Da desclassificação dos licitantes de acordo com a Lei de Licitações


Pormathiasfoletto- Postado em 23 maio 2013

Autores: 
SARTORIO, Milton Tiago Elias Santos

 

 

1. DA LICITAÇÃO

A licitação é um certame onde a Administração Pública contrata com o particular, obedecendo certos requisitos. Nesse diapasão:

Licitação, no ordenamento brasileiro, é o processo administrativo em que a sucessão de fases e atos leva à indicação de quem vai celebrar contrato com a Administração. Visa, portanto, a selecionar quem vai contratar com a Administração, por oferecer proposta mais vantajosa ao interesse público. A decisão final do processo licitatório aponta o futuro contratado. (MEDAUAR, 2000, p. 214).

O artigo 22 da Carta Política, que dispõe sobre a licitação, dispõe:

Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: (...)

XXVII – normas gerais de licitação e contratação, em todas as modalidades, para as administrações públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, obedecido o disposto no art. 37, XXI, e para as empresas públicas e sociedades de economia mista, nos termos do art. 173, § 1º, III.

Ou seja, a Constituição determinou a edição de uma lei que trata-se da Licitação e Contratação do particular com a Administração Pública. Esta lei surgiu em 21 de junho de 1993 (lei 8.666/93), prevendo normas para a licitação do particular (pessoa física ou jurídica) para contratação com a Administração.

Segundo leciona Celso Antonio Bandeira de Mello, a licitação pressupõe duas fases fundamentais, quais sejam: “uma, a da demonstração de tais atributos, chamada habilitação, e outra concernente à apuração da melhor proposta, que é o julgamento”. (MELLO, 2006, p. 493).

Portanto, o licitante deve preencher os requisitos legais (habilitação jurídica, técnica, fiscal, econômico-financeira) e oferecer melhor proposta à Administração. Deste modo, será declarado vencedor da licitação e poderá adjudicar seu objeto, conforme disposto no Edital.

2. PROCESSO LICITATÓRIO

Sinteticamente, pode-se classificar o processo licitatório em 5 fases: a) edital (ato convocando os interessados em licitar com a Administração, desde que preenchidos os requisitos nele estabelecidos); b) hablitação (existência da pessoa física e/ou jurídica, bem como quitação com o Fisco, etc. – arts. 27 a 32); c) julgamento com a classificação (ordenando as melhores propostas); d) homologação (verificação da regularidade das habilitações e julgamento das propostas); e) adjudicação (declarando o vencedor do certame). (MELLO, 2006, p. 543).

Estas cinco fases (edital, habilitação, julgamento com a classificação, homologação e adjudicação) compõem o processo licitatório. Logo, após apresentação da proposta, a autoridade competente escolherá aquela que estiver de acordo com o Edital, ou seja, mais atraente à Pessoa Jurídica de Direito Público, e declarará o vencedor.

No entanto, pode ocorrer que todos os licitantes não se habilitem (por não preencher qualquer dos requisitos dos artigos 27 a 31 da Lei. Ou uma vez habilitados, não sejam classificados, pois a sua proposta não foi aquela estabelecida pela Administração no Edital.

Tanto num, quanto em outro caso, estar-se-ia diante do disposto no artigo 48, I, da Lei 8.666/93, que dispõe:

Art. 48. Serão desclassificados:

I – as propostas que não atendam às exigências do ato convocatório da licitação.

Neste caso, o licitante eivado será excluído da licitação e se verificará se o segundo classificado preenche os requisitos do Edital, sob pena de chamar o terceiro, e assim sucessivamente.

3. VÍCIOS NO PROCEDIMENTO DE LICITAÇÃO

A desclassificação (proposta não foi aceita pela autoridade julgadora) ou a desqualificação (não observância dos requisitos de habilitação), retiram o licitante do procedimento para contratação com a Administração Pública.

