A análise da constitucionalidade do enunciado 13.18 das Turmas Recursais do Paraná


PorJeison- Postado em 11 novembro 2012

Autores: 
UTZIG, Naiara Andressa

 

Resumo: O salário é absolutamente impenhorável, nos termos do artigo 649, IV, do CPC. No entanto, as Turmas Recursais do Paraná editaram o Enunciado 13.18, que permite a penhora de 30% da conta-salário, nas ações que tramitam perante os Juizados Especiais Cíveis. Todavia tal enunciado além de ir contra o dispositivo legal fere o princípio da dignidade da pessoa humana consagrado em nossa Constituição Federal, como um dos fundamentos da República Federativa do Brasil. Todavia, os Enunciados são criados, editados e cancelados por deliberação dos membros das Turmas Recursais o que inviabiliza a sua revogação. Ademais, considerando que as causas processadas nos Juizados são de baixo valor fica mitigado a possibilidade e interesse de interposição de recurso extraordinário junto Supremo Tribunal Federal.  Desta forma, tal Enunciado deve ser considerando inconstitucional e ilegal, vez que afronta ao ordenamento jurídico brasileiro.

Palavras-chave: Impenhorabilidade; Salário; Enunciado; Juizado Especial Cível; Execução.

ABSTRACT: Salary is absolutely unattachable, under Article 649, IV, CPC. However, the Remedial Classes Paraná 13:18 edited the Statement, which allows the attachment of 30% of salary account in lawsuits that before the Small Claims Courts. However such a statement but to go against the legal provision violates the principle of human dignity enshrined in our Constitution as one of the foundations of the Federative Republic of Brazil. However, the Statements are created, edited and canceled by resolution of the members of the Remedial Classes which prevents its repeal. Furthermore, considering that the causes are processed in the Courts of low value is mitigated interest and the possibility of appeal with extraordinary Supreme Court. Thus, this Statement should be considered unconstitutional and illegal, since affront to Brazilian law. 

kEYWORDS: Unseizability; Salary; Statement; Small Claims Court; Execution.


 

1  INTRODUÇÃO

Os Juizados Especiais Cíveis foram implantados no ordenamento jurídico brasileiro pela Lei nº. 9.099/95, consagrando os princípios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, visando dirimir os litígios de menor complexidade, garantindo o amplo acesso à justiça a todas as classes sociais. Busca, ainda, um trâmite processual mais célere, considerando que o principal objetivo é a conciliação.

Todavia, quando a auto-composição não é alcançada é possível a interposição de recurso contra a sentença prolatada pelo juízo de primeira instância, que será direcionado às Turmas Recursais, responsáveis pelas decisões de segundo grau dos Juizados.

Nesse passo, as Turmas Recursais do Paraná também são responsáveis pela edição dos enunciados a serem aplicados no âmbito dos Juizados Especiais Cíveis, que atualmente conta com 97 enunciados, dentre eles o 13.18 que dispõe: Não existindo outros bens a satisfazer o crédito exequendo, possível a penhora de conta-salário no limite de 30%.

No entanto, o Código de Processo Civil Brasileiro é claro, em seu artigo 649, inciso IV, ao dispor que são absolutamente impenhoráveis os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões, pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberdade de terceiros e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal.

Além disso, a Constituição Federal, em seu artigo 1º, elenca o princípio da dignidade da pessoa humana, como um dos mais importantes de todo o ordenamento jurídico, elevado, aliás, à categoria de fundamentos da República Federativa do Brasil.

Analisando-se esses dispositivos legais e o princípio da dignidade da pessoa humana, e considerando-se o caráter alimentar do salário, cabe aferir se o Enunciado 13.18 das Turmas Recursais do Paraná é ou não constitucional.

2 DESENVOLVIMENTO

2.1. A Execução Por Quantia Certa no Âmbito do Juizado Especial Cível

Através da Lei nº 9.099/95, foram implantados no sistema jurisdicional brasileiro os Juizados Especiais Cíveis, com intuito de solucionar as causas de menor complexidade jurídica, que não ultrapassem quarenta vezes o salário mínimo, buscando sempre a composição entre as partes.

Além disso, como nos ensina o doutrinador Ernane Fidelis dos Santos (1999, p. 136):

Tais Juizados Especiais têm, na realidade, a conotação de Juizados de Pequenas Causas, mas muito embora se insista na característica básica de se atenderem por eles os mais necessitados, seu principal objetivo é a facilitação do acesso à justiça, permitindo a pobres, ricos e remediados que sejam levados à procura da realização de seus direitos, estimulados por processo mais célebre, mais barato e menos desburocratizado.

O artigo 2º, da referida lei elenca os princípios norteadores dos Juizados Especiais Cíveis, quais sejam: a oralidade, onde não se exige que os atos processuais sejam necessariamente escritos, podendo ser de forma oral, desde que devidamente registrados nos autos, para que seja possível a sua revelação e verificação em qualquer fase do processo; a simplicidade e informalidade, que dispensam as formas rígidas dos atos processuais [...] o que não se dispensa é a rigorosa observância de garantia às partes, principalmente no atendimento do contraditório e ampla defesa [...] (Ernane Fidelis dos Santos, 1999, p.148); a economia processual, que visa evitar os gatos desnecessários; e por fim, a celeridade, almejando um trâmite processual célebre, obtendo-se soluções rápidas e eficazes para os litígios.

Conforme os ensinamentos do doutrinador Hélio Martins Costa (2000, p. 21):

Desta forma, os princípios instituídos por esta lei, estabelecendo o diferencial quanto aos demais procedimentos já existentes, objetivam imprimir acessibilidade e celeridade à atuação jurisdicional, com o propósito de oferecer aos jurisdicionados a solução rápida para os conflitos e interesses.

Desta forma, tais princípios devem ser analisados e aplicados pelo magistrado no caso concreto, observando ainda as peculiaridades que possuem os Juizados, principalmente nos processos de execução por quantia certa.

Primeiramente importante frisar que apenas poderão ser discutidas no âmbito dos Juizados Cíveis as causas que não ultrapassem quarenta vezes o salário mínimo nacional, na data da propositura da ação, conforme dispõe o artigo 3º, inciso I, da Lei nº 9.099/95[2] e que sejam de menor complexidade.

Tem competência ainda, conforme nos ensina o doutrinador Hélio Martins Costa (2000, p. 175):

É competente para a execução da sentença do próprio Juizado que a proferiu. Reportamo-nos ao art. 3º, § 1º, da lei em estudo para tratarmos das atribuições executivas dos Juizados. Segundo este artigo, ao Juizado Especial competirá executar os seus julgados (inc. I) e os títulos executivos extrajudiciais (inc. II) no valor de até 40 vezes o salário mínimo.

As normas de processamento das ações de execução de título judiciais nos Juizados estão disciplinadas no artigo 52, da referida Lei, enquanto que o artigo 53, cuida dos títulos extrajudiciais, sendo que em ambos aplica-se subsidiariamente o Código de Processo Civil quando não houver disposição na lei especial, devendo para tanto serem observados os princípios e regras de regimento dos Juizados Especiais Cíveis.

