exercício dos direitos políticos;

III – o alistamento eleitoral;

IV – o domicílio eleitoral na circunscrição;

V – a filiação partidária;

VI – idade mínida de: a) trinta e cinco anos para Presidente e Vice-Presidente da República e Senador; b) trinta anos para Governador e Vice-Governador de Estado e do Distrito Federal; c) vinte e um anos para Deputado Federal, Deputado Estadual ou Distrital, Prefeito, Vice-Prefeito e juiz de paz; d) dezoito anos para vereador”.

Citando Luis Lopes Guerra, Luiz Alberto David Araujo explica: “o direito de sufrágio passivo, embora implique o de se apresentar como candidato a cargos eletivos e simultaneamente ter o direito à proclamação de sua eleição, com a efetiva posse no cargo, quando vitorioso no certame eleitoral, não se esvai nesses direitos. É que as regras pertinentes ao sufrágio passivo devem ter conexão com o direito de sufrágio ativo, isto é, com o direito de votar”[8]

2.1. Os eleitos e o mandato político

Eleito é o candidato que receber votos em número suficiente para que lhe seja conferido o mandato, sendo diplomado pela Justiça Eleitoral.

Ao eleito é conferido o direito à investidura no cargo para o qual se candidatou, pelo prazo previsto na Constituição Federal, desde que não incorra ou venha incorrer em alguma incompatibilidade para o exercício do mandato. Incompatibilidades são situações jurídicas que impedem o eleito de exercer certas ocupações ou praticar certos atos cumulativamente com o mandato.

Outra conseqüência da investidura se refere às prerrogativas inerentes ao exercício do mandato. Assim, todos os representantes do povo estão em posição de igualdade, um não podendo colocar-se em situação de superioridade em relação a outros, de tal forma que o debate legislativo, por exemplo, deve assegurar o direito de manifestação das minorias parlamentares, bem como o uso de todos os dispositivos regimentais em igualdade com a maioria parlamentar.

3.     Sistemas Eleitorais

Antes de falar do sistema eleitoral, importante destacar que ele se expressa por meio da eleição, a qual é o processo mediante o qual se dá a escolha dos governantes por um grupo social, através do voto.

Conforme visto acima, o voto é a manifestação popular em um regime democrático, que permite a participação do eleitorado na vida pública da Nação.

Existem dois sistemas eleitorais no Brasil, quais sejam, o majoritário e o proporcional. O majoritário é aquele pelo qual se considera eleito o candidato que obtiver o maior número de votos.

 Por seu turno, a forma proporcional consiste na eleição de membros de um grupo para um órgão em proporção ao número de sufrágios que recebeu o grupo em relação ao total apurado. NOTA DE RODAPÉ Ferreira Filho, Manoel Gonçalves. Curso de Direito Constitucional. Ed. Saraiva. 2006. página 103.

O sistema eleitoral majoritário é utilizado para a eleição do Presidente da República, Governadores e Prefeitos (de cidades com mais de duzentos mil eleitores) e Senadores. Para ser eleitor pelo sistema majoritário, o candidato deverá obter 50% + 1 dos votos (maioria absoluta) para que seja eleito em primeiro turno. Caso isso não ocorra, será instaurado o segundo turno das eleições, no qual disputarão os dois candidatos mais votados em primeiro turno, elegendo-se o candidato que obtiver a  maioria dos votos.

Por seu turno, no sistema eleitoral proporcional são eleitos Vereadores e Deputados Estaduais e Federais. Por esse sistema, o total de votos válidos é dividido pelo número de vagas em disputa. O resultado é o quociente eleitoral, ou o número de votos correspondentes a cada cadeira. Ao dividir o total de votos de um partido pelo quociente eleitoral, chega-se ao quociente partidário, que é o número de vagas que ele obteve.

4.     Direitos Políticos

Todo brasileiro pode ascender à condição de cidadão ativo, isto, é eleitor. Todavia, é necessário que não esteja como conscrito realizando serviço militar obrigatório, não esteja privado, temporário ou definitivamente, dos direitos políticos e tenha, no mínimo, dezesseis anos de idade. . Preenchendo tais requisitos, pode inscrever-se como eleitor. Na verdade, o maior de dezoito, menos de setenta anos, é obrigado a inscrever-se como eleitor.  NOTA DE RODAPÉ. OBRA JÁ CITADA .114

O artigo 12, § 1º da Constituição permite ao português inscrever-se como eleitor, caso haja reciprocidade desse direito com relação ao brasileiro.

4.1. Hipóteses de Perda e Suspensão dos Diretos Políticos

Os requisitos apontados para a aquisição da condição de eleitor são os requisitos para aquisição dos poderes políticos.

No mesmo sentido, somente possui a capacidade eleitoral passiva o candidato que estiver em pleno gozo da capacidade eleitoral ativa, sendo pressuposto de elegibilidade.

Embora os direitos políticos estejam constitucionalmente consagrados, em determinadas hipóteses o brasileiro pode vir a ser privado dos mesmos, temporária ou definitivamente (nesse ultimo caso, estamos diante de perda dos direitos políticos).