Neste contexto, pode-se perquirir o que aconteceria se todos os licitantes fossem desclassificados ou desqualificados. Nesse contexto, surge o artigo 48, da Lei de Licitação:

Art. 48, (...) § 3º Quando todos os licitantes forem inabilitados ou todas as propostas forem desclassificadas, a Administração poderá fixar aos licitantes o prazo de 8 (oito) dias úteis para a apresentação de nova documentação ou de outras propostas escoimadas das causas referidas neste artigo, facultada, no caso de convite, a redução deste prazo para 3 (três) dias úteis.

Seria praticamente uma nova Licitação, mas com os mesmos licitantes, garantindo-lhes prazo para regularizem sua situação ou melhorarem suas propostas. A doutrina, nesse sentido se manifesta:

Quando várias propostas forem desclassificadas, sua lista poderá ser publicada em um único julgamento, desde que todas tenham sido desclassificadas pelo mesmo ou pelos mesmos motivos.(...)

A fundamentação não necessita ser longa, mas deve indicar, de modo concreto, o vício encontrado pela autoridade julgadora. (...). (FRANÇA, 2000, p. 95).

A autora, indica a forma que deve ser observada no caso de desclassificação de todas as propostas. Nesse sentido, a lista contendo os desclassificados deve ser publicada num único julgamento (desde que pelo mesmo motivo) e a fundamentação deve indicar de modo concreto, claro, conciso, o vício encontrado pela autoridade julgadora.

Este tipo de vício “(...) acarreta a invalidade de todos os atos posteriores, inclusive do contrato administrativo (se chegou a ser pactuado), conforme dispõe o art. 49, § 2º. Deverá refazer a licitação, integral ou parcialmente”. (JUSTEN FILHO, 2005, p. 371).

A licitação será refeita, mas com os mesmos licitantes, após afastar o vício que gerou sua invalidade.

4. DESCLASSIFCAÇÃO E DESQUALIFICAÇÃO DO INTERESSADOS

Conforme esposado no artigo 48, § 3º , tanto na hipótese de desclassificação, que nada mais é senão a “(...) exclusão de proposta desconforme com as exigências necessárias para sua participação no certame”. (MELLO, 2006, p. 560) ou desqualificação (não preenchimento de habilitação jurídica, técnica, econômico-financeira, fiscal) de todos os licitantes. Neste caso, a lei prevê um prazo de 8 dias para realização de nova licitação com os mesmos interessados.

Pode-se questionar o caso de desqualificação de alguns e qualificação de outros e após, a desclassificação de todos. Isto é, apenas alguns licitantes passaram pela fase de qualificação (preencheram todos os requisitos de habilitação), mas não conseguiram que suas propostas fossem classificadas pela autoridade do certame licitatório. Nesse contexto, deve ser feita nova licitação somente para os interessados que foram classificados ou para todos (desqualificados e desclassificados)?

Por analogia doutrinária, a melhor posição é a realização de novo processo licitatório para todos os interessados, seja desclassificado, seja desqualificado. Nesse sentido Celso Antonio Bandeira de Mello: “Na fase de habilitação a promotora do certame deve se abster de exigências ou rigorismos inúteis.”. (MELLO, 2006, p. 558).

Por seu turno, Adílson Dallari, em seu livro Aspectos Jurídicos da Licitação. São Paulo: Saraiva, 1992, p. 88:

“Visa a concorrência pública fazer com que o maior número de licitantes se habilitem para o objetivo de facilitar aos órgãos públicos a obtenção de coisas e serviços mais convenientes a seus interesses. Em razão deste escopo, exigências demasiadas e rigorismos inconsentâneos com a boa exegese da lei devem ser arredados. Não deve haver nos trabalhos nenhum rigorismo e na primeira fase de habilitação deve ser de absoluta singeleza o procedimento licitatório”. (DALLARI apud MELLO, 2006, p. 558).