O artigo 52, da Lei 9.099/95, dispõe que a execução da sentença processar-se-á no próprio Juizado, aplicando-se, no que couber, o disposto no Código de Processo Civil, com as seguintes alterações:

O inciso I traz que as sentenças serão necessariamente líquidas, em decorrência do princípio da simplicidade, contendo a conversão em Bônus do Tesouro Nacional – BTN ou índice equivalente. Nesse passo, importante o ensinamento do doutrinador Fernando da Costa Tourinho Neto (2011, p. 370):

A lei não admite sentença ilíquida em hipótese alguma, mesmo que o pedido tenha sido formulado genericamente (at. 39, parágrafo único), a fim de que ela possa ser imediatamente executada sem a necessidade de proceder-se à prévia liquidação; aliás, inexiste a fase de liquidação nos Juizados Especiais. Para facilitar a identificação, sempre atual, do quantum debeatur, o legislador determinou que as importâncias fossem convertidas, na própria sentença, em índices oficiais (p. ex., Bônus do Tesouro Nacional). Assim, a qualquer momento, mediante simples operação de conversão, é possível chegar-se à importância devida quando da prolação da decisão, evitando, desta maneira, a realização de cálculo complexo pelo contador judicial, sem prejuízo da possibilidade de elaboração de simples cálculo aritmético.

Já o inciso II, dispõe que os cálculos de conversão dos índices, de honorários, de juros e de outras parcelas serão efetuados por servidor judicial, ou seja, o próprio serventuário da Secretária dos Juizados pode realizar a elaboração dos cálculos. Frise-se, no entanto, que a elaboração desses ‘cálculos’ não representa, em hipótese alguma “liquidação de sentença” (Fernando da Costa Tourinho Neto, 2011, p. 370).

O principal motivo de tal permissão é explicado claramente pelo doutrinador Fernando da Costa Tourinho Neto (2011, p. 370):

Por outro lado, justifica-se a redação do inciso II, deste art. 52, em face da circunstância de que, nos Juizados Especiais, muitos jurisdicionados leigos postulam desacompanhados de advogados, razão pela qual necessitam de apoio da contadoria ou de serventuários da Justiça para a elaboração de cálculos adequados à execução de sentença por quantia certa.

O inciso III disciplina que a intimação da sentença será feita, sempre que possível, na própria audiência em que for proferida. Nessa intimação, o vencido será instado a cumprir a sentença tão logo ocorra seu transito em julgado.

Segundo o doutrinador o mesmo doutrinador acima citado (2011, p. 371):

O conhecimento, de fato, de dá no instante imediato no qual o magistrado está prolatando a sentença, oralmente. A lei transcende a necessidade do ato de comunicação, determinando ao juiz que o vencido seja instado a cumprir a sentença tão logo ocorra seu trânsito em julgado e advertido dos efeitos resultantes do descumprimento (aplicação de multa), nos termos do inciso V, art. 52, em se tratando de obrigação de entregar, de fazer ou de não fazer, ou, ainda tratando-se de pagamento em quantia certa, da multa de 10% sobre o montante da condenação, nos termos do disposto no art. 475-J do CPC.

Diante disso, o juiz deve deixar claro ao vencido os efeitos que um processo de execução pode trazer, tais como penhora, remoção, adjudicação de seus bens.

No inciso IV é disposto que não cumprida voluntariamente a sentença transitada em julgado, e tendo havido solicitação do interessado, que poderá ser verbal, proceder-se-á desde logo à execução, dispensada nova citação. Portanto, havendo solicitação da parte exequente o executado apenas será intimado para efetuar o pagamento da condenação, pessoalmente, caso não esteja representado por advogado. Tratando-se de pessoa jurídica, a intimação far-se-á da mesma forma, valendo ressaltar que “é cabível a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, inclusive na fase de execução” (Fernando da Costa Tourinho Neto, 2011, p. 372/373).

Ademais, não será necessária nova citação, porque ele tomou conhecimento de todos os termos da condenação quando intimado da sentença (Hélio Martins Costa, 2000, p. 177).

Além disso, importante destacar o disposto pelo doutrinador Hélio Martins Costa (2000, p. 177):

O processo executivo de julgados dos Juizados Especiais realiza-se dentro do próprio processo de conhecimento, com as particularidades procedimentais instituídas pela lei em comento, subsidiado, no que couber pelo Código de Processo Civil.

 Já no inciso V, está disposto que nos casos de obrigação de entregar, fazer, ou de não fazer, o juiz, na sentença ou na fase de execução, cominará multa diária, arbitrada de acordo com as condições econômicas do devedor, para a hipótese de inadimplemento. Não cumprida a obrigação, o credor poderá requere a elevação da multa ou a transformação da condenação em perdas e danos, que o juiz de imediato arbitrará, seguindo-se a execução por quantia certa, incluída a multa vencida de obrigação de dar, quando evidenciada a malícia do devedor na execução do julgado.

Em relação a este inciso, forte crítica é realizada pelo doutrinador Fernando da Costa Tourinho Filho (2011, p. 374):

As medidas sugeridas nessa lei para as obrigações de entregar coisa são praticamente inócuas e desproporcionais em relação ao benefício e malefício que as partes terão. Tanto é que o sistema do Código de Processo Civil não se utiliza desse regime, de acordo com as reformas introduzidas pelas Leis 8.952/1994 e 10.444/2002 (tutela antecipatória específica – arts. 461 e 461-A), mas apenas para as obrigações de fazer ou de não fazer.

Com relação á multa que poderá ser aplicada, sábios são os ensinamentos do doutrinador Hélio Martins Costa (2000, 177):

A multa será fixada na sentença ou mesmo já na fase executiva e a qualquer momento. Será diária e arbitrada de acordo com as condições econômicas do devedor, de modo a induzi-lo ao cumprimento da obrigação. Decorrido o prazo de cumprimento da obrigação incide a multa que houver sido cominada. A multa, pedida na inicial, é devida a partir do trânsito em julgado da decisão que a decreta.

Em complementação as palavras do doutrinador Fernando da Costa Tourinho Neto (2011, p. 375):

Em qualquer situação, o valor da totalizada não poderá ultrapassar muito o limite estabelecido para a alçada dos juizados cíveis, sob pena de tornar-se inexequível e, o que é pior, iníqua, pois representará para o exequente um enriquecimento sem causa, às custas do executado. Ora se a multa não consegue atingir o seu escopo (compelir o executado ao cumprimento do julgado) em determinado temo de incidência, não poderá eternizar-se. Por isso, acena o legislador para a conversão em perdas e danos, somando-se, nestes casos, à sanção pecuniária, em favor do exequente (...).

Para o controle de incidência da pena pecuniária coercitiva (inibitória), há de se aplicar, subsidiariamente e por analogia, o disposto no art. 461, § 6º, do CPC, in verbis: “O juiz poderá, de ofício, modificar o valor ou a periodicidade da multa, caso verifique que se tornou insuficiente ou excessiva”.

Das decisões do magistrado de fixação ou diminuição da multa aplicada não cabe nenhum recurso, haja vista tratar-se de decisão interlocutória, uma vez que não é admitido agravo de instrumento nos Juizados Cíveis.

Com relação ao termo inicial de incidência da multa, nos ensina o doutrinador Fernando da Costa Tourinho Neto (2011, p. 377):

O termo inicial a ser considerado para a incidência da multa é o descumprimento da ordem judicial, assim perdurando a sua incidência até que o juiz a revogue, amplie ou reduza. Todavia, a sua execução somente deverá efetivar-se após o trânsito em julgado da sentença que confirma a tutela antecipada que deu azo à fixação da multa.

O inciso VI traz que na obrigação de fazer, o juiz pode determinar o cumprimento por outrem fixado o valor que o devedor deve depositar para as despesas, sob pena de multa diária.

Nesse momento, sábios são as palavras do doutrinador Hélio Martins Costa (2000, p. 178):

A Lei 9.099/95, ao contrário do CPC, procurou simplificar os trâmites para o procedimento de prestação da obrigação por terceiro. Nesse passo, o Juiz fixará o valor das despesas para custear a transformação da obrigação e, mais, cominará pena de multa diária para efetivação do depósito.