A perda dos direitos políticos está prevista no artigo 15 da Constituição Federal, a qual decorre: 1) do cancelamento da naturalização por sentença transitada em julgado; 2) da escusa da consciência, ou seja, da recusa em cumprir com obrigação, encargo ou serviço impostos pela lei aos brasileiros em geral, ou em satisfazer os deveres que a lei estabeleceu em substituição àqueles.

4.2. Suspensão e Recuperação dos Direitos Políticos

A privação temporária dos direitos políticos, impropriamente chamada “suspensão”, decorre de:

1)    incapacidade civil absoluta (artigo 15, II) decretada pelo Judiciário, conforme a jurisprudência;

2)    condenação criminal (artigo 15, III), enquanto perdurarem os seus efeitos. Contra o texto claro desse dispositivo constitucional, julgados há que entendem suspender o sursis, não só a execução da pena, também a privação dos direitos políticos. JURISPRUDÊNCIA

3)    Improbidade administrativa nos termos do artigo 37, § 4.

Importante ressaltar que as pessoas privadas dos direitos políticos podem recuperá-los. Se essa provação for a dita definitiva, ou perda, dependerá do cumprimento de exigências legais. Se a privação for decorrente de suspensão, a recuperação será automática, quando do desaparecimento de seu fundamento ou pelo decurso do prazo assinalado.

Da perda e da suspensão dos direitos políticos ocorrem os mesmos efeitos. Assim, ambas acarretam a perda dos cargos que não possam ser preenchidos por quem não for cidadão, bem como dos mandatros representativos.

4.2 Elegibilidade e Inelegibilidade

A capacidade eleitoral passiva (elegibilidade) também decorre do princípio democrático. O analfabeto não goza da elegibilidade. Ela só se torna plena aos 35 anos, pois até essa idade o brasileiro não pode ser eleito para a presidência e vice-presidência da República e para o Senado. Os naturalizados não a têm em sua plenitude, pois só podem se candidatar a determinados cargos, sendo alguns destinados somente aos brasileiros natos.  O português equiparado usufrui de situação igual ao brasileiro naturalizado, caso haja reciprocidade.

A inelegibilidade é uma medida destinada a defender a democracia contra possíveis e prováveis abusos,

5.     Irreelegibilidade

A irreelegibilidade impede que a reeleição por tempo indeterminado dos Chefes do Executivo. A Emenda Constitucional n. 16/97 veio a admitir a reeleição, mas apenas para o período imediatamente subsequente. A aludida Emenda deu nova redação ao artigo 14, § 5º, da Constituição vigente, permitindo que o Presidente da República, o Governador de Estado ou do Distrito Federal a o Prefeito possam se reeleger para o período posterior, uma única vez.

7.     Incoerência

As autoridades mencionadas no tópico acima podem reeleger-se sem sequer se afastarem do exercício do cargo. Todavia, por força do artigo 14, § 6, se objetivarem cargo distinto, terão de renunciar ao cargo que ocupam “até seis meses antes do pleito”.

8. Inelegibilidades Enunciadas no Texto Constitucional

A Constituição Federal de 1988 prevê a possibilidade de lei complementar enunciar hipóteses de inelegibilidade que não as previstas na Carta Magna.

São hipóteses de inelegibilidade previstas no texto constitucional:

a) Não possuir domicílio eleitoral na circunscrição; b) não ter filiação partidária; c) ser analfabeto; d) ser titular de determinados cargos; e) ter vínculos pessoais com quem seja titular de determinados cargos, ou os haja exercido num determinado período (Constituição, artigo 14, § 7º).

Conclusão

Os direitos políticos, ou de cidadania proporcionam ao cidadão a participação na via pública do País.

O direito de participação do povo no governo, por seus representantes, é elementar ao estado democrático de direito, posto que todo poder deve emanar do povo.

Sem os direitos políticos mencionados no presente trabalho, estaríamos diante de uma ditadura, na qual prevaleceriam os interesses de uma classe dominante.


[1]              Silva, José Alfonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. Editora Malheiros. 23º Edição. 2004. página 344.

[2]           Araujo, Luiz Aberto David. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva. 10ª Edição. 2006. pg. 239.

[3]              Silva, José Alfonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. Editora Malheiros. 23º Edição. 2004. página 348.

[4]

                        [4]De Moraes, Alexandre. Direito Constitucional. Editora Atlas. 13ª Edição. 2003. página 234.

[5]              Araujo, Luiz Aberto David. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva. 10ª Edição. 2006. pg. 242.

[6]              Silva, José Alfonso. Curso de Direito Constitucional Positivo. Editora Malheiros. 23º Edição. 2004. página 365.

[7]              Impende destacar que para se candidatar a Presidente ou Vice-Presidente da República é necessário ser brasileiro nato.

[8]              [8]Araujo, Luiz Aberto David. Curso de Direito Constitucional. Editora Saraiva. 10ª Edição. 2006. pg. 243.