Ou seja, a finalidade do processo de licitação é pluralidade de concorrentes. Ainda, a fase de habilitação deve ser in dubio pro interessado. Na dúvida, decide-se a favor do interessado.

Este entendimento vai de encontro com o princípio da Igualdade que:

(...) implica o dever não apenas de tratar isonomicamente todos os que afluírem ao certame, mas também o de ensejar oportunidade de disputá-lo a quaisquer interessados que, desejando dele participar, podem oferecer as indispensáveis condições de garantia. (MELLO, 2006, p. 500-501).

O artigo 48, § 3º é silente em relação a esta hipótese. Logo, por analogia mais benéfica, deve-se conceder a oportunidade daqueles que não foram qualificados, num primeiro momento, se qualificarem num segundo. O impedimento pode gerar recurso e até mandado de segurança, com fundamento no princípio da igualdade, esposado no artigo 5º, caput, da Constituição. Isso faria que o processo licitatório ficasse moroso, obstando seu prosseguimento, indo contra o princípio da eficiência, celeridade (art. 37, caput, da Constituição).

Nesse diapasão, dispõe a doutrina:

Cabe observar que, ante o princípio do formalismo moderado que norteia o processo administrativo, não deverá predominar rigor exagerado na apreciação dos documentos, que leve à inabilitação por motivo de minúcia irrelevante, afetando o princípio da competitividade. Quanto maior o número de licitantes, mais aumenta a possibilidade de obter melhores serviços, obras e materiais. (MEDAUAR, 2001, p. 231).

Não se está defendendo a contratação daqueles que não preencham sua habilitação, mas sim, de acordo com o art. 48, § 3º, a possibilidade de todos os interessados em contratar com a Administração Pública nova oportunidade para regularizarem suas situações.

Este entendimento encontra-se em consonância com o princípio da igualdade, da competitividade e com a interpretação de que o maior número possível de interessados enseja a obtenção de bens e serviços de acordo com os interesses da Administração.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A licitação pressupõe uma série de princípios que devem ser observados. Composta, em síntese, de cinco fases (edital, habilitação, julgamento com a classificação, homologação e adjudicação).

A proposta que não atender aos requisitos do Edital será desclassificada ou desqualificada, conforme o caso (art. 48, I). Neste contexto, a segunda melhor proposta será chamada para ser apreciada pela autoridade julgadora.

Há casos, contudo, onde há desclassificação ou desqualificação de todos os interessados. Dessa forma, deve ser concedido prazo de 8 dias (5 se na modalidade convite) para realização de nova licitação.

O objeto do presente artigo foi solucionar a indagação quando alguns interessados são desqualificados e outros, posteriormente, desclassificados. Neste âmbito, utilizando-se de princípios da igualdade, celeridade chega-se a conclusão de que todos devem ser convocados para apresentarem novas propostas e novas qualificações. Caso não sejam qualificadas, não terão direito a ingressar na licitação.

O escopo da licitação é a participação de vários interessados para que sejam atendidos interesses da própria Administração Pública, mitigando o princípio da morosidade com a impetração de mandado de segurança ou recursos daqueles que foram preteridos no prazo de 8 dias para se adequarem ao processo licitatório, conforme o artigo 48, § 3º da Lei 8.666/93.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. São Paulo: Saraiva, 2005.

______. Lei 8.666/93. Publicada em 22 de jun. de 1993. São Paulo: RT, 2006.

FRANÇA, Maria Adelaide de Campos. Comentários à lei de licitações e contratos da administração pública. São Paulo: Saraiva, 2000.

JUSTEN FILHO, Marçal. Curso de direito administrativo. São Paulo: Saraiva, 2005.

MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 5. ed. rev. e atual. São Paulo: RT, 2001.

MELLO, Celso Antonio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros, 2006.

 

Disponível em: http://www.direitonet.com.br/artigos/exibir/3029/Da-desclassificacao-dos...