O valor do depósito será fixado pelo Juiz, dispensada qualquer liquidação ou outros procedimentos que geram as delongas verificadas no processo comum. Entretanto, na face das dificuldades que tal procedimento pode ocasionar ao Juiz da execução, dadas as peculiaridades de cada caso, deverá o Juiz aplicar subsidiariamente as disposições do CPC, nomeando perito para auxiliá-lo. Há entendimento do que a perícia será realizada em audiência, nos termos do art. 33 da lei em estudo, na qual o Juiz buscará a conciliação das partes em torno do assunto.

O inciso VII, dispõe que na alienação forçada dos bens, o juiz poderá autorizar o devedor, o credor ou a terceira pessoa idônea a tratar da alienação do bem penhorado, a qual se aperfeiçoará em juízo até a data fixada para a praça ou leilão. Sendo o preço inferior ao da avaliação, as partes serão ouvidas. Se o pagamento não for à vista, será oferecida caução idônea, nos casos de alienação de bem móvel, ou hipotecado o imóvel.

A finalidade de tal inciso é explicada com clareza pelo doutrinador Fernando da Costa Tourinho Neto:

Essa medida se destina, como facilmente se percebe, a agilizar a efetivação do processo executivo, por meio de alienação sem os entraves do processo de execução tradicional, dependente dos trâmites judiciais. Por sua vez, o aperfeiçoamento da operação dar-se-á em juízo até a data fixada para a praça (imóveis) ou leilão (móveis).

Já com relação a responsabilidade patrimonial, aplicam-se nos Juizados Especiais, subsidiariamente, as hipóteses previstas no CPC e legislação esparsa (Hélio Martins Costa, 2000, p. 179).

Ademais, sabiamente nos explica o doutrinador Hélio Martins Costa (2000, p. 179):

A lei em estudo é omissa quanto ao procedimento de penhora, o que leva à aplicação das disposições contidas no CPC sobre a matéria.

Frisa-se inicialmente, que há de se observar os preceitos sobre a impenhorabilidade de certos bens previstos no CPC (arts. 648 et seq.) e legislação esparsa, assim como a graduação legal para nomeação (CPC, art. 655 et seq.).

Desta forma, com exceção do disciplinado neste inciso, aos demais atos da execução serão aplicados subsidiariamente às normas previstas no Código de Processo Civil.

O VIII da referida lei, dispõe que é dispensada a publicação de editais em jornais, quando se tratar de alienação de bens de pequeno valor. Tal inciso traz consigo grande divergência doutrinária sobre o conceito de pequeno valor, haja vista que não é expressamente fixado.

Segundo o doutrinador Hélio Martins Costa, deve ser considerado como pequeno valor o bem avaliado em até 40 salários mínimos, vejamos (2000, p. 180):

A expressão pequeno valor deve ser compreendida dentro do mesmo referencial que fixou o valor da alçada a determinar a competência dos Juizados Especiais, ou seja, 40 salários mínimos. Nesta ordem de ideias, consideram-se bens de pequeno valor todos aqueles cujo valor da avaliação não ultrapassem 40 salários mínimos.

Já Fernando da Costa Tourinho Neto, entende que nada obstante, quiça o parâmetro para estabelecer o “pequeno valor” possa ser enquadrado no limite de até vinte salários mínimos (2011, p. 377/378).

E com relação à hasta pública o mesmo doutrinador nos ensina (2011, p. 378):

Para fins de hasta pública, recomenda-se a designação de um único ato, se o bem penhorado não atingir valor superior a sessenta salários mínimos, tendo-se como certo que a alienação poderá ocorrer em quantia inferior ao da avaliação e, ao valor da dívida, haverão de ser incluídos os acessórios, hipóteses que podem ultrapassar o limite de quarenta salários mínimos.

O último inciso, do artigo 52, dispõe que o devedor poderá oferecer embargos, nos autos de execução, versando sobre: a) falta ou nulidade da citação no processo, se correu à revelia; b) manifesto excesso de execução; c) erro de cálculo; e d) causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, superveniente à sentença.

Diferentemente do que ocorre na vara comum, nos Juizados para que o devedor possa oferecer embargos é necessário que haja segurança do juízo, ou seja, algum tipo de penhora realizada. Ademais, conforme já exposto, o rol das matérias que podem ser alegadas em sede de embargos é taxativo, e tal peça deve ser protocolada junto ao processo de execução, eis que não há tramitação em autos apartados.

Além disso, importantes são os ensinamentos do doutrinador Hélio Martins Costa (2000, p. 181):

A oportunidade para a interposição dos embargos se dá na audiência que se realiza após a efetivação da penhora, quando dela é intimado o executado (art. 53, §2º, da LJE), inclusive para comparecimento à sessão respectiva, quando, novamente, é tentada a conciliação com a proposta de medidas alternativas possíveis à realização do pagamento do débito, tais como o pagamento a prazo ou a prestação, a dação em pagamento ou a adjudicação do bem penhorado (art. 53, § 2º da LJE).

A execução de título executivo extrajudicial, conforme disposto no artigo 53, da Lei nº 9.099/95, será no valor de até quarenta salários mínimos, obedecerá ao disposto no Código de Processo Civil, com as modificações já elencadas, introduzida por tal lei.

Frise-se ainda, que se não encontrado o devedor ou inexistindo bens penhoráveis, o processo será imediatamente extinto, devolvendo-se os documentos ao autor, de acordo com o § 4º, do artigo 53, da Lei nº 9.099/95, não sendo cabível a suspensão do feito prevista no artigo 791, III, do CPC[3].

No entanto, conforme explica o doutrinador Fernando da Costa Tourinho Neto, é de bom alvitre na hipótese de inexistência de bens penhoráveis que, após esgotados os meios de defesa, seja expedida, a pedido do exequente, certidão de dívida, para fins de inscrição no Serviço de Proteção ao Crédito – SPC e Serasa (2011, p. 383).

Assim, tem-se que respeitando seus princípios norteadores, os Juizados possuem algumas peculiaridades que visam à celeridade do processo, bem como a satisfação do crédito de forma menos burocrática.

3 OS BENS ABSOLUTAMENTE IMPENHORÁVEIS

3.1. Princípios da Impenhorabilidade

Conforme nos ensina o doutrinador Misael Montenegro Filho (2005, p. 259):

A execução é o instrumento processual posto à disposição do credor para exigir o adimplemento forçado da obrigação através da retirada de bens do patrimônio do devedor ou do responsável, suficientes para a plena satisfação do exequente, o que se operará em seu benefício e independentemente da vontade do executado – e mesmo contra a sua vontade – conforme entendimento doutrinário unânime.

Entretanto, buscando resguardar os direitos da parte executada, o artigo 649 do Código de Processo Civil elenca os bens que são absolutamente impenhoráveis, sobre os quais, em regra, não se pode recair nenhum um tipo de penhora, salvo as prevista no inciso IV, para fins de pagamento de verbas alimentares.

Neste liame, segundo a corrente majoritária da doutrina, a impenhorabilidade, apresenta dois princípios fundamentais: o da tipicidade e o da disponibilidade.

O primeiro significa que todos os bens são penhoráveis, sendo, essa, a regra. Portanto, como exceção tem-se os bens impenhoráveis, que devem ser expressamente previstos em diploma legal. 

O segundo, da disponibilidade, segundo o mestre Araken de Assis (2010, p. 245):

Qualquer bem impenhorável, mas disponível pelo devedor – excluem-se, destarte, os bens sobre os quais o devedor perdeu o poder de dispor, a exemplo dos inalienáveis –, poderá ser afetado pela execução por sua livre e soberana nomeação.

Desta forma, entende-se que o devedor pode nomear seus bens à penhora, excetos os protegidos pela impenhorabilidade, uma vez que se encontram fora do comércio legal permitido, sendo, portanto, indisponíveis. Além disso, a impenhorabilidade é matéria de ordem pública, que pode ser reconhecida de ofício pelo juiz se verificada que a constrição recaiu sobre bem impenhorável, o qual determinará o cancelamento da penhora. Frise-se ainda que a parte executada pode alegar tal direito em qualquer fase do processo, tendo em vista que não esta sujeito à preclusão, justamente pelo fato de ser matéria de ordem pública.

Por fim, sábias são as conclusões do doutrinador Araken de Assis (2010, p. 247):

O princípio da disponibilidade surge, neste contexto, como forma de ponderar os interesses em jogo, porque o complexo de regras atinentes à impenhorabilidade e o interesse próprio do obrigado asseguram-lhe o mínimo existencial.

3.2. Rol dos Bens Impenhoráveis

Conforme já explanado, o artigo 649 do Código de Processo Civil é taxativo e elenca o rol dos bens absolutamente impenhoráveis, os quais possuem a finalidade “‘benefium competentiae’ (benefício à competência), ou seja, a impenhorabilidade absoluta do estritamente necessário à sobrevivência do executado e de sua família, e à sua dignidade” (Araken de Assis, 2010, p. 252).

Nesse passo, referido artigo elenca como absolutamente impenhoráveis: I - os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução; II – os móveis, pertencentes e utilidades domésticas que guarnecerem a residência do executado, salvo os de elevado valor ou que ultrapassarem as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida; III – os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, salvo se de elevado valor; IV – os vencimentos, subsídios, soldos, salários, remunerações, proventos de aposentadoria, pensões pecúlios e montepios; as quantias recebidas por liberdade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal; V - os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão; Vl – o seguro de vida; VII – os materiais necessários para obras em andamento, salvo se estas forem penhoradas; VIII – a pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família; IX – os recursos públicos recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social; X – até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos, a quantia depositada em caderneta  de poupança; e XI – os recursos públicos de fundo partidário recebidos, nos termos da lei, por partido político.

Assim, mister se faz a compreensão e a abrangência de tal rol, uma vez que “a impenhorabilidade material absoluta, que, direta ou indiretamente, é ‘ex lege’” (Araken de Assis, 2010, p. 253), ou seja, prevista em lei de forma taxativa.

O primeiro inciso do referido artigo dispõe que são impenhoráveis os bens inalienáveis, quais sejam, aquelas sobre os quais não é possível a incidência de nenhuma penhora, por estarem fora de comércio, em decorrência da vontade legislativa, como, por exemplo, os bens públicos. Faz menção, ainda àqueles bens que, conforme nos ensina Humberto Theodoro Júnior (2009, p. 277):

(...) podem se tornar inalienáveis ou apenas impenhoráveis, em atos de vontade unilaterais ou bilaterais, como nas doações, testamentos, instituição do bem de família, etc. Caso de impenhorabilidade de larga aplicação prática é o dos bens vinculados às cédulas de crédito rural enquanto não resgatado o financiamento (Decreto-Lei nº 167, de 14.02.67, art. 69) (...)

Por se não permitir que os bens “objeto de penhor ou hipoteca constituídos pela cédula de crédito rural” sejam penhorados, arrestados ou sequestrados por outras dívidas do eminente ou do terceiro empenhador ou hipotecante, o que criou o legislador para os órgãos financiadores da economia rural foi mais do que uma garantia real, pois conferiu-lhes “verdadeira garantia exclusiva”.

Essa imunidade executava que envolve os bens vinculados às cédulas rurais hipotecárias e pignoratícias não é absoluta e deve cessar quando se decretada a insolvência do devedor, já que do concurso universal de credores não se exclui nenhum credor, a não ser a Fazenda Pública, e não prevalece , obviamente, quando a execução é movida pelo próprio titular da garantia cedular.

O segundo inciso trata dos móveis[4], pertencentes[5] e utilidades domésticas[6] que guarnecerem a residência do executado, que não podem ser penhorados, a fim de não causar sacrifícios para o mesmo e para sua família, garantido o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. Todavia, tal inciso traz duas exceções, nos casos do bem ser de elevado valor ou de ultrapassar as necessidades comuns correspondentes a um médio padrão de vida.

Frise-se ainda, o que nos ensina o doutrinador Araken de Assis (2010, p. 257):

É imperioso que os bens aluídos no art. 649, II, guarneçam a residência do executado. Situados em outro local, como escritório profissional (exceto tratando-se de peça integrada à residência, na qual o obrigado trabalha à noite, ou nos fins de semana, e, por comodidade, dotada de um pequeno refrigerador, por exemplo) e a casa de veraneio, comportam penhora. (...) Os imóveis de lazer, em si, consoante a disciplina conhecida da Lei 8.009/1990, bem como os respectivos móveis, pertenças e utilidades domésticas, situados nestes locais de ocupação transitória, ou periódica, são plenamente penhoráveis.

O terceiro inciso consagra como impenhoráveis os vestuários, bem como os pertences de uso pessoal do executado, atingindo a mesma finalidade do inciso II, qual seja, a de proteger a dignidade da pessoa humana, com o fim de evitar sacrifícios para o devedor e sua família. Ressalte-se ainda, que a mesma exceção aplicada ao inciso anterior aplica-se a esse. Assim, salvo se de elevado valor, poderá o bem ser penhorado, como jóias, relógios, dentre outros.

A impossibilidade de se realizar a penhora de vencimentos, subsídios[7], soldos[8], salários, remunerações[9], proventos de aposentadoria[10], pensões pecúlios e montepios[11]; as quantias recebidas por liberdade de terceiro e destinadas ao sustento do devedor e sua família, os ganhos de trabalhador autônomo e os honorários de profissional liberal, é disciplinada no quarto inciso do artigo 649 do Código de Processo Civil, pois se trata de uma verba de natureza alimentar, que deve ser destinada ao sustento do executado e de sua família, sendo que a penhora dos valores recebidos em função do trabalho do mesmo, pode ferir os princípios constitucionais da livre iniciativa e da dignidade da pessoal humana.

Há apenas uma exceção para essa regra, de acordo com os ensinamentos de Humberto Theodoro Junior (2009, p.278):

Em relação a todas as verbas do inciso IV, há uma ressalva legal que abre possibilidade para a penhora, qual seja: se o débito em execução consistir em prestação de alimentos, torna-se cabível a penhora sobre salários, remunerações e outras verbas equivalentes auferidas por aquele que responda pela pensão alimentícia (§ 2º do art. 649).

Nesse passo, em se tratando de execução alimentícia, é possível a penhora do salário do executado, uma vez que esta “não atinge a parcela de indispensável à subsistência do próprio executado e alimentante” (Araken de Assis, 2010, p. 262), cabendo ao juiz fixar o percentual a ser penhorado, com base no binômio necessidade x possibilidade, podendo, inclusive, determinar o desconto em folha de pagamento.

Saliente-se ainda, o entendimento de Araken de Assis (2010, p.261):

Não importa se o executado recebe a retribuição pecuniária em espécie ou por intermédio de depósito bancário, haja ou não conta-salário específica. O dinheiro depositado e conta corrente bancária só poderá sofrer a constrição de que trata o art. 655-A no montante que exceder à retribuição recebida por mês, semana ou quinzena, porque o excesso indica a existência de poupança financeira. No entanto, a 4ª Turma do STJ declarou impenhoráveis os valores recebidos em decorrência da extinção do contrato de trabalho, “ainda que tais verbas sejam aplicadas em fundos de investimentos, no próprio banco, para melhor aproveitamento do depósito”. Caberá ao executado o ônus de alegar e provar a impenhorabilidade (art. 655-A, §2º).

Já o inciso cinco protege da penhora os livros, as máquinas, as ferramentas, os utensílios, os instrumentos ou outros bens móveis necessários ou úteis ao exercício de qualquer profissão, que não vincula ao porte ou ao valor, tampouco, ao critério da indispensabilidade ao exercício profissional (Araken de Assis, 2010, p. 263).

Segundo Araken de Assis (2010. P. 263):

É irrelevante, outrossim, a importância da profissão ou sua regulamentação legal, ou que o executado trabalhe por conta própria ou por conta de outrem, bem como a circunstância de se localizar na residência do devedor (art. 1º, da Lei nº 8.009/1990). Porém o imóvel em que se localiza tais bens é penhorável, conforme decidiu a 5ª Turma do STJ, relativamente a uma escola de dança. Em termos mais gerais, mostra-se penhoráveis imóveis que sirvam para escritório de advocacia, clínica médica “e qualquer outra sociedade”. Por sinal a dicção legal deixa claro que se cuida de bens móveis.

No mesmo sentido, posiciona-se o doutrinador Humberto Theodoro Júnior (2009, p. 279):

Restou, pois, bem explicitada, a “mens legis” de privilegiar o profissional com preservação apenas do aparelhamento móvel de sua atividade. Os imóveis, ainda que se prestem a sediar o desempenho da profissão, não se inserem no benefício da inexecutibilidade.

Importante compreender que referido inciso apenas traz como requisito à impenhorável do bem a necessidade ou utilidade do mesmo para o exercício profissional. Consigne-se ainda, que também não importa o valor do bem, desde que cumpra seu papel de utilidade no exercício do trabalho.

O seguro de vida é protegido com a impenhorabilidade pelo inciso VI, independentemente de quem for o titular. Disciplina no mesmo sentido o artigo 794, do Código Civil, dispondo que no seguro de vida ou de acidentes pessoais para o caso de morte, o capital estipulado não está sujeito às dividas do segurado, nem se considera herança para todos os efeitos de direito.

Desta forma, a regra pressupõe que o dinheiro recebido propiciará a subsistência do beneficiário, e, portanto, tem destinação alimentar (Araken de Asssis, 2010, p. 253), não podendo sofrer constrição judicial para saldar dívidas.

O inciso VII relaciona os materiais necessários para obras em andamento, como impenhoráveis, ressalvando situações em que houver penhora de toda a construção. Todavia, não se incluem, por obvio, as máquinas e ferramentas do devedor porventura utilizadas na obra e que sejam estranhas à tutela do art. 649, V (Araken de Assis, 2010, p. 266).

A pequena propriedade rural, assim definida em lei, desde que trabalhada pela família, também não pode ser objeto de penhor, uma vez que faz parte do rol do art. 649, no inciso VIII.

Além disso, conforme disciplina Araken de Assis (2010, p. 269):

A sede de moradia, ainda que localizada em grande propriedade rural, se mostra impenhorável por força do art. 4.º, §2.º, da Lei nº 8.009/1990. A disposição vale pela incolumidade outorgada à construção em si, às plantações, às benfeitorias, aos equipamentos e aos móveis que guarnecerem a casa, segundo o parágrafo único do art. 1.º deste diploma.

Frise-se que a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXVI, garante que a pequena propriedade rural, desde que trabalhada pela família, não será objeto de penhora para o pagamento de débitos decorrentes de sua atividade produtiva.

Desta forma, se a área ultrapassar as dimensões entendidas como de pequena propriedade, a impenhorabilidade restringir-se-á à “dimensão da área regionalmente definida como módulo rural” (Araken de Assis, 2010, p. 270).

Importante lembrar o disciplinado pelo doutrinador Araken de Assis (2010, p.270):

E, ademais, a impenhorabilidade somente protege o bem objeto de efetiva exploração pelo proprietário e sua família. Assim, a pequena propriedade rural arrendada a terceiro é penhorável em razão de dívida de qualquer natureza contraída pelo proprietário.

A regra é clara ao ressalvar que a família deve trabalhar na propriedade, presumindo-se que dela tiram o seu sustento, e desta forma, em respeito ao princípio da dignidade da pessoa humana e do próprio direito à moradia, não pode ser penhorada.

Impenhorável também, nas palavras de Araken de Assis (2010, p. 285):

Ainda que não haja “família” a luz da CF/1988, a convivência de pessoas de mesmo sexo importa a impenhorabilidade da respectiva residência, em virtude da aplicação do princípio da igualdade e da proibição de discriminações em virtude da orientação sexual. Eventual restrição não se justificaria, ademais, ante a tendência de se reconhecer a impenhorabilidade da residência de pessoas solteiras.

Tendência essa que foi confirmada com a criação da Súmula nº 364, do STJ, a qual dispõe que: “O conceito de impenhorabilidade do bem de família abrange também o imóvel pertencente a pessoas solteiras, separadas ou viúvas”.

Nesse passo, a residência familiar, equiparada à pequena propriedade para fins de direito apenas pode ser penhora nos casos de execução de crédito concedido, por instituição financeira ou não, à aquisição e à construção do prédio, no limite dos créditos e acréscimos constituídos em função do respectivo contrato (Araken de Assis, 2010, p.287). Para satisfação de crédito na execução de alimentos, uma vez que o crédito dessa natureza predomina, no plano axiológico, e relação ao direito de moradia. Não interessa, ademais, a espécie e obrigação alimentar (Araken de Assis, 2010, p.287/288); E ainda quando não houver o pagamento dos créditos tributários, de preço público e despesas condominiais, bem como para a satisfação de crédito hipotecário quando o imóvel tiver sido oferecido como garantia real pelo casal ou pela entidade familiar (Araken de Assis, 2010, p.289).

Perde ainda o caráter de impenhorabilidade nos termos do art. 3º, VI, da Lei nº 8.009/1990 se for declara penhorável a residência familiar, no caso da “execução de sentença penal condenatória a ressarcimento, indenização ou perdimento de bens” (Araken de Assis, 2010, p.289). E por fim, nos casos de execução de crédito decorrente de fiança locatícia, uma vez que foi declarada, pelo STF, a constitucionalidade do art. 3º, VII, da Lei nº 8.009/1990.

Já o inciso IX, elenca como impenhoráveis os recursos públicos[12] recebidos por instituições privadas para aplicação compulsória em educação, saúde ou assistência social, que tem como principal fundamento o interesse público.

Saliente-se os ensinamentos de Humberto Theodoro Júnior (2009, p.280):

O fato, porém, de uma instituição ser beneficiária de subvenção do Poder Público não torna seu patrimônio imune de penhora. Apenas as verbas públicas, enquanto tais, é que não podem ser bloqueadas por meio de penhora. Os bens particulares da instituição, mesmo de utilidade pública, conservam-se como garantia de seus credores e, assim, podem ser executados para realizar suas obrigações inadimplidas. São os recursos públicos, e apenas estes, que devem ser aplicados nas metas projetadas de educação, saúde e assistência social, sem sofrer embaraço de penhora por dívidas da instituição a que se destinam.

Frise-se, que essa impenhorabilidade é absoluta, seja qual for a natureza do crédito. O dinheiro em depósito ou aplicação financeira, no todo ou em parte, é impenhorável (Araken de Assis, 2010, p.254).

Impenhorável também a quantia depositada em caderneta de poupança, até o limite de 40 (quarenta) salários-mínimos, tendo em vista possuir função de segurança alimentícia ou de previdência pessoal e familiar (Humberto Theodoro Júnior, 2009, p. 280).

Importante salientar que a regra desse inciso protege apenas a caderneta de poupança mantida pelo devedor, não abrangendo nenhum outro tipo de investimento, sendo este valor - de até quarenta salários mínimos - absolutamente impenhorável, independentemente da natureza do crédito.

Ademais, importantes são as palavras de Araken de Assis (2010, p. 255):

O art. 649, X, não alude à “única” conta de poupança. No entanto, a interpretação restritiva parece recomendável; do contrário, valores expressivos poderiam ser pulverizados em várias contas, burlando a finalidade da regra, que é a de proteger a população de baixa renda.

Por fim, o inciso XI dispõe que os recursos públicos de fundo partidário, recebidos nos termos da lei, por partido político, também não podem ser passíveis de penhoras.

Para melhor compreensão, importante destacar os elementos que compõem o fundo partidário, para o que, sábios são os ensinamentos de Araken de Assis (2010, p. 256):

De acordo com o art. 38 da Lei 0.096, de 19.09.1995, compõe o fundo partidário: (a) multas e penalidades pecuniárias aplicadas nos termos do Código Eleitora e leis conexas; (b) recursos financeiros que lhe forem destinados por lei, em caráter permanente ou eventual; (c) doações de pessoa física ou jurídica; (d) dotações orçamentárias da União, calculadas na forma do inc. IV da regra. Do conjunto dessa receita, só não constituem “recursos públicos”, para os efeitos do art. 649, XI, as doações em dinheiro de pessoas naturais e jurídicas.

Em relação aos “recursos públicos”, portanto, há impenhorabilidade absoluta: qualquer que seja a natureza da dívida, a verba é impenhorável. No entanto, a impenhorabilidade não abrange qualquer quantia depositada na conta corrente, e passível do bloqueio on line (art. 655-A), porque são penhoráveis as doações. Caberá ao órgão partidário responsável pela dívida alegar a impenhorabilidade (art. 655-A, §2º), demonstrado, através das contas apresentadas à Justiça Eleitoral, a composição dos seus recursos financeiros.

Ademais, são impenhoráveis os recursos do fundo partidário por dívida própria do candidato (Araken de Assis, 2010, p.256).

3.3 A impenhorabilidade no novo Código de Processo Civil

O Projeto de novo Código de Processo Civil, que está em trâmite na Câmara dos Deputados como o PL 8.046/2010, traz algumas modificações ao atual diploma legal no que tange a impenhorabilidade dos bens.

Importante, todavia, lembrar que a redação original de tal projeto mantinha na integra o disposto no artigo 649, do CPC que passaria a ser disciplinado no artigo 758 do novo código. Entretanto, na tramitação do Anteprojeto pelo Senado Federal houve uma relativização parcial de tal artigo, que passou a ter sua redação disciplinada no artigo 790.

Neste ponto, frise-se o disposto na Revista de Processo (novembro, 2011, p. 229):

Enquanto o novel art. 790 do Substitutivo permaneceu regulando as hipóteses de impenhorabilidade “absoluta”, seu §2º passou a conter regra expressa permitindo a penhora da remuneração do executado a partir do patamar de 50 salários mínimos mensais, independentemente da natureza do crédito exequendo, em outros termos, os valores mensais que superarem esse limite poderão ser livremente penhorados em sede de qualquer execução, ainda que o crédito não tenha natureza alimentar.

Tal mitigação da impenhorabilidade apenas foi aprovada no sentido de permitir a penhora da remuneração, enquanto, que a penhora de imóveis residenciais de elevado valor ainda não foi apreciada para possível modificação pelas Casas Legislativas.

Consigne-se ainda que tal disposição do § 2º, do artigo 790, do Projeto já esta sendo criticado pela doutrina:

Guardando o Brasil dimensões continentais, com graves contrastes socioeconômicos (tanto entre regiões geográficas, quanto entre seguimentos sociais), deve o legislador preferivelmente evitar a estipulação de alçadas fixas de impenhorabilidade (fixação de valores ou patamares preestabelecidos pelo Legislativo), como forma, inclusive, de permitir atuação mais ativa do magistrado em cada caso.

Para maior efetividade da tutela jurisdicional, é necessário dotar o magistrado de deveres-poderes para exercer a justiça do caso concreto. Ao juiz cabe, de acordo com as peculiaridades de cada situação, verificar o quantum de patrimônio relativamente impenhorável que poderá ser objeto de constrição judicial, a fim de permitir satisfação mais efetiva do crédito com preservação do mínimo necessário à sobrevivência digna do executado.

Diante disso, nota-se que a doutrina espera por uma relativização da impenhorabilidade, dando ao magistrado a autonomia para decidir se um bem ou remuneração pode e deve ser penhorado.

No entanto, o Projeto para o Novo Código de Processo Civil, ainda encontra-se tímido em relação a mitigação da impenhorabilidade, realizando avanços pequenos, mas que já podem trazer grandes reflexos a atual crise de inadimplemento que nossa sociedade vem enfrentando.

3.4. Relativização da impenhorabilidade do salário pelos tribunais

Em nosso ordenamento jurídico a penhora do salário é expressamente proibida, todavia, há na jurisprudência brasileira grandes divergências sobre tal assunto. Com o fim de solucionar a discordância de ideias no âmbito dos Juizados Cíveis, o FONAJE (Fórum Permanente de Coordenadores de Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Brasil) criou o Enunciado 59 que dispõe:

ENUNCIADO 59 - Admite-se o pagamento do débito por meio de desconto em folha de pagamento, após anuência expressa do devedor e em percentual que reconheça não afetar sua subsistência e a de sua família, atendendo sua comodidade e conveniência pessoal.

Entretanto, tal Enunciado, transmite a ideia de um acordo realizado pelas partes, com descontos na folha de pagamento, o que não fere o disposto no artigo 649, IV do CPC, tendo em vista que se houver discordância do executado a penhora não pode ser realizada.

Nesse sentido, a jurisprudência do Distrito Federal:

JUIZADO ESPECIAL. CÍVEL. EXECUÇÃO. DÉBITO NÃO ALIMENTAR. PENHORA DE SALÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. ARTIGO 649, IV, DO CPC.

1. A MODALIDADE DE DESCONTO DE VALORES DEVIDOS EM FOLHA DE PAGAMENTO SE APLICA TÃO SOMENTE AOS CRÉDITOS ALIMENTARES, OU ÀQUELES QUE DECORRAM DA ANUÊNCIA EXPRESSA DO DEVEDOR, DESDE QUE COMPORTE SUA MARGEM CONSIGNÁVEL.

2. OS VALORES EXECUTADOS PELA RECLAMANTE REFEREM-SE A ALUGUÉIS E DANOS MORAIS, MOTIVO PELO QUAL A PENHORA POSTULADA NÃO PODE SER AUTORIZADA EM FACE DO QUE DISPÕE O ART. 649, IV, DO CPC.

3. RECLAMAÇÃO CONHECIDA E IMPROVIDA.

4. SEM CUSTAS E SEM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS (Distrito Federal, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do D.F., 312971220078070001 DF 0031297-12.2007.807.0001, Relatora: Carmem Bittencourt, julgado em 03.03.2009, DJ 13.03.2009 p. 146.).

Porém, há entendimentos diversos até mesmo na Justiça comum, como no julgado do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios, de relatoria da Des. Ana Maria Duarte Amarante Brito:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO. PENHORA ON LINE. SISTEMA BACEN JUD. LEGALIDADE.

Nos termos do artigo 655-A do CPC, “para possibilitar a penhora de dinheiro em depósito ou aplicação financeira, o juiz, a requerimento do exequente, requisitará à autoridade supervisora do sistema bancário, preferencialmente por meio eletrônico, informações sobre a existência de ativos em nome do executado, podendo no mesmo ato determinar sua indisponibilidade, até o valor indicado na execução.

Consiste o BACENJUD em um sistema de informática desenvolvido pelo Banco Central, o qual hoje possibilita aos magistrados darem efetividade ao artigo 655-A, solicitando, por meio eletrônico, informações acerca da movimentação financeira dos clientes das instituições financeiras e determinando, também por meio eletrônico, o bloqueio de contas-correntes ou qualquer conta de investimento.

A absoluta impenhorabilidade da verba salarial do executado diz respeito à vedação de desconto em folha. Depositado em conta-corrente, não continua intangível, podendo ser objeto de penhora on line, sobretudo se inexistirem outros meios para a satisfação do crédito. Entender de modo diverso equivaleria a fomentar o enriquecimento ilícito do devedor.

Contudo, a penhora integral de conta-salário mostra-se excessiva. Mais razoável é que a constrição recaia somente sobre o percentual de 30% (trinta por cento) dos valores decorrentes de salário, de forma a não acarretar onerosidade excessiva ao devedor, tampouco ofensa ao artigo 649, inciso IV, do Código de Processo Civil .

Agravo conhecido e não provido.” (Processo nº 20090020042864 AGI, Relator ANA MARIA DUARTE AMARANTE BRITO, 6ª Turma Cível, julgado em 10/06/2009, DJ 17/06/2009 p. 84).

Em nosso Estado do Paraná, a jurisprudência se diferencia ao passo que na Justiça Comum é proibida a penhora de salário e nos Juizados há previsão para tal, conforme abaixo se vê:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. VERBA DE SUCUMBÊNCIA. PENHORA SOBRE SALÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. É impenhorável valores provenientes do pagamento de salário, em face de seu caráter alimentar. O art. 7º, inc. X, da Constituição Federal, estabelece que o salário do trabalhador possui caráter alimentar e é inviolável, pois se destina ao seu próprio sustento e de sua família. Inteligência dos artigos art. 7º, da CF e dos 649, IV, do CPC. RECURSO NÃO PROVIDO

(TJPR - 10ª C.Cível - AI 897333-5 - Guarapuava -  Rel.: Nilson Mizuta - Unânime - J. 12.07.2012)

MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA DECISÃO QUE DEFERIU A PENHORA SOBRE A CONTA SALÁRIO DA IMPETRANTE - ALEGAÇÃO DE IMPENHORABILIDADE - MITIGAÇÃO DA REGRA DO ARTIGO 649, IV DO CPC - PRECEDENTES DA TRU ­ MINORAÇÃO DA PENHORA PARA 30% - ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA.  Vistos, relatados e discutidos estes autos de Mandado de Segurança n. DECISÃO: Isto posto, decidem os Juízes integrantes da 1ª Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do Estado do Paraná, por unanimidade de votos, em  conceder parcialmente a segurança.

(TJPR - 1ª Turma Recursal - 20110010888-8 - Curitiba - Rel.: ANDREA FABIANE GROTH BUSATO -  - J. 06.10.2011).

Desta forma, em face do enunciado 13.18, aqui no Estado do Paraná os operadores do direito deparam-se com uma situação bastante peculiar, ou seja, um mesmo juiz pode indeferir um pedido de penhora de salário em execução na justiça comum e deferir no Juizado Especial. Por outro lado, dois usuários da Justiça com idênticas demandas podem ter soluções diferentes, dependendo de qual foro elegeram para distribuir o seu pedido, assim como, entre dois réus, um pode ter parte do salário penhorado e o outro não.

Além disso, importante frisar que contra a decisão proferida de penhora do salário dos Colégios Recursais, apenas cabe recurso extraordinário, uma vez que conforme a Súmula 203, do Superior Tribunal de Justiça, “Não cabe recurso especial contra decisão proferida por órgão de segundo grau dos Juizados Especiais Cíveis”, baseado no artigo 105, inciso III, da Constituição Federal, que disciplina competir ao Superior Tribunal de Justiça, julgar, em recurso especial, as causas decididas, em única ou última instância, pelos Tribunais Regionais Federais ou pelos Tribunais dos Estados, do Distrito Federal e Territórios. Desta forma, não sendo os Colégios Recursais considerados tribunais, não é possível a interposição de recurso especial, o que por si só dificulta o acesso das pessoas a Justiça.

4 O ENUNCIADO 13.18 DAS TURMAS RECURSAIS DOS JUIZADOS ESPECIAIS DO PARANÁ EM CONFRONTO COM A CONSTITUIÇÃO FEDERAL E O CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL

4.1. O princípio da Dignidade da Pessoa Humana

A Constituição Federal de 88 assegura em seu artigo 1º, inciso III, a dignidade da pessoa humana, como um dos principais fundamentos do Estado Democrático de Direito.

Além disso, como nos ensina o doutrinador Ingo Wolfgang Sarlet (2010, p.75):

Consagrando expressamente, no título dos princípios fundamentais, a dignidade da pessoa humana como um dos fundamentos do nosso Estado democrático (e social) de Direito (art. 1º, inc. III, da CF), o nosso constituinte de 1988, - a exemplo do que ocorreu, entre outros países, na Alemanha – além de ter tomado uma decisão fundamental a respeito do sentido, da finalidade e da justificação do exercício do poder estatal e do próprio Estado, reconheceu categoricamente que é o Estado que existe em função da pessoa humana, e não o contrário, já que o ser humano constitui a finalidade precípua, e não meio da atividade estatal.

Portanto, deve o Estado garantir, de todas as formas, a valoração da pessoa humana, e não o seu constrangimento em ter penhorado o fruto de seu trabalho mensal, quando existem diversas formas de liquidação de dívidas.

Neste ponto, sábias são as palavras do filósofo Ingo Wolfgang Sarlt (2009, p. 18/19):

Não restam dúvidas de que a dignidade é algo real, algo vivenciado concretamente por cada ser humano, já que não se verifica maior dificuldade em identificar claramente muitas das situações em que é espezinhada e agredida, ainda que não seja possível estabelecer uma pauta exaustiva de violação da dignidade. Além disso, verifica-se que a doutrina e a jurisprudência – notadamente no que diz com a construção de uma noção jurídica de dignidade – cuidaram, ao longo do tempo, de estabelecer alguns contornos basilares do conceito e concretizar o seu conteúdo, ainda que não se possa falar, também aqui, de uma definição genérica e abstrata consensualmente aceita, isto sem falar no já referido ceticismo por parte de alguns no que diz com a própria possibilidade de uma concepção jurídica de dignidade.

Além disso, segundo o doutrinador Ingo Wolfgang Sarlet, toda pessoa possui dignidade, e, note-se, independentemente da sua nacionalidade, das suas características pessoais, das suas prestações e do seu ‘status’ social (2009, p. 152).

Nesse passo, tem-se que a Carta Magma de 88 não faz qualquer distinção de raça, cor, sexo, religião, garantido a todos uma vida com dignidade e evitando que ocorram violações a tal princípio fundamental.

Frise-se os ensinamentos do doutrinador Ingo Wolfgang Sarlet (2010, p. 136/137):

É justamente neste contexto que o princípio da dignidade da pessoa humana passa a ocupar lugar de destaque, notadamente pelo fato de que, ao menos para alguns, o conteúdo em dignidade da pessoa humana acaba por ser identificado como constituindo o núcleo essencial dos direitos fundamentais, ou pela circunstância de – mesmo não aceira tal identificação – se considerar que pelo menos (e sempre) o conteúdo em dignidade da pessoa em cada direito fundamental encontra-se imune a restrições.

Na mesma linha situam-se os entendimentos de acordo com os quais uma violação do núcleo essencial – especialmente do conteúdo em dignidade da pessoa – sempre e em qualquer caso será desproporcional.

Por fim, ressalte-se, que em seu artigo 170, com nova redação oriunda da Emenda Constitucional nº 06/1995, a Constituição Federal, garante a ordem econômica, fundando-se na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna.

A Carta Magna eleva tanto o valor que o Estado deve dar aos seus cidadãos, que assegura o livre exercício de todas as atividades econômicas, não necessitando de autorização de nenhum órgão público para o seu exercício, exceto as hipóteses devidamente previstas em lei, a fim de incentivar que todos tenham o seu trabalho, garantindo o seu próprio sustento e de sua família.

4.2. Meios processuais para insurgência contra os Enunciados das Turmas Recursais do Paraná

Verificado que um Enunciado não possui mais serventia no ordenamento jurídico ou que se encontra em confronto com as normas constitucionais e infraconstitucionais, o mesmo pode ser cancelado, mediante proposta dos membros das Turmas Recursais, conforme disposto no artigo 6º, § 1º, inciso I da resolução nº 01/2010 que traz o Regimento Interno das Turmas Recursais dos Juizados Especiais Cíveis, Criminais e Fazenda Pública do Estado o Paraná[13].

Portanto, resta claro que tanto a criação quanto a revogação de qualquer enunciado é realizada por meio de mera deliberação dos membros das Turmas Recursais.

Outra possibilidade é remeter a análise do Enunciado ao Supremo Tribunal Federal, através de recurso extraordinário, nos termos da Súmula 640, in verbis, do STF: “É cabível recurso extraordinário contra decisão proferida por juiz de primeiro grau nas causas de alçada, ou por turma recursal de Juizado Especial Cível e Criminal”.

No entanto, é pressuposto para o acesso ao Supremo Tribunal Federal o esgotamento das outras vias de jurisdição, o que acaba dificultando o acesso das partes menos favorecidas ao judiciário, que preferem se omitir, deixando o seu salário ser penhorado, do que enfrentar um árduo e demorado trâmite processual em instâncias superiores, que necessita da assistência de um advogado, ferindo um dos objetivos dos Juizados, a simplicidade.

Além disso, tal recurso passa por um exame de admissibilidade, uma vez que o Supremo apenas julga em sede de recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância quando a decisão recorrida contrariar dispositivo desta Constituição; declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; julgar válida lei ou ato de governo local contestado em face desta Constituição ou julgar válida lei local contestada em face de lei federal, nos termos previstos no artigo 102, inciso III, da Constituição Federal.

Diante disso, tem-se que para as causas do Juizados Especiais Cíveis chegarem ao Supremo Tribunal, requer um árduo e demorado processo, que além de tudo vai requerer, como já mencionado, a assistência de um advogado, impossibilitando muitas vezes o acesso das partes menos favorecidas à Justiça.

5 CONCLUSÃO

Desta forma, após a análise do o procedimento das execuções de título extrajudicial e de título judicial junto aos Juizados Especiais Cíveis, bem como suas particularidades e diferenças da Justiça Comum e ainda dos bens tidos como impenhoráveis em nosso ordenamento jurídico mediante a compreensão dos incisos do artigo 649, do Código de Processo Civil, que trata claramente sobre tal matéria, torna-se mais fácil entender que o Enunciado 13.18, das Turmas Recursais do Paraná, encontra-se em confronto com o códex acima citado.

Ademais, importante frisar que tal enunciado afronta o princípio da dignidade humana, constitucionalmente previsto em nossa Carta Magna de 88, como um dos fundamentos do Estado Democrático de Direito.

Além do mais, ocorre um verdadeiro cerceamento ao acesso à Justiça, eis que os enunciados são criados, editados e revogados, por mera deliberação dos Membros das Turmas Recursais, e considerando que nos Juizados não há nenhum tipo de recurso previsto contra decisões interlocutórias a instâncias superiores e nem mesmo as próprias Turmas, as partes acabam por não ter a quem se socorrer.

A única medida cabível é o recurso extraordinário ao Supremo Tribunal Federal, todavia, é necessário levar em conta que os Juizados já foram criados com o objetivo de facilitar o acesso a justiça para as pessoas menos favorecidas. Desta forma, é sabido que tal recurso tem que ser elaborado e acompanhado por um advogado, bem como passar pelos requisitos de admissibilidade, o que torna um verdadeiro calvário para a parte que teve seu salário penhorado.

Portanto, considerando que a Constituição Federal, norma suprema, protege os direitos de cada individuo, e o livre exercício da atividade de trabalho, resta claro que a realização da penhora sobre os rendimentos de qualquer cidadão, fere a sua dignidade, tendo em vista que há diversos outros meios de que podem ser utilizados para a satisfação de débitos.

Assim, deve haver a imediata revogação do Enunciado 13.18, das Turmas Recursais do Paraná, na medida em que o mesmo afronta tanto a Constituição Federal quanto os dispositivos infraconstitucionais.

REFERÊNCIAS

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NETO & JÚNIOR, Fernando da Costa Tourinho e Joel Dias Figueira. Juizados Especiais Cíveis e Criminais. 7a ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011.

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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARANÁ. Enunciados – Turmas Recursais do Paraná. <Disponível em: http://www.tjpr.jus.br/enunciados-turmas-recursais>. Acesso em: 11 de agosto de 2012.

Notas:

[1] Mestre em Jurisdição Constitucional e Direito Processual Civil pela Universidade Paranaense – UNIPAR. Advogado. Professor do Curso de Direito da UNIVEL – Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas de Cascavel.

[2] O Juizado Especial Cível tem competência para conciliação, processo e julgamento das causas cíveis de menor complexidade, assim consideradas: I – as causas cujo valor não exceda a 40 (quarenta) vezes o salário-mínimo.

[3] Suspende-se a execução: III – quando o devedor não possuir bens penhoráveis.

[4] Bens suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substancia ou da destinação econômico-social, conforme artigo 83, do Código Civil.

[5]  Bens que, nas constituindo partes integrantes, se destinam, de modo duradouro, ao uso, ao serviço ou ao aformoseamento de outro, segundo artigo 93, do Código Civil.

[6]  Abrange, fundamentalmente, os aparelhos eletrodomésticos (ex. refrigerador) e eletroeletrônicos (ex. computador) (Araken de Assis, 2010, p. 257).

[7]  Vencimentos e subsídios são percebidos, respectivamente, por servidores públicos e por certos agentes políticos em atividade, exemplo, os magistrados (Araken de Assis, 2010, p. 260).

[8] É a designação tradicional da retribuição pecuniária dos servidores militares, e definida nas leis próprias (Araken de Assis, 2010, p. 260).

[9] Salário e remuneração designam o dinheiro recebido, em sentido restrito e amplo, pelos trabalhadores da iniciativa privada, embora o termo remuneração se aplique, por igual, ao conjunto das vantagens pecuniárias recebidas pelos servidores públicos. (Araken de Assis, 2010, p. 260).

[10] Recebem proventos os servidores públicos e os agentes políticos aposentados (Araken de Assis, 2010, p. 260).

[11] As pensões, os pecúlios e os montepios constituem contraprestações previdenciárias, recebidas pelo próprio beneficiário ou por seus dependentes (Araken de Assis, 2010, p. 260).

[12] São os que, sob a forma de auxílios financeiros ou de subvenções, originam-se das dotações orçamentárias, em regra das pessoas jurídicas de direito público (União, Estados-membros e Municípios), e, observada a disposição do artigo 4º do Dec.- lei 200, 25.02.1967, aplicável ao plano federal, eventualmente de pessoas jurídicas integrantes da Administração indireta (autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas)

[13] Serão julgadas pela Turma Recursal Reunida: §1º. À Turma Recursal Reunida, caberá ainda: I - editar, alterar ou cancelar enunciados mediante proposta de membros das Turmas Recursais;

 